FLÁVIA LEFÈVRE GUIMARÃES
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Junho 2013              Índice Geral


10/06/13

• O regulamento do SCM e a morte iminente da Internet - por Flávia Lefèvre

[Obs: No final desta página estão transcritas, na íntegra, as matérias referenciadas no texto]

Já prevendo a conduta errática e capturada da ANATEL, bem como o oportunismo eleitoreiro que tem trazido consequências lesivas para a garantia da integridade da internet regulada como um espaço público voltado para a livre manifestação do pensamento e do direito à comunicação, a PROTESTE, em fevereiro de 2012, logo em seguida da assinatura dos vergonhosos Termos de Compromisso do PNBL firmado entre a União e teles, enviou a agência um ofício apresentando pedidos de esclarecimentos, estando entre as perguntas a seguinte:

“Os regulamentos de gestão de qualidade serão aplicados aos contratos – denominados de banda larga popular – firmados com base nos Termos de Compromisso assinados com as concessionárias em julho de 2011?”

E o então Superintendente de Serviços Provados – Bruno Ramos – nos respondeu o seguinte:

“O RGQ-SCM e o RGQ-SMP estabelecem metas de qualidade a serem cumpridas pelas prestadoras do SCM e do SMP com mais de cinquenta mil acessos em serviço. Todos os planos existentes destas prestadoras, independentemente de sua formatação e oferta, devem estar aderentes às obrigações constantes dos regulamentos.

Nesse sentido, os contratos de adesão firmados entre as prestadoras e os assinantes com base nos Termos de Compromisso do Plano Nacional de Banda Larga – PNBL devem atender às obrigações constantes dos regulamentos, conforme dispõe a seguinte cláusula dos Termos de Compromisso:

'(nome da empresa) deverá observar os regulamentos da Anatel e garantir a adequação da Oferta de Varejo e da Oferta de Atacado aos padrões gerais de qualidade aplicáveis pela Anatel, sujeitando-se à sua fiscalização e às sanções cabíveis no tocante estritamente ao cumprimento destas regulamentações.

Parágrafo único. Para as Ofertas de Varejo, (nome da empresa) garantirá que os padrões de qualidade da oferta não serão inferiores aos das suas ofertas regulares de mercado de mesmas características’.

A PROTESTE perguntou, ainda:

“Considerando que o fornecimento do serviço de comunicação de dados se caracteriza como duração continuada, a Anatel entende que os contratos firmados antes da entrada em vigor dos novos parâmetros de qualidade estarão contemplados pelas garantias fixadas com os novos regulamentos de gestão de qualidade do SMP e SCM?

E a ANATEL respondeu:

“Conforme já esclarecido, a partir do momento em que o cumprimento das metas e obrigações do RGQ-SCM e RGQ-SMP for exigível, todas as prestadoras que possuírem uma quantidade igual ou superior a cinquenta mil acessos em serviço deverão atende-las integralmente. Conforme preceitua a Lei 9.472/97 (LGT), em seu artigo 130, ‘a prestadora de serviço em regime privado não terá direito adquirido à permanência das condições vigentes quando da expedição da autorização ou do início das atividades, devendo observar os novos condicionamentos impostos por lei e pela regulamentação’. Assim, todos os contratos firmados entre a prestadora e o assinante, inclusive aqueles anteriores à publicação dos instrumentos normativos, deverão estar aderentes às obrigações constantes dos regulamentos de qualidade”.

A resposta do então superintendente é de clareza solar e está corretíssima pelo aspecto jurídico. Até porque, se fosse diferente, estaria contrariando a LGT, quando, expressamente garante a todos padrões de qualidade e regularidade e proíbe o tratamento discriminatório dos consumidores (art. 3º, incs. I e III: O usuário de serviços de telecomunicações tem direito: I - de acesso aos serviços de telecomunicações, com padrões de qualidade e regularidade adequados à sua natureza, em qualquer ponto do território nacional; III - de não ser discriminado quanto às condições de acesso e fruição do serviço).

Entretanto, parece que o Conselheiro Marcelo Bechara está fazendo interpretação desconforme sobre os efeitos do mais recente Regulamento do SCM, que representa retrocesso quanto à alguns dos importantes direitos dos consumidores, como por exemplo a autorização para a fidelização, proibida no antigo regulamento, ou ainda a autorização à quebra da neutralidade da rede. Pelo menos é o que podemos entender das manifestações que fez, publicadas em matéria do Convergência Digital:

Para Anatel, limite de velocidade é decisão do mercado (por Luís Osvaldo Grossmann)

"Ao desistir de limitar o tamanho das reduções de velocidades em casos de acesso à Internet com franquia de dados, a Anatel escolheu um caminho pró-mercado, como defende o relator do regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia, Marcelo Bechara.

