José
Roberto de Souza Pinto
WirelessBrasil
Setembro 2023 Índice dos assuntos deste website
06/09/23
• As Tecnologias de Informação e Comunicações e a
oportunidade de revisão da regulação
Fato mais que comprovado, que as Tecnologias de Informação e Comunicações
convergiram, gerando novos serviços ou aplicativos que fazem parte do dia a dia
da população.
Ambientes como o das Telecomunicações e da Informática, integrados tecnicamente,
são tratados de forma independente, segundo as regras estabelecidas.
O cenário da Informática evoluiu com a abrangência da rede Internet e surgem as
Plataformas Digitais, que experimentam um crescimento acima de qualquer
expectativa, mas que se desenvolvem com suporte nas Telecomunicações.
A realidade é que a convergência tecnológica levou a uma convergência de
serviços, com uma situação em destaque diferenciada em relação a regulação e
controle das Telecomunicações e das Plataformas Digitais, perfeitamente
separados, segundo a Lei Geral de Telecomunicações – LGT.
A Lei Geral das Telecomunicações – LGT (Lei 9.472 de 16 de julho de 1997),
portanto com um certo tempo de vida e também concebida num cenário tecnológico
bastante diverso do atual, destaca entre outros a clara diferença entre Serviço
de Telecomunicações e Serviço de Valor Adicionado. Vou transcrever o texto dos
artigos da LGT a seguir, para um melhor entendimento.
Na LGT o Artigo 60:
“Serviço de Telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a
oferta de telecomunicações.
-1. Telecomunicações é a transmissão, emissão ou recepção, por fio,
radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de
símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer
natureza.
-2. Estação de telecomunicações é o conjunto de equipamentos ou aparelhos,
dispositivos e demais meios necessários à realização de telecomunicações, seus
acessórios e periféricos, e, quando for o caso, as instalações que os abrigam e
complementam, inclusive terminais portáteis.”
Na LGT o Artigo 61:
“Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de
telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas
utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou
recuperação de informações.
-1. Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações,
classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que
lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição.
-2. É assegurado aos interessados o uso das redes de telecomunicações para
prestação de serviços de valor adicionado, cabendo à Agência, para assegurar
esse direito, regular os condicionamentos, assim como o relacionamento entre
aqueles e as prestadoras de serviço de telecomunicações.”
Penso que um dos motivos dessa
clara diferenciação se concentrava, no risco das Empresas Prestadoras do Serviço
de Telecomunicações, dominarem todo esse conjunto de iniciativas de serviços e
em particular as recentes, a época de ISPs – Internet Service Provider. Dessa
forma a clara separação tinha esse sentido e no meu entendimento essas Empresas
estariam fora do contexto regulatório das Telecomunicações.
Não resta dúvida que o ambiente tecnológico e de serviços prestados é totalmente
diferente seja por parte das Empresas Prestadoras de Serviços de
Telecomunicações ou pelas Empresas que exploram as Plataformas Digitais, que são
as Prestadoras de Serviços de Valor Adicionado.
Se observarmos os serviços prestados por Empresas do Setor das Telecomunicações
e pelas Plataformas Digitais, vamos encontrar os mesmos serviços prestados nas
duas diferentes categorias, segundo a LGT.
Vou me permitir explicitar alguns casos que no nosso entendimento podem melhor
descrever esta situação.
Na comunicação entre usuários, temos a voz na telefonia fixa e na telefonia
móvel e textos como SMS na telefonia móvel, prestadas pelas Empresas
Concessionárias ou Autorizadas pela Anatel, entretanto por meio de aplicativos
do tipo WhatsApp, Facebook Messenger, Telegram, Viber, WeChat e mais alguns,
podemos realizar os mesmos serviços. Nestes casos as telecomunicações funcionam
como um meio para os aplicativos prestarem os mesmos serviços.
As tradicionais conferencias que incluem um número maior de usuários que
anteriormente eram programadas e realizadas, utilizando-se dos recursos da
telefonia fixa e móvel, passaram a ser realizadas por meio de aplicativos, do
tipo zoom, meet entre outros.
Claramente o que se observa é que as Plataformas Digitais ocuparam o espaço de
comunicação das tradicionais Prestadoras de Serviços de Telecomunicações,
incorporando nos serviços, a transmissão de imagens, vídeos e a comunicação em
vídeos on-line, as vídeochamadas.
Duas tendências, já podem ser identificadas como claras do ponto de vista do
usuário ao fazer uma “ligação telefônica”. Uso do aplicativo da Plataforma
Digital no seu smartphone e preferencialmente utilizando o Wi-Fi de um acesso em
banda larga.
