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Leia na Fonte: O Estado de S.Paulo
[14/11/15]
Agências reguladoras: melhorar, não piorar - por Raymundo Magliano Filho*
Vinte anos após a criação das agências reguladoras, autarquias especiais de
Direito Público que exercem funções típicas do Estado em três esferas -
administrativa, normativa e fiscalizatória -, o momento é de repensar
democraticamente o sistema e de contribuir para aperfeiçoá-lo.
Tais agências são muito importantes para os cidadãos e as empresas, pois elas
regulam serviços públicos e atividades econômicas que afetam diariamente nossa
vida e nossos negócios. Nesse contexto, é importante notar que cidadãos e
empresas têm direito a reclamar tanto do atendimento que lhes é dispensado
quanto do desvirtuamento da independência e autonomia que a lei confere às
agências reguladoras, entre elas a Anvisa (vigilância sanitária), a Aneel
(energia elétrica), a Anatel (telefonia e telecomunicações), a ANS (planos de
saúde) e a Anac (aviação civil).
O grande nó da questão está na excessiva politização das agências, com nomeações
para cargos de direção atendendo a critérios político-partidários, e não de
competência técnica requerida por lei. Intervenção do governo via ministérios,
aos quais as autarquias especiais estão vinculadas... Tal prática política,
característica dos últimos governos, prejudica a segurança jurídica,
indispensável para os investimentos. E o resultado é a perda da confiança e da
credibilidade, essenciais para os cidadãos viverem numa democracia, cujos
pilares devem ser transparência, acesso e visibilidade, tal como diria Norberto
Bobbio, de cujas ideias me considero um seguidor.
Algo precisa ser feito para fortalecer o marco regulatório das agências, para
que elas possam atuar de forma equilibrada, mediando os interesses do governo,
dos concessionários e dos consumidores. Justamente por acreditar na força das
ideias e desejoso de contribuir para o debate sobre o redesenho das agências
reguladoras federais, estou em fase avançada da redação de um livro sobre o
assunto.
Neste afã, infelizmente, deparei-me com a notícia de que o Senado está prestes a
aprovar projeto de lei que põe em risco a autonomia das agências reguladoras
federais. Entre as principais mudanças previstas está a criação de uma câmara de
"supervisão regulatória", que será diretamente vinculada à Presidência da
República e terá a missão de "avaliar e acompanhar" as deliberações das
autarquias. O texto prevê, ainda, que os planos estratégicos das agências sejam
analisados previamente por quatro ministérios.
Sendo assim, o projeto de lei vai na contramão de mudanças democráticas para
aperfeiçoar as agências e dar uma resposta aos cidadãos, que, indignados, buscam
serviços mais eficientes, e às empresas, que buscam ambientes de negócios em que
possam competir de forma leal, por meio de uma regulação transparente e digna de
confiança.
Felizmente, noticia-se que a tramitação apressada do Projeto de Lei do Senado (PLS)
52/2013 já provoca um movimento de contestação de dirigentes das agências. Eles
dizem temer impacto negativo para os investidores no momento em que o governo se
prepara para fazer novos leilões de hidrelétricas, linhas de transmissão,
rodovias, portos e aeroportos. Avaliam, também, que a implantação de "controle
externo" sobre a agência será uma péssima sinalização ao mercado.
O que diriam os cidadãos brasileiros diante dessas mudanças? O Legislativo
pretende aprovar um projeto de lei sobre agências reguladoras que afetam o
cotidiano das pessoas sem ouvi-las? Para o nosso livro, pesquisamos o sistema de
agências reguladoras nos EUA, na França, no Reino Unido. Ainda que imperfeitas e
sujeitas a críticas, elas levam em consideração, precipuamente, que a proteção
ao consumidor é um dos princípios basilares da atividade regulatória. Este, sim,
é um caminho democrático fundamental para as agências reguladoras.
* EX-PRESIDENTE DA BOVESPA, FUNDADOR DO INSTITUTO NORBERTO BOBBIO - DEMOCRACIA E
DIREITOS HUMANOS, É AUTOR DO LIVRO 'A FORÇA DAS IDEIAS PARA UM CAPITALISMO
SUSTENTÁVEL'
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