“Incorporei essa sugestão que veio da área técnica. Entendo que a forma como o usuário e a empresa vão negociar é livre. Posso continuar pagando para ter a mesma velocidade, ou ter reduzida a velocidade. De qualquer jeito, o serviço continua sendo prestado”, argumenta o conselheiro. Segundo ele, a medida poderia beneficiar quem usa muito a Internet.

Ao tratar a mudança como “ponto pacífico”, a Anatel esqueceu de tornar pública uma alteração sobre um item que o próprio setor demonstrou forte interesse, como será visto. Não houve menção à supressão desse ponto nem no voto do relator, nem ele foi discutido na reunião que aprovou o novo regulamento." (...)

Anatel desiste de limitar reduções de velocidade na Internet  (por Luís Osvaldo Grossmann)

"Sem alarde, a Anatel retirou do novo regulamento que trata do serviço de acesso à Internet um dispositivo que limitava o tamanho da redução da velocidade nos casos de contratos com franquia de dados. A ideia original era impedir que essas velocidades caíssem abaixo de 50% da velocidade contratada.

Esse dispositivo surgiu ainda em 2011, quando o novo regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia começou a ser discutido na agência. Na época, o texto da então conselheira Emília Ribeiro previa esse limite, ponto mantido ao longo de toda a tramitação da norma – mas que sumiu nos últimos 10 dias.

Significava que quando o internauta utilizasse os, digamos, 500 MB previstos, a velocidade de 1Mbps, por exemplo, não poderia ficar abaixo de 500kbps. Na prática era uma reação a ofertas comuns no mercado, nas quais após o consumo da franquia as velocidades caem para 128kbps ou mesmo 64kbps.

Um dos alvos era a ‘banda larga popular’ nascida de um acordo entre o Ministério das Comunicações e as operadoras naquele mesmo 2011. O governo abria mão das obrigações de infraestrutura de banda larga e, em troca, as empresas se obrigaram a oferecer pacotes de 1Mbps por R$ 35 ou menos." (...)


Ou seja, a manifestação do Conselheiro Bechara vem corroborar a pública e reiterada manifestação do Ministro das Comunicações no sentido de que “a internet é um grande ambiente de negócios”, como já divulguei neste blog. Além disso, o entendimento do Conselheiro viola o inc. I, do art. 4º, do Código de Defesa do Consumidor, que reconhece a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo como um dos princípios a serem observados pelas políticas públicas.

Na mesma ocasião, foi publicado um artigo meu na Carta Capital tratando do mesmo assunto:

Ninguém é dono da internet

“A internet é um espaço público, como uma cidade, um parque, o meio ambiente que, apesar de ter surgido num contexto de guerra, tornou-se o que é hoje por impulso do que o ser humano tem de mais nobre: a criatividade, inteligência e vocação para socializar, tornando-a uma importante e decisiva manifestação cultural.

E este espaço ainda está em estado bruto, sujeito ao poder dos grupos econômicos que veem na internet uma oportunidade infinita de lucros, bem como ao poder dos governos autoritários que encaram este valioso palco para as mais diversas e livres manifestações dos pensamentos e comunicação uma ameaça aos seus domínios”.

Todavia, na prática, o que o Ministro Paulo Bernardo e o Conselheiro Bechara estão dizendo é que as empresas podem privilegiar o tráfego de dados nas redes daqueles que tiverem dinheiro para contratar planos ilimitados. E tudo isso com o aval da Presidente Dilma, pois sabemos que seu perfil não permite que um ministro saia negociando direitos por aí sem o seu consentimento.

Assim, o discurso malicioso e falacioso que as teles têm feito circular no Congresso para evitar a aprovação do Marco Civil da Internet: Quem usa mais paga mais – até aqui concordamos – e, por isso, terá o tráfego privilegiado – é quanto a este aspecto que eu discordo, está autorizado pela Casa Civil; o que nos permite afirmar que a internet no Brasil está correndo grande risco.

Vamos a um exemplo bem simples: os caminhões pagam muito mais pedágio do que os carros de passeio e motocicletas, o que está correto, pois desgastam mais as estradas. Mas nem por isto têm privilégio no tráfego.

O lobby das teles, com o aval movido por intenções eleitoreiras do Governo Dilma, que apresenta como boi de piranha o Ministro Paulo Bernardo, está surtindo efeito e nós cidadãos estamos aos poucos deixando de ter direitos com efeitos reflexos no direito à livre manifestação e comunicação.

