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[16/09/08]  Banda larga na rede elétrica: mitos e verdades - por Jana de Paula

Expira no próximo dia 29 de setembro o prazo dado pela Anatel para a consulta pública ao regulamento do uso da rede elétrica para internet em banda larga. Para a maioria dos players envolvidos neste mercado, esta regulamentação traz à discussão um tema de interesse e que movimenta vários pesos pesados das áreas de energia, telecomunicações e fabricantes há alguns anos.

Aprove ImagemNeste debate, porém, dois conceitos são apresentados como verdade absoluta quando, de fato, não passam de 'ouro de tolo'. Ou seja, de que será possível ampla e irrestrita banda larga em 98% da rede elétrica e, por conseguinte, à mesma proporção do território nacional. E o que faz da interferência a outros serviços de telecom um vilão invencível. Nesta conversa com Rogerio Botteon Romano (foto), pesquisador de telecomunicações da Gerência de Infra-estrutura de Redes do CPqD, foram abordados estes mitos e levantados os modelos de negócios factíveis, em curto e médio prazos.

Enquanto não se regulamenta o uso da rede externa de energia elétrica, o PLC - Power Line Communications, ou sistema de telecom que utiliza a rede elétrica de distribuição como meio de transmissão - vai sendo adotado para implantação de redes locais privadas no cabeamento interno, ou seja, na parte da rede do usuário, seja ele corporativo ou residencial. A Light, do Rio de Janeiro, tem este serviço de telecom para prédios residenciais. A Cemig, de Belo Horizonte, para residências e escolas. A maior, a Eletropaulo, fornece o PLC na rede interna para soluções residenciais, corporativas e de ensino na Região Metropolitana de São Paulo, além de vários outros projetos semelhantes prestados pelas diversas concessionárias de energia elétrica do país.

O que se deseja agora é regulamentar o uso da rede externa, como nova alternativa de fornecimento de banda larga em ampla escala. De fato, a rede elétrica tem potencial para transmitir multimídia (canais de TV), telefonia (voz) e internet em banda larga. Isto tudo adicionado a outro portfólio que inclui medição e balanço energético, com redução de custo eficiente. Este modelo já é adotado em mercados maduros, como nos Estados Unidos e no Reino Unido. Mas, para que a rede elétrica no país atue como mais um meio de transmissão de serviços de comunicação é necessário um amplo entendimento e a realização de minuciosos modelos de negócios que tragam rentabilidade e confiabilidade.

Até que se chegue a este consenso, algumas questões devem ser levantadas - e respondidas. Como será o modelo de banda larga via rede elétrica externa do país? As concessionárias de energia elétrica concederão suas redes para outros players, inclusive os de telecom? Ou atuarão diretamente no mercado? Que tipos de rede terão preferência? Uma rede totalmente fixa, com fibra óptica na interligação da central de transmissão com a subestação de eletricidade? Ou se dará prioridade a uma rede híbrida, onde a interligação dos dois serviços será feita por tecnologias de radiofreqüência, como Wi-Fi e WiMAX? Que tipo de 'limpeza' será exigida da rede elétrica para que ela esteja apta a transmitir em IP?

O fato é que o uso da rede elétrica para provimento de serviço em banda larga dá uma forte 'mexida' no mercado. Além da disposição das concessionárias da rede propriamente ditas, é fundamental a participação, desde o DNA deste tipo de serviços, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que terá que trabalhar em estreita parceria com a Anatel e a Aneel, as agências reguladoras de telecom e de energia elétrica. Um fato é claro: ao final do processo haverá um ganho bastante democrático: os serviços de telecom ganham um novo meio de transmissão, as concessionárias de energia podem se transformar em rede toda IP - e estar mais aptas a coibir roubos e evitar acidentes; e o usuário, além de receber banda larga pela velha rede elétrica, terá um serviço mais eficiente de fornecimento de eletricidade e, consequentemente, de melhor custo/benefício. Um verdadeiro nirvana...

