Fonte: Comunique-se
Da Redação
A maneira como a Globo cobriu a revelação do “dossiê dos aloprados” e a
abordagem dada à ausência de Luiz Inácio Lula da Silva no debate do
primeiro turno nas eleições foram determinantes para a criação da nova
rede de TV pública, segundo reportagem da Folha de S. Paulo publicada no
domingo (07/10). Lula considerou a cobertura dos episódios
“desequilibrada”, e viu na TV pública um contraponto.
Segundo o jornal, Lula disse a auxiliares que
sentiu pressão acima do normal para comparecer no debate, realizado uma
semana antes das eleições. E que sua ausência foi retalhada com uma
cobertura mais negativa do episódio do dossiê. Para o presidente, então
candidato à reeleição pelo PT, as fotos do dinheiro em toda a imprensa
geraram perda de votos, mas o Jornal Nacional da véspera do dia de votação
foi essencial para que Geraldo Alckmin, do PSDB, chegasse ao segundo
turno.
Chapa-branca
Decidido a acelerar a criação da nova rede pública de TV – o projeto
existia desde o primeiro mandato – Lula convidou Franklin Martins para
comandar o processo como ministro-chefe da Secretaria de Comunicação
Social (Secom). Franklin, ex-chefe de jornalismo da Globo em Brasília,
aceitou afirmando que, se o canal fosse chapa-branca, nasceria morto.
Franklin e Lula adotaram discursos e
mecanismos de evitar influência presidencial, e as duas jornalistas
confirmadas na TV Brasil, a presidente Tereza Cruvinel e a diretora de
jornalismo Helena Chagas, têm transito tanto com governo como oposição.
José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, ex-executivo da Rede Globo,
também colaborou trazendo números do mercado. Ficou acertado que a TV
Brasil começaria com um orçamento de R$ 350 milhões, parelho ao da Band.
O governo não pretende que a rede dispute com
a Globo e outras emissoras em audiência, mas espera que a TV Brasil aborde
temas ausentes da grande mídia.
O lado da Globo
Procurada pela Folha, a Central Globo Comunicação enviou comunicado
informando que “As boas normas de jornalismo recomendam tanto a
não-publicação de críticas em off [nas quais as fontes não se identificam]
quanto o comentário sobre críticas em off”. Na época, jornalistas da
emissora reagiram com um abaixo-assinado contra as acusações de cobertura
tendenciosa. Dezembro passado, Rodrigo Vianna, após ser informado que seu
contrato não seria renovado, redigiu uma carta criticando a falta de
pluralismo no jornalismo da Globo.
Fonte: Veja
"Agora que jornalistas da minha listinha de
fato foram trabalhar para Lula, com carteira assinada e tudo, aguardo os
pedidos de desculpas de meus detratores arrependidos, as odes em minha
homenagem, os beijinhos e os cafunés"
A TV do Lula já tem um chefe: Tereza Cruvinel.
Na quarta-feira, ela foi escolhida para presidir o canal estatal. Petistas
e peemedebistas brigam para abocanhar cargos na Petrobras. Enquanto isso,
o lobista Mainardi, com seu jeito sonso, conseguiu emplacar mais um nome
de sua listinha para um posto de comando no governo.
A primeira listinha do lobista Mainardi foi
publicada numa coluna de dezembro de 2005. Nela, relacionei uma série de
jornalistas comprometidos com Lula. Mais do que simples torcedores ou
correligionários do presidente, acusei-os de distorcer os fatos a fim de
abafar as denúncias contra os mensaleiros. A certa altura, eu dizia:
O Globo tem Tereza Cruvinel. É lulista do
PCdoB. Repete todos os dias que o mensalão ainda não foi provado. E que
José Dirceu não deveria ter sido cassado. Ela aparelhou o jornal da mesma
maneira que os lulistas aparelharam os órgãos públicos. Quando tira
férias, seu cunhado, Ilimar Franco, assume sua coluna.
Minha listinha de colaboracionistas na
imprensa incluía o nome do atual ministro Franklin Martins, que indicou
Tereza Cruvinel para a TV do Lula. E o nome de Helena Chagas constava de
uma listinha sucessiva em que tratei da quebra do sigilo do caseiro
Francenildo. O que fará Helena Chagas? Ela dirigirá o departamento de
jornalismo da TV estatal.
Fui muito atacado na época da primeira
listinha. Me acusaram de ligeireza. Me diagnosticaram um extenso rol de
neuroses. Quatro dos citados chegaram a me processar: Franklin Martins,
Leonardo Attuch, Paulo Henrique Amorim e Mino Carta. Até aquele momento,
os quinta-colunas da imprensa permaneciam incógnitos. Ninguém admitia que
a afinidade partidária pudesse interferir no desempenho profissional dos
jornalistas. E ninguém admitia que eles pudessem estar trabalhando para
Lula clandestinamente. Agora que alguns deles de fato foram trabalhar para
Lula, com carteira assinada e tudo, aguardo os pedidos de desculpas de
meus detratores arrependidos, as odes em minha homenagem, os beijinhos e
os cafunés.
No fim daquele primeiro artigo, anunciei o
plano de delatar todos os lulistas da imprensa, formando o tribunal
macarthista mainardiano. Como sempre acontece comigo, a piada se voltou
contra mim. Por muito tempo, fui tachado como um macarthista que perseguia
seus colegas por motivos puramente ideológicos. O fato é que Joseph
McCarthy estava certo: o comunismo tinha um monte de agentes infiltrados
no sistema americano. O fato é que eu também estava certo: o lulismo tinha
um monte de agentes infiltrados na imprensa brasileira.