É o que ficou bem explicado na coluna de Mariana Mazza publicada na semana passada:

Com aval da Anatel, teles vão mexer na sua conexão

Forças muito estranhas têm rondado a Internet brasileira. As últimas duas semanas trouxeram à tona novamente um dos debates mais quentes nas telecomunicações, sobre a neutralidade de rede. No dia 25 de maio, a Anatel aprovou o novo Regulamento de Comunicação Multimídia (SCM), que traz as regras para a prestação da Internet no país. O texto já está valendo, tendo sido publicado no Diário Oficial da União no dia 31 do mesmo mês. O que o usuário das redes não sabe é que esse documento tem potencial para mudar dramaticamente a experiência dos consumidores na web.

O ponto alto, digamos assim, do novo regulamento é o fato de a Anatel ter assumido o absoluto controle sobre a aplicação do princípio da neutralidade de redes no Brasil. A neutralidade é talvez o maior ponto de atrito entre as autoridades públicas e a sociedade civil na discussão sobre a oferta de Internet no Brasil. Este princípio prevê que as operadoras de telecomunicações não façam nenhuma discriminação entre os pacotes que trafegam na rede. Na prática, as empresas ficariam proibidas de reduzir a velocidade oferecida quando seus clientes acessassem serviços que demandam muita capacidade de rede ou concorram com ofertas tradicionais das telefônicas, como aplicativos de voz sobre IP (VoIP). (...)


Ocorre que o problema é muito mais profundo do que parece; além de a medida da quebra da neutralidade ser ilegal, como já dissemos aqui nesse blog tantas vezes, a competência para definir questões afetas à política de telecomunicações não é da ANATEL; nem tem competência também para criar modalidade de serviço, como fez quando editou a Resolução 272/2001, por meio da qual se instituiu a aberração do Serviço de Comunicação Multimídia.

A omissão histórica, desde a privatização, do Poder Executivo na tarefa de editar o regulamento geral de serviços de telecomunicações e suas respectivas abrangências, tem nos trazido grandes prejuízos e uma margem muito confortável para que as teles capturem a ANATEL e os governantes possam negociar desbragadamente direitos irrenunciáveis da sociedade brasileira.

É fundamental, então, que a ANATEL esclareça se o entendimento revelado no ofício da Superintendência de Serviços Privados enviado a PROTESTE será adotado ou não e por que!

Abraço a todos.

Flávia Lefèvre Guimarães

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[Obs: O documento abaixo foi recuperado via OCR e reformatado, sem modificação do conteúdo]

ANATEL
Ofício nº 24 / 2012/PVSTR/PVCPR/PVST/PVCP/SPV-ANATEL

Brasília, 07 de março de 2012

À PROTESTE - Associação Brasileira de Defesa do Consumidor
Avenida Lúcio Costa. 6420 - Térreo - Barra da Tijuca
22630-013 Rio de Janeiro / RJ

Assunto: Esclarecimentos — Abrangência dos Regulamentos de Gestão da Qualidade SCM e SMP

Prezado (a),
 
1. Reportamo-nos ao documento n.° 2107.02/12, de 15 de fevereiro de 2012, protocolizado nesta Agência sob números 53500.004.063/2012 e 53500.004.081/2012 e ao documento, datado de 16 de fevereiro de 2012, também protocolizado nesta Agência sob número 53500.003672/2012, em que a PROTESTE
"requer esclarecimentos a respeito da abrangência dos Regulamentos de Gestão da Qualidade do Serviço de Comunicação Multimídia - RGQ-SCM e do Serviço Móvel Pessoal - RGQ-SMP".

2. Sobre o assunto, seguem os esclarecimentos solicitados.

a) A Anatel tem acompanhado os termos dos contratos de adesão ofertados aos consumidores pelas operadoras, a fim de verificar se as garantias buscadas com as normas editadas pela Agência estão sendo de fato praticadas?

Inicialmente, vale destacar que o início de vigência das metas de Velocidade Instantânea e Média, dentre os demais indicadores do RGQ-SCM, bem como as metas relativas á Taxa de Transmissão Instantânea na Conexão de Dados e Taxa de Transmissão Média na Conexão de Dados, estabelecidas pelo RGQ-SMP. será a partir de 31 de outubro de 2012.

Assim, como o cumprimento das citadas metas ainda não é exigível, o acompanhamento dos contratos de adesão aos serviços, no que tange ao previsto nesses regulamentos. somente será realizado a partir de novembro.

Porém, cumpre informar que as Prestadoras do SMP devem observância na oferta de conexão de dados por meio de Estações Móveis ao Regulamento do Serviço Móvel Pessoal — SMP, aprovado pela Resolução n° 477. de 7 de agosto de 2007, e as Prestadoras do SCM, na oferta de conexão de dados fixa, ao Regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia, aprovado pela Resolução n° 272. de 09 de agosto de 2001.

