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21/05/10
• Telebrás, Eletronet e PNBL (265) - Flávia
Lefèvre recomenda o artigo: "Os avanços e as insuficiências do PNBL" de
Jonas Valente
de Flávia Lefèvre Guimarães <flavia@lladvogados.com.br>
para Helio Rosa <rosahelio@gmail.com>
data 21 de maio de 2010 16:52
assunto Fw: Artigo sobre o PNBL
Caro Helio e Grupos
Recebi do amigo e precioso jornalista Jonas Valente o artigo que segue com
uma excelente análise a respeito do Decreto 7.175/2010, que trata dos
Avanços e Insuficiências do PNBL.
Aproveitem!!!
Abraço.
Flávia
----- Original Message -----
From: Jonas Valente <jonasvalente@gmail.com>
Sent: Tuesday, May 18, 2010 4:36 PM
Subject: Artigo sobre o PNBL
Caros,
Segue abaixo um artigo sobre o Programa Nacional de de Banda Larga. Se for
de interesse, fica a contribuição para divulgação ou publicação nos seus
respectivos blogs.
Um abraço,
Jonas Valente
------------------------------------------------
Fonte: Observatório do
Direito à Comunicação
[18/05/10]
Os avanços e as insuficiências do PNBL - por Jonas Valente
Jonas Valente é jornalista. Membro do
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e pesquisador do
Laboratório de Políticas de Comunicação da UnB (Lapcom).
O governo publicou no último dia 14 o
Decreto 7.175, que institui o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL). A
meta principal do Programa é assegurar o acesso à internet em alta
velocidade a cerca de 39 milhões de domicílios até 2014. O decreto traz uma
série de avanços importantes. Talvez o mais representativo seja o papel
indutor dado ao Estado, especialmente com a retomada da Telebrás como
protagonista do setor. Mas peca pela omissão de questões fulcrais para fazer
com que esta nova tecnologia sirva de fato à promoção da comunicação como um
direito humano para todos os brasileiros e todas as brasileiras.
O PNBL está formatado para ser um conjunto de ações que visa à massificação
da banda larga, estabelecendo como meta mais do que triplicar os atuais 11,8
milhões de lares conectados atualmente. O mérito do Programa está em assumir
que o mercado é incapaz de assegurar o alcance desta meta. No entanto, tal
ampliação, no Programa, não assume o objetivo central que vem norteando as
políticas de diversos países: a universalização deste serviço. Sem este
horizonte, corre-se o risco de que esta tecnologia torne-se um elemento
qualificador da desigualdade existente em nosso país.
Para atingir as metas do PNBL, o governo federal promete atuar para baratear
a oferta de banda larga a partir do fomento ao desenvolvimento de um mercado
apoiado em pequenos e médios provedores. O principal instrumento seria o uso
da Telebrás como fornecedora de dados no atacado. A empresa negociará a
preços mais baixos do que os praticados pelas grandes detentoras de
infraestrutura (em sua maioria, operadoras de telefonia) e exigirá, em
troca, que o serviço chegue na casa do cidadão a um preço máximo para uma
dada velocidade. A previsão é que o valor fique entre R$ 35 e R$ 25, a
depender do nível de isenção de impostos concedido.
Para pessoas que não têm renda suficiente para comprar pacotes nesta faixa
de preço, estuda-se uma espécie de “banda larga popular”, que poderia custar
entre R$ 15 e R$ 10. No entanto, ela teria velocidade de 512 Kbps e
limitações do volume de dados. A redução de custos neste caso seria
possibilitada por uma forte redução do Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS).
Para dotar a Telebrás de condições para cumprir este novo papel, será criada
uma Rede Nacional aproveitando a infraestrutura de propriedade de empresas
públicas, como Petrobrás, Furnas, Eletronorte e Companhia Hidrelétrica do
São Francisco (Chesf). O uso das fibras da Eletronet, alvo de denúncias de
jornalões paulistas, foi abandonado. Segundo o governo, pelo fato do
investimento na melhoria desta rede ser equivalente ao de uma nova. A opção
foi pela expansão da Rede Nacional, que deve acumular 30 mil Km de fibras
óticas e chegar à Brasília e a outras 25 capitais em 2014. Uma extensão
feita por linhas de rádio vai possibilitar a cobertura de um raio de 100 Km
de cada ponto da rede.