Dois anos depois do estouro do mensalão, já
podemos fazer um retrospecto do caso. O STF delineou com clareza suas
principais ramificações: o núcleo presidencial, o núcleo parlamentar, o
núcleo bancário, o núcleo publicitário. O mensalinho tucano irá
desmascarar o núcleo oposicionista. Quanto ao núcleo jornalístico, a ida
de Tereza Cruvinel para a TV do Lula fechará o ciclo de uma vez por todas.
Estou à espera dos beijinhos. Estou à espera dos cafunés.
Fonte: Estadão - Blog de
Daniel Piza
17/03/07]
Valeu a pena por
Christina Fontenelle
Eu não conheço pessoalmente o jornalista Franklin Martins. Tudo que sei
sobre ele é o que sai na mídia e o que na mesma o vejo fazer, dizer e
escrever. E é com base no que leio e vejo que, pelo menos para mim, ele
está muito mais para militante partidário do que para jornalista – o que,
em minha opinião, são ocupações antagônicas, por motivos éticos óbvios.
Diga-se de passagem e faça-se justiça, Franklin não é o único. Não que uma
pessoa com formação jornalística não possa ser um militante de
carteirinha. Pode e, se achar que deve, deve mesmo. O problema é deixar
isso bem claro. Como? Há mil e uma maneiras, mas, um bom começo, é não
exercer o cargo de comentarista político em mídias que dizem estar fazendo
jornalismo e não militância. Fazer parte da assessoria de imprensa de um
partido pode, por exemplo. Mas, isso não é nem revolucionário nem
gramsciniano, é?
O pai de FM, Mario Martins, foi jornalista e político – vereador, deputado
federal e senador cassado pelo AI-5. Foi justamente depois do AI-5 que
Franklin, segundo suas próprias palavras, chegou "à conclusão de que não
havia outro caminho senão o de enfrentar a ditadura de armas na mão ". E
foi exatamente o que ele fez. Entre outras coisas, em setembro de 1969,
participou do grupo que seqüestrou o embaixador americano Charles B.
Elbrick para forçar o governo a libertar 15 presos políticos. Foi o
próprio Franklin quem redigiu o manifesto dos seqüestradores , do qual
destaco as seguintes partes: 1) "Este ato não é um episódio isolado. Ele
se soma aos inúmeros atos revolucionários já levados a cabo: assaltos a
bancos, nos quais se arrecadam fundos para a revolução, tomando de volta o
que os banqueiros tomam do povo e de seus empregados; ocupação de quartéis
e delegacias, onde se conseguem armas e munições para a luta pela
derrubada da ditadura; invasões de presídios, quando se libertam
revolucionários, para devolvê-los à luta do povo; explosões de prédios que
simbolizam a opressão; e o justiçamento de carrascos e torturadores "; e
2) "A vida e a morte do Sr. embaixador estão nas mãos da ditadura. Se ela
atender a duas exigências, o Sr. Burke Elbrick será libertado. Caso
contrário, seremos obrigados a cumprir a justiça revolucionária ".
Como se pode constatar o que os revolucionários queriam era mesmo a
revolução comunista e não a democracia pela qual, falsamente, hoje, dizem
ter lutado. Ditadores, para eles, eram os que combatiam os comunistas. O
detalhe é que a "ditadura" só se instalou porque, antes dela, havia
comunistas querendo tomar o país. Até hoje tem gente que acredita no
contrário. Mas, isso não vem ao caso, agora.
Voltando ao nosso personagem, FM foi para Cuba, para fazer curso de
guerrilha rural. De lá, foi para o Chile de Salvador Allende. Voltou para
o Brasil e trabalhou para o movimento revolucionário na clandestinidade.
Em 1974, auto exilou-se na França (sabem quanto custa isso em dólares?
Haja trabalho clandestino, hein?) onde se diplomou na École des Hautes
Études en Sciences Sociales, da Universidade de Paris. Voltou para o
Brasil em 1977 e passou mais dois anos na clandestinidade até "aparecer"
em 1979, quando foi anistiado. Foi durante esse período de dois anos que
conheceu a militante Ivanisa Teitelroit, uma psicóloga com quem se casou e
com quem, posteriormente, teve dois filhos.
De 1979 para cá, trabalhou no jornal Hora do Povo, candidatou-se a
deputado (não foi eleito), foi repórter do "Indicador Rural", redator do
Globo e do Jornal do Brasil. Em 1987, mudou-se para Brasília, onde foi
repórter e depois coordenador político da sucursal do JB. Foi
correspondente do JB, em Londres. Trabalhou também no no SBT e no Estado
de São Paulo. De volta ao Globo, foi repórter especial, colunista
político, editor de política e diretor da sucursal de Brasília. Escreveu
colunas para o Jornal de Brasília e para as revistas "República" e
"Época". Durante oito anos e meio esteve na TV Globo, na Globonews e na
CBN, como comentarista político. Atualmente, Franklin Martins é
comentarista da TV e da Rádio Bandeirantes e assina uma coluna diária no
portal iG.
Ainda na TV Globo, como comentarista político, não conseguiu disfarçar a
raiva e o medo de ter "morrido na praia" (ele e o PT) quando estouraram os
escândalos do mensalão e de todos os outros crimes cometidos pela turma do
PT e pelos vendidos ao partidão. Defendeu até o fim a tese de que "Lula
não sabia", não só do tal mensalão mas também de todo o resto. Não que
tenha feito isso aberta e claramente, mas sempre bateu na tecla de que não
havia provas concretas. Realmente, para quem acha que prova concreta
limita-se à confissão assinada e sacramentada, não havia nenhuma mesmo,
apesar da exuberância esclarecedora dos fatos – contra os quais não havia
argumentos antes dos marxistas tomarem conta de tudo nesse país. Em
entrevista à revista Carta Maior , em 14/06/06, Franklin disse o seguinte
sobre essa estórida de se Lula sabia ou não sabia: "Olha, nesse caso, eu
uso o exemplo do pai que pergunta para a mãe sobre a filha. A mãe
responde: "Ela está com o namorado, trancada no quarto, há horas, e não
quer sair". O pai sabe exatamente o que se passa lá dentro? Não, mas pode
supor. Com Lula aconteceu parecido ..."