Quanto aos aspectos de qualidade na prestação do SMP, importante mencionar que atualmente o Plano Geral de Metas de Qualidade do SMP, aprovado pela Resolução n°317, de 27 de setembro de 2002, e o Regulamento de Indicadores de Qualidade do SMP, aprovado pela Resolução n° 335, 17 de abril de 2003, já contemplam diversos aspectos de qualidade da prestação. tais como atendimento, redes, setores de atendimento, etc.

Destaque-se que essas normativas são objeto de constante acompanhamento e fiscalização por parte da Agência desde suas edições e têm gerado a abertura de procedimentos de averiguação específicos ao longo do tempo.

 Deve-se mencionar, por fim, que a Anatel atua de diversas formas na busca da efetividade das normas por ela editadas e. nesse contexto, atua por meio de envio de ofícios solicitando adequação de procedimentos, por meio de reuniões de acompanhamento do serviço buscando melhor entendimento das normas e melhores práticas por parte das Prestadoras, por meio de ações fiscalizatórias que verificam, in loco, se as normas estão sendo cumpridas, dentre outras ações.

b) Os regulamentos de gestão da qualidade serão aplicados aos contratos - denominados de banda larga popular - firmados com base nos Termos de Compromisso assinados com as concessionárias em julho de 2011?

O RGQ-SCM e o RGQ-SMP estabelecem metas de qualidade a serem cumpridas pelas prestadoras do SCM e do SMP com mais de cinquenta mil acessos em serviço. Todos os planos existentes destas prestadoras, independentemente de sua formatação e oferta, devem estar aderentes às obrigações constantes dos regulamentos.

Nesse sentido, os contratos de adesão firmados entre as prestadoras e os assinantes com base nos Termos de Compromisso do Plano Nacional de Banda Larga — PNBL devem atender às obrigações constantes dos regulamentos, conforme dispõe a seguinte cláusula dos Termos de Compromisso:

"(nome da empresa) deverá observar os regulamentos da Anatel e garantir a adequação da Oferta de Varejo e da Oferta de Atacado aos padrões gerais de qualidade e demais regras aplicáveis pela Anatel, sujeitando-se à sua fiscalização e às sanções cabíveis no tocante estritamente ao cumprimento destas regulamentações.
Parágrafo Único. Para as Ofertas de Varejo, (nome da empresa) garantirá que os padrões de qualidade da oferta não serão inferiores aos das suas ofertas regulares de mercado de mesmas características."

c) Considerando que o fornecimento do serviço de comunicação de dados se caracteriza como duração continuada, a Anatel entende que os contratos firmados antes da entrada em vigor dos novos parâmetros estarão contemplados pelas garantias fixadas com os novos regulamentos de gestão de qualidade do SMP e SCM?


Conforme já esclarecido, a partir do momento em que o cumprimento das metas e obrigações do RGQ-SCM e RGQ-SMP for exigível, todas as prestadoras que possuírem uma quantidade igual ou superior a cinquenta mil acessos em serviço deverão atendê-las integralmente. Conforme preceitua a Lei 9.472/97 (LGT), em seu artigo 130, "a prestadora de serviço em regime privado não terá direito adquirido à permanência das condições vigentes quando da expedição da autorização ou do início das atividades, devendo observar os novos condicionamentos impostos por lei e pela regulamentação." Assim, todos os contratos firmados entre a prestadora e o assinante, inclusive aqueles anteriores à publicação dos instrumentos normativos, deverão estar aderentes às obrigações constantes dos regulamentos de qualidade.

3. Colocamo-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais julgados necessários.

Atenciosamente,

BRUNO DE CARVALHO RAMOS
Superintendente de Serviços Privados

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Fonte: Convergência Digital
[06/06/13]  Para Anatel, limite de velocidade é decisão do mercado - por Luís Osvaldo Grossmann

Ao desistir de limitar o tamanho das reduções de velocidades em casos de acesso à Internet com franquia de dados, a Anatel escolheu um caminho pró-mercado, como defende o relator do regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia, Marcelo Bechara.

“Incorporei essa sugestão que veio da área técnica. Entendo que a forma como o usuário e a empresa vão negociar é livre. Posso continuar pagando para ter a mesma velocidade, ou ter reduzida a velocidade. De qualquer jeito, o serviço continua sendo prestado”, argumenta o conselheiro. Segundo ele, a medida poderia beneficiar quem usa muito a Internet.