A intenção deste modelo é acabar com o gargalo dos backbones e backhauls
(grandes e médios troncos por onde passam os dados) das concessionárias,
cujo tráfego é oferecido a preços altíssimos aos pequenos e médios
provedores para miná-los na concorrência com os pacotes das próprias
operadoras. Por isso, a lógica de fixação de um preço máximo a ser garantido
pelos provedores que comprarem dados da Telebrás é bastante positiva. A
expansão e a capilaridade da rede também, pois delas dependem parte
importante do sucesso do PNBL.
No entanto, um aspecto medular ainda a ser equalizado é a oferta do serviço
de internet em alta velocidade diretamente pelo governo federal, ou pelo
Poder Público em geral. O decreto prevê, no Artigo 4º, inciso IV, esta
possibilidade “apenas e tão somente em localidades onde inexista oferta
adequada” dos serviços. O Comitê Gestor do Programa de Inclusão Digital (CGPID)
será o responsável por identificar estas áreas.
Esta formulação é restritiva. A Constituição Federal diz, em seu Artigo 21,
que “compete à União explorar, diretamente ou mediante autorização,
concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei,
que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão
regulador e outros aspectos institucionais”. Não há, portanto, por que um
decreto limitar a ação direta do Estado se esta é uma diretriz da nossa
Carta Magna.
Apesar da redação limitadora, o conceito de “localidades onde inexista
oferta adequada” ainda permite uma abertura para traçar um planejamento com
vistas à oferta própria da banda larga pela União. O uso deste expediente
deve ser entendido como pilar do Programa, pois não há qualquer perspectiva
de que a universalização da banda larga possa ser feita pelo mercado.
Segundo dados do Ministério das Comunicações, compilados no documento
“Brasil em Alta Velocidade”(veja
aqui), há um “gap de acesso” no Brasil (domicílios que estão em
condições geográficas ou de renda incapazes de atrair a oferta do serviço)
de 55,7% dos lares. Diagnóstico apresentado pelo próprio governo mostra como
o custo da banda larga representa 4,5% das despesas de uma família. Desta
forma, é improvável que as operadoras comerciais, mesmo com preços
subsidiados por isenções ou pela Telebrás, consigam chegar a uma parcela
importante da população brasileira.
A tentativa de oferecer o serviço a R$ 10 é importante. Porém, a velocidade
escolhida (512 Kbps) e a admissão de limites no volume de dados que podem
ser carregados são condicionantes preocupantes. O governo argumenta que tal
combinação é a possível, e que ela já seria uma evolução frente ao quadro
atual, já que boa parte dos brasileiros possui conexões com velocidade de
256 Kbps. Independente desta constatação, o PNBL deve tratar a banda larga
como parte de um direito, devendo o acesso a ela ser garantido de forma
isonômica.
Qual seria a saída, já que o mercado não será o vetor de universalização do
acesso a este serviço? Discutir uma solução mágica e imediata é temerário.
Mas é possível visualizar um caminho mais ambicioso do que o explicitado no
Decreto 7.175. A Telebrás deveria capitanear uma infraestrutura estatal que
contaria com o backbone feito a partir de sua Rede Nacional, com backhauls
sustentados pelos governos estaduais com o último quilômetro (mecanismos
para fazer chegar a banda larga na casa do cidadão) mantidos por esses ou
por prefeituras. Ou até mesmo pelo governo federal, quando necessário. Este
sistema deveria buscar a oferta gratuita sempre que possível. Quando não
fosse viável, disponibilizaria o serviço a um custo muito baixo e a taxas de
velocidade a serem ampliadas gradualmente.
Regulação: separação estrutural e regime público
O governo também pretende qualificar a concorrência por meio da aprovação de
regras incidentes sobre as grandes operadoras. Entre elas estão a
regulamentação do compartilhamento das redes (conhecido também como
unbundling) e a definição do modelo de custos do tráfego de dados. O
primeiro vai coibir as concessionárias na fixação de preços abusivos para o
tráfego de dados que comercializam. Este é um grande obstáculo hoje para os
pequenos e médios provedores e mesmo para estados e prefeituras que têm
programas de inclusão digital. O segundo compreende o cálculo sobre quanto
custa o tráfego de dados por uma dada infraestrutura. Este mecanismo é
condição para que a agência reguladora, Anatel, possa fiscalizar se o preço
cobrado é justo ou não. Ambas já deveriam ter sido regulamentadas pela
Anatel há anos, mas, por conta da fragilidade e falta de vontade política da
Agência, ainda não o foram.