Na verdade, até bem pouco tempo atrás, FM nunca fez muita questão de
disfarçar a sua, digamos, "simpatia" pelo PT. Depois dos escândalos, teve
de se controlar. Mas, com a consagração da vitória dos revolucionários
gramscinianos sobre a realidade, sobre a justiça e sobre a razão, aos
poucos, de emprego novo e aliviado, o sorriso e a postura de
"comentarista" bem relacionado foram voltando ao corpo de Franklin.
O comentarista trocou as Organizações Roberto Marinho pela Rede
Bandeirantes depois que a Globo não renovou seu contrato. Não passou
nenhum dia desempregado. A Band é proprietária da Rede 21, que passou a se
chamar PlayTV depois que Fábio Luiz da Silva — o Lulinha - filho de Lula —
assumiu o controle de quase toda a programação. Muitos dizem que Franklin
deixou a Globo por causa de um "duelo público" entre o jornalista global e
o colega de profissão Diogo Mainardi, colunista da revista Veja. Mainardi
deu notoriedade ao irmão e à irmã de Franklin, Victor e Maria Paula
Martins, ambos, respectivamente, designados pelo atual governo para a
Agência Nacional do Petróleo e para a diretoria da estatal capixaba que
regula o setor do gás, a Aspe. A mulher de FM, funcionária pública há mais
de 20 anos, foi secretária parlamentar do líder petista Aloizio Mercadante
e, depois, passou a trabalhar numa subsecretaria do Ministério do
Planejamento. De acordo com Mainardi, o sobrenome Martins pesou nas
nomeações. De acordo com Franklin, não pesou.
Mas, o pior mesmo, foi a divulgação de uma estorinha que circulava entre
jornalistas. Mainardi diz que possui muitas fontes e que pelo menos 15
delas poderiam confirmar a estória de que Franklin Martins teria avisado
ao ex-ministro Antônio Palocci de que o caseiro Francenildo teria recebido
dinheiro para fazer a denúncia sobre a presença constante do ministro na
"casa da maracutaia", em Brasília. Quem poderia saber que o caseiro havia
recebido dinheiro senão quem tivesse tido acesso aos dados de sua
conta-corrente na CEF. O fato é que deve ser difícil ser um jornalista
imparcial com tantos parentes trabalhando no governo. Ou não?
Martins chamou Mainardi de golpista por pedir o impeachment de Lula. Num
outro trecho da entrevista que concedeu à revista Carta Maior, disse o
seguinte sobre a comparação entre a situação em que se pediu o impeachment
do ex-presidente Fernando Collor de Melo: " Não existia no governo uma
espécie de comitê central da corrupção, como havia no governo Collor. Cada
um foi fazer sua jogada particular. As divisões internas ao governo
impediram que vários negócios desse tipo prosperassem. Havia sim uma
quadrilha, mas não o mensalão, entendido como pagamento regular a
determinados parlamentares. Houve compra de apoio político de chefes
partidários, através de doações clandestinas a gente como Valdemar da
Costa Neto e José Janene, que ficaram com o dinheiro. Para onde foram
esses recursos, eu não sei ". Vejam como são as coisas... Para mim, é
justamente o contrário. Mas, eu não sou "uma conceituada comentarista
política".
O surrealisticamente reeleito presidente Lula está formando seu ministério
para o novo mandato. Vai criar o Ministério da Comunicação Social e, aos
moldes do que já fez o companheiro Hugo Chavez, na Venezuela, vai criar a
super TV Estatal digital. Franklin Martins, pelo que tem sido divulgado,
vai assumir a pasta da Comunicação Social. Se aceitar o cargo, Martins
deixa a BAND para chefiar um ministério com super-poderes e verbas
publicitárias que chegam a 1,5 bilhão de reais por ano. Sob o novo
ministério ficarão a Radiobrás (e a futura rede estatal de televisão (*));
a Secom; a secretaria de Imprensa da presidência da República e as verbas
publicitárias do governo. A propósito, nosso futuro ministro não poderá
colocar os pés nos EUA – por causa de sua participação no seqüestro do
embaixador americano em 1969.
Tem gente que nega. Nega veementemente, peremptoriamente, como gostam de
dizer os petistas. Mas, a imprensa e a mídia de um modo geral (e, é claro,
os profissionais que nela trabalham) ficam numa posição um tanto quanto
desconfortável diante dos mais variados tipo de perseguição que podem
sofrer, não somente os veículos de comunicação mas também quem neles
anuncie. Há uma lista infindável de exemplos na história recente do país.
Vou citar o último deles. Diogo Mainardi está sendo processado por se
referir ao nordeste como "bandas de lá" e por dizer não querer pisar em
Cuiabá. Manifestar gosto e vontade está ficando perigoso e cada vez mais
caro – o que quer que se diga poderá ser interpretado como manifestação
preconceituosa passível de punição. Mas, como sempre, e como não poderia
deixar de ser, Reinaldo Azevedo descreve e analisa muito bem o fato . Eu
fecho com seus comentários sobre o assunto.