Ao tratar a mudança como “ponto pacífico”, a Anatel esqueceu de tornar pública uma alteração sobre um item que o próprio setor demonstrou forte interesse, como será visto. Não houve menção à supressão desse ponto nem no voto do relator, nem ele foi discutido na reunião que aprovou o novo regulamento.

Quando começou a ser discutido o novo regulamento do SCM, a ideia era impedir que, nos planos com franquia de dados – ou seja, com uma quantidade de dados pré-determinada que o usuário pode acessar, em geral a cada mês – a velocidade da conexão caísse a menos da metade do contratado.

O que guiou a relatora inicial da norma, a então conselheira Emília Ribeiro, foi o acordo firmado, naquele mesmo 2011, pelo Ministério das Comunicações e as operadoras para oferta de planos populares de acesso à Internet, de 1Mbps por R$ 35. Esses planos, ainda em vigor, previam franquia de 300MB.

Como não há menção no acordo sobre as condições de oferta após o consumo dessa franquia, as empresas podem reduzir a velocidade aos 64kbps já utilizados em outras ofertas de “banda larga”. A ideia do regulamento era, portanto, evitar que as velocidades ficassem abaixo de 500kbps.

A saída pró mercado da Anatel não surpreende, dada a forte resistência das teles, assim como de provedores de pequeno ou grande porte, à fixação de um limite para o “corte”. Como argumentaram as empresas na consulta pública, o desestímulo aos internautas é essencial ao modelo de negócios.

“[É] uma forma indireta de gratuidade pois desta forma o usuário prosseguirá utilizando o serviço sem pagar por este consumo extra”, reclamou a Vivo, sendo ecoada pela Net, para quem a medida “permitirá que esses assinantes continuem a usufruir da rede da prestadora mesmo após o fim da franquia acordada”.

Para a Oi, “um usuário que atinge a franquia previamente contratada e acertada com a operadora é porque tem a tendência a utilizar a totalidade da banda disponível, portanto se a velocidade mínima for de 50% , isso equivale a um link dedicado com velocidade de 50% do contratado”.

A TIM ponderou que com isso se estaria “premiando os usuários que fazem mal uso dos serviços, em detrimento daqueles que cumprem regiamente as suas obrigações”. Ao que a Embratel esclareceu que, com o limite, “o usuário não sentiria qualquer desconforto em sua experiência de navegação”.

A mesma consulta deixou evidenciado que as empresas também estavam preocupadas com as ofertas populares nos termos acertados com o governo. A Oi lembrou um limite ao corte seria “destoante do disposto no Termo de Adesão firmado [com] Anatel e Minicom para adesão ao Plano Nacional de Banda Larga”.

Mas do que a questão pontual, porém, as empresas fizeram associações entre a medida proposta e a “neutralidade absoluta de rede”. “A melhor alternativa seria a não neutralidade através da diferenciação por níveis de serviço e preço”, defendeu a Vivo naquela consulta.

A Oi resumiu o que as empresas queriam: “É permitido às prestadoras ofertarem serviços customizados que atendam a perfis de consumo específicos e adotar medidas para gestão e diferenciação de tráfego, inclusive aquelas que envolvam diferenciação de custos, preços e priorização por tipo de trafego.”

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Fonte: Convergência Digital
[04/06/13]   Anatel desiste de limitar reduções de velocidade na Internet - por Luís Osvaldo Grossmann

Sem alarde, a Anatel retirou do novo regulamento que trata do serviço de acesso à Internet um dispositivo que limitava o tamanho da redução da velocidade nos casos de contratos com franquia de dados. A ideia original era impedir que essas velocidades caíssem abaixo de 50% da velocidade contratada.

Esse dispositivo surgiu ainda em 2011, quando o novo regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia começou a ser discutido na agência. Na época, o texto da então conselheira Emília Ribeiro previa esse limite, ponto mantido ao longo de toda a tramitação da norma – mas que sumiu nos últimos 10 dias.

Significava que quando o internauta utilizasse os, digamos, 500 MB previstos, a velocidade de 1Mbps, por exemplo, não poderia ficar abaixo de 500kbps. Na prática era uma reação a ofertas comuns no mercado, nas quais após o consumo da franquia as velocidades caem para 128kbps ou mesmo 64kbps.

Um dos alvos era a ‘banda larga popular’ nascida de um acordo entre o Ministério das Comunicações e as operadoras naquele mesmo 2011. O governo abria mão das obrigações de infraestrutura de banda larga e, em troca, as empresas se obrigaram a oferecer pacotes de 1Mbps por R$ 35 ou menos.

O detalhe é que esses pacotes “populares” preveem franquias de dados de 300 MB – ou 150 MB, no caso de conexões móveis. No acerto com o governo, não houve limite a quanto a velocidade pode cair depois de consumidos esses 300MB – que, portanto, podem cair aos existentes 64kbps. A norma cobria esse vácuo.

