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Dezembro 2008
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12/12/08
• Profissão de fé - Mensagem de José Smolka
----- Original Message -----
From: J.R.Smolka
To:
wirelessbr@yahoogrupos.com.br
Sent: Friday, December 12, 2008 1:21 AM
Subject: [wireless.br] Profissão de fé
Aos colegas da
ComUnidade, particularmente o
Rogério, o Bruno e o Julião.
Estivemos conversando nestes últimos dias, até porque eu mesmo provoquei isto,
sobre vários aspectos (técnicos, políticos e regulatórios) do mercado de
telecom no Brasil. Porém percebo vcs com uma fixação muito grande sobre a
questão de acesso à Internet, com um razoável componente de oposição a "isso
que está aí". Porém acho que estamos em uma encruzilhada. E talvez o que vou
dizer venha a colocar-nos em campos opostos com relação a estes assuntos, mas
acho que não vai ser possível continuar um debate honesto sem colocar isto
abertamente.
Gente, o real problema com a Internet é muito mais profundo que simplesmente
garantir acesso isonômico a backbones. O que está em curso há alguns
anos, e que não vai voltar atrás, por mais que alguns queiram, é uma disputa
direta sobre quem terá o papel dominante no mercado de serviços de
telecomunicações do século XXI (ou, pelo menos, deste primeiro terço dele). E
os sinais desta disputa estão espalhados por toda parte. Basta prestar
atenção.
Vou ser curto e grosso. As operadoras de telecom, e seus tradicionais
fornecedores de equipamentos, e os fora (plural latino correto para
forum) de padronização, não estão abraçando alegremente a idéia de
transformação das suas redes para um modelo all-IP. Isto está sendo
feito, com muito choro e ranger de dentes, por pura necessidade. Por causa da
percepção que a convivência entre a Internet e as redes de telecomunicações
não é simbiótica, é parasitária. E, se nada for feito para impedir, a Internet
(o parasita) tem grandes chances de engolfar e substituir completamente as
redes de telecomunicações (fixas e móveis) subjacentes a ela (o hospedeiro).
Existe uma certeza: todos os serviços de telecomunicações, inclusive, e
especialmente, aqueles que antes eram prestados com o uso de redes
especializadas (ex.: telefonia, televisão, rádio, etc.), passarão a ser
prestados por versões equivalentes TI: aplicações de informática, programas de
computador - pouco importa se a plataforma de execução destes programas seja
um desktop, laptop, palmtop, celular, ou que as aplicações executem embarcadas
nos mais variados dispositivos. A troca de dados entre os peers ou
entre clientes e servidores destas aplicações/serviços de telecomunicações
será feita exclusivamente pela técnica de comutação de pacotes, e a
arquitetura TCP/IP não tem nenhum rival à altura para ocupar o papel de
infra-estrutura de transporte. As redes especializadas legadas utilizadas hoje
não vão desaparecer de imediato. Isto será um processo gradual, que (IMHO)
durará entre dez e trinta anos para se completar. Mas este é um processo
inexorável e irreversível. BTW, creio que o que chamamos de STFC e SMP serão
as primeiras vítimas deste processo, seguidos pelos serviços de TV por
assinatura.
Mas existem duas escolas de pensamento a respeito disto. Escolha de qual lado
ficar, porque elas são inconciliáveis, e não há meio-termo aqui. Um ponto de
vista é que as redes de telecomunicações irão realmente dissolver-se, restando
apenas a infra-estrutura necessária para o suporte da Internet. Não por acaso,
este é o pensamento da comunidade TI-cêntrica, os
netheads.
O outro ponto de vista é que as redes de telecomunicações utilizarão TCP/IP
sim, mas os seus serviços trafegarão em uma estrutura IP separada logicamente,
e devidamente "domesticada", da Internet pública, que continuará a ser
suportada como um ambiente de serviços, mas cujos serviços não se confundem
com os serviços IP da rede de telecomunicações. Adivinhe só... os engenheiros
de telecom clássicos, os
bellheads,
preferem este ponto de vista. Esta dicotomia pode ser entendida melhor dando
uma lida
neste artigo.
Pode parecer que não, mas o debate e a disputa pela primazia nos corações e
mentes dos usuários vão muito bem, obrigado. WiFi + WiMAX móvel versus
LTE, IMS + SDP versus o modelo de negócio Google, ASON/ASTN versus
IP/MPLS puro, und so weiter...
Então, meus senhores, vou fazer o meu "credo de Nicéia" a respeito desta
disputa, e do que acho importante debater.
Creio que, apesar do apelo libertário de uma Internet encampando todo o
cenário de serviços de telecom, e das operadoras clássicas de telecom sendo
limitadas ao papel de bit carriers, a predominância econômica e a
capacidade de lobby legislativo/regulatório das operadoras dá a elas o poder
de fogo suficiente para fazer valer o seu ponto de vista a longo prazo (ou,
pelo menos, provocar um empate onde os dois pontos de vista sejam obrigados a
conviver). Isto não é uma peculiaridade do Brasil, mas uma tendência mundial,
que vai ser um tsunami sim, não uma "marolinha".
Creio que, dada a convicção anterior, estamos perdendo tempo em ficar
discutindo as falhas da implantação do modelo regulatório atual. O crítico é
discutir como este novo modelo regulatório virá a ser. Sintoma disto é o muro
de desinteresse que o Deputado Arnaldo Jardim (PPS/SP) vem encontrando para
levar adiante a idéia de contestar o Decreto 6.654/2008 (que aprovou o novo
PGO que autoriza a criação da BrOi). Embora possam discordar da forma que foi
feito, a maior parte dos deputados acha que o novo PGO está na direção certa.
Mas os motivos ideológicos que embasam esta crença são diferentes. Uns
acreditam que uma "empresa forte de capital nacional" é importante no cenário
geral de competição que virá. Outros acham que o desenho tecnológico do
mercado empurra o modelo de outorgas para grandes empresas, fazendo de tudo,
competindo com footprint nacional. Pessoalmente simpatizo mais com esta
última opção.
Creio que temos que começar a desenhar o novo marco regulatório de telecom no
Brasil com estas premissas em vista. E deve ser um modelo alinhado com a
realidade regulatória em outros países. A pior coisa que podemos fazer é
tentar inventar um modelo "jabuticaba". Gera desconfiança, dificulta os
investimentos e impede que se usufruam dos benefício de economias de escala. E
as principais características deste novo modelo devem ser: (a) a clara
separação entre os estratos de serviços prestados aos assinantes
(predominantemente prestados a pessoas físicas) e de serviços de transporte
(tipicamente prestados a pessoas juridicas); e (b) definições dos serviços, em
ambos os estratos, que sejam agnósticas para a tecnologia utilizada para
suporte á sua prestação.
Existirá, em algum futuro previsível, espaço para evolução das redes para o
modelo all-Internet? Talvez. Depois de estabilizada a primeira onda de
conversão de serviços para ambiente all-IP, talvez as animosidades e
desconfianças das comunidades nethead e bellhead venham a
diminuir, e uma visão comum possa ser construída. Mas não vejo como possamos
chegar lá sem passar pelo cenário inicial que já descrevi.
E, por último, lembrem sempre que a minha ideologia política está próxima ao
minarquismo.
Não esperem de mim simpatia com idéias socialistas e/ou estatizantes. Sem
chances.
[ ]'s
J. R. Smolka
ComUnidade
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