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Fonte: CBEJI - Centro
Brasileiro de Estudos Jurídicos da Internet
[24/03/05]
Primeiro o VOIP, agora as MVNO, os novos desafios para a
ANATEL - por Hélio Moraes
Hélio Moraes [ Pinhao e Koiffman Advogados]
(*)
Atuando no mercado de regulamentação de telecomunicações desde a privatização
do Sistema Telebrás, já faz algum tempo que costumo ser questionado pelas
empresas sobre os requisitos para prestação de serviço de telecomunicações de
voz utilizando a tecnologia VoIP.
Entretanto, o cenário regulatório vigente ainda é carente de normas específicas
para disciplinar de maneira eficiente os serviços de voz sobre IP no Brasil,
pois a tecnologia IP se dissocia dos serviços de voz que são prestados com esta
tecnologia. Este entendimento segue a linha das vagas e imprecisas manifestações
da ANATEL de que a questão central não se trata da utilização ou não da
tecnologia IP, mas sim qual é o serviço de voz que está sendo prestado e se a
sua prestadora possui a devida autorização da ANATEL.
Dentro deste contexto, existem vários serviços de telecomunicações que podem
utilizar esta tecnologia, como por exemplo o serviço de telefonia fixa (STFC),
quer seja pelas concessionárias ou pelas autorizadas, prestadoras estas que
estariam autorizadas a empregar a tecnologia IP na prestação de seu serviço. Ou
ainda, as próprias prestadoras de SCM (Serviço de Comunicações Multimídia),
dentro das limitações da características das autorizações que detêm para prestar
serviços de telecomunicações.
As prestadoras de STFC procuram estar atentas a utilização do VoIP, mas mesmo
para estas empresas a questão não é tão simples, pois atender aos requisitos de
qualidade que estão submetidas, utilizando uma estrutura de comunicação baseada
em rede aberta com as características do VoIP sobre a Internet, ainda soa como
um desafio para a ANATEL fiscalizar e avaliar o cumprimento de seus padrões.
Quantos de nós, utilizando provedores de banda larga, não nos deparamos com
downloads lentos em certas ocasiões, então não temos convicção ainda de que
nosso estágio atual permita a substituição dos serviços convencionais das
prestadoras de STFC para o VoIP, atendendo aos padrões de qualidade exigidos
pela ANATEL.
Além disso, uma série de empresas, que já prestam serviços de telecomunicações,
gravitam sobre a possibilidade de utilizar o VoIP, que comparativamente possui
custos muito inferiores aos de implantação de uma rede própria, muitas delas
sujeitas aos riscos da indefinição regulatória.
Aliás, este tipo de problema não é novo para a ANATEL. No passado,
principalmente as prestadoras de STFC de longa distância internacional travaram
uma árdua batalha contra as empresas de call-back e serviços similares, que
ofereciam serviços de telefonia internacional sem as devidas autorizações da
ANATEL.
A imprensa vem noticiando a recente aquisição da AT&T pela SBC Communications,
nos Estados Unidos por US$ 16 bilhões, sinalizando que um novo paradigma pode
estar surgindo, com a necessidade de uma velocidade de adaptação aos novos
negócios baseados em Internet, que a AT&T não pôde suportar.
Novos nomes, como a Vonage e a Skype, são anunciados como os cavaleiros do
apocalipse para as empresas de telefonia tradicional que não forem ágeis o
suficiente para se adaptarem ao novo mercado de telefonia baseado no VoIP.
Realmente as projeções de crescimento da voz sobre IP são impressionantes, em
breve o volume de ligações na telefonia convencional deverá ser ultrapassado
pela telefonia baseada em voz sobre IP e, além disso, já para 2006 é esperado
que o volume de ligações utilizando voz sobre IP ultrapasse em mais de 100% a
quantidade de minutos utilizados em telefonia convencional.
O pavimento para esta onda da nova telefonia baseada em VoIP já está bastante
consolidado em alguns países asiáticos, em Taiwan, Hong Kong e Coréia, os
percentuais de lares que possuem banda larga (essencial para os usuários de voz
sobre IP) são da ordem de 50% até 80% dos lares. Obviamente, o Brasil ainda está
bastante distante destes números, com os seus 2,7% de residências servidas com
banda larga, entretanto a expectativa é que esta tendência mundial impulsione o
nosso mercado em curto espaço de tempo, colocando nossos agentes reguladores
contra a parede novamente. De fato, a Associação Brasileira da Indústria
Elétrica e Eletrônica (Abinee) divulgou no último 15/02/05 suas previsões de que
o número de usuários de Internet em banda larga deverá crescer 84% em 2005,
passando de 1,9 milhão em dezembro de 2004 para 3,5 milhões no mesmo mês de
2005.
Outros institutos como Ibope//NetRatings possuem estimativas ainda mais
animadoras para quem pretende utilizar os recursos da banda larga para prestar o
VoIP, tendo divulgado no último 23/02 que em 2004, 5,3 milhões de internautas
residenciais utilizaram acesso em banda larga no Brasil.
Realmente, os desafios da ANATEL não são poucos, pois não bastassem os serviços
de telefonia fixa estarem sujeitos a estas intempéries tecnológicas, agora o
mercado das empresas de serviços móveis de telecomunicações começa a sofrer um
choque ao se deparar com o surgimento das operadoras móveis virtuais, ou MVNOs,
sigla em inglês de "mobile virtual network operators".