Em outro segmento a Televisão tradicional aberta e a TV por assinatura, na
legislação tratada como Serviço de Acesso Condicionado (SEAC), são considerados
Serviços de Telecomunicações, enquanto as Plataformas Digitais, prestam os
mesmos serviços, com destaque para os Filmes e transmissão de jogos em
Plataformas específicas como a NETFLIX, PRIME, DISNEY+, HBO MAX, STAR+, APPLE
TV+ entre outras. A questão se concentra na diferença das obrigações impostas
para a prestação dos serviços de TV em comparação com os prestados pelas
Plataformas Digitais.
Não é por acaso que o número de clientes das tradicionais TV por assinatura vem
caindo, assim como os espectadores dos canais de TV aberta.
Na realidade as Operadoras de TV reguladas pelas Telecomunicações, oferecem os
mesmos produtos ou serviços por meio de Plataformas Digitais via Internet, como
algumas das citadas anteriormente.
Em outras palavras, para estar no negócio de comunicações, é necessário ter ou
utilizar Plataformas Digitais de modo a veicular os serviços em todas as mídias.
Em uma visão mais técnica das Redes de Comunicação, fica atualmente difícil
delimitar o que é Telecomunicações e o que é Valor Adicionado, salvo nos
elementos de rede que se utilizam de radiofrequências e outros meios de
transmissão, onde ainda é indiscutível serem elementos de telecomunicações.
Aonde se observa uma clara diferença entre os Serviços de Telecomunicações e os
Serviços de Valor Adicionado, são nos impostos cobrados, pois nos Serviços de
Telecomunicações são cobrados o ICMS numa faixa de 19 à 29% dependendo do Estado
da Federação e nos fornecidos por Plataformas Digitais o ISS na faixa de 2 à 5%
dependendo do Município.
Neste particular de impostos, consultei algumas faturas de Prestadoras de
Serviços de Telecomunicações e encontrei impostos de ICMS e de ISS, o que me faz
crer que estão prestando outros serviços, como Plataformas Digitais, na
prestação de serviços de banda larga, fixa ou móvel, a ser conferido.
Outro aspecto interessante a ser observado, é que os ISPs, são também
Prestadores de Serviços de Telecomunicações, através das licenças ou
autorizações do Serviço de Comunicação de Multimidia (SCM), que na linguagem
mais popular prestam o serviço de banda larga fixa.
Da mesma forma que as Prestadoras de Serviços de Telecomunicações, os ISPs na
Prestação dos Serviços de Comunicação Multimidia, devem utilizar elementos de
rede, que devem ser considerados como parte das suas Plataformas Digitais.
Recentes fatos como a Pandemia em escala mundial, creditaram às Comunicações a
sua real importância, classificando-os como Serviços Essenciais para o
funcionamento da sociedade e assim deveriam ser tratados nesta questão
tributária.
Quando penso no tema regulamentação, a minha primeira opção sempre será; quanto
menor e mais restrita será melhor, visando o desenvolvimento econômico e social
do país.
A interferência do Estado em atividades e segmentos do mercado deve ser mínima,
entretanto o comportamento dos agentes pode requerer que regras sejam
estabelecidas, para proteção de usuários consumidores de um serviço, para
garantir a competitividade no mercado ou mesmo proteção da sociedade.
Em situações em que a competição se estabeleceu e sem concentração de mercado, a
regulação pode ser reduzida na medida em que o consumidor e a população têm
poder de escolha.
Partindo do princípio que será difícil encontrar um Prestador de Serviço de
Telecomunicações, que não seja também um Prestador de Serviço de Valor
Adicionado, através de uma Plataforma Digital ou vice versa, podemos estar
diante de uma nova oportunidade de rever a regulamentação desse conjunto,
buscando o mínimo necessário de interferências.
Existem diferentes modelos ao redor do mundo para regulação das
Telecomunicações. A escolha do Brasil de regular o setor, com base nos serviços
prestados, certamente teve o seu valor e permitiu este enorme desenvolvimento, a
partir da emenda constitucional número 8 e da já citada LGT.
Entretanto, posso assim dizer que hoje todos serviços são prestados por
plataformas digitais e as telecomunicações podem estar restritas aos meios de
transmissão, seguindo a estrita definição atual da LGT, que indica, que são as
radiofrequências e os cabos que realizam a transmissão, emissão ou recepção, por
fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo
eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou
informações de qualquer natureza.
Complementando e de forma simplificada, posso adicionar que não existem mais
aquelas estruturas de centrais telefônicas para realizar chamadas e sim um
conjunto de controle, com processadores e roteadores, funções típicas de uma
Plataforma Digital.
Certamente é uma visão até um pouco assustadora para os agentes reguladores, mas
entendo que “pensar fora da caixa” pode apresentar melhores resultados.
Em resumo, a minha expectativa é de reconstruir um ambiente competitivo neste
segmento de prestação de serviços, que está totalmente desequilibrado, pelos
condicionamentos e tributos, reconhecendo que Telecomunicações são somente os
meios de transmissão e a