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FUST - Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações
Telecomunicações
- Questões jurídicas
SérgioMiranda
Página sobre o Fust |
Conteúdo
- Encurtando o caminho para o
Primeiro Mundo [09/Mar/2001]
- Acesso Universal à Rede: faltaria mais política à ação?
[09/Mar/2001]
- Programa Telecomunidade - [Fevereiro 2001]
Estadão
Encurtando o caminho para o Primeiro Mundo
[13/03/01]
A licitação que a Agência Nacional de
Telecomunicações está preparando, para a compra de
250 mil computadores, 43 mil impressoras, 16 mil
scanners e 30 mil hubs, cujo objetivo é informatizar
12,5 mil escolas secundárias e profissionalizantes
em todo o País, fornecendo um computador para cada
grupo de 25 alunos, num total de 6,554 milhões de
jovens.
O governo pretende, com isso, fazer uma verdadeira
revolução no ensino público, com repercussões
imediatas sobre a vida das comunidades, pois os
equipamentos não ficarão ociosos, quando não
estiverem sendo usados pelos alunos. Eles servirão
para informatizar serviços hospitalares e as
bibliotecas públicas, formando uma rede de utilidade
pública ao alcance do cidadão, que de outra forma
não teria acesso às facilidades que só o computador
possibilita.
Embora o programa esteja sendo desenvolvido pelo
governo federal, seus usuários - na verdade,
beneficiários - serão os Estados e, especialmente,
os municípios. O uso do computador, uma poderosa
ferramenta pedagógica hoje ao alcance quase que
exclusivo dos alunos da rede privada de ensino, será
estendido a escolas espalhadas por quase todo o
território brasileiro. Onde houver uma escola
contemplada pelo projeto Telecomunidade, haverá um
ponto de acesso à Internet. Hoje só existem locais
de acesso à Internet em 27 de cada 1.000 municípios.
Por esse simples dado se pode avaliar o potencial
multiplicador de benefícios para a comunidade,
representado pelo Telecomunidade, que, se tiver
pleno êxito, encurtará de muitas décadas o caminho
do Brasil para o Primeiro Mundo. Pode-se, também,
ter por aí uma idéia da complexidade técnica do
projeto, uma vez que as operadoras de telefonia que
se interessarem pela licitação terão de instalar
linhas diretas entre as escolas que receberem os
computadores - e algumas estarão nos mais remotos
rincões do País - e as principais redes provedoras
de Internet.
Os recursos para o Telecomunidade serão fornecidos
pelo Fundo de Universalização dos Serviços de
Telecomunicações (Fust), constituído por 1% da
receita das operadoras de telefonia, de TV por
assinatura e outros serviços de telecomunicações. O
Fust, portanto, tem uma dupla utilidade: ao mesmo
tempo que possibilita investimentos sociais nas
áreas de educação e saúde, realimenta e estimula as
atividades das indústrias de telecomunicações e
informática.
O governo anuncia que os professores das escolas que
receberão os equipamentos do Telecomunidade
receberão treinamento específico para a sua
utilização. Além disso, as escolas terão à sua
disposição recursos para gastos com a manutenção dos
computadores e o pagamento das linhas telefônicas.
Tudo isso é essencial para o êxito do projeto.
Afinal, computadores são importantes auxiliares
pedagógicos, mas não substituem os professores na
tarefa única de educar seus alunos. E nada seria
mais melancólico e frustrante se, depois de algum
tempo, as escolas se transformassem em meras
depositárias de computadores quebrados.
Notícia -
http://www.proinfo.es.gov.br/fust/fust.htm
Programa Telecomunidade
O presidente Fernando Henrique Cardoso lançou no dia
19/02/01, o Programa Telecomunidade e foi
acompanhado pelos ministros da Educação, Paulo
Renato Souza, da Comunicação, Pimenta da Veiga, o
governador Dante de Oliveira e os secretários
estaduais de Educação das 27 Unidades da Federação
brasileira. O programa prevê a instalação de 250 mil
computadores com acesso à internet em 12.500 escolas
públicas de ensino médio do país, beneficiando 6,6
milhões de estudantes. Este programa será mantido
com investimento inicial da ordem de R$ 500 milhões
provenientes do Fundo de Universalização dos
Serviços de Telecomunicações (Fust).
