Fonte: Tele.Síntese
*Gustavo Gindre - Integrante do Coletivo
Intervozes, coordenador acadêmico do Nupef/RITS e membro eleito do Comitê
Gestor da Internet no Brasil (CGIbr).
O Senado aprovou projeto de Aloizio Mercadante (PT-SP) que visa modificar
a lei do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST),
arrecadação de 1% da receita bruta das operadoras. O FUST foi previsto na
Lei Geral de Telecomunicações (LGT), criado por lei ordinária em 2000 e
até hoje não teve um único centavo gasto. Estima-se que o governo já tenha
arrecadado mais de R$ 6 bilhões com esse imposto.
O projeto do senador Mercadante está
tramitando atualmente em uma comissão especial da Câmara dos Deputados e
seu relator, deputado Paulo Lustosa (PMDB-SP), já anunciou mudanças na
proposta inicial. Com isso, o projeto terá que voltar ao Senado depois de
aprovado pela Câmara.
Mas, tanto a versão inicial de Mercadante
quanto o relatório de Lustosa mantêm um equívoco gigantesco, que atende
apenas aos interesses das operadoras de telefonia fixa (Brasil Telecom,
Oi, Telefônica, CTBC e Sercomtel). Trata-se do trecho contigo no inciso I
do caput do artigo 2° e no inciso I do parágrafo 1° deste mesmo artigo.
Os acertos
Quase a totalidade do projeto visa garantir
que o Estado poderá apoiar projetos de universalização da banda larga,
através de suas próprias iniciativas, de governos estaduais, prefeituras,
ONGs e empresas privadas. Acertadamente dá destaque para a meta de
disponibilizar banda larga em todas as escolas públicas brasileiras e
reserva pelo menos 30% dos recursos para as regiões Norte e Nordeste.
O projeto prevê também a necessidade de
prestação de contas e a obrigação da Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel) outorgar licenças e frequências para que o poder público local
possa prover o acesso gratuito à Internet banda larga.
O equívoco
Contudo, logo em seu artigo 2° o projeto prevê
um outro uso dos recursos do FUST, em total desacordo com o restante do
próprio projeto. Trata-se da possibilidade da criação de um “bolsa
telefonia fixa” (único serviço atualmente prestado em regime público), nos
dizeres do presidente da Associação Brasileira das Concessionárias do
Serviço Telefônico Fixo Comutado (Abrafix), José Pauletti, em recente
entrevista à Tele.Síntese. Com estes dois incisos, o projeto permite que o
governo federal pague as contas de telefone fixo daquelas pessoas que não
tiverem recursos para tal.
A Anatel prevê apenas para 2010 o modelo
incremental de custos que lhe permitirá definir um limite para a cobrança
de interconexão. Atualmente, cada empresa cobra o que quer e não é
possível saber até que ponto estes valores são justificáveis ou não. E na
mesma Câmara dos Deputados tramitam projetos de lei que visam acabar com a
assinatura da telefonia fixa.
Enquanto isso, a proposta de Mercadante e o
relatório de Lustosa simplesmente desconsideram todo esse processo e
determinam que o governo pague, sem discutir, o preço cobrado pelas teles.
Para as teles é um negócio fantástico.
Para a enorme maioria da população, as
concessionárias de STFC surgem como a única opção para o acesso ao
telefone fixo (portanto, um monopólio desprovido da concorrência). E
agora, as teles ainda poderão usufruir de recursos públicos para lhes
remunerar não o custo, mas o preço final.
Na prática, as teles continarão oferecendo o
mesmo serviço, no mesmo valor atual. Se José puder pagar a conta, ótimo.
Se João não puder, o Estado paga. De uma forma ou de outra, a tele recebe.
Como as teles vêm perdendo a cada dia que
passa assinantes do telefone fixo (expulsos por conta dos valores
excorchantes), as propostas tanto do senador quanto do deputado permitem
conter a sangria do monopólio privado utilizando recursos públicos.
Ao invés disso, o projeto deveria manter seus
acertos e se destinar exclusivamente à garantia da universalização do
acesso banda larga a Internet, que, graças aos serviços de VoIP, também
permite levar a telefonia fixa (a custos reduzidos) ao conjunto da
população brasileira.