Segundo a advogada Claudia Domingues, as empresas Brasil
Telecom e Oi podem discutir a possível aquisição, mas não
negociar. Podem, inclusive, propor à Anatel que faça
alteração no Plano Geral de Outorga. Mas, enquanto a mudança
não é aprovada, não é possível nenhuma efetivação da compra.
Os dispositivos que impedem a transferência de concessão são
os artigos 7º e 14º do Plano Geral de Outorga (PGO). Para a
advogada, são essas regras que precisam ser alteradas. Já a
Lei Geral de Telecomunicações nos artigos 201 e 202,
viabiliza a transferência.
O artigo 7º do PGO estabelece: “Após a desestatização de que
trata o art. 187 da Lei nº 9.472, de 1997, e de acordo com o
disposto no art. 209 da mesma Lei, só serão admitidas
transferências de concessão ou de controle societário que
contribuam para a compatibilização das áreas de atuação com
as Regiões definidas neste Plano Geral de Outorgas e para a
unificação do controle societário das concessionárias
atuantes em cada Região”.
Para o especialista Fábio Kujawski, o cerne da questão está
no artigo 14 do PGO. De acordo com o dispositivo, “a
obtenção de concessão em determinada Região por empresa já
concessionária do serviço a que se refere o art. 1º, sua
coligada, controlada ou controladora implicará a obrigatória
transferência a outrem, de contrato de concessão detido em
outra Região, no prazo máximo de dezoito meses, contado da
data de obtenção da concessão”. O advogado explica que o
artigo dá margem a interpretações. “Não existe vedação pura
e simples”, constatou.
Para alterar as regras do PGO, caberá à própria agência
elaborar e propor a mudança. Conforme explicou Claudia
Domingues, a Anatel também terá de submeter as alterações à
consulta pública e à opinião do conselho consultivo da
agência. “O processo tem de obedecer todo o trâmite, ir ao
Ministério das Comunicações e, depois, ao presidente, o que
levaria uns dois meses”, afirma.
Se a alteração não for feita antes da negociação, a agência
pode barrar a pretensão das duas empresas. E mais, as duas
empresas podem ser punidas pela Anatel com a perda da
concessão, já que a Brasil Telecom e a Oi não poderiam
fechar um negócio que é considerado ilegal.
Concentração e concorrência
Kujawski explica que, na Lei Geral de Telecomunicações, não
há vedação explícita para o negócio. Ele citou o artigo 202,
da lei, que estabelece que a transferência do controle
acionário ou da concessão poderá ser feita após cinco anos
da privatização, que ocorreu em 1998.
“Vencido o prazo referido no caput, a transferência de
controle ou de concessão que resulte no controle, direto ou
indireto, por um mesmo acionista ou grupo de acionistas, de
concessionárias atuantes em áreas distintas do plano geral
de outorgas, não poderá ser efetuada enquanto tal
impedimento for considerado, pela Agência, necessário ao
cumprimento do plano”, determina o parágrafo primeiro do
dispositivo. O advogado ressalta que a Anatel só aprovará a
negociação caso não haja prejuízo à concorrência.
Já a advogada Claudia Domingues informa que quanto à
concentração, apesar de as duas empresas juntas
representarem mais ou menos 70% do consumo de
telecomunicações do país, elas não são concorrentes entre
si, pois atuam em áreas diferentes. Apenas no que diz
respeito ao mercado de comunicação de dados e à longa
distância é que são concorrentes, mas não atuam como
concessionárias.
Além de notificarem a Anatel, as empresas devem informar ao
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre a
pretensão. Os especialistas explicaram que, enquanto a
atuação da agência é anterior ao fechamento do negócio, a do
conselho se dá em uma fase mais avançada.
Com a privatização da telefonia no Brasil, o país foi
dividido em quatro regiões de concessão: a Telemar ficou com
a primeira (Rio de Janeiro, Minas Gerais e estados do Norte
e Nordeste), a Brasil Telecom com a segunda (Região Sul,
Centro-Oeste e estados do Norte) , a Telefônica com a
terceira (São Paulo) e a Embratel abrangendo ligações de
longa distância em todo o território nacional. Durante cinco
anos, o Plano Geral de Outorga só permitia a transferência
de concessão ou controle acionário das empresas para
compatibilizar as áreas de atuação.
Enquanto as mudanças no Plano Geral de Outorga não saem, as
ações da Oi e da Brasil Telecom dispararam e tiveram, em
conjunto, valorização equivalente a R$ 9 bilhões.