Embaladas pelo crescimento dos serviços móveis no Brasil, que pelos dados
divulgados pela ANATEL no fim do ano de 2004, o País atingiu o marco de 61,2
milhões de celulares ativos, atingindo uma densidade média nacional na casa dos
33%, diversas empresas estão de olho neste mercado, pois se o ritmo de
crescimento for mantido, o mercado, hoje disputado a unha por grandes operadoras
como Vivo, Claro, TIM e Oi, poderá, em breve, ter novos concorrentes.
Surge então novamente um tabu que acompanha a ANATEL desde a sua criação, a
revenda de serviços de telecomunicações, pois certamente as operadoras móveis
virtuais, ou MVNOs se apresentarão como empresas menores e até não tão
tradicionais do setor de telecomunicações, mas bastante conhecidas do consumidor
brasileiro médio.
Na Europa, as MVNOs são operadoras que não possuem espectro próprio e também
não contam com infra-estrutura de rede, mas que por meio de acordos com
operadoras móveis tradicionais adquirem pacotes de minutos de uso (MOU) no
atacado para vender aos seus clientes.
Diferente do VoIP, em que as prestadoras tradicionais se vêem prejudicadas pela
concorrência das prestadoras "informais", no caso dos serviços móveis as
próprias operadoras de telefonia móvel tradicionais normalmente não se opõem a
parceria com uma MVNO, que pode ampliar, de forma quase imediata, a base de
usuários por meio da venda de minutos adicionais, com a vantagem de ter custo
zero de aquisição.
O desafio da ANATEL em manter uma regulamentação no caso das MVNO é ainda maior
que no VoIP, devido a esta verdadeira simbiose que acaba ocorrendo entre as
operadoras de telefonia móvel tradicionais e as MVNO, pois normalmente estas
parcerias com uma MVNO, para que esta cuide dos usuários de menor renda, com
produtos e serviços customizados, traz benefício à operadora tradicional, que
pode se concentrar no atendimento exclusivo aos clientes pós-pagos, corporativos
ou com as maiores receitas médias mensais (ARPU).
Mas os grandes grupos de telefonia móvel deverão ter cautela na hora de se
aliar a uma MVNO, procurando entender principalmente qual é a seu verdadeiro
plano de negócios para evitar uma canibalização de sua base de clientes. As
MVNOs não chegam a representar uma grande ameaça às operadoras móveis
tradicionais, mas poderão incomodá-las caso venham a criar uma pressão para
redução de preços dos serviços de telefonia móvel, o que poderá ocasionar o
encolhimento da participação das grandes operadoras, saturação do mercado,
comoditização dos serviços de voz e, em conseqüência do achatamento das margens,
menores investimentos nas redes.
Diante deste possível cenário, o que se pergunta é, como a ANATEL se
posicionará perante os serviços móveis virtuais, em linha com grande parte dos
órgãos reguladores de todo o mundo, que apóiam as MVNOs como um meio de
incentivar a competição, ou mantendo a restrição que vem lhe acompanhando, desde
a sua criação, restringindo a revenda dos serviços móveis.
Ao que parece a ANATEL já foi inclusive instada a se manifestar sobre o assunto
e estaria estudando a possibilidade de regulamentar a revenda de minutos de voz,
mas não temos definições claras até o momento. Assim, as empresas aguardam
ansiosas para saber se a ANATEL regulamentará os serviços VoIP, que já se
encontram no mercado de forma relativamente indefinida, bem como se
regulamentará a criação de operadoras móveis virtuais no País, pois a chegada
desse novo modelo de negócios é apenas uma questão de tempo, ou se a ANATEL
andará a reboque do mercado se preocupando posteriormente com fiscalizar ou
regulamentar aquilo que já é prática corrente das empresas do setor.
O que se pode constatar é que a questão não é simples e diversas são as facetas
reveladas pela análise jurídica da viabilidade da implementação do VoIP e MVNOs,
estando a controvérsia acerca desta questão longe de estar sepultada, pois
qualquer que seja o posicionamento adotado pela empresa, esta deverá se cercar
das devidas garantias legais para assegurar a sustentação desta posição.
(*) Hélio Moraes, engenheiro
eletrônico e especialista em automação e controle pela Escola Politécnica - USP,
advogado na área de direito eletrônico, telecomunicações e tecnologia,
coordenador da área de direito de Tecnologia da Informação e Comunicações - TIC
- em Pinhão e Koiffman Advogados.
http://www.pinhaoekoiffman.adv.br
Contatos ou comentários para:
hfmoraes@pk.adv.br.
O presente material foi elaborado meramente para fins de informação e debate,
não devendo ser considerado como uma consulta, indicação ou sugestão ou
entendido como um parecer ou substituto a uma assessoria profissional
especializada para qualquer operação ou negócio específico. Nesses casos,
sugere-se que se procure orientação para avaliação dos aspectos peculiares da
operação pretendida. A sua divulgação é livre desde que seja incluída a seguinte
nota: "Pinhão e Koiffman Advogados -
http://www.pinhaoekoiffman.adv.br - Mar.2005"