Não mais. A versão final do documento, publicada no Diário Oficial da União na sexta-feira, 31/5, diz que nos casos dos planos com franquia de dados as empresas podem cobrar valores adicionais para os clientes que quiserem manter as mesmas condições de navegação, ou reduzir a velocidade – mas não menciona mais nenhum limite a isso.

Agora, no artigo 62 do regulamento, o tema é tratado assim:

“§ 1o O Plano de Serviço que contemplar franquia de consumo deve assegurar ao Assinante, após o consumo integral da franquia contratada, a continuidade da prestação do serviço, mediante:

I - pagamento adicional pelo consumo excedente, mantidas as demais condições de prestação do serviço; ou,

II - redução da velocidade contratada, sem cobrança adicional pelo consumo excedente.

§ 2o A Prestadora que ofertar Plano de Serviço com franquia de consumo deve tornar disponível ao Assinante sistema para verificação, gratuita e em tempo real, do consumo incorrido.

§ 3o As prestadoras de SCM devem, em seus Planos de Serviços e em todos os demais documentos relacionados às ofertas, informar a(s) velocidade(s) máxima(s), tanto de download quanto de upload, de maneira clara, adequada e de fácil visualização, bem como as demais condições de uso, como franquias, eventuais reduções desta(s) velocidade(s) e valores a serem cobrados pelo tráfego excedente.”

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Fonte: Band / Colunas
[06/06/13]  Com aval da Anatel, teles vão mexer na sua conexão - por Mariana Mazza

Forças muito estranhas têm rondado a Internet brasileira. As últimas duas semanas trouxeram à tona novamente um dos debates mais quentes nas telecomunicações, sobre a neutralidade de rede. No dia 25 de maio, a Anatel aprovou o novo Regulamento de Comunicação Multimídia (SCM), que traz as regras para a prestação da Internet no país. O texto já está valendo, tendo sido publicado no Diário Oficial da União no dia 31 do mesmo mês. O que o usuário das redes não sabe é que esse documento tem potencial para mudar dramaticamente a experiência dos consumidores na web.

O ponto alto, digamos assim, do novo regulamento é o fato de a Anatel ter assumido o absoluto controle sobre a aplicação do princípio da neutralidade de redes no Brasil. A neutralidade é talvez o maior ponto de atrito entre as autoridades públicas e a sociedade civil na discussão sobre a oferta de Internet no Brasil. Este princípio prevê que as operadoras de telecomunicações não façam nenhuma discriminação entre os pacotes que trafegam na rede. Na prática, as empresas ficariam proibidas de reduzir a velocidade oferecida quando seus clientes acessassem serviços que demandam muita capacidade de rede ou concorram com ofertas tradicionais das telefônicas, como aplicativos de voz sobre IP (VoIP).

Faço essa explicação no condicional porque o visão da agência reguladora destoa do conceito básico da neutralidade defendido mundo afora. Para a Anatel, é possível permitir que as empresas controlem a navegação dos usuário por meio da redução de velocidade sem ferir o princípio da neutralidade de redes. Na visão de muitos especialistas em Internet e ativistas o conceito anatelino não passa de uma distorção, colocando os interesses do mercado acima dos direitos civis dos usuários. Vários países também temem que a flexibilização do conceito da neutralidade coloque em risco a democracia no acesso às informações na Internet. No ano passado, a União Europeia divulgou um documento defendendo efusivamente a adoção do princípio da neutralidade de redes sem exceções.

Um detalhe: apesar de a Anatel ter tornado pública sua visão deste conceito em eventos nacionais e internacionais, a agência nunca colocou por escrito o que entende por neutralidade em nenhum documento que rege o setor. O Regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia mantém a omissão. A agência incluiu nas disposições finais e transitória a determinação de que as prestadoras devem respeitar a neutralidade de rede, conforme regulamentação, nos termos da legislação, mas não diz o que entende por neutralidade.

A frase sugere que pode vir um Regulamento da Neutralidade por ai, ao jogar para uma regra ainda inexistente os parâmetros para o cumprimento deste artigo. O lacônico texto da agência é esperto. Com a frase solta ao vento a Anatel força seu protagonismo na gestão da neutralidade, mas ainda assim tenta manter o direito da presidência da República (daí a citação à regulamentação) e do Poder Legislativo (nos termos da legislação) de definir o conceito que será adotado no Brasil. O texto pode estar ensaboado, mas não o suficiente para que a agência escape da crítica de que a inserção da frase é um atropelamento do debate que vem sendo travado há anos no Congresso Nacional em torno do Marco Civil da Internet.