O custo das
ligações será por conta das operadoras do sistema de
telefonia e os estados e municípios custearão o
treinamento dos professores e a adequação das
escolas para que recebam os computadores. Os
recursos serão obtidos por meio da cobrança de 1% do
movimento das operadoras do sistema de telefonia do
país – fixas, móveis e de TV a cabo, sem implicar
alteração no custo final da tarifa paga pelo
consumidor. Desta forma, o Governo espera arrecadar
este ano R$ 1 bilhão.
Com o Programa
Telecomunidade, a previsão é de que, entre 2001 e
2002, o Espírito Santo receba 5.484 computadores,
atendendo 271.789 alunos, 9.235 professores, em 214
escolas de 77 municípios.
http://www.no.com.br/revista/noticia/17816/984139277000
Acesso Universal à Rede: faltaria mais
política à ação?
Silvio Meira
Para quem ainda não sabe, todas as empresas prestadoras de serviços
de telecomunicações têm que contribuir para um caixa especial do
governo, chamado Fundo para Universalização dos Serviços de
Telecomunicações, destinado a fazer exatamente isso. Transformar
telecom em algo absolutamente ubíquo no país, em qualquer lugar, a
qualquer hora. Inclusive a "forma" de telecom conhecida como
Internet, que até cinco anos atrás era vista pelas operadoras como
uma chateação que tinha vindo mudar o tempo médio de ocupação dos
terminais telefônicos (e para os quais, obviamente, elas não estavam
preparadas).
Claro que o mundo mudou e não chega a ser uma grande surpresa ver,
no site da ANATEL, a agência reguladora do setor de
telecomunicações, que o presidente da mesma, Renato Guerreiro,
esteve recentemente (6/3) em reunião da UIT, a União Internacional
das Telecomunicações, uma espécie de FIFA das teles, falando sobre
protocolo Internet (o tal do TCP/IP)...
O presidente, (todo o texto em itálico citado neste artigo está,
literalmente, em comunicados da ANATEL, www.anatel.gov.br), externou
as principais preocupações quanto ao Protocolo Internet. Uma delas,
se refere à questão do modelo de prestação de serviços de
telecomunicações nos diversos mercados, que vão do "monopólio" até a
"ampla competição". Para ele, o uso do IP nos hoje denominados
Serviços Internet constitui uma nova ameaça nos mercados
monopolistas, e atenua-se à medida em que esses mercados se tornam
mais competitivos. "Portanto, uma conseqüência dessa nova tecnologia
é eliminar, de vez, a crença, o pré-conceito ou ideologia do
monopólio natural para os serviços de telecomunicações"....
Diferenças de ortografia, gramática e estilo à parte, não há como
discordar de Guerreiro, que, em outra parte do mesmo comunicado,
diz: "Na nossa opinião, a regulação de um setor deve se pautar,
fundamentalmente, pelos interesses dos usuários e não de prestadores
de serviços, fabricantes ou de governos, que não sejam as de servir
à sociedade". A regulamentação deve, portanto, segundo Guerreiro,
estabelecer o modelo e condições de prestação de serviços e não as
características e especificações tecnológicas das plataformas de
suporte. E destacou dois elementos basilares: "a obrigação de
interconexão das redes para a livre circulação da informação e o
tratamento isonômico dos usuários".
A salva de palmas, no auditório em Genebra onde estavam
representantes de 189 países, deve ter sido calorosa. Difícil é
fazer valer, na prática, alguns dos tais elementos basilares citados
no discurso. Aqui no Brasil, por exemplo, não há um só ponto efetivo
de interconexão de redes Internet, e tal acontece porque há
incumbentes que entendem ter algo a perder se entrarem nisso. Ou
seja, os antigos donos do "monopólio natural" de infra-estrutura de
conexões Internet de longa distância (ou backbones...) acham que
todo mundo que quiser montar um backbone e falar com quem está no
seu deve, na prática, pagar um canal tão caro quanto for necessário
para se conectar à sua rede.
O mesmo acontece entre os países: os EUA não querem nem ouvir a
conversa de montar centros de interconexão verdadeiramente entre
pares: quem quiser falar comigo, que se ligue a mim. E pague a conta
integral. Resultado: as redes americanas pagam quase nada pra falar
com o mundo e nós enviamos uma montanha de dinheiro pra lá, não só
pra falar com eles mas, em alguns casos, pra mandar e-mail pra
países que estão nas nossas fronteiras.
