[19/10/09]
É possível a tomada hostil de operadora de telecomunicações? -
por Luciano Costa
Luciano
Costa é advogado especializado em telecomunicações do
escritório Caldas Pereira Advogados e Consultores Associados.
A recente Oferta Pública de
Aquisição de Ações da GVT, divulgada pela Telesp, poderá jogar
luzes sobre uma questão extremamente interessante. Afinal, é
possível a tomada hostil de uma operadora de telecomunicações?
A pergunta merece ser feita em função do regime legal no qual
atuam as operadoras de telecomunicações. Por se tratar de um
setor regulado, as empresas que nele atuam precisam estabelecer
uma relação própria com o Estado, qual seja, a relação entre
outorgada (operadora) e outorgante (Poder Público, representado
pela ANATEL), consubstanciada, no caso das autorizatárias de
STFC – situação da GVT –, em um Termo de Autorização celebrado
com o Poder Público.
Essa relação confere à Anatel um alto grau de supervisão sobre
as condições operacionais e financeiras da operadora, inclusive
no que se refere à sua estrutura societária. E, de outro lado,
dá ao controlador, por meio da operadora, a condição de executor
das atividades objeto da outorga, com seus direitos e
obrigações.
Entendeu a Lei brasileira que é relevante identificar o
controlador – ou os controladores – de uma operadora de
telecomunicações, pois esse aspecto é objeto de várias normas
legais e infra-legais, com objetivo de evitar excessiva
concentração econômica e garantir a continuidade da prestação do
serviço.
Entretanto, no caso de uma empresa
com controle pulverizado, cuja maioria das ações é livremente
negociada na bolsa de valores, a questão do controle e da
posição de controlador ganha contornos mais complexos.
É certo que desde o início de 2007 a GVT opera dessa forma,
tendo atualmente cerca de 70% do seu capital votante em “free
float”, e o restante compartilhado entre duas empresas. Ao que
consta, não houve nenhuma ação da Anatel se opondo a este
modelo. Aceitar que uma operadora de telecomunicações atue sem
um grupo de controle definido – além de situação esdrúxula para
qualquer empresa – nos parece incompatível com o modelo
regulatório do setor.
Por isso é provável que a Agência tenha entendido, corretamente,
que as duas empresas detentoras das ações formariam
conjuntamente um bloco com participação superior a 20%,
qualificando-se, portanto, como controlador nos termos da
Resolução Anatel n. 101. Note-se, porém, que no caso de uma
operadora de telecomunicações, esse controlador assume perante a
Anatel uma condição de interlocução única, privilegiada, pois é
com essa estrutura societária – devidamente informada e mantida
– que a Agência permite a operação da empresa.
Alterações relevantes, até por obrigação legal, devem
necessariamente ser submetidas à Agência. Vale ressaltar que, de
acordo com o Termo de Autorização das operadoras de telefonia
fixa, a obrigação de solicitar anuência prévia é do vendedor, e
não do adquirente, pois é a operadora – que detém a licença –
que tem a obrigação de requerer à Agência a anuência para a
transferência do seu controle societário. Embora a Lei fale, de
modo geral, em anuência prévia da Agência, sem fazer referência
a quem a solicitaria.
De qualquer modo, é exatamente
essa situação, a condição única do controlador perante a
Agência, que nos leva ao questionamento do título. A
regulamentação do setor estabeleceu uma distinção entre o
controlador para efeitos da análise regulatória e o controlador
na lógica do Direito Societário. Assim, no caso de uma operação
societária de tomada hostil, perfeitamente possível em um setor
qualquer da economia, a obtenção do controle se dá à revelia do
controlador, independentemente da sua vontade.
Entretanto, no caso do setor regulado de telecomunicações,
parece-nos que, no momento que se apresentou à Agência, o
controlador estabeleceu, por força da regulamentação, uma
relação direta com o Poder Concedente que talvez não possa ser
quebrada de forma tão simples. Ou seja, a alteração de controle,
sob a perspectiva do Regulador, deveria se dar sempre com o
consentimento e participação do Controlador, o que impediria que
esse controlador sofresse um ataque hostil à sua posição de
controle.
A alternativa, que não nos parece
de todo irrazoável, é o entendimento de que – ao menos no caso
de autorizatárias, que prestam o serviço de telecomunicações em
regime privado –essa relação do controlador com o Poder
Concedente não seria estabelecida, ou, se estabelecida, seria
absolutamente circunstancial e não configuraria nenhuma proteção
para as partes. Assim, admitir-se-ia certa variação na
composição do bloco de controle e, até mesmo, sua completa
substituição, desde que o novo controlador – ou grupo de
controladores – atendesse aos requisitos regulamentares para
tanto.
A nós parece que o ideal, do ponto
de vista regulatório, seria decidir quanto à possibilidade ou
não de transferência do controle somente quando a questão
societária estivesse definitivamente resolvida. Ou seja, somente
após a conclusão de todas as etapas societárias, com clareza
quanto a quais partes efetivamente celebrarão o negócio, aí sim
seria a operação submetida à Anatel. Mas é de se avaliar se esse
formato seria compatível com a dinâmica das relações societárias
a que, ao pulverizar o controle, a operadora se submeteu. Enfim,
esta questão certamente merece análise cuidadosa.
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Fonte: TelecomOnline
Ambos argumentam que competição no setor de telecomunicações
será prejudicada
A exemplo do que fez o Pro-Teste, a Telcomp
(Associação das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações
Competitivas) e o Idec, órgão de defesa do consumidor,
enviaram carta à Anatel solicitando que a agência não
autorize a compra da GVT pela Telefónica. Ambos argumentam
que essa aquisição trará prejuízo para a competição no
mercado de telecom. O pedido de anuência prévia para essa
operação deverá ser analisado amanhã pelo conselho diretor
do órgão regulador. O leilão para a compra das ações da GVT
está marcado para o dia 19.
A Telcomp recomenda que antes de concordar
com a transação, a agência faça uma análise legal e
concorrencial profunda que releve os custos e benefícios que
uma operação desse tipo pode ter. " Por si só a compra da
GVT – único operador-espelho com sucesso em seu projeto e
com saúde financeira – por uma concessionária local coloca
em risco a sustentabilidade do modelo regulatório vigente,
já que confronta a sua lógica de maneira inexorável", diz a
carta enviada à Anatel.
O Idec tem posicionamento semelhante,
alegando que a transação "viola os princípios da Lei Geral
de Telecomunicações - que busca regular o mercado e evitar
concentrações" Na prática, diz o órgão, a operação eliminará
um novo e potencial competidor, "mantendo o quadro de
péssima qualidade dos serviços prestados e de preços
abusivos".
O órgão de defesa do consumidor também
ressalta que "não é aceitável que a Telefônica empenhe
aproximadamente R$ 7 bilhões na aquisição da GVT sem a
comprovação de que os investimentos já realizados são
suficientes para a garantia da qualidade dos serviços".