Fonte: Observatório do
Direito à Comunicação
[12/03/07]
Rádio digital avança sem debate público
por Ana Rita Marini e Laura Schenkel - Redação FNDC
No momento em que se transita para a digitalização dos meios de
comunicação, a velocidade peculiar ao rádio manifesta-se ainda mais
intensa nas decisões políticas e de mercado acerca das escolhas
tecnológicas. Neste caso, porém, tal rapidez pode ser prejudicial aos
futuros ouvintes: sociedade e a comunidade científica estão sendo
praticamente ignoradas. Os empresários do setor adiantam as suas
preferências, antecipando-se a qualquer possibilidade de debate público
sobre a questão. Para justificar o processo oblíquo de escolha do que será
o rádio digital no Brasil, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel)
abriu, nesta semana, Consulta Pública para avaliar o Iboc, padrão
americano escolhido pelos radiodifusores para ser implementado no país.
Enquanto ainda se definem especificações
técnicas e critérios diplomáticos de cooperação entre Brasil e Japão para
a implementação da TV digital brasileira, o sistema de digitalização do
rádio se encaminha, ao que tudo indica, para uma definição bem mais
rápida. A agilidade, característica intrínseca do rádio, se transpõe para
as decisões políticas sobre o veículo, com resultados discutíveis. Para
colher contribuições acerca do sistema americano de Rádio Digital AM Iboc
(In Band on Channel), em fase de testes desde o ano passado, a Anatel
abriu a Consulta Pública nº 771, em 5 de março de 2007, que estará
vigorando até 24 de abril (leia íntegra da Consulta), baseada no documento
Proposta de Critérios e Procedimentos para Avaliação do Sistema de Rádio
Digital AM Iboc elaborado pela Universidade de Brasília - UnB.
Para o Fórum Nacional pela Democratização da
Comunicação (FNDC), estes são os arremates de um processo que iniciou
torto, pois não incluiu qualquer tipo de consulta além do que já estava
dado: a escolha do padrão americano pelos radiodifusores. “Sem nem mesmo
um arremedo de debate, como foi o da TV digital, a Anatel baterá o martelo
pelo Iboc”, declarou o coordenador-geral do FNDC, Celso Schröder. A
consulta da Anatel limita-se a um único padrão, mas poderá servir como
justificativa pública para embasar a decisão final. Em levantamento
realizado no ano passado, o FNDC estimou que a transição para o padrão
proprietário Iboc poderá custar R$ 15,7 bilhões ao cidadão e mais de R$
1,3 bilhão às emissoras (leia matéria).
Legitimado pelo ministro
Em entrevista concedida a Abert (Associação
Brasileiras das Emissoras de Rádio e TV), esta semana, o ministro Hélio
Costa anunciou a criação de um Comitê Consultivo interministerial, com a
participação da indústria e os radiodifusores, que observará a Consulta
Pública do Iboc. Da indústria, participarão especialmente os
representantes das áreas de transmissão e recepção – os radiodifusores,
através de suas associações e as emissoras educativas, comunitárias e
culturais. (acesse
trechos da entrevista).
Segundo Costa, em 90 dias será divulgado um
estudo indicando o sistema de rádio a ser adotado no país. Ele anunciou,
ainda, que há um cronograma para implantação do rádio digital até
dezembro, nas capitais. Confirmando mais uma vez sua posição, Costa disse
que o padrão americano Iboc é o mais adequado à realidade brasileira, mas
ainda não está definido. Adiantou que os radiodifusores terão acesso a
linhas de crédito especiais.
Na opinião de Regina Motta, pesquisadora em
Comunicação e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),
que participou dos estudos do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD),
difícil é imaginar que o modo como os radiodifusores pressionam o poder
público pela adoção do padrão norte-americano IBOC não vai influenciar
nessa escolha. “Se for para haver um debate tal qual o da TV Digital, para
depois dele resolver por um padrão que já estava previamente escolhido, a
iniciativa é só um gasto de dinheiro público.” A seu ver, nesta decisão,
tudo indica que o Ministério das Comunicações vai passar por cima tanto
das comunidades acadêmicas e científicas, quanto da sociedade civil.