Mas o discurso do secretário, que certamente é lido por todas as
operadoras, tem recados e admoestações ao falar de tratamento
isonômico para os usuários e de interconexão de redes. Até agora, no
que tocava à Internet, o assunto era somente do Comitê Gestor que,
por não ter poderes legais para coagir as operadoras, tem que tratar
o assunto na base do convencimento. O que normalmente não funciona
se os ouvidos do outro lado não se dignam a prestar atenção. Por
outro lado, agências como a ANATEL, mundo afora, têm uma tradição de
intervenção e controle que remonta aos tempos da "segurança
nacional"... onde o interesse público era normalmente o último a ser
cuidado. O que deixa nas mãos do presidente da ANATEL a complexa e
delicada tarefa de articular sem intervir e coordenar sem limitar a
criatividade e inovação no setor. Dá pra fazer, mas ninguém está
acostumado.
Ainda mais complexa, aparentemente, é a consecução da solução que a
ANATEL está propondo para universalização do acesso à Internet no
ensino médio e profissionalizante, cujo plano, edital e consulta
pública estão na página da agência. Trata-se de conectar 60% dos
estabelecimentos com mais de 600 alunos até 31/12/2001, 80% dos que
têm mais de 300 alunos até 30/06/2002 e chegar a 100% das escolas
médias e profissionalizantes até 31/12/2002.
A sociedade inteira, principalmente, os excluídos por razões
econômicas e geográficas, repetem o coro de Genebra e batem palmas
até rachar as mãos. Até porque a conexão, segundo o edital, inclui
"atividades e facilidades associadas à transmissão e recepção de
sinais digitais que suportem o acesso a redes digitais de informação
em velocidades adequadas; conexão às redes digitais de informação
destinadas ao acesso público; a disponibilidade de módulos
terminais, necessários ao acesso, operação e à utilização dos
serviços de rede digitais de informação, compreendendo os
equipamentos que permitam visualização, digitalização e impressão de
textos e imagens, a rede interna e o que for necessário à sua
instalação e funcionamento, em especial os dispositivos necessários
à adequada alimentação elétrica..." sem falar no treinamento de
professores e o que mais for necessário para que a rede seja usada
para mais do que chats e mail. Certíssimo. Depois do aplauso, todos
querem saber como isto vai ser feito, até porque parece que o FUST
tem mesmo o dinheiro para fazê-lo: somente este ano, caro leitor,
são quase um bilhão de reais...
Dado que há dinheiro, qual é o problema? Dois são os problemas: o
primeiro, de escala, pois pelas contas da ANATEL as escolas médias e
profissionais a conectar são mais de 13.000, com mais de sete
milhões de alunos, espalhadas em todo o território nacional. Segundo
o MEC, o Brasil tem cerca de 4.000 escolas profissionalizantes, das
quais 1.300 são públicas e outras 400 pertencem ao sistema S (Senai,
Senac...). Segundo os números da Consulta 284 da ANATEL, as outras
11.300 são escolas públicas de ensino médio.
Vamos assumir que seja só isso e que não apareçam, no caminho, as
contas do Programa Sociedade da Informação, do mesmo governo do qual
a ANATEL faz parte: os números, lá, são mais de 20.000 escolas
médias, 4.000 bibliotecas e mais de 1.000 museus. Mesmo que não haja
tudo isso, daqui até dezembro de 2002 há menos de 100 semanas, no
máximo 500 dias úteis, sem excluir os feriados. Pra cumprir a meta
da ANATEL, começando hoje, seria preciso ligar 30 escolas por dia!
Não há muita experiência, na Terra, pra fazer isso, com qualidade e
nesta velocidade. Ah, sim, os sistemas de computação e comunicação a
serem instalados devem prover conectividade 24/7, ou seja, todo dia,
dia e noite...
Assumindo que o Brasil realmente se organize para isso, neste prazo,
há um outro problema, maior, porque conceitual e político. O Edital
da ANATEL, que está aberto para consulta pública, dá o nome do bode
que entra na sala das escolas, na forma de sistema operacional. As
máquinas são todas "Windows ou superior". Ora, não é preciso ser
nenhum grande pensador para imaginar que um programa deste porte,
que vai mais que duplicar a população da rede brasileira, traz junto
do imenso desafio que representa uma oportunidade única de fazer
política industrial.