Franklin Martins finalmente chega ao governo e ao poder, de fato. Tentou
fazer isso através da revolução comunista armada. Não conseguiu. Tentou
eleger-se deputado. Não conseguiu. Agora, a recompensa. Num país onde a
realidade e a verdade vêm sendo sistematicamente ignoradas e subjugadas
pela mentira meticulosa e insistentemente construída a partir de uma
revolução gramsciniana que se desenvolve há mais de 20 anos, não só tem
valido a pena esperar como também pagar o preço. Para quem os fins
justificam os meios, aliás, não há o quê nem pelo quê não se possa pagar.
Preço maior tem pago mesmo é a democracia brasileira, para a qual coisas
como essa significam a consumação da derrota.
Christina Fontenelle
E-MAIL: Chrisfontell@gmail.com
BLOG/artigos: http://infomix-cf.blogspot.com/
BLOG/Série CAI O PANO: http://christina-fontenelle.blogspot.com/
BLOG/opinião: http://infomix2.blogspot.com/
(*) A Rede Nacional de Televisão Estatal deve consumir R$250 milhões de
recursos orçamentários nos próximos quatro anos. O projeto, destinado a
divulgar ações governamentais, entra em choque com propostas em discussão
no Congresso que sugerem a restrição dos gastos com propaganda. "Temo que
o destino dessa rede seja se tornar uma TV Lula. É um despropósito"...
"Pela proposta colocada, o governo quer uma TV de louvação e não de
informação", critica o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR) que integra a
oposição ao governo e promete resistir à proposta. "Nem o Congresso nem a
sociedade têm instrumentos para fiscalizar a programação de uma super-rede
como essa que o governo planeja", acrescenta o vice-líder do PFL, José
Carlos Aleluia (BA).
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Fonte: Folha de S.Paulo, em
Brasília
"As empresas de comunicação no Brasil, de modo
geral e em sua maioria, são empresas sérias. Não aceitariam misturar os
guichês. Eu sou uma pessoa séria e não aceito misturar os guichês."
Fala, porém, que a imprensa "não está numa
redoma" e "será criticada sempre que avançar o sinal". Na sua visão, isso
ocorre quando a mídia "pretende puxar a sociedade pelo nariz para um lado
e para o outro".
Indagado se o governo incentivaria a criação
de órgãos de imprensa simpáticos, como prega o PT, diz: "Não cabe ao
governo plantar, regar e colher veículos de comunicação simpáticos a ele".
Prega a criação de uma rede pública de TV,
dizendo que ela não deve funcionar com lógica comercial. Afirma que o
governo fará indicação inicial de diretoria, mas sem partidarismo. "Senti
na conversa com o presidente que é TV pública e não estatal. Plural e não
partidária."
Defende encontro entre Lula e o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso para que se mantenha agenda comum nacional que
quase se perdeu na crise do mensalão devido a "luta política" entre PT e
PSDB. A agenda tem cinco pontos: democracia, estabilidade monetária,
responsabilidade fiscal, crescer com distribuição de renda e combater a
exclusão social.
"Os dois precisam conversar. Seria muito bom
para os dois e para o país, mantendo as opiniões e divergências. Cada
macaco no seu galho. E, do seu galho, cada um pode conversar com o outro."
O novo ministro manterá o processo contra o
jornalista Diogo Mainardi, da revista "Veja", porque ele o acusou de
crimes. "Fiz o que se faz em qualquer estado de direito." Diz que tratará
a Globo profissionalmente, empresa da qual foi demitido após o episódio
Mainardi. "Quem olha para trás vira estátua de sal."
Diz ter "orgulho" de ter combatido a ditadura
militar de 1964. "Lutei do lado certo." Com olhos marejados, demonstra
emoção ao falar desse assunto. "Vivi na clandestinidade cinco anos e meio.
Vivi cinco anos e meio no exílio. No entanto, não vivo mais na
clandestinidade. Muita gente que torturou e matou é clandestina até hoje,
até para a sua família", afirma.
Indagado a respeito do que achava hoje de o
manifesto dos seqüestradores do embaixador americano Charles Elbrick
defender a matança de torturadores e carrascos da ditadura, afirma:
"Naquela época, quem fizesse oposição ao regime estava sob o risco de ser
preso, torturado e morto. Eram outras circunstâncias, circunstâncias de
guerra".
Imagina que seria negado um pedido de visto de
entrada nos EUA devido à sua participação no seqüestro de Elbrick, ação de
um grupo formado por militantes de duas organizações guerrilheiras, a Ação
Libertadora Nacional e o Movimento Revolucionário 8 de Outubro, que
seqüestrou o embaixador americano para forçar a ditadura a libertar 15
presos políticos, entre os quais José Dirceu, hoje ex-ministro da Casa
Civil.
"[O visto] É uma questão secundária. Tanto os
Estados Unidos quanto eu sobreviveremos a esse detalhe", diz, num tom
bem-humorado.
Franklin acumulará a função de secretário de
imprensa com a de ministro até indicar um substituto para o cargo hoje
exercido pelo jornalista André Singer. Para porta-voz, nomeará alguém de
fala "concisa". Convidou o jornalista Eugênio Bucci a permanecer à frente
da Radiobrás e aguarda resposta. A seguir, a íntegra da entrevista dada em
sua casa, em Brasília, na tarde de sexta-feira:
Folha - Por que o presidente o convidou?
Franklin Martins - A idéia do presidente é passar para a sociedade a idéia
de que deseja ter uma relação de comunicação forte, mais intensa e mais
profissional. Simbolicamente, ao chamar um profissional como eu, quis
passar essa idéia. Comunicação é falar e ouvir. Não é só falar.