Para Nélia Del Bianco, coordenadora de
pesquisa "Jornalismo e Sociedade" na UnB, a tendência é clara: a escolha
recairá sobre um modelo de transmissão digital que não coloque em risco o
status quo das emissoras existentes. “Neste caso, o Iboc oferece segurança
em tempos de incerteza, porque mantém os radiodifusores onde estão, com
suas freqüências, e garante a transição pela coexistência (um valor caro
aos processos de transição tecnológica) com o analógico”, reflete.
Segundo a pesquisadora, a tendência por um
modelo comercial que desconsidere o processo de adaptação de emissoras
públicas e comunitárias revela a essência do modelo de concessão de rádio
e televisão no Brasil, de natureza patrimonialista. “Um bem público
explorado pela iniciativa privada com enfoque essencialmente comercial”,
analisa Nélia, acrescentando: “Aqueles que já exploram os serviços
ganharam o direito de continuar no sistema de forma indefinida, sem o
questionamento de sua prática de uso”. A escolha dos radiodifusores de
emissoras comerciais pelo Iboc, reforça a pesquisadora, é um esforço para
combinar vantagens tecnológicas com a possibilidade de preservação do
negócio e da marca.
Testes não empolgam
Apesar da escolha dada, há informações de que
os radiodifusores não estão muito animados com os primeiros testes com o
Iboc, por conta do delay. Segundo Nélia, o digital apresenta um atraso
(chamado delay) de oito segundos em relação ao analógico, que, na fase de
transição, quando os dois sistemas conviverão por algum tempo, o ouvinte
perceberá. “Você começa a ouvir uma notícia, aí sai do digital, passa para
o analógico e o analógico já está lá na frente, pulando uma parte da
notícia. A sensação é de que há um avanço no tempo. Mas quando se dá o
contrário, com a queda do sinal digital e o retorno para o analógico, o
ouvinte é obrigado a escutar a repetição da fala do locutor pelos mesmos
oito segundos”, explica.
O Iboc é uma tecnologia cara e que ocupa uma
faixa larga do espectro. Tanto que a empresa Ibiquity, proprietária do
padrão Iboc, pediu à Comissão Federal de Comunicações, agência reguladora
dos setores de radiodifusão e telecomunicações nos EUA, a ampliação do uso
de espectro de 200 kHz para 250kHz. (leia
matéria - transcrição mais abaixo).
Se a ampliação da banda digital é requisito técnico para que o sistema
funcione sem interferência, o aumento da faixa concedido a uma emissora
significará que outras terão que sair para dar espaço a ela. Considerando
ainda o alto custo de implantação dessa tecnologia, pode-se deduzir que
cairão fora do espectro as pequenas rádios comerciais, as comunitárias e
as educativas.
A pesquisadora da UnB esclarece que, para ser
disseminada, uma nova tecnologia passa por aceleradores e freios de acordo
com a indústria, o poder econômico, pressões competitivas e políticas em
confronto naquele momento. “Atualmente, as rádios estão tentando entender
como funciona essa tecnologia. Falta capacitação técnica e em muitas
rádios será necessário trocar os transmissores. A rádio Globo em SP ainda
funciona com transmissores analógicos”, lembra. Nélia pondera, entretanto,
que por mais que a tendência seja a indicação do Iboc, é provável que se
abra espaço para o padrão aberto europeu DRM (Digital Radio Mondiale), por
exemplo, para atender às emissoras públicas. Quanto às comunitárias, diz,
“pouco se fala e não parece ser uma preocupação no momento”.
