FLÁVIA LEFÈVRE GUIMARÃES
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Abril 2014 Índice Geral
28/04/14
• Artigo de Flávia Lefèvre no IDGNow! - "Eleições 2014: Institucionalizada a intimidação"
Fonte: IDG Now!
[28/04/14]
Eleições 2014: Institucionalizada a intimidação - por Flávia Lefèvre
Guimarães
No contexto da minirreforma eleitoral, em 11 de dezembro de 2013, foi editada a
Lei 12.891, alterando dispositivos da Lei 9.504/1997, que estabelece normas para
as eleições.
O que mais chamou atenção foi a introdução de novos dispositivos ao artigo 57 da
lei, que trata de propaganda eleitoral no rádio e na televisão.
Foi introduzido o art. 57-H criminalizando “a contratação direta ou indireta
de grupo de pessoas com a finalidade específica de emitir mensagens ou
comentários na internet para ofender a honra ou denegrir a imagem de
candidato, partido ou coligação”. E as penas são duras: detenção de 2 a
4 anos e multa de R$ 15 mil a R$ 50 mil reais.
A lei pune não só o contratante, mas também o profissional contratado para atuar
na internet, ainda que as penas sejam menores: detenção de 6 meses a 1 ano, com
alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa de
R$ 5 mil a R$ 30 mil.
Os primeiros impasses que se apresentam para o cumprimento desta lei são: o que
será considerado contratação direta e indireta; como será feita a prova de que
alguém tenha sido contratado específica e exclusivamente para se manifestar na
internet contra um determinado candidato, partido ou coligação.
A despeito de ser mesmo importante que as leis eleitorais contemplem o que
acontece na internet, fiquei tomada pela forte sensação de que se trata de uma
tentativa de institucionalizar a intimidação.
Vejam que “ofender a honra ou denegrir a imagem” são expressões bastante
subjetivas, além de a lei não ter feito ressalvas no sentido de descaracterizar
o crime quando o fato publicado corresponder à verdade.
As figuras introduzidas com essa nova lei são bem distintas da calúnia e da
difamação, que já estão previstas no Código Penal. Calúnia é quando se imputa a
alguém FALSAMENTE a prática de um crime; difamação é imputar fato ofensivo à
reputação e, nos dois casos se admite a exceção da verdade; o que significa que,
se os fatos publicados forem verdadeiros o crime não se configura.
Já no caso da injúria, que consiste em ofender a dignidade ou o decoro de
alguém, a pena é bem mais branda – 6 meses a um ano, sendo que não cabe exceção
da verdade, pois nestes casos não se atribui um fato a alguém, mas apenas se
profere uma ofensa.
Então, o que preocupa no caso da nova lei é a possibilidade de um certo político
poder se sentir ofendido na honra ou com a imagem abalada por conta da
publicação na internet de artigo, coluna jornalística ou qualquer outro tipo de
manifestação publicada na internet que comente fatos reais, venha a processar
empresas de assessoria de imprensa ou jornalistas.
Um exemplo bem recente é o do Senador Aécio Neves, que moveu ação contra o
Google, o Yahoo e o Bing, pedindo a remoção de links e perfis que fazem
referência a desvio de dinheiro quando era governador de Minas Gerais e a uso de
entorpecentes. O pedido de liminar foi negado em primeira e segunda instância,
mas ainda não há decisão final neste caso.
Porém, resta saber se, com base nessa nova lei, políticos que se sintam
ofendidos por serem veiculadas notícias verdadeiras a respeito de fatos reais
vão se valer dela para criminalizar a atividade jornalística.
As vias abertas com essa nova lei colidem com direitos constitucionais
fundamentais, como a liberdade de expressão e de comunicação social.
Nossa Constituição, que não por acaso é chamada de cidadã, determina que a
“manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer
forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto
nesta Constituição”. E diz mais: que “nenhuma lei conterá dispositivo que possa
constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer
veículo de comunicação social”, desde que não haja abuso de direito e que se
respeite a privacidade e a imagem das pessoas, resguardado o direito de
indenização daquele que for injustamente ofendido.
Evidente, portanto, que essa lei vem na contramão da ampliação da informação e
transparência, fatores fundamentais para a democracia e importantes para que o
eleitor possa se posicionar e votar com consistência.
Afinal, estamos falando de homens e mulheres que pretendem ocupar cargos
públicos, de modo que não deveriam ter o que esconder! Ou não?
* Flávia Lefèvre Guimarães Coordenadora da Frente dos
Consumidores de Telecomunicações, consultora da associação Pro Teste e
conselheira do Comitê Gestor da Internet