Folha - Lula é criticado por ter dado raras
entrevistas coletivas no primeiro mandato.
Franklin - Isso correspondeu a um momento. O presidente tem dado
entrevista quase todo dia, falando ao final dos eventos.
Folha - Mas foge ao formato de coletiva e às
exclusivas em que pode haver o pingue-pongue entre entrevistado e
entrevistador.
Franklin - Cabe o formato de coletiva, que não é para se fazer todo dia. O
presidente fará uma coletiva em breve. E cabem essas entrevistas de saída
de eventos em que dará a palavra do presidente sobre o assunto do dia, o
que é fundamental para os jornalistas. E cabem os formatos de conversas
com jornalistas e entrevistas para órgãos de imprensa. O presidente terá
uma comunicação muito mais intensa e profissional.
Folha - E por que o sr. aceitou?
Franklin - Um pouco de vaidade com essa coisa de ser ministro. Gosto de
desafios. Profissionalmente, estava no auge da minha carreira.
Comentarista respeitado, prestigiado junto aos colegas e às fontes. Mas,
no fundo, queria fazer coisas novas, diferentes. Tem a ver com as
circunstâncias políticas do país. Passamos por uma crise política
extremamente dura, selvagem em alguns momentos, e estamos saindo dela.
Foram cometidos erros de lado, do governo e da imprensa. O povo brasileiro
demonstrou maturidade. Quis a apuração dos fatos. Mas também olhou e
disse: eu também quero que o país continue a melhorar, a enfrentar os seus
problemas reais. Não vamos confundir disputa política com solução dos
grandes problemas nacionais".
Isso baixou a intoxicação do debate político.
Na campanha, quando os candidatos subiram de tom, tiveram queda nas
pesquisas. O recado era "menos, gente".
Lula venceu com grande vantagem, demonstrando
que a opção do eleitor não foi fortuita. Mas o eleitor disse: "Não quero
perder os avanços que nós temos devido a luta política tumultuada".
Folha - Não foi só luta política. Houve
escândalos de corrupção sérios. Houve o dossiegate. O sr. acha que a
imprensa exagerou?
Franklin - Falando ainda como jornalista, não como ministro, a imprensa
cumpriu um papel importante no primeiro momento da crise, forçando a
realização das CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito). De certa
forma, pautou os primeiros momentos. Trouxe à tona o caixa dois, os
recebimentos de dinheiro por parlamentares. Entretanto, a partir de
determinado momento, era preciso avançar e responder a uma questão crucial
que eu repetia como um mantra nos comentários: "De onde veio o dinheiro do
valerioduto?" Por quê?
Essa resposta permitiria que a investigação
desse os passos seguintes. Hoje, não contamos a história. Há a suspeita.
Evidente que o dinheiro do valerioduto foi para maior número de
parlamentares do que o apontado pela CPI. O dinheiro havia sido aplicado
para financiar troca de partidos, uma hipótese bastante plausível. Por que
a CPI não quebrou o sigilo desses parlamentares? Não houve da parte da CPI
esse interesse. E a imprensa não fez uma investigação independente para
saber de onde veio e para onde foi o dinheiro do valerioduto, o que
permitiu que o processo ficasse apenas com aparência de discurso político.
A partir de um determinado momento, a imprensa
parou de pautar a CPI e passou a ser pautada pela CPI. Prevaleceu não a
investigação, mas o discurso. E a população percebeu isso e se afastou, o
que é ruim, pois nos afastou de conhecer melhor e mais o que aconteceu.
Folha - Colocar numa mesma pasta a verba
publicitária do governo e a relação com a imprensa não traz o risco de
tentativa de manipulação política da mídia?
Franklin - Traz. Viver é muito perigoso, como dizia Guimarães Rosa. Risco
sempre existe, mas não é um risco novo. Em todos os Estados da Federação,
é assim. No governo federal, sempre foi assim. Já tivemos casos em que o
porta-voz do presidente [diplomata Sérgio Amaral no governo FHC] era
também quem controlava a verba de publicidade. E não houve nada demais.
Folha - No segundo mandato, FHC separou as
funções. E Lula as deixou assim no primeiro mandato.
Franklin - O Sérgio Amaral controlou a verba de publicidade e isso não
resultou em coisa escusa, malandragem. Não houve nada.
Folha - Separar publicidade e imprensa não é
uma fórmula mais imparcial?
Franklin - A maioria esmagadora dos recursos de verba publicitária é das
estatais. O governo não controla. As campanhas de publicidade do governo
têm uma dimensão política e técnica. Vou indicar alguém da minha absoluta
confiança, íntegro e com conhecimento do mercado de publicidade, com
experiência de trabalho executivo, para cuidar da parte técnica. Serei
responsável em última instância.
Na dimensão política, deve-se discutir qual o
sentido da campanha que o governo realiza ou vai realizar. Se há dúvidas
sobre um programa social do governo ou uma medida do governo, talvez caiba
uma campanha para esclarecer melhor. O acompanhamento da mídia é
fundamental para sentir, por exemplo, se há dúvidas sobre o PAC (Programa
de Aceleração do Crescimento). Colhe-se isso também na relação com a
imprensa, que expressa as mais variadas posições da sociedade. Uma
eventual inflexão da propaganda poderá esclarecer tais dúvidas.
É um conceito de unificação da comunicação do
governo, não é para misturar dois guichês. Os guichês serão absolutamente
separados. As empresas de comunicação no Brasil, de modo geral e em sua
maioria, são empresas sérias. Não aceitariam misturar os guichês. Eu sou
uma pessoa séria e não aceito misturar os guichês. O governo é sério e não
aceita misturar os guichês.