Quem disputa nesta arena

O problema são os passos que se deve dar para atingir este admirável mundo novo. Como já dito, a primeira providência, após a regulamentação, as especificações e as definições de praxe, é a escolha do modelo ou modelos de negócios. "Para quem já tem backbone de fibra óptica, o negócio é bom de imediato. E, para quem não tem, é bastante viável o uso de rede WiMAX, com IP, numa solução híbrida. Assim, quem é que está mais próximo da rentabilidade? Primeiro quem tem backbone; depois, o dono da rede elétrica; e, em seguida, os vendors de infra-estrutura, modems e outros dispositivos móveis ou fixos e de serviços. No caso específico das concessionárias há um ganho extra: elas podem adotar o uso corporativo na própria rede, com significativa economia", avalia Romano.

Segundo o especialista, o CPqD tende mais para o modelo do PLC como integrante de uma solução híbrida, ou seja, composta de fibra, WMAX e/ou Wi-Fi, até para o mercado ganhar força. "Já que não é preciso instalar a rede, as soluções sem fio podem se mostrar atraentes, sobretudo em situações que requeiram muitos repetidores", acrescenta Romano. Uma vantagem do PLC surge de imediato: sua adoção em áreas de alta densidade populacional, pois, ao contrário do DSL, por exemplo, o sistema permite que a rede se regenere e se amplifique.

O modelo com inclusão digital

Muito se fala, nesta etapa de consultas e sugestões, sobre uma possível capacidade da banda larga via rede elétrica em projetos de inclusão social. De fato, existe o piloto coordenado pela Aptel PLC Brasil - com FITec, Cemar, Eletropaulo, Celg, EBA, Samurai, Positivo e Star One - para levar banda larga (45 Mbps) numa escola de ensino fundamental com 365 alunos em Barrerinhas, no Maranhão. O projeto de inclusão social e digital tem o apoio do Sebrae e da Secretaria Estadual de Saúde. Como este há outros - o Restinga, em Porto Alegre (RGS), o Bandeirante, em São Paulo (SP). Mas, pelo número e o porte dos players envolvidos nestes projetos, que se pode classificar de pequeno porte, é possível enxergar o nível de parceria envolvido e os custos implicados.

"Não vejo a inclusão digital como a principal aplicação do PLC. Prefiro acreditar que há outras formas de ele decolar", adverte Romano. Aí, novas questões se pousam. Quem vai realizar as instalações necessárias? O próprio governo? Haverá planos de metas de inclusão digital para os players interessados, como no caso das outorgas da 3G?Estarão as concessionárias de energia elétrica dispostas a reduzir a tarifa de concessão de eletricidade diante do aumento de receita originário destes serviços de banda larga através de sua rede? Como se vê, antes de se pensar em projetos de inclusão de grande porte, mais uma vez, é preciso se elaborar um minucioso plano que inclua um detalhado calendário de retorno sobre investimentos (ROI).

"Como já disse, os modelos de negócio mais viáveis para o PLC atualmente são o que implicam outro tipo de meio acoplado a ele, seja fibra óptica ou tecnologias de radiofreqüência. As grandes cidades, com seus amplos backbones de fibra óptica, podem ser consideradas o filé mignon deste negócio. As áreas com pouca densidade populacional não são atualmente o melhor mercado. Mas, com a regulamentação do PLC e a elaboração de um minucioso ROI é possível torná-lo rentável. A oferta de equipamentos ainda é incipiente, sobretudo internamente. O modem com gerenciador é um equipamento fundamental, por exemplo. Hoje há alguns players estrangeiros competindo no mercado local. A Current (dos EUA), por exemplo, realiza testes com a Eletropaulo em projetos de telecom em prédios residenciais (banda indoor)", pondera o especialista.

Interferência, o vilão

Está constatado, principalmente em redes que adotam meios sem fio, que existem problemas de interferências em linhas de visada. Também, nas redes externas de PLC já implantadas no mundo, notou-se o quanto os eletro-domésticos 'sujam ' a rede elétrica, bem como alguns tipos de lâmpadas compactas. Mas tudo é uma questão de especificação. Assim, a interferência, que é o problema número um quando se trata de PLC, pode, sim, ser mitigada. Até porque a capacidade de interferência em outras redes não é exclusiva do PLC.

