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Fonte: Portal
Teletime - Origem: Revista Teletime
[Set 2010]
Do virtual ao real - por Samuel Possebon - Colaborou Fernando Paiva
Desde março deste ano, quando a Anatel recebeu as contribuições sobre o
regulamento de operadoras móveis virtuais, a expectativa sobre a abertura desse
mercado vem crescendo. Mas as incógnitas sobre a viabilidade do modelo ainda são
grandes, e mesmo entre os maiores entusiastas do mercado de MVNO, há quem aposte
que para o Brasil deverá acabar prevalecendo um modelo muito mais próximo do
mobile-marketing do que um modelo de operadora virtual tradicional. Entre
aqueles que apostam no potencial brasileiro para o desenvolvimento estão
empresas como a Everis, que hoje atua como consultora em projetos que envolvem
MVNOs. Para Marco Galaz, sócio responsável por telecom na Everis, esse não deve
ser um mercado para pequenas empresas. “O que a gente pode observar em
experiências em todo o mundo é que apenas aqueles que investiram com um business
plan sólido acabaram se dando bem no mercado de operadoras virtuais”. O modelo
brasileiro de MVNOs terá uma característica de ser dividido em dois níveis, pelo
menos se for mantida a proposta que foi colocada em consulta pública em dezembro
e cujo texto final deve ser aprovado em outubro pela agência.
A base do regulamento, explica Bruno Ramos, gerente geral de regulamentação de
comunicações móveis da superintendência de serviços privados da Anatel, deve ser
a mesma da consulta pública. Ou seja, duas categorias de operadores virtuais: os
credenciados, que na prática fazem o papel de revendedores dos serviços para os
operadoras tradicionais (também chamados de operadores de origem), e os
autorizados, que como o próprio nome diz, são autorizados pela Anatel a operar
como se fossem operadoras de fato. No caso das credenciadas, todo o trabalho de
billing, atendimento, garantia de qualidade de serviço e responsabilidade
técnicas são dos operadores que detém a rede. No caso das operadoras
autorizadas, elas operam tudo e assumem toda a responsabilidade perante a
Anatel. Só não controlam a rede em si, que é alugada de uma operadora “real”.
Questões superadas
Durante o processo de consulta pública, no primeiro trimestre, uma série de
questionamentos foram levantados contra o modelo da Anatel. Um dos pontos
questionados dizia respeito ao fato de que o operador virtual, seja credenciado
ou autorizado, teria que estar atrelado a apenas uma operadora móvel real em
cada área de registro. Ou seja, não poderá, em um mesmo mercado, utilizar um
eventual poder de barganha para contratar capacidade de rede de diferentes
operadoras e assim conseguir preços melhores. Esse é um dos pontos que devem
estar mais claros na regulamentação definitiva, segundo apurou este noticiário,
pois a intenção da Anatel é que no caso da operadora virtual autorizada, ela
possa contratar minutos de quantas operadora de origem quiser. O que a Anatel
não poderá permitir é que uma credenciada opere com mais de uma empresa, pois
seria impossível fiscalizar a qualidade de serviço e cobrar responsabilidades
nesse caso.
Segundo Bruno Ramos, a ideia da regulamentação é que ela não amarre o mercado,
mas ao mesmo tempo dê segurança para que apenas empresas sérias e comprometidas
entrem nesse mercado. “O que a Anatel constatou é que, no mundo todo, só os
modelos em que todo o mundo ganha prosperaram”. Para a agência, há um filão
grande de mercado, sobretudo para a exploração de nichos, com oferta de serviços
de valor adicionado específicos para determinadas comunidades ou grupos de
interesse, e também potencial de exploração comercial pelo varejo.