Folha - Concorda com as teses do PT de que é
preciso democratizar os meios de comunicação? Acha que deve ser estimulada
a criação de veículos de comunicação simpáticos ao governo, dando-lhes
financiamento oficial direto ou indireto?
Franklin - Essa questão de democratização dos meios de comunicação é uma
fórmula na qual cabe tudo. Sou a favor, óbvio. Quanto mais democrática e
plural a circulação de idéias na sociedade, melhor. Mas não cabe ao
governo plantar, regar e colher órgãos de comunicação simpáticos a ele.
Quem cria órgãos de comunicação é a sociedade. O governo tem uma função na
relação com a imprensa: garantir a liberdade de imprensa. Ponto. O resto é
a sociedade quem faz.
Folha - A rede pública de TV não corre risco
de virar uma nova Radiobrás ou TV Voz do Brasil? Ela é necessária?
Franklin - É necessária. A intensidade com que essa discussão surgiu
mostra que o país estava precisando discutir isso. Em qualquer discussão
que se inicia, as posições, às vezes, vêm truncadas. Esse processo ajuda a
avançar. O governo não pretende criar uma TV do governo, estatal. Mas
estimular, fazer crescer e dar forma a uma rede pública de TV.
Folha - Com qual formato em termos editoriais,
de gestão e de financiamento?
Franklin - Não vai funcionar guiada pela questão comercial. Isso coloca
limitações para uma série de TVs que necessitam adquirir uma determinada
escala de audiência e respondem a estímulos comerciais porque são empresas
que visam lucro. Essas TVs privadas não podem entrar em determinadas
áreas, fazer determinadas programações, que são importantíssimas.
Folha - Mas não é importante ter audiência?
Franklin - É importante. Estou falando de escala de audiência. Não tem
obrigação de concorrer para liderar o horário nobre. Na Inglaterra, na
época em que fui correspondente, havia duas TVs públicas, BBC 1 e BBC 2, e
dois canais privados, ITV e Channel Four. A BBC 1, com programação mais
educativa, competia com o Channel Four. A BBC 2, com a outra, que tinha
programação mais comercial. A BBC 1 tinha audiência de seis e sete pontos,
o que é um índice bom. Essa situação ajudava a melhorar o padrão de
produção de todas as TVs.
Os mecanismos de gestão e de financiamento
devem ser discutidos e feitos com base na experiência exitosa de outros
países e aqui, como a TV Cultura, por exemplo.
Folha - Quem vai escolher a diretoria?
Franklin - Evidentemente, a escolha inicial parte do governo. Mas o
governo não precisa escolher os partidários do governo. Não existe ainda
um formato definido. A discussão ainda não está madura. O que senti na
conversa com o presidente é uma TV pública e não estatal. Plural e não
partidária. Aberta para contribuição e presença das diferentes identidades
regionais e não com uma programação de uma cara só. [Deve ter] programação
variada, com jornalismo, com parte cultural voltada para cidadania.
Isso é diferente da Radiobrás, que tem um
papel que deve continuar, funciona como uma agência noticiosa do governo.
Nesse aspecto, a gestão do Eugênio Bucci foi importante, sem caráter de
chapa branca. Tanto que convidei-o para permanecer na Radiobrás. E ele
ficou de me dar a resposta.
Folha - O governo deverá colocar recursos
vinculados, haverá possibilidade de corte no orçamento dessa rede pública?
Franklin - Honestamente, ainda não tenho idéia. O governo vai ter de botar
verba. Há discussões se vale a pena trabalhar com patrocínio privado, como
existe na TV Cultura. Não publicidade comercial. Os modelos de
financiamento e de gestão devem ser discutidos. Será bom para o Brasil ter
uma TV pública.
No Brasil, a gente se assusta com tudo que
significa mudança, modernidade e novidade. Depois, descobre que é muito
bom. Não sei por que o Brasil se assusta com a possibilidade de ter uma
BBC.
Folha - As primeiras reações de parte dos
veículos privados têm sido de reticência.
Franklin - Foram reações próprias de um debate inicial. Editoriais, como
os da Folha, criticavam a TV do governo, mas, se for uma TV pública, a
coisa muda de figura. Podemos discutir. Isso é parte do debate político.
Estamos saindo de um momento muito tumultuado de disputa política. Passou
a ser óbvio, de entrada, desqualificar a outra posição para não ter que
entrar no mérito da discussão.
O que mais quero como ministro da comunicação
social é ajudar a qualificar o debate político, o debate público.
Liberdade de imprensa não é só informar, mas também qualificar o debate
público. Fazer com que se exprimam as diferentes posições da sociedade,
que se choquem, e a sociedade escolha a melhor.
Pode haver gente tão a favor da liberdade de
imprensa quanto eu, mais a favor não tem. Meu pai foi jornalista e preso
na ditadura Vargas por não aceitar o autoritarismo. Eu passei a minha
juventude lutando contra a ditadura [militar de 1964].
A liberdade de imprensa é o nome que se dá ao
direito de a sociedade ser informada.
Folha - Como diz o ex-ministro da Justiça
Márcio Thomaz Bastos, a Constituição deseja que a imprensa seja livre, não
determina que seja justa.
Franklin - Isso. Quando a imprensa não é justa, ela paga um preço. Não é o
Estado que paga. Paga pela crítica feita a ela pela sociedade. A imprensa
também não está numa redoma. O presidente pode ser criticado, o ministro
pode ser criticado, o papa pode ser criticado, a imprensa pode ser
criticada e será criticada sempre que avançar o sinal. Quando ela avança o
sinal? Quando vai além do trabalho de dar informação, de fazer circular a
informação e de aumentar o debate público. Quando pretende puxar a
sociedade pelo nariz para um lado e para o outro. Essa não é uma função da
imprensa.