Revista Consultor Jurídico, 15 de janeiro de 2008
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Fonte: Tele.Síntese
[20/02/08]
Revisão do modelo: contrapartidas à sociedade por Lia
Ribeiro
Desta vez, o governo reagiu rapidamente às críticas de que
estaria propondo uma alteração no Plano Geral de Outorgas
apenas para atender a uma demanda pontual de mercado, ou
seja, a compra da Brasil Telecom pela Oi, sem levar em conta
o interesse público. O ministro das Comunicações, Hélio
Costa, de seu lado, já anunciou que será lançada uma
consulta pública, em março, para discutir a política
setorial; e a Anatel, por meio de seu presidente Ronaldo
Sardenberg, de outro, já avisou que vai avaliar a alteração
no PGO dentro do conjunto de necessidades de atualização da
regulação setorial.
A revisão do modelo de telecomunicações, mais do que
necessária frente à convergência tecnológica e às novas
demandas da sociedade, como a universalização da banda
larga, pode ter começado por um caminho torto, mas tem tudo
para entrar nos trilhos. Há um consenso de que mudanças são
necessárias, e que elas têm que ser promovidas a partir de
um amplo debate democrático, no qual o interesse empresarial
tem de estar subordinado ao interesse público.
Dada a largada
A largada para a revisão do modelo, em vigor há dez anos,
foi dada com o envio à Anatel, pelo Ministério das
Comunicações, de um documento que recomenda ao regulador a
alteração no Plano Geral de Outorgas, eliminando o
impedimento de que um mesmo acionista ou grupo de acionistas
controle concessionárias que atuem em regiões distintas do
PGO, e a revisão de restrições regulatórias, constantes de
outros atos normativos, que impedem a consolidação da
operação de múltiplos serviços.
O documento do Minicom responde formalmente a uma consulta
feita pela Anatel sobre as diretrizes para a política
nacional de telecomunicações, a partir de uma demanda de
alterações regulatórias que permitam a consolidação de
empresas e a oferta, por elas, de múltiplos serviços, que a
agência recebeu da Abrafix, a entidade que reúne as
concessionárias de telefonia fixa.
No documento de oito páginas onde fundamenta a sua
recomendação, o Ministério das Comunicações diz que o
cenário atual das telecomunicações no mundo demanda ganhos
de escopo e escala, a serem conseguidos com a consolidação
de empresas, e a oferta, pela mesma infra-estrutura, de
serviços de voz, dados e vídeo. Do ponto de vista do cenário
de convergência e consolidação, as justificativas
apresentadas para a mudança regulatória, são sólidas, da
mesma forma que tem consistência a análise de por que as
razões apresentadas, na exposição de motivos que acompanha a
LGT, para a divisão do país em três áreas regionais de
concessão de telefonia local (mais uma de longa distância),
já foram superadas.
Risco à competição?
Mas o documento não responde a uma questão que vem sendo
levantada seja por especialistas, seja por leigos que temem
que a junção das duas concessionárias, com a criação de uma
empresa que vai operar em todo o país, à exceção de São
Paulo, piore as já precárias condições de competição. Não na
telefonia local, pois não há mais ilusão de que ela venha a
acontecer de forma relevante – na voz, a competição é entre
fixo e celular --, mas na banda larga, acesso pelo qual
passam os mais diversos serviços.
Na visão desses especialistas, o documento não deixa claro
qual é o interesse público no patrocínio dessa mudança
regulatória. Um deles insiste em que o interesse público não
pode estar apenas na criação de uma operadora nacional que
possa vir a expandir sua atuação para a região,
especialmente para o Mercosul, com destaque para a
Argentina. Mas reconhece que a criação da super tele
nacional é importante para o país, onde vai competir com a
espanhola Telefônica e a mexicana Telemex, e para o projeto
de integração regional no qual o Brasil, pelo seu peso
econômico, tem papel importante.
Contrapartidas necessárias
Mas só isso não basta e, por isso, o documento do Ministério
das Comunicações deixa a desejar. Muitos querem,
especialmente as entidades que representam as operadoras
entrantes e órgãos de defesa do consumidor, que esse
processo de revisão do modelo seja usado para também
fortalecer a competição, implementando efetivamente medidas
previstas do Plano Geral de Competição que não foram
colocadas em prática pela Anatel. Estamos falando de um
unblunding efetivo, de tarifas de interconexão baseadas em
custo e da regulamentação da revenda, entre outros
dispositivos regulatórios capazes de garantir espaço para o
avanço dos atuais competidores e o surgimento de novos.
A falta dessa formulação política sobre os ganhos dos
usuários, a não ser os benefícios decorrentes da oferta de
pacotes de serviços pelo mesmo prestador, deixa dúvidas no
ar sobre o que se quer com a mudança de modelo. A consulta
pública a ser lançada pelo Minicom e a da Anatel são os
espaços onde essas questões terão debatidas e respondidas.
Sem dúvida, as contrapartidas para a sociedade à permissão
para que as empresas prestem múltiplos serviços e se
consolidem têm que ir além dos ganhos de escopo e escala.