A neutralidade de rede foi a grande pedra no caminho da aprovação do Marco Civil no ano passado, na Câmara dos Deputados. A briga girou em torno justamente da legitimidade da Anatel para ser a única responsável pela gestão da neutralidade. Na visão do relator da proposta Alessandro Molon (PT/RJ), quem deveria dizer quais as diretrizes para a oferta da Internet é a Presidência da República, por decreto, e não a agência reguladora. Ironicamente, o Ministério das Comunicações (para onde poderia ser transferida esta atribuição) teimou que deveria existir uma citação clara na nova lei dando poderes para a Anatel regulamentar a neutralidade. O impasse impediu que o texto fosse votado e, por ora, não há previsão de quando a proposta retornará à pauta da Câmara.

Como todos sabem, não existe vácuo legal. Na ausência do Marco Civil da Internet, a Anatel não se furtou em fincar sua bandeirinha no território da neutralidade, deixando bem claro que, seja qual for a ação do Legislativo, a palavra final sobre o assunto será dela. Mas o movimento da agência não ficou restrito ao campo político.

Entre várias mudanças na relação consumidor/empresa de banda larga, a Anatel deu às companhias o direito de reduzir a velocidade de conexão de seus clientes. A jogada vale para os pacotes de franquia de dados, em que os consumidores pagam para usar uma quantidade limitada de bytes no acesso à Internet. De acordo com o novo texto em vigor, após o fim da franquia, a operadora tem o direito de derrubar a velocidade de conexão do cliente. Se o consumidor quiser manter a velocidade, terá que pagar por isso.

Se considerarmos o que está escrito nos regulamentos de qualidade editados pela Anatel, essa queda na velocidade estaria limitada, garantindo a entrega de 70% da velocidade média contratada neste ano e de 80% a partir de 2014. Acontece que a própria agência não pretende aplicar a regra da qualidade sobre os pacotes de franquia. Segundo fontes, a interpretação é que as regrinhas de qualidade só valem enquanto o pacote de dados está sendo consumido. Depois que a franquia acabar, a operadora pode reduzir a velocidade para o patamar que quiser, inclusive abaixo do mínimo exigido pela Anatel no regulamento de qualidade.

Esta interpretação cai como uma luva nos argumentos das empresas durante a consulta pública do Regulamento do SCM. As grandes companhias reclamaram que não seria justo manter o nível de qualidade após o consumo da franquia. A TIM chegou a dizer que o consumidor seria premiado caso a Anatel exigisse uma velocidade mínima após o uso completo do pacote. Cabe ressaltar aqui que não existiria prêmio algum aos clientes uma vez que estes pacotes de franquia preveem a cobrança excedente após o consumo do pacote.

Além de desrespeitar o consumidor, este artigo do novo regulamento abre um precedente grave na disputa em torno da implementação do princípio da neutralidade. Ao assegurar às empresas o direito de manipular ao seu bel prazer a velocidade contratada pelo assinante, a Anatel inicia a pavimentação do caminho onde a redução da velocidade é vista como uma ferramenta válida para as empresas gerirem suas redes. E, por consequência, isso não feriria a neutralidade das redes na visão do agente regulador.

Todos esses aspectos criam um cenário preocupante para os milhões de brasileiros que usam a Internet. Em favor dos interesses puramente comerciais das empresas de telecomunicações, as autoridades públicas estão gradativamente permitindo que o cidadão brasileiro sofra uma censura tão grave ou pior do que a feita por governos ditatoriais. Teremos nosso acesso à informação controlado e limitado por grupos econômicos estrangeiros. Grupos estes que, nos últimos tempos, têm deixado bem claro que sequer se importam em prestar um serviço de qualidade mínima, vide a degradação da telefonia móvel no Brasil. Quem está sendo premiado com este regulamento é o mercado, às custas do direito do consumidor de ter um serviço de qualidade e pleno acesso à uma rede, que até ordem em contrário, é livre.

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Fonte: Carta Capital
[26/11/2011]  Ninguém é dono da internet - por Flávia Lefèvre

A internet é um espaço público, como uma cidade, um parque, o meio ambiente que, apesar de ter surgido num contexto de guerra, tornou-se o que é hoje por impulso do que o ser humano tem de mais nobre: a criatividade, inteligência e vocação para socializar, tornando-a uma importante e decisiva manifestação cultural.

E este espaço ainda está em estado bruto, sujeito ao poder dos grupos econômicos que veem na internet uma oportunidade infinita de lucros, bem como ao poder dos governos autoritários que encaram este valioso palco para as mais diversas e livres manifestações dos pensamentos e comunicação uma ameaça aos seus domínios.