Folha - O sr. identifica veículos que avançam
sinal hoje?
Franklin - A sociedade pode fazer essa crítica. Não sou eu quem devo
fazer. Evidente, nesse período de crise, teve gente que se comportou de
uma forma, teve gente que se comportou de outra. Dentro de nossas
redações, há jornalistas que foram mais longe. Eu sempre disse que
seríamos julgados pelo nosso comportamento, o que é positivo, não é ruim.
A imprensa sairá melhor e já está saindo melhor dessa crise do que entrou.
Como o governo está saindo melhor do que entrou. A crítica é o que faz
pessoas crescerem desde que elas consigam perceber o que fizeram de
errado. E quem critica a imprensa e muda a imprensa é a sociedade, não é o
governo. Não é o leitor. O leitor de um jornal pode até estar gostando
desse jornal. Mas o debate na sociedade pode levar aquele leitor a
perceber que não era bem assim.
Folha - Como ministro, o sr. manterá o
processo contra o jornalista Diogo Mainardi?
Franklin - Vou manter.
Folha - Por quê?
Franklin - Não estou fazendo nada contra a liberdade de imprensa. Manter o
processo contra esse senhor não tem nada a ver sobre o que eu penso ou o
que ele acha que eu penso. É um direito que ele tem. Isso não discuto.
Entrei com processo contra ele porque ele me acusou de crimes. Me acusou
de ter praticado tráfico de influência e de ter participado da quebra de
sigilo do caseiro Francenildo Costa.
Fez essas acusações sem nenhum elemento. Mais
do que isso, ele e a revista dele ["Veja"] se recusaram a publicar a minha
resposta, a minha explicação. Que liberdade de imprensa é essa na qual um
lado fala e sequer publica o outro lado. Fiz o que se faz em qualquer
estado de direito. Quando acha que sua honra foi atingida, recorre à
Justiça. Quem pode definir se essa honra foi atingida? Eu? O colunista da
revista? Não, a Justiça. No processo, peço que seja publicada a minha
resposta e peço reparação por danos morais.
Folha - Como ministro, não ganhará mais peso
esse processo em seu favor?
Franklin - A Justiça não vai agir assim porque sou ministro. Pelo ritmo no
Brasil, a Justiça só terá julgado esse processo depois que eu deixar de
ser ministro. Ele terá toda a oportunidade de provar que todas as
acusações de que cometi crimes são verdadeiras. E, se for isso, quem vai
ficar mal sou eu.
Ele também pode, se quiser, dizer: "Eu errei.
Volto atrás". Mas hoje em dia pega mal para ele. Acho que dificilmente o
fará. Não vou abrir mão de defender a minha honra da única forma num
estado de direito, que é ir à Justiça.
Folha - Esse episódio foi determinante para o
seu afastamento da função de comentarista do "Jornal Nacional" e da saída
da Rede Globo?
Franklin - Não. Eu já havia deixado de ser comentarista do "Jornal
Nacional". A direção da TV Globo chegou à conclusão de que deveria tirar
toda e qualquer opinião do jornal porque ele era basicamente informativo.
Folha - E em relação à saída?
Franklin - Fiz essa pergunta à direção, e eles disseram que não. A
alegação que me deram é que eu estava com imagem fraca como jornalista,
muita gente não me conhecia. Eu disse a eles que achava que a explicação
não me convencia. A pergunta tem de ser feita à TV Globo.
Folha - O sr. tem mágoa da Rede Globo e de sua
cúpula atual?
Franklin - Não. Tive oportunidades profissionais fantásticas na TV Globo.
Trabalhei lá durante oito anos e meio. Fui comentarista dos principais
jornais. Participei do núcleo que coordenou a cobertura das eleições de
2002, que foi um marco na história da TV Globo. Fui diretor de jornalismo
em Brasília, sempre com uma relação excepcional com a Central Globo de
Jornalismo. Portanto, sou grato à TV Globo. Aconteceu uma coisa que não
entendo.
Folha - Como o sr. pretende se relacionar com
a Globo?
Franklin - Digo sempre que não vou olhar para trás. Quem olha para trás
vira estátua de sal. Tenho muitos amigos na Globo. Deve haver pessoas que
não gostam de mim. Será um relacionamento profissional.
Folha - Qual é a sua avaliação da cobertura da
imprensa de modo geral a respeito do governo Lula?
Franklin - Vou falar como acho que deve ser daqui para frente.
Profissional, séria, crítica, sem preconceito.
Folha - O sr. está proibido de entrar nos EUA
por causa do sequestro de Charles Elbrick?
Franklin - É uma versão que corre, provavelmente verdadeira. Mas nunca
pedi visto para o governo americano, até porque imagino que não me dariam.
Outras pessoas que estiveram na mesma situação que a minha, de seqüestro
do embaixador americano Charles Burke Elbrick, receberam sinais de que não
conseguiriam.
Folha - O sr. vai com Lula para Washington no
final do mês?
Franklin - Não sei. É uma questão secundária. Tanto os Estados Unidos
quanto eu sobreviveremos a esse detalhe.
Folha - O sr. participou da luta armada contra
a ditadura militar de 1964. Como avalia hoje aquele período? Valeu a pena?
Foi o melhor caminho? Arrepende-se de algo? Faria diferente?
Franklin - Faria muitas coisas diferentes com a visão que tenho hoje. Não
me arrependo do que é central. Lutei do lado certo. Lutei do lado da
democracia contra a ditadura.