Para Maurício Giusti, analista de telecomunicações e sócio da consultoria
PriceWaterhouseCoopers, o sucesso do modelo de operadoras virtuais depende da
não-imposição de modelos e de uma atuação regulatória mínima. “Se houver
imposição de modelos, não dá certo”. Ele ressalta que na negociação de
contratos, o equilíbrio entre a operadora real e a virtual é muito delicado. Ele
chama a atenção também para a questão da interconexão, o que dificulta muito a
negociação do airtime no atacado. “As operadoras têm pouca margem para negociar
minutos com valores reduzidos”, disse. Giusti participou em setembro do Fórum
Mobile+, realizado pela TELETIME e TI INSIDE. “O mercado de MVNO começa a
crescer quando o mercado tradicional deixar de crescer. O Brasil ainda tem muito
crescimento de base de celular nas classes C e D, o que deve se manter pelos
próximos dois anos”, analisa.
Entre as operadoras de telefonia celular, empresas como Claro, TIM e Vivo estão
analisando com olhos mais atentos o desenvolvimento do mercado de MVNO, e tudo
indica que elas estarão abertas a, pelo menos, negociar o compartilhamento de
suas redes.
Negócio próprio
Mas a Oi, por exemplo, é apontada pelo mercado como a operadora mais resistente.
Segundo João Silveira, diretor de mercado da operadora, não é que a Oi não
esteja interessada em operadoras virtuais. Mas ele explica que há grandes
dificuldades para esse mercado se desenvolver no Brasil. “Vejo MVNOs como
operadoras de nicho que deverão ter entre 3% e 5% de market share. Uma das
dificuldades é que o pré-pago já é muito forte no Brasil”, diz o executivo. Ele
aponta também uma incompatibilidade entre o modelo que as operadoras virtuais
estão propondo e o modelo de venda da Oi. “Muitos me procuram e sugerem que eu
venda minutos a um custo menor e, em troca, eu não teria mais o custo de venda
dos chips. Mas hoje, a venda dos chips é uma fonte de renda, porque eu consigo
vender minutos junto”, explica. A maior parte das vendas de chip da Oi é feita
em bancas de jornal, e a operadora já repassa seus chips com minutos aos
comerciantes, o que compensa com sobra o esforço de venda.
Para Marco Galaz, da Everis, grandes empresas, que já tenham sistemas de billing
e controle de clientes terão vantagens se optarem por explorar o mercado de
operadoras virtuais. “Nos outros casos, a figura do viabilizador, a MVNE, é
fundamental, porque é quem vai viabilizar uma operação dentro de uma estrutura
que não foi pensada para operar telefonia móvel”. Do lado da operadora que
proverá a rede, diz Galaz, a dificuldade é entender o modelo e fazer as contas
para saber se um operador virtual poderá trazer redução de custos. “Depois
disso, ele tem todo o trabalho de negociar interconexão, acertar os seus sistema
e integrar as operações, o que não é simples em todos os casos”. Em compensação,
o que ela pode ganhar é um crescimento significativo no volume de minutos
comercializados e aumento no tráfego de SVA.
Algumas operadoras virtuais começam a surgir apenas no modelo de revenda de
dados, por exemplo, indicando um caminho que pode começar a ser seguido por
operadores virtuais no Brasil. Outro modelo são as operadoras virtuais voltadas
ao mercado corporativo, em que uma empresa opta por ter a sua própria operadora
para poder ter o controle total dos serviços voltados a seus colaboradores. Por
exemplo, empresas com grandes forças de venda ou manutenção em campo, ou
empresas que precisam se relacionar com uma comunidade específica, como
seguradoras. Atualmente, a Spring Wireless e a Abacomm, as duas principais
integradoras de serviços móveis para o mercado corporativo, começam a trabalhar
em projetos de MVNOs voltadas para o mercado empresarial.
Outro aspecto questionado durante a consulta de operadoras virtuais dizia
respeito à incerteza sobre a possibilidade ou não de se ter acesso às redes das
operadoras de SMP. Segundo estas análises, não havia garantia no regulamento de
MVNOs que desse ao potencial candidato a operadora virtual a segurança de que
conseguirá o contrato com a operadora. Também não há nenhum critério que permita
à agência avaliar se a razão de uma eventual recusa do operador de SMP em fazer
negócio com operadores virtuais se deve a questões técnicas ou a um mero
desinteresse comercial. O texto definitivo não deve trazer nenhuma obrigação de
negociação, mas deve dar um prazo para que haja uma resposta definitiva sobre o
interesse ou não por parte do operador real de se associar a uma operadora
virtual. E as condições deverão ser isonômicas.