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Fonte: Fórum Nacional pela
Democratização da ComUnicação
A empresa Ibiquity, proprietária norte-americana do padrão IBOC de rádio
digital, protocolou no dia 5/7 pedido de ampliação do uso de espectro de
200kHz para 250kHz. Se for concedida pela Comissão Federal de
Comunicações (FCC, sigla em inglês) – agência reguladora dos setores de
radiodifusão e telecomunicações nos EUA – a ampliação de freqüência pode
significar a redução de cerca de 30% no total de canais FM hoje
disponíveis naquele país.
Isto porque o IBOC (In Band, On Channel) opera com o sinal analógico e
digital transmitidos ao mesmo tempo e no mesmo canal de freqüência. A
ampliação da banda digital é um requisito técnico para que o sistema
funcione sem interferência. Mas se este aumento for concedido para uma
determinada emissora outras terão que sair para dar espaço a ela.
O IBOC é o padrão preferido de 13 emissoras
brasileiras que já iniciaram testes de rádio digital no país. Para o
representante da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária
(Abraço), Josué Lopes, a notícia só agrava o quadro de entrave ao
processo de democratização da comunicação. “Além de ser um padrão que já
excluiria pela questão econômica, em função do alto custo dos royalties,
agora exclui pela questão técnica”, disse Josué.
Demanda técnica
Para que a transmissão simultânea aconteça é
preciso linearizar o sinal analógico, ou seja, fazer com que menos
sinais espúrios provocados pelo emissor analógico sejam transmitidos.
Isso provoca uma redução na qualidade sonora recebida, pois diminui a
amplitude do sinal de modulação e reduz a relação entre o nível do sinal
recebido e o nível do ruído existente no canal. O sinal do transmissor
digital, sobreposto ao sinal analógico linearizado, compõe o que
tecnicamente chama-se de máscara de emissão. Duas bandas laterais
digitais são inseridas na emissão do sinal analógico (veja gráfico ao
lado).
Na prática, estudos detectaram a
interferência do sinal digital sobre o analógico, e entre canais
distintos da mesma localidade. Uma das soluções vislumbradas para
reduzir o problema das interferências seria a ampliação desta banda
digital, como a Ibiquity está solicitando. “A ampliação é uma demanda
técnica, sem a qual o padrão não apresentará um desempenho
satisfatório”, diz o técnico do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em
Telecomunicações (CPqD), Marcus Manhães.
Caixa de sapato
A necessidade da elevação na potência de
transmissão, demanda que surge com a interferência ente os canais,
acarreta também no obrigatório replanejamento do espectro na forma que
hoje está distribuído. Segundo Manhães, caso os EUA procedam com a
implementação total do padrão IBOC, está prevista a redução de cerca de
30% dos canais hoje disponíveis, conforme Manhães.
No Brasil, algo semelhante aconteceria caso
o padrão norte-americano fosse adotado já com esta nova largura de
banda. Em localidades como Rio de Janeiro e São Paulo, onde o espectro
está lotado, alguns canais acabariam sendo despejados. “A redução do
número de canais aconteceria de forma indiscriminada, não apenas os
comunitários e educativos, mas também os comerciais”, diz Manhães, que
também é diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Pesquisa no Estado de
São Paulo (SinTPq).
Para o engenheiro de telecomunicações e
diretor técnico da rádio FM Cultura e da TVE/RS, Higino Germani, a
tentativa de realocar os mesmos canais analógicos para o padrão digital
usando o sistema "in band" é o mesmo que tentar acomodar um elefante em
uma caixa de sapato. No artigo "Rádio Digital: uma outra opção não seria
possível?", Germani defende a criação de um paradigma em radiodifusão
completamente novo. "Podem fazer idéia de quantos canais exclusivamente
digitais e o que será possível fazer nos mesmos em termos de qualidade
de áudio e informações suplementares (dados) numa banda de 6 MHz na
faixa de 88 MHz?", questiona Germani.