As redes de TV a cabo, quando há rompimento do cabo coaxial, também são fortes poluidoras e trata-se de uma rede super utilizada. Mas, por ser um serviço regulamentado, quando há vazamento, seja por falha técnica, humana ou vandalismo, ou seja por conectores mal feitos e/ou mal instalados, é possível o controle, monitoramento e mitigação dos problemas verificados. O mesmo ocorrerá ao PLC, depois de regulamentado e, por ser uma rede subutilizada, seus problemas não serão maiores que o verificado neste exemplo da TV a cabo.

"Trata-se de um segmento onde a regulamentação é indispensável. Todos os países que adotam este tipo de serviço elaboraram suas regras. O fato é que o PLC está numa freqüência que pode interferir em vários serviços, já que trabalha numa faixa ampla - de 1,7 MHz a 30 MHz. E, como atua em todas as faixas em modulação similar ao DSL, ao TLC e ao rádio etc., a interferência deve ser controlada para a prestação de um serviço de qualidade. Hoje a mitigação deste problema está avançada. O CPqD fez vários testes nos chamados PLC de segunda geração e constatou isso", disse Romano.

Em longo prazo, o PLC pode se transformar em opção tecnológica para implantação da rede de comunicação orientada nos conceitos de SmartGrid, além de rede de acesso externo à banda larga.

Os tipos de PLC

Há três tipos de rede PLC. O de média tensão (20 kV - 11,9 kV) é usado exclusivamente pelas concessionárias de energia elétrica. O de baixa tensão (220V-110V) é o indicado para o uso da rede de distribuição de energia das concessionárias no fornecimento de serviços de telecom para residenciais e escritórios. Há ainda PLC na rede interna, de uso do cabeamento interno de prédios e casas para estabelecer redes locais privadas.

No caso de um PLC em rede de baixa tensão, que é o que leva banda larga outdoor, o backbone de internet é levado pela mesma tensão dos transformadores (tensão média). Ou seja, a banda larga chega até os transformadores em média tensão e é distribuída para as casas em redes de baixa tensão (220 V-110 V). Neste ponto da rede é que também são instalados os regeneradores de PLC (para controlar interferências). O backbone de internet também pode vir direto da subestação (por fibra óptica). Quanto ao cliente, ele instala um modem PLC em sua casa e passa a ter banda larga.

PLC nas faixas de 80 MHz a 1,6 MHz

De início (há dez anos), o plano entre os pioneiros, era de as próprias concessionárias de energia se tornarem as fornecedoras de serviços de telecom. Os sistemas PLC foram desenvolvidos inicialmente por pesquisadores da Nor.Web - empresa formada entre Northern Telecom (Nortel) e United Utilities. As primeiras redes de telecom em PLC basearam-se em fibra óptica, numa rede totalmente com fio. Neste caso, o centro de operação do sistema de comunicações é interligado à subestação de energia elétrica por fibra óptica e transmitido ao consumidor até a rede primária de média tensão/PLC (o transformador instalado nas ruas, dos quais se bifurcam os fios para as residências) As residências, tecnicamente, recebem a chamada rede secundária de baixa tensão (a conexão entre a rede primária e a secundária seria a última milha).

Assim, enquanto na concessão de telefonia fixa comutada o xis da questão é a última milha, na da rede elétrica a ponta principal fica entre o transformador e a subestação, que é onde se instala a rede de transmissão de dados, voz imagem etc.

A rede híbrida

No caso da rede híbrida, a estação de base, ou centro de operações (telefonia, multimídia e internet), é interligada à rede secundária de baixa tensão (a que fica nas vias públicas, no transformador), dispensando a interligação com a subestação. A banda larga chega sem fio na casa do cliente, com uma vantagem: o cliente que dispuser de uma antena wireless, femtocell, Wi-Fi, WiMAx etc. pode adquirir mobilidade nesta rede. Este tipo de rede híbrida WLAN-PLC está num estágio entre a segunda e a terceira geração.