Entre os grupos que têm interesse em entrar no mercado de operadoras virtuais
estão empresas varejistas e outras com grandes bases de clientes, como
operadoras de serviços de telecomunicações sem redes móveis. Um bom exemplo é o
da operadora de TV a cabo Net Serviços, que não esconde a intenção de
desenvolver um produto móvel, caso a regulamentação permita. O problema é que na
primeira proposta de regulamentação que foi a consulta no começo do ano,
empresas coligadas, afiliadas, controladas ou controladoras de operadoras reais
não poderiam ser MVNOs. E a Net é coligada à Claro, já que ambas têm,
indiretamente, a América Móvil (controladora da Embratel) como acionista. A
Anatel ainda não havia batido o martelo sobre essa questão de coligadas operando
operadoras virtuais até o fechamento desta edição. A dúvida se devia ao fato de
que se, por um lado, uma empresa como a Net pudesse ter grande força para
operar, por outro isso poderia representar uma vantagem indevida, já que ela
poderia ter facilidade na negociação com a Claro, por exemplo. Esta restrição,
dependendo da forma como for colocada, pode impedir também que operadoras como a
CTBC e a Sercomtel, que hoje têm atuação limitada, expandam suas áreas de
atuação como operadoras virtuais.
Outra possível interessada no mercado de MVNO entre as operadoras de
telecomunicações é a GVT, mas esta também é apontada como forte candidata ao
leilão da banda H, cujo edital deve ser publicado em outubro. A Copel,
concessionária de energia do Paraná e com forte presença no mercado de telecom,
também é apontada como forte candidata a operadora virtual.
Modelos diferentes
Entre as empresas de outros setores, algumas, declaradamente, já disseram que
estudam entrar no mercado de operadoras virtuais. O grupo Pão de Açúcar é um
deles, seguindo o exemplo de outros grandes varejistas, como Carrefour e Walmart,
que já operam operadoras virtuais em outros países. Bancos como o Bradesco e o
Banco do Brasil também já analisam esse mercado, segundo fontes do setor. Ambos
já criaram contas correntes em que as despesas dos clientes com taxas são
revertidas em créditos para assinantes. São experiências que podem ser embriões
de operações móveis virtuais. Para Marcelo Zylberkan, especialista em operadoras
virtuais e diretor do Titans Group, empresa que desenvolve produtos para a
exploração de serviços móveis em mercados de nicho, o problema da VU-M e das
margens apertadas dos operadores móveis de fato deve ser um grande entrave para
a viabilização dos operadores virtuais no Brasil. “Por isso eu acho que um
modelo de comercialização de chips e serviços para nichos específicos, mas sem
separar as operações, me parece mais viável”. Para ele, o modelo de operadores
virtuais é mais viável para teles sem acesso móvel, como GVT, que têm
necessidade estratégica de mobilidade mas não precisam desse mercado para seus
resultados. “Acho difícil que uma MVNO consiga baratear muito mais os minutos
comprados da operadora de origem. A regulamentação coloca limites e
responsabilidades que têm custos, e as margens das operadoras no Brasil já são
apertadas”. Fora isso, diz Zylberkan, o processo de consolidação entre Embratel
e Claro e entre Vivo e Telefônica deve concentrar grande parte dos esforços de
desenvolvimento de sistemas dessas operadoras. “Será que elas terão tempo, nos
próximos dois anos, a dedicar times para integrar sistemas com operadoras
virtuais?”, pergunta.
