FLÁVIA LEFÈVRE GUIMARÃES
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Fevereiro 2011 Índice Geral
Fonte:
Convergência Digital
[22/02/11]
PNBL: É mais do que hora de fazer acontecer - por Flávia Lefèvre
Flávia Lefèvre Guimarães é advogada e coordenadora
da Frente dos Consumidores de Telecomunicações, consultora da associação Pro
Teste e foi representante das entidades de defesa do consumidor no Conselho
Consultivo da ANATEL de fevereiro de 2006 a fevereiro de 2009.
Quando
em maio de 2010, o Governo Federal editou o Decreto 7.175, instituindo as
diretrizes gerais do Plano Nacional de Banda Larga, podíamos acreditar que
sabia quais seriam as estratégias que iria utilizar para democratizar o
serviço de comunicações de dados no país. As medidas adotadas foram fortes e
definitivas; a reativação da Telebrás ocorrida na mesma época é prova
incontestável disto.
É curioso que naquela época, as concessionárias de telefonia fixa reclamaram
muito, alegando que pretendiam participar do PNBL e que o papel a ser
desempenhado pela Telebrás poderia ser desempenhado por elas, a ponto de
ajuizarem ação contra os planos do Governo.
Em resposta, o Governo jogou firme: em agosto de 2010, divulgou a lista das
100 primeiras cidades que passariam a estar interligadas à rede da Telebrás,
sendo que destas, em 97, as concessionárias já atuavam. A posição do Governo
foi eficiente e se justificava, pois a reação imediata das teles foi reduzir
o preço do acesso à internet tanto no varejo quanto no atacado.
Ou seja, ficou evidente que faltava atuação estatal que estimulasse a
redução dos preços e melhoria da qualidade do serviço, fator essencial para
ampliar o acesso ao serviço de comunicação de dados em condições adequadas.
Ocorreu que, estranhamente e na contramão dos movimentos que vinha fazendo,
o Comitê Gestor do Programa de Inclusão Digital – CGPID passou a atribuir às
metas de backhaul, incluídas na proposta do próximo Plano Geral de Metas de
Universalização – PGMU - correspondente aos contratos de concessão da
telefonia fixa, cujo decreto está para ser editado, um papel fundamental
para o PNBL.
Diante do fato de que as concessionárias reclamavam uma participação no PNBL,
poderíamos supor que concordariam com as novas metas de universalização de
expansão do backhaul (desde que se chegasse a um consenso sobre os custos
para a implantação das metas). Mas não foi o que ocorreu.
Apesar de já terem aceitado implantar backhaul como obrigação relativa aos
contratos de concessão de telefonia fixa, nos termos do Decreto 6.424∕2008,
que estabeleceu a troca de metas de Postos de Serviços de Telecomunicações –
PSTs pela implantação das redes de acesso à internet, agora as teles se
insurgiram contra o plano e foram bater às portas da Justiça para questionar
a legalidade do PGMU III. E as teles têm razão!
A implantação de redes de acesso à internet nunca poderia ter sido incluída
como obrigação vinculada aos contratos de telefonia fixa, na medida em que
não são essenciais nem necessárias para a prestação do serviço objeto dos
contratos de concessão, gerando por isso custos injustificáveis a serem
repassados para tarifa (art. 81, da Lei Geral de Telecomunicações – LGT)
tornando a telefonia fixa inacessível para os cidadãos de baixa renda,
violando os princípios da modicidade tarifária e universalização dos
serviços públicos. Aliás, esta matéria já está judicializada desde maio de
2008 por iniciativa da PROTESTE – Associação de Consumidores, que moveu ação
civil pública.
O impasse se colocou e o Governo condicionou a negociação relativa às
obrigações de universalização da telefonia fixa à desistência pelas teles
das ações que tinham na Justiça contra a Telebrás e o PGMU III. Ora, como
poderia o Governo fazer queda de braços com as concessionárias utilizando
algo ilegal?
A ameaça feita às concessionárias de edição do decreto com o novo PGMU III
da telefonia fixa mantendo as metas de expansão do backhaul é inócua, não
tem força, devido a precariedade decorrente de sua evidente ilegalidade,
discutida há pelo menos dois anos pela sociedade.
E o que espera o Governo como contrapartida à rendição quanto às metas de
expansão do backhaul? Pasmem: que as teles “sejam generosas” e façam
propostas para a prestação do serviço de comunicação de dados, denominado de
banda larga, em condições melhores de velocidade e preço no atacado e no
varejo, levando o serviço à localidades que não lhes despertam interesse
econômico, como vem sendo amplamente noticiado!
Pior, utilizando uma rede pública de alta capacidade, de âmbito nacional e
internacional, também conhecida como rede de troncos que, segundo o artigo
207 da LGT, deveria estar sendo operada por uma concessionária específica
desde 1998 (modelo “open reach”).
Cabe, então, perguntarmos: mas, quando o Governo lançou o PNBL, não
pretendia justamente fazer frente ao poder significativo de mercado das
concessionárias no provimento de acesso ao serviço de comunicação de dados?
Como agora quer colocar as redes essenciais para o provimento do serviço de
acesso à internet nas mãos destas mesmas operadoras, sendo que este fator é
preponderante para o sucesso do PNBL? Como pode o Governo, com a urgência
que se impõem para a democratização dos serviços de telecomunicações,
inclusive a comunicação de dados, estar ESPERANDO uma oferta melhor das
teles?
O PNBL já foi editado e está em vigor. Agora, cabe ao Governo editar o
regulamento geral dos serviços de telecomunicações, como determinam a
Constituição Federal e a Lei 9.649∕1998, definindo, entre os demais
serviços, o serviço de comunicação de dados (leia-se banda larga) e, em
seguida, publicando o regulamento específico para sua exploração comercial,
com parâmetros claros de qualidade e preço (ou tarifa, caso este serviço
venha a ser incluído no regime público, como defendemos que seja feito,
tendo em vista o que dispõe o § 2º, do art. 65, da LGT).
Esperar de empresas privadas, que já dominam os mercados e devem respostas
aos seus acionistas a respeito de lucros, a iniciativa de compartilharem
espontaneamente as redes públicas, que hoje detêm por força dos contratos de
concessão, e as que estão por ser implantadas a preços módicos pode ser
considerado, no mínimo, ingenuidade.
As chances de o Governo conseguir expandir a penetração do serviço de
comunicação de dados para as regiões mais pobres do país em condições
adequadas pelas mãos das concessionárias são mínimas por uma razão muito
simples: não há instrumento de pressão.
Se o Governo pretende de fato levar adiante com algum sucesso o PNBL, vai
ter de fazer a lição sozinho: fortalecer a Telebrás, criando uma subsidiária
específica para operar as redes de troncos públicas, apropriadas
indevidamente pelas concessionárias que as exploram em descompasso com o
interesse público e regulamentar os serviços de comunicação de dados para
então licitá-los, respeitando os princípios da moralidade, eficiência e da
impessoalidade, a fim de estabelecer condições equilibradas para todos os
agentes de mercado que se interessarem (não faltarão interessados, tenho
certeza) pela sua exploração comercial, de acordo com o art. 37 da
Constituição Federal.
Vamos lá companheiros! Como já nos dizia Geraldo Vandré: quem sabe faz a
hora não espera acontecer!