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Leia na Fonte: Portal da Band - Colunas
[09/08/12]
Vem ai a CPI da Telefonia? - por Mariana Mazza (foto)
Todo
o barulho causado nas últimas semanas com a sequência de problemas e denúncias
envolvendo as operadoras de telefonia móvel culminou em uma reação inesperada
para boa parte do setor de telecomunicações. Ontem, os deputados apresentaram
dois requerimentos para criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com a
intenção de investigar os serviços telefônicos. Desde que o setor foi
privatizado, vários pedidos para a abertura de CPIs foram apresentados, mas
nenhum deles vingou. Mesmo com o número de assinaturas necessário, os
requerimentos anteriores foram barrados na presidência da Câmara dos Deputados.
Os pedidos entregues ontem foram apoiados, em princípio, por 246 deputados,
número bem acima das 171 adesões necessárias. Mas a lista ainda está sendo
conferida pela Secretaria Geral da Mesa e esse número pode cair com a retirada,
se houver, das assinaturas repetidas. De qualquer forma é uma adesão e tanto
para um requerimento de CPI, o que mostra o descontentamento dos parlamentares
com a situação na telefonia. Também é necessário considerar que a exposição das
mazelas do setor criou um ambiente bastante favorável para desta vez a CPI ter
chance de ser implantada.
O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, estava participando de uma
audiência no Senado Federal - também sobre a crise na telefonia móvel - quando
os deputados entraram com os pedidos. E sua primeira reação quando soube da
iniciativa não foi muito boa. Bernardo disse que uma CPI sobre o setor pode ser
inócua e que o melhor seria a Anatel continuar cuidando do assunto.
Acontece que o objeto que os parlamentares querem investigar está intimamente
ligado com a atuação da Anatel. Engana-se quem pensa que o mote para a abertura
da CPI é a baixa qualidade dos serviços prestados pelas operadoras. Os
parlamentares pretendem investir um assunto bastante específico. Pedem o direito
de apurar os efeitos da tarifa de interconexão sobre o mercado de telefonia
celular.
Poucos consumidores sequer sabem que esta tarifa existe. A interconexão é o
preço pago entre as operadoras para completar as chamadas destinadas às redes
concorrentes. Assim, toda vez que um cliente liga para alguém de outra
companhia, a operadora está pagando um "pedágio" para completar a chamada no
território inimigo. Isso vale para qualquer tipo de ligação, tanto fixa quanto
móvel, embora o objeto de apuração da pretendida CPI seja apenas a taxa cobrada
nas redes móveis, chamada de Valor de Uso Móvel (VU-M).
Essa tarifa é altíssima em comparação com o pedágio da rede fixa, a tarifa de
Uso de Rede Local (TU-RL). Enquanto a VU-M está, em média, R$ 0,35, a TU-RL
custa R$ 0,05. Essa disparidade entre as duas tarifas de interconexão tem
motivos políticos. Quando a telefonia móvel ainda engatinhava, o governo criou
esse desbalanceamento para incentivar as operadoras móveis. Os anos passaram, a
telefonia móvel tornou-se o serviço telefônico mais usado no país e, ainda
assim, as tarifas não foram equacionadas. Recentemente a Anatel fez uma redução
na VU-M, mas o movimento não foi suficiente para gerar impacto real para os
consumidores. Boa parte do fato de pagarmos ainda um dos mais caros serviços de
telefonia móvel do mundo está no valor da interconexão.
E por que a Anatel não reduz a VU-M de forma drástica? Porque hoje um terço do
faturamento das operadoras móveis vem desta negociação inter-redes. Além disso,
as operadoras criaram meios para perpetuar a taxa em um alto valor, amparando
seus planos de sucesso no dinheiro arrecadado com a tarifa. A primeira
iniciativa foi subsidiar os celulares com recursos vindos da VU-M. Nos tempos de
celular a R$ 1, o que completava o custo dos aparelhos era o caixa gerado pela
interconexão.
A nova onda custeada pela VU-M é a estratégia dos planos ilimitados. Para que
uma operadora possa oferecer ligações de graça dentro da própria rede sem
desequilibrar o faturamento ela precisa ter um belo caixa de interconexão. Eis
ai o motivo de os parlamentares associarem à investigação dessa parte do negócio
à busca da melhoria nos serviços das empresas.
Mas atacar a VU-M é um campo minado, afinal, ela tem financiado boa parte do
modelo de negócios adotado pela telefonia celular. Se essa tarifa for
drasticamente reduzida, o consumidor pode dar adeus aos subsídios de aparelho e
aos planos ilimitados que tanto agradam a população. Por outro lado, manter o
custo da interconexão em um nível tão alto é condenar o consumidor a continuar
pagando tarifas exorbitantes. É bem verdade que o brasileiro já deu um jeitinho
para escapar dessa encruzilhada: ter um chip de cada uma das operadoras. Mas
isso não pode servir de desculpa para abandonar a busca por uma solução mais
justa desse modelo de negócios.
Se a CPI for criada mesmo e se focar exclusivamente na interconexão, a
iniciativa vai deixar muitas empresas satisfeitas, especialmente as grandes
concessionárias fixas. Há anos a Oi defende publicamente o corte na VU-M. O
motivo é simples: a Oi é uma potência na telefonia fixa, mas fica na lanterna no
ramo móvel. E, quando o assunto é interconexão, quanto menor é a empresa, mais
VU-M ela paga para as concorrentes. Novamente a principal atingida será a TIM.
Sem ter uma empresa de telefonia fixa em seu grupo econômico, a operadora é a
maior dependente da interconexão no setor. Cortar a tarifa pode inviabilizar a
operação da empresa no Brasil.
Interesses empresariais à parte, a criação de uma CPI da Telefonia seria muito
saudável para o setor. Até porque uma das máximas mais verdadeiras do Congresso
Nacional é "CPI, sabe-se como começa, mas não se sabe como termina". Uma
comissão parlamentar de inquérito sempre vai mais longe do que seu objeto de
investigação inicial. E ainda há muita coisa mal explicada na telefonia
brasileira.