O modelo que a Titans Group propõe é o modelo de recarga combinado com venda
segmentada, marketing de nicho e SVA voltado para comunidades específicas. A
primeira experiência da Titans foi com a CN Chama, do grupo Canção Nova, ligado
à Igreja Católica, e com a operadora Claro (ver box). Atualmente, o principal
projeto, nos mesmos moldes, é com o clube de futebol Corinthians, também com a
Claro. Segundo Zylberkan, já houve a ativação de 20 mil linhas em 60 dias de
serviço. Ao todo, foram distribuídos 100 mil chips para o varejo. Outros 100 mil
foram encomendados para essa primeira fase do projeto. O foco são os estados de
São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro. As vendas dos chips estão
sendo feitas na rede de lojas Poderoso Timão, assim como em sites de e-commerce
e em revendedores de recarga. Com cerca de 30 milhões de torcedores espalhados
pelo País, o clube estima que poderia ativar até 5 milhões de linhas com seu
SIMcard customizado. Na verdade, são todos clientes Claro, mas que ao adquirirem
o chip do Corinthians, passam a ter acesso a serviços exclusivos e um
atendimento personalizado para este produto. “É uma MVNO light: não compramos
tráfego”, esclarece Marcelo Zylberkan. Enquanto a receita de voz fica toda com a
operadora, o clube e a Titans recebem uma participação na venda de conteúdo
móvel com a marca Corinthians, acessível tanto pelo menu do SIMcard quanto pela
web. São oferecidos alertas de gol, notícias, vídeos, ringtones, dentre outros.
São criadas também promoções para os usuários, todas envolvendo o time. “O
grande desafio é montar uma oferta de conteúdo móvel que seja atrativa para o
torcedor”, explica Zylberkan. O investimento no projeto por parte da Titans
girou entre R$ 2 milhões e R$ 5 milhões. O Chip do Timão é vendido apenas na
modalidade pré-paga, embora o cliente possa, se quiser, solicitar à Claro a
troca para pós-pago depois. A Titans planeja entrar no mercado de venda de
recargas especificamente para os usuários do Chip do Timão a partir de novembro,
usando os mesmos canais de vendas do SIMcard, além da web e do menu do chip. A
empresa ganhará uma comissão da operadora, como qualquer outro revendedor de
recarga.
No primeiro trimestre de 2011, a Titans promete lançar no mercado os chips de
outros oito grandes clubes de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio
Grande do Sul. No mesmo período lançará projetos similares com um programa de TV
e com uma grande rede varejista, que estima vender até 2 milhões de chips nos
primeiros 12 meses de operação. “O nome do jogo é fechar parcerias com clientes
agora para poder comprar e revender airtime no futuro, quando a legislação
permitir, se houver atratividade”, explica.
Chama pioneira
Um dos primeiros embriões de algo que poderá vir a ser uma operadora virtual no
Brasil é a experiência da CN Chama, ligada à Fundação João Paulo 2º, que também
é responsável pela TV Canção Nova. O projeto, iniciado há cerca de um ano, teve
como objetivo comercializar chips de celular e serviços de valor adicionado para
a comunidade católica. O projeto foi interrompido por questões contratuais nos
primeiros meses de operação, pois a fundação não poderia ter uma empresa
comercial como sócia (no caso, a Bel Mobile, do grupo Titans). Resolvida a
questão, a CN Chama voltou a comercializar os chips há cerca de um mês. “A nossa
missão é evangelizar usando todas as tecnologias, e o celular é uma delas”, diz
João Paulo Ferraz Kruschewsky, gerente de tecnologia da CN Chama. O grupo atua
também na TV, rádio e Internet, e tem cerca de 1,2 milhão de fiéis associados,
que consomem os produtos Canção Nova. A expectativa é chegar a 100 mil SIMCards
comercializados até o final do ano. “A tecnologia é um meio. O importante é o
conteúdo que está sendo difundido pelo celular”, explica Kruschewsky. Entre os
conteúdos estão mensagens religiosas, orientação para os colaboradores que fazem
a venda de produtos. “O investimento é o equivalente a uma retransmissora de TV,
mas a capacidade de interação com a base é muito maior”, explica o executivo. A
CN Chama também é fruto de uma parceria com a Claro, primeira operadora a
apostar nesse modelo de vendas de nicho.
Para Sandro Zamarioni, diretor da Triad Systems, que assessorou a CN Chama no
desenvolvimento tecnológico do projeto, o primeiro passo de quem busca um
projeto de operadora virtual é buscar uma MVNE (Mobile Virtual Network Enabler),
que ajudará na integração e na definição dos parâmetros de operação com a
operadora real. “O maior desafio é o ajuste das plataformas de billing e
atendimento para uma operadora virtual completa”