É neste contexto que nasceu o projeto de lei (PL 2126/2011) do Marco Civil da Internet, resultado de um debate intenso contando com a participação significativa da sociedade iniciado em 2009 pelo Ministério da Justiça, que se deu por intermédio de dois processos de consulta pública, até chegar à Câmara, tendo como relator o deputado Alessandro Molon (PT-RJ).

Pretende-se com o PL o estabelecimento de princípios, garantias, direitos e deveres, bem como a definição de diretrizes para atuação dos Poderes Públicos para a regulação do uso da internet no Brasil.

O PL traz princípios fundamentais para a garantia de que a internet não será apropriada por interesses comerciais e que não servirá de instrumento para a discriminação social, o cerceamento da livre manifestação do pensamento e para o desrespeito à garantia da privacidade.

Sendo assim, é fácil entender o motivo pelo qual as teles têm mobilizado esforços significativos para impedir a aprovação do projeto. E seus esforços têm sido bem sucedidos, especialmente porque encontram respaldo na atuação retrógrada e marcada pelo viés oligárquico que domina o Congresso Nacional.

Foi assim que no último dia 20 de novembro, por uma manobra hábil do deputado Eduardo Cunha (PMDB), o deputado Arnaldo Farias de Sá (PTB) se prestou a apresentar requerimento de retirada do PL da pauta de votação pela quarta vez, acolhido pelo voto da maioria dos partidos, menos do PT, PSOL e PCdoB.

O golpe no PL poderá ter sido decisivo, pois o presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), irritado com a manobra, anunciou que a partir daquele momento o projeto deixava de ser uma prioridade, o que significa um retrocesso.

Corremos o risco de deixarmos de ter a “Constituição da Internet”, como se comentou na imprensa internacional noticiando que o Brasil perdeu a oportunidade de se tornar uma referência geopolítica no cenário da regulamentação dos direitos da internet.

O objetivo das teles é levar a discussão do tema para a próxima reunião da União Internacional de Telecomunicações (UIT), que ocorrerá em Dubai a partir de 3 de dezembro. Os grandes grupos econômicos pretendem que na UIT – órgão marcado pela falta de transparência e sujeito às pressões dos poderosos – consigam definir orientações contrárias ao princípio da neutralidade das redes, de modo que as empresas fiquem autorizadas a discriminar o tráfego de pacotes de dados na internet, de acordo com o valor pago pelos consumidores. Traduzindo: quem pagar mais vai ter privilégio no tráfego.

Outro ponto fulcral para as teles: ao contrário do que estabelece o projeto, querem ter o direito de guardar e usar as informações privadas daqueles que usam suas redes.

Dezenas de entidades da sociedade civil, entre elas a PROTESTE – Associação de Consumidores – enviaram cartas a ANATEL – que representa nosso país na UIT – no sentido de deixar claros os interesses dos cidadãos brasileiros e as divergências com as pretensões das teles. Sabemos que elas hoje têm um poder de influência determinante na agência e seria lamentável ver o Brasil defendendo posição retrógrada quanto ao que foi recentemente reconhecido pelo Conselho dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas de que, assim como a liberdade de expressão na internet, o acesso às redes de telecomunicações também se constitui como direito humano fundamental a ser protegido por todos os países.

No meio dessa forte disputa, saudamos a União Europeia que, identificando a manobra dos grupos econômicos, no último dia 23 de novembro divulgou uma carta de diretrizes afinadas com os princípios expressos no PL do Marco Civil da Internet, especialmente no que diz respeito à neutralidade das redes.

Estamos, então, num momento crucial, pois, no fundo, o que as teles pretendem é exercer o poder de donas da internet; pretendem confundir infraestrutura com o espaço virtual criado a partir das redes de telecomunicações, sob o falacioso argumento de que não é justo que empresas de conteúdo como Google, Facebook, Netflix, entre outras , paguem pelo uso da internet o mesmo do que os pequenos consumidores.

Ocorre que, se essas empresas ocupam muito as redes é porque nós consumidores demandamos muitas informações; é este o maior valor envolvido na questão. Quanto mais as empresas de conteúdo pagarem às teles, mais caros ficarão os valores dos serviços contratados com os consumidores, trazendo consequências indesejáveis para a universalização dos serviços ofertados na internet.

A mobilização da sociedade civil neste momento é urgente e imprescindível; temos de ser eficientes para que o Congresso Nacional, especialmente a Câmara dos Deputados, atuem de acordo com os anseios legítimos de nós que os elegemos, apoiando e fortalecendo os parlamentares comprometidos com o interesse público e com a aprovação do Marco Civil da Internet.
 


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