Fazendo uma conta bem elementar, nossa balança de pagamentos de
tecnologia da informação já é deficitária. E muito. Se a remessa de
divisas, em compras e royalties, para cada 1000 dólares de
equipamento computacional a ser usado num processo destes, for de
200 dólares (chutando muito por baixo), cada mil equipamentos, mais
duzentos mil dólares de buraco na balança. Somente a licitação da
ANATEL vai comprar uns 300 mil PCs, na partida... e eu acho que este
número pode chegar na casa do milhão de equipamentos, quando se
somar o que estados, municípios e outras partes do governo vão
adquirir...
Um milhão de equipamentos, dois mil dólares por ponto (contando
impressoras, scanners, roteadores...)... quatrocentos dólares
negativos na balança por ponto... quatrocentos milhões de dólares a
mais no nosso prejuízo externo, e isso é apenas a menor parte do
problema.
A maior parte é que, toda vez que não aproveitamos desafios desta
monta, que podem gerar mercado, para fazer política industrial, para
criar projeto e implementação nacional, para gerar aqui a cultura de
desenvolvimento que perdemos todo e qualquer controle do ciclo de
vida de tais produtos e, conseqüentemente, a possibilidade de
discutir, ao mesmo pé, a evolução das tecnologias, sistemas e
aplicações que estaríamos usando com outros países e grandes
corporações internacionais. Ficamos só de "compradores" e
utilizadores, quase normalmente medíocres, de produtos tecnológicos
que não conseguimos, normalmente, transformar em cultura.
Tecnologia é cultura, é bom não esquecer isso; cultura é a expressão
da natureza de um povo, que quanto maior for (quanto maior seu
mercado) mais importante se torna pensar, mais de uma vez, quando se
vai definir padrões que afetarão sua vida por muito tempo, talvez
décadas. Fazer, não isoladamente, mas com outros, com muitos outros,
nossa tecnologia, significa participar do controle do seu ciclo de
vida e de sua evolução. Significa decidir sua evolução e suas
próximas gerações.
Primeiro por medida de economia, mas segundo, e muito mais
importante, por uma questão de oportunidade, de criação de
possibilidades de desenvolvimento e inovação, de geração de mais
valor, renda, riqueza e trabalho aqui, não seria o caso de se
repensar o edital de compra de Windows da ANATEL?
Por que não abrir a discussão e pensar em alternativas de mais baixo
custo e abertas, na forma de arquiteturas sobre as quais pudéssemos
exercer maior controle e usando software aberto, para o que estaria
sendo criada uma comunidade de muitos milhões de usuários, em sua
larga maioria ainda não exposta a nenhuma forma de artefato
computacional e modelos de sua utilização?
Em países do tamanho do nosso, ações do porte da qual falamos
equivalem a definir a vida de pequenos países. Só que o efeito aqui
é maior. Seja lá qual for a solução do FUST, ela vai acabar afetando
a vida de mais de 40 milhões de alunos do primário, secundário e
profissional. Isso é muito, mas muito grande para ser feito sem um
mínimo de discussão e articulação entre os muitos níveis de
representação da sociedade, desde educadores e políticos até
indústria e academia.
O período de consultas do edital da ANATEL termina dia 23 de março
às 24h. Dias 21 e 22, em Belo Horizonte, a Sociedade Brasileira de
Computação e o Departamento de Ciência da Computação da Universidade
Federal de Minas Gerais promovem o I Workshop Brasileiro de
Universalização de Acesso para discutir temas como os apresentados
neste artigo e outros, mais técnicos. E para tentar contribuir, de
forma construtiva, para o processo de universalização das
telecomunicações no país, gerando recomendações para a ANATEL.
Ninguém, em sã consciência, é contra ou quer atrapalhar o trabalho
da ANATEL ou as ações do FUST até porque, repetidas vezes, esta
coluna tem defendido a causa da universalização. Mas é possível
querer mais e muitos querem, inclusive o autor, que estará em BH,
juntamente com engenheiros, cientistas, políticos, industriais,
usuários, pra ver o que mais pode ser feito. Ainda é hora de pensar
em ir até o Workshop ou, mesmo não indo, contribuir para o debate no
site da ANATEL e exercer outras formas de pressão política, através
de senadores e deputados.
Este artigo é, ostensivamente, uma chamada à ação, pois há muito a
se perder ou ganhar neste caso.
Silvio Meira é professor da UFPE e um dos pioneiros da Internet
brasileira. Escreve às sextas-feiras.
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