Debate urgente
Para Josué Lopes, da Abraço, é premente a
normatização do debate sobre a questão do rádio digital. "É preciso que
o presidente Lula publique um decreto que institua o início de um
processo de pesquisa e discussão sobre qual o melhor padrão de rádio
digital para o Brasil", disse. "Está visto que o IBOC só favorece às
grandes empresas", avaliou Josué. O representante da Abraço lembra que
não só as cerca de 15 mil emissoras comunitárias existentes hoje no
país, mas também as pequenas rádios comercias e as educativas correm o
risco de ficar excluídas do processo de digitalização caso a escolha não
se dê de forma responsável. "Um momento que deveria ser de
democratização, pode acabar se tornando de exclusão", considera o
representante da Abraço.
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Fonte:
Informativo
Eletrônico Sete Pontos
IBOC – Sistema de Rádio Digital nos
Estados Unidos por
Takashi Tome
[As fiiguras
e gráficos foram omitidos nesta transcrição: consultem em
http://www.comunicacao.pro.br/setepontos/21/takashi_iboc.htm]
1. Introdução
A tecnologia para o rádio digital adotada nos Estados Unidos é conhecida
como IBOC (In-Band-On-Channel).
O serviço em si passou por diversos nomes:
- primeiro foi o DARS (Digital Audio Radio Service);
- depois DAB (Digital Audio Broadcasting), "emprestado" dos europeus;
e, mais recentemente, parece ter se estabilizado em
- HD Radio (High Definition Radio).
Da mesma forma que os outros sistemas de rádio digital (DAB Eureka 147,
ISDB-Tsb, DRM), a idéia é levar ao ouvinte um som de melhor qualidade
(como no CD), além de possibilitar a inclusão de outras informações por
meio de um fluxo de dados ou mesmo um segundo canal de áudio
independente.
Entretanto, ao contrário dos demais sistemas, o IBOC foi concebido para
possibilitar a transmissão simultânea dos sinais digitais dentro da
mesma banda alocada para o sinal analógico da emissora.
No modo híbrido, ambos os sinais – o analógico e o digital – convivem
dentro do mesmo canal.
Na etapa posterior, o sinal analógico seria desativado, tendo-se uma
transmissão totalmente digital ocupando todo o canal.
Existem duas versões do IBOC:
- uma para a faixa de ondas médias (IBOC AM) e
- outra para a faixa de 88-108 MHz (IBOC FM).
Ambas adotam a mesma filosofia, o mesmo codificador de áudio e o mesmo
processo de modulação, diferindo em alguns detalhes como a configuração
de parâmetros ou a alocação do espectro.
Em tese, por usar a mesma arquitetura e o mesmo codificador de áudio, um
receptor "IBOC AM" e outro "IBOC FM”, ambos digitais, teriam boa parte
de seus circuitos em comum para as duas faixas.
Para a emissora, existem dois grandes atrativos.
O primeiro é que ela pode usar o espectro de que já dispõe.
O segundo é que o acréscimo de equipamento necessário para a transmissão
digital é mínimo.
Bem, essas são as vantagens que os defensores do IBOC alegam (as
desvantagens serão abordadas na parte final deste artigo).
Este artigo versa sobre o IBOC FM.
Embora do ponto de vista de circuitaria, como observado acima, o IBOC AM
seja similar, o ambiente de ondas médias apresenta problemas distintos,
que trataremos em outra ocasião.
Para facilitar a compreensão dos leitores, apresentaremos inicialmente
uma breve descrição técnica do sistema e, em seguida, o processo
histórico de sua elaboração.
O que é surpreendente para muitos de nós, que vimos estudando esse tema
há algum tempo, é que o rádio digital nos Estados Unidos, embora venha
sendo implantado e testado em diversas estações, ainda não é um sistema
consolidado e homologado pela FCC (como é, por exemplo, a TV Digital).
Essa questão será tratada na seção 3.
2. A tecnologia IBOC - Ler mais:
IBOC – Sistema de Rádio Digital nos
Estados Unidos