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Leia na Fonte: Portal da Band / Colunas
[26/03/13]
Compartilhamento de redes: quem era pró agora é contra - por Mariana Mazza
O presidente da Anatel, João Rezende, fez algumas declarações intrigantes nesta
terça-feira, 25, ao analisar os problemas e eventuais soluções para esta crise
do setor de telefonia móvel. Em um evento realizado em Brasília, Rezende fez um
mea culpa para o alto custo dos serviços telefônicos no país ao frisar que o
Brasil possui a tarifa de interconexão mais cara do mundo. Esta tarifa é paga
entre as empresas para completar as chamadas entre redes de diferentes
companhias. Normalmente o valor é acordado entre as próprias operadoras, mas
existem parâmetros para este cálculo estipulados pela Anatel, que homologa os
preços estabelecidos pelo mercado.
O alto custo da interconexão faz parte de uma política fixada logo após a
privatização para estimular o crescimento dos serviços móveis, ainda insipientes
na década de 90, ao gerar mais receita para as operadoras que entraram no
mercado. Segundo Rezende, está na hora de inverter esta lógica. A Anatel já vem
aplicando um plano de redução do custo da interconexão móvel, chamado de Valor
de Uso Móvel (VU-M), mas os efeitos da medida ainda não foram percebidos pelos
consumidores.
A redução da VU-M é uma faca de dois gumes. De fato a tarifa é altíssima, se
comparada com a interconexão da rede fixa. Enquanto a média do custo de rede
móvel é de R$ 0,48, a da rede fixa é R$ 0,08. Acontece que as promoções e
pacotes ilimitados que circulam na telefonia móvel atualmente são financiados em
boa parte pela receita gerada pela interconexão que sobra no caixa das empresas.
Sendo assim, uma forte queda no valor da VU-M ou sua eventual eliminação do
mercado exigirá uma mudança nos modelos de negócio utilizados hoje pelas
operadoras. Assim, não há como ter certeza se o corte dessa tarifa culminará
realmente em uma queda dos preços ao consumidor final já que o mercado aprendeu
a utilizar a interconexão como forma de compensar as receitas perdidas com a
oferta de planos mais baratos. Será um desafio para a Anatel equilibrar todos
estes fatores e ainda assim assegurar que o consumidor será beneficiado no
final.
Todo cliente de telefonia no Brasil sabe que o custo deste serviço é alto. Ainda
assim é sempre bom ver as autoridades admitindo a existência do problema. Outra
coisa que todo consumidor sabe é que as redes das operadoras não estão dando
conta do recado. A própria Anatel conhece bem o problema e adotou várias medidas
no ano passado inclusive a suspensão da venda de novas linhas para forçar as
empresas a investirem mais na infraestrutura. Além de apresentarem planos de
investimento, as operadoras começaram a trabalhar em outras alternativas para
distribuir melhor o tráfego de voz nas redes. Uma delas é o compartilhamento das
redes.
Neste modelo de operação, as companhias selam um acordo para usar em conjunto as
redes que estão implantadas, reduzindo os custos de ampliação ao alocar com mais
eficiência não só as chamadas realizadas mas também os investimentos futuros
para expansão da infraestrutura. Como a operação móvel depende visceralmente do
uso de radiofrequências, esses compartilhamentos também costumam prever o uso
conjunto do espetro. No início do mês, Claro e Vivo anunciaram uma parceria
nesses moldes. A proposta de uso conjunto das redes ainda precisa do aval da
Anatel para ser efetivada. Hoje, a diretoria da TIM informou que entregará nessa
quarta-feira, 26, um acordo semelhante firmado com a Oi.
Mas, para surpresa do setor, a Anatel não parece estar muito empolgada com os
acordos das empresas. É uma coisa nova e não apenas para nós, afirmou João
Rezende segundo o portal Convergência Digital. Acho que a Anatel tem que se
debruçar sobre isso e estudar profundamente o compartilhamento de frequências. A
declaração do presidente da Anatel sugere que, no mínimo, as operadoras não
ganharão o aval da agência reguladora na velocidade que previam. O mais estranho
na fala de Rezende é a afirmação de que esse tipo de acordo é uma coisa nova.
Quem acompanha o setor já ouviu falar desse tipo de contrato há muito tempo. E
quem começou com essa história no Brasil foi a própria Anatel.
Tudo teve início em 2007, quando a agência realizou o leilão do 3G. Uma condição
imposta aos vencedores naquela disputa foi exatamente o compartilhamento de
radiofrequências. A proposta da Anatel era que municípios de pequeno porte
fossem divididos entre as operadoras que compraram faixas no leilão. E que o
atendimento dessas populações seria feito por meio do compartilhamento das
frequências.
A atual preocupação da Anatel é legítima, embora pareça meio tardia haja vista o
que foi proposto às empresas seis anos atrás. A agência teme que o uso conjunto
das faixas crie conflitos entre as operadoras que acabem deixando na mão o
consumidor. É preciso deixar bem claro quais as responsabilidade de cada empresa
em um acordo dessa natureza para evitar que ambas se omitam da responsabilidade
quando um problema for identificado. Afinal, é de se esperar que as companhias
continuem atuando como adversárias no mercado apesar dos acordos de
compartilhamento. E essas alianças criam um cenário onde sabotagens e outras
práticas anticoncorrenciais podem acontecer.
O que é importante neste caso é que a agência se prepare para conseguir
fiscalizar esses acordos de forma eficiente. E, ao que parece, a Anatel ainda
não se sente segura para acompanhar esse tipo de aliança. O uso da
infraestrutura terrestre como as torres de celular por mais de uma companhia já
é conhecido no setor e é possível que a agência libere apenas esta parte dos
acordos. Mas o uso compartilhado das frequências continua sendo uma incógnita. E
o consumidor é quem sai perdendo enquanto este impasse não é resolvido, já que o
compartilhamento poderia melhorar a qualidade dos serviços prestados.
Os acordos que estão sendo firmados deixam mais uma dúvida: estamos vendendo
mais frequências do que as empresas conseguem utilizar? Essas frequências são um
bem escasso e ano após ano a Anatel vem desocupando faixas e até eliminando
serviços para colocar em leilão novas radiofrequências a serem utilizadas pelas
empresas móveis. Não podemos ignorar que a indústria tecnológica tem um papel
decisivo na escolha de quais frequências serão utilizadas em cada geração da
telefonia celular. Mas um detalhe nunca debatido é o fato de que, a cada nova
frequência negociada com as operadoras móveis, as que deixaram de ser utilizadas
não são devolvidas para a agência reguladora.
Há alguns anos, quando a Anatel começou a discussão do chamado passivo digital
frequências que deixarão de seu utilizadas quando as televisões migrarem
completamente para a transmissão digital ouvi de um técnico de alto escalão da
Anatel que era uma obrigação das empresas colocar à disposição as frequências
sem uso. Foi então que perguntei: mas as operadoras móveis já devolveram alguma
vez um pedacinho sequer do espectro? A resposta, apesar de envergonhada, foi um
categórico não. Agora está ficando muito claro que a falta de frequências não é
um problema tão grande quanto o setor nos fez acreditar. Ou alguém acredita que
uma empresa fecharia um acordo para compartilhar um bem que lhe custou tão caro
se esse patrimônio não estivesse totalmente subutilizado?