FLÁVIA LEFÈVRE GUIMARÃES
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Fevereiro 2012 Índice Geral
23/02/12
• Artigo de Flávia Lefèvre no portal Carta Capital: "Os médicos e os planos de saúde"
Fonte: Carta Capital
[23/02/12]
Os médicos e os planos de saúde - por Flávia Lefèvre Guimarães
Flávia Lefèvre Guimarães, advogada e sócia do
escritório Lescher e Lefèvre Advogados Associados, mestre em processo civil pela
PUC-SP e conselheira da PROTESTE – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor
Há poucos dias um amigo médico me procurou bastante angustiado. Fora intimado
para responder a uma denúncia no Conselho Regional de Medicina. Motivo:
negligência? Não. Segundo a empresa de plano de saúde que o denunciou, excesso
de zelo. O médico está respondendo por ter prescrito muitos exames para uma
paciente com quadro de suspeita de câncer.
É sabido que há muitos anos as empresas de plano e seguro de saúde vêm tratando
a classe médica de forma aviltada. Pagam valores irrisórios por consultas e
procedimentos cirúrgicos, incompatíveis com a importância que a profissão tem
para a concretização do direito universal de acesso e garantia da saúde.
Foi a Constituição Federal de 1988 que instituiu o direito ao acesso universal
aos serviços de saúde, estabelecendo que esta garantia passava a ser atribuição
do Estado. Surgiu, então, o Sistema Único de Saúde – o SUS, voltado para o
atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas,
desenvolvidas pela União, estados e municípios.
Mas todos sabemos da precariedade da rede pública, que termina por empurrar as
classes média e alta para o enorme sacrifício financeiro de contratação de
planos de saúde, na esperança de serem atendidos dignamente quando estiverem
doentes.
A mesma Constituição autorizou que empresas privadas participassem de forma
complementar ao SUS, seguindo as mesmas diretrizes. Entretanto, os planos e
seguro de saúde vêm marcando sua atuação no mercado como se vendessem serviços
supérfluos e não serviços públicos essenciais.
Apesar da clareza da lei, estas empresas são conhecidas pelas práticas
desrespeitosas ao Código de Defesa do Consumidor, como tem sido comprovado nos
tribunais do país, que têm tido o papel fundamental de impor a elas o dever de
arcarem com as despesas relativas a consultas, internações, procedimentos,
equipamentos e materiais correspondentes aos atendimentos médicos, ambulatoriais
e cirúrgicos.
Considerando o entendimento dos nossos tribunais quanto às práticas muitas vezes
abusivas das empresas de saúde, que inclusive tem revertido em condenações ao
pagamento de danos morais aos consumidores, é possível que agora elas tenham
passado a uma nova estratégia – o constrangimento dos médicos.
É inadmissível que os médicos, com as obrigações e ética a que estão obrigados,
passem a orientar o exercício da profissão pelo temor de terem de responder
junto aos conselhos de medicina.
O quadro claro de desrespeito que aflora nos tribunais e Procons do país revela
que seria fundamental uma atuação mais forte da Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS), no sentido de acompanhar e coibir práticas abusivas voltadas
contra a classe médica e que têm significado uma barreira ao cumprimento de
direitos dos consumidores de planos de saúde , e também uma violação ao
princípio básico de tratamento digno aos doentes.
No entanto, sabemos que a ANS tem sido omissa, uma vez que fiscalizam de forma
insuficiente as empresas, e, no processo regulatório, as posições das operadoras
têm pesado muito mais do que a dos consumidores e da classe médica.