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Leia na Fonte: Consultor Jurídico
[08/12/12]
Judiciário pode intervir em tarifas de interconexão - por Tadeu Rover
Tadeu Rover é repórter da revista
Consultor Jurídico.
A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reconheceu a possibilidade de o Poder
Judiciário intervir nos casos em que se discute a fixação dos valores cobrados
das empresas prestadoras de serviços de telefonia fixa a título de Valor de Uso
de Rede Móvel (VU-M). A decisão unânime foi tomada na última terça-feira (4/12).
Nos processos analisados, a Turma foi favorável à operadora GVT.
O VU-M é uma tarifa cobrada pelas empresas de serviços de telecomunicações fixos
quando se conectam às redes de prestadoras móveis. Para se conectarem às redes
móveis, as operadoras pagam em média R$ 0,39 (VU-M), ao passo que para se
conectarem às redes fixas, as operadoras móveis pagam R$ 0,03 pela tarifa Tarifa
de Uso de Rede Local (TU-RL).
Em seu voto, o relator, ministro Mauro Campbell Marques, afirmou que a Lei Geral
de Telecomunicações expressamente confere às concessionárias de telefonia
relativa liberdade para fixar os valores das tarifas de interconexão VU-M, desde
que tais valores não estejam em desacordo com os interesses difusos e coletivos
envolvidos, consistentes na proteção dos consumidores e na manutenção das
condições de livre concorrência no mercado.
Para o relator, “a discussão judicial desses valores não afasta a regulamentação
exercida pela Anatel, visto que a atuação do referido órgão de regulação
setorial abrange, sobretudo, aspectos técnicos que podem melhorar a qualidade do
serviço oferecido ao consumidor pelas concessionárias de telefonia fixa e
móvel”.
A partir desse entendimento, foi negado provimento aos recursos especiais e
determinada a manutenção da antecipação de tutela concedida pela Seção
Judiciária do Distrito Federal, que determinou a aplicação dos valores sugeridos
por empresa de consultoria, mais condizentes com os interesses difusos
envolvidos.
Acordo exclusivo
A GVT entrou com ação na Justiça e junto ao Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade) buscando a diminuição dos valores cobrados pela VU-M. Segundo o
advogado que representa a GVT, Juliano Maranhão, sócio do escritório Sampaio
Ferraz Advogados, em 2005, as grandes operadoras fixas fizeram um acordo com as
grandes de telefonia móvel em que somente elas seriam beneficiadas, enquanto as
demais operadoras seriam prejudicadas com um aumento da VU-M, dando prejuízo a
estas operadoras em ligações para celular.
No processo do Cade, a GVT alegou discriminação às demais operadores, devido ao
acordo que beneficia apenas algumas. O processo ainda não foi julgado, porém já
possui parecer favorável da Secretaria de Direito Econômico do Cade e do
Ministério Público. Na Justiça, a GVT pediu interferência para baixar o valor
cobrado pela VU-M em antecipação de tutela. Pediu também o reembolso dos valores
pagos desde 2004.
O advogado Juliano Maranhão elogiou a decisão do STJ. “O atual valor de VU-M,
apesar da iniciativa tardia da Anatel para redução, continua um dos mais altos
do mundo, prejudicando a concorrência e os consumidores finais. A atuação do
Poder Judiciário e do Cade é fundamental para proteção do mercado", diz.
Mais caras do mundo
De acordo com o Cade, que atuou no julgamento do STJ como amicus curiae, as
taxas cobradas podem ser duas: taxa de interconexão em chamadas de móvel para
fixo (TU-RL), tarifa cobrada pelas concessionárias de telefonia fixa para a
utilização de sua rede local para originação ou terminação por outras empresas;
e taxa de interconexão em chamadas de fixo para móvel (VU-M), que é devida pelas
empresas de serviços de telecomunicações quando se conectam às redes de
prestadoras móveis. O caso julgado diz respeito apenas à VU-M.
No caso dos autos, a 2ª Turma do STJ constatou, a partir de análise das
características do mercado brasileiro de telecomunicações, que as tarifas
cobradas no Brasil a título de interconexão estão entre as mais caras do mundo.
Recentemente, a Comissão Europeia publicou recomendação orientando as operadoras
da região a baixar as tarifas a patamares bem inferiores àqueles praticados no
Brasil.
Na contramão dessa tendência mundial, a análise dos elementos constantes dos
autos que foram levados em consideração pelo Tribunal Regional Federal da 1ª
Região (TRF-1) indica que há no Brasil uma tendência de aumento dos valores
cobrados a título de VU-M, com a chancela da própria Anatel.
Efeitos maléficos
De acordo com o ministro Mauro Campbell, do STJ, a partir das manifestações do
Cade e dos elementos considerados pelo TRF-1, ficou claro que a fixação de
valores elevados a título de VU-M pode ter efeitos maléficos para as condições
de concorrência no setor, bem como para o consumidor final.
Isso porque, ressalvada a possibilidade expressamente prevista em lei referente
à concessão de descontos, esse custo é normalmente repassado para a composição
da tarifa final que deve ser paga pelo usuário.
Assim, de acordo com o relator, a par da regulação exercida pela Anatel, os
valores cobrados pelas empresas a título de VU-M podem ser discutidos no Poder
Judiciário, pois, por determinação da Lei Geral de Telecomunicações, elas têm
liberdade para fixar esses valores, desde que não estejam em desacordo com as
normas de proteção dos direitos dos consumidores nem com a cláusula geral da
liberdade de iniciativa concorrencial.
O advogado Juliano Maranhão também apontou outros efeitos maléficos causados
pela cobrança diferenciada. Segundo ele, há uma distorção quando as empresas
cobram mais barato para ligações com a própria rede e mais caro quando outros
utilizam, pois isso induz o cliente a fazer chamadas somente dentro desta rede.
“Assim, as pessoas compram chips de todas as operadoras para ficar ligando
somente entre elas. Com isso, ao invés de investir em redes e faturar com as
chamadas, as operadoras investem e ganham vendendo o chip. Isso ajudou a causar
a saturação das redes que estamos vendo”.
Reajuste escalonado
Em janeiro, a Agência Nacional de Telecomunicações homologou um plano de redução
de tarifas das ligações de telefone fixo para móvel. O reajuste escalonado é
divido em três vezes, até 2014, sempre em janeiro.
Cada redução de tarifa será de, em média, 10%. Em janeiro de 2014, o total
chegará a 26%. De acordo com a agência, no entanto, os ganhos para os
consumidores deve atingir 45%, considerando reajustes que não serão feitos.