Para garantir os objetivos do PNBL, de aumento da competição e redução dos
preços, estas medidas são importantes, mas insuficientes. Uma saída mais
efetiva seria a adoção do modelo de separação estrutural entre os detentores
da infraestrutura e os prestadores do serviço. Nele, não poderia haver uma
empresa que detivesse a rede e prestasse o serviço. Quem optasse pelo
negócio da venda de tráfego no atacado buscaria comercializar para o maior
número de operadores. Já quem oferta o serviço teria mais alternativas de
fornecedores de dados. Ele já é utilizado no Reino Unido, Itália, Nova
Zelândia e Suécia.
Contudo, a implantação de nenhuma destas medidas será efetiva se o serviço
não passar a ser prestado em regime público. Este, segundo a Lei Geral de
Telecomunicações (9.472/97), é um enquadramento jurídico que deve ser
aplicado àqueles serviços considerados essenciais, “de interesse coletivo,
cuja existência, universalização e continuidade a própria União
comprometa-se a assegurar” (Art. 64). Tal definição não se adequa à internet
em alta velocidade?
O regime público é condição para que o Estado tenha condições de assegurar
obrigações de universalização, qualidade, velocidade e continuidade, bem
como o controle das tarifas. Para além da discussão sobre universalização já
colocada, faz-se necessário discutir a qualidade, especialmente a
velocidade. Segundo dados do governo federal, a internet no Brasil é lenta:
33% das conexões têm somente até 256 kbps e apenas 1% das conexões são
superiores a 8Mbps.
Como o modelo preconizado pelo PNBL se apóia fortemente na oferta pelo
mercado, atribuir esta responsabilidade aos prestadores privados sem
determinar regras efetivas que garantam a boa prestação do serviço pode ser
um tiro no pé. É importante lembrar que as operadoras de Telecom são campeãs
de reclamações no Procon. Também é bom recordar a pane recente da Telefónica
em São Paulo, que deixou a cidade sem telefone e sem internet por dias.
Gestão da política
A gestão do Programa ficará a cargo do Comitê Gestor do Programa de Inclusão
Digital (CGPID). A opção é interessante, dá um caráter interministerial e
coloca o núcleo da condução do PNBL dentro da Presidência da República.
Junto ao Comitê, o governo anunciou a criação de um Fórum Brasil Digital,
com a presença de representantes do poder público, associações
representativas das operadoras comerciais do setor e entidades da sociedade
civil. A iniciativa é importante.
Preocupa o fato de não haver qualquer menção a ela no Decreto 7.175. O Fórum
não pode ser uma instância informal, mas um órgão institucionalizado. Para
além disso, é necessário fazer uma reflexão sobre sua composição. A
sociedade civil deve ter participação majoritária, já que reúne, de diversas
formas, os sujeitos do direito a ser assegurado por meio das ações do PNBL.
Uma presença excessiva das operadoras privadas traz o risco de captura do
FBD, ao permitir a elas regulem seu próprio negócio.
Para além do acesso
Outra melhoria importante a ser feita no Programa é o equilíbrio entre suas
várias dimensões. Corretamente, ele encara o problema do acesso com foco na
infraestrutura para permitir uma oferta mais acessível. Mas a democratização
da internet não se esgota no simples acesso à ela. Diferente de outros
meios, a internet permite uma interação maior. Por isso, tão importante
quanto é a política para a produção e circulação de conteúdos que garanta
instrumentos à população para poder entrar no mundo digital não apenas como
consumidores, mas como sujeitos da Rede Mundial de Computadores.
Esta discussão está prevista dentro de um grupo temático a ser criado no
CGPID, sob coordenação dos ministérios da Educação e da Cultura. Este último
já vem discutindo uma política de conteúdos digitais. Este tema precisa
entrar no debate público, para que não seja tratado como uma segunda etapa
do PNBL, mas como um eixo cuja implantação comece já no curto prazo.
Deve fazer parte do esforço do Programa o Marco Civil em elaboração no
âmbito do Ministério da Justiça. O processo é rico, pelo seu caráter
colaborativo. No site
culturadigital.br/marcocivil, o anteprojeto de lei é debatido com
qualquer cidadão que participar da comunidade. A dinâmica pode ser um
exemplo de procedimentos a ser adotado nas outras discussões do PNBL.
Jonas Valente
http://twitter.com/jonasvalente
www.intervozes.org.br
www.direitoacomunicacao.org.br
www.unb.br/fac/lapcom
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