Folha - O manifesto dos seqüestradores do
embaixador falava em matar carrascos e torturadores do regime militar. O
que acha disso hoje?
Franklin - Fica difícil discutir porque hoje não existe uma polícia como
um instrumento de opressão política do Estado sobre as pessoas. Hoje, as
pessoas fazem oposição livremente, falam livremente. Naquele época, quem
fizesse oposição ao regime estava sob o risco de ser preso, torturado e
morto. Eram outras circunstâncias, circunstâncias de guerra.
Com todas as suas diferentes nuances, o povo
brasileiro superou a ditadura militar. Participei das manifestações
estudantis de 1968 que praticamente inviabilizaram o modelo de ditadura
que eles tinham. Então, partiram para o terrorismo de Estado aberto. Em
1974, a vitória do MDB, inviabilizou o terrorismo de Estado. As diretas,
em 1984, inviabilizaram a distensão que pretendia manter uma ditadura sob
controle. Estive do lado certo. Tenho o maior orgulho de ter lutado. Tenho
um certo pudor de bater no peito e ficar proclamando, parece que estou
contando vantagem.
Tenho o maior orgulho de ter lutado contra a
ditadura. Posso contar tudo o que fiz, inclusive os meus erros, para os
meus filhos, os meus netos, discutir abertamente na sociedade.
Os que estiveram do outro lado não podem. Vivi
na clandestinidade cinco anos e meio. Vivi cinco anos e meio no exílio. No
entanto, não vivo mais na clandestinidade. Muita gente que torturou e
matou é clandestina até hoje, até para a sua família.
Folha - O sr. foi preso e torturado?
Franklin - Fui preso durante dois meses, mas não fui torturado. Saí um dia
antes do AI-5 [ato institucional número 5, de 13 de dezembro de 1968, que
suspendeu direitos políticos e tornou mais bruta a ditadura militar de
1964]. Se estou aqui até hoje, é porque sou um sujeito que teve muita
sorte.
Folha - O sr. participou de alguma ação em que
morreram pessoas? Matou alguém?
Franklin - Não, não.
Folha - Nas eleições, Lula chegou a dizer que
desejava um acordo com a oposição, encontrar uma agenda comum. É possível
haver algum entendimento entre PT e PSDB, duas forças com algumas
características em comum, mas que se digladiam?
Franklin - No auge da crise, o Brasil correu o risco de perder uma coisa
que ele construiu quase sem saber. E poderia ter perdido sem saber que
construiu, que é uma agenda política comum nacional. Essa agenda tem cinco
pontos. O primeiro é a democracia. Vamos resolver nossos problemas pela
via democrática. Queremos eleições, queremos respeito aos direitos e
garantias individuais. A oposição tem o direito de fiscalizar, mas não tem
o direito de impedir o governo de governar. O governo tem o direito de
governar, mas não tem o direito de impedir a opinião de se expressar. Se
há uma direita no Brasil, o que se discute [risos], ela é mais democrática
do que era antes. A esquerda é mais democrática do que era antes.
O segundo ponto é a moeda. Queremos
estabilidade monetária. Houve uma época em achávamos que podíamos conviver
com a inflação alegremente graças ao overnight, ao gatilho salarial, à
escala móvel de salário. O preço estamos pagando até hoje.
Terceira questão: responsabilidade fiscal. Não
basta o governante ir gastando e pendurar a conta no cabide ali em frente.
Temos de ter seriedade com o dinheiro público. Quarta questão. Tudo isso é
muito importante, mas é preciso crescer, gerar emprego, gerar
oportunidades para a juventude. E a quinta é que não basta crescer. Temos
de combater a exclusão social.
Essa agenda vem sendo construída ao longo do
tempo. Parte dela foi construída durante a ditadura. Parte no governo
Fernando Henrique Cardoso. Parte no primeiro governo Lula. Essa agenda
corresponde a um pensamento de 70% a 80% das forças políticas do país. A
vantagem disso é que a luta política pode se dar num terreno razoavelmente
delimitado. Nessa crise, quase jogamos isso pela janela. Se a crise
tivesse ido um pouquinho mais longe e se o povo brasileiro não tivesse
dito "calma, pessoal, eu não quero perder essa coisa".
Folha - O que seria ter ido mais longe? A
oposição patrocinar o impeachment do Lula? O Lula tentar dar uma guinada
autoritária?
Franklin - Sim. Por que não partiram para o impeachment? Por que o Lula
não endureceu? Porque a sociedade disse: "Não quero". Temos essa agenda
comum. Grandes programas que começam a dar certo são apoiados por muito
mais partidos do que os que estão no governo. O Bolsa Família era tido
como uma "Bolsa Esmola". Hoje, a maioria das forças políticas reconhece
que é um vigoroso programa de transferência de renda que deve ser mantido
e aprimorado. É uma conquista que não dá para abrir mão. O atual programa
de melhoria da qualidade da educação incorpora coisas que vieram do
governo FHC. Nos últimos 25 anos, construímos coisas em comum e quase
jogamos fora na crise.
Folha - Lula se queixa de FHC ter sido muito
duro com ele na crise. FHC se queixa de Lula não ter mantido a
cordialidade a que ele deu início com a transição de governos. O sr. acha
que eles deveriam se encontrar e conversar?
Franklin - Os dois precisam conversar. Seria muito bom para os dois e para
o país, mantendo as opiniões e divergências. Esse negócio de agenda comum
não é aderir ao governo. A oposição está na oposição por vontade do
eleitor. O governo está no governo porque o eleitor mandou. Cada macaco no
seu galho. E, do seu galho, cada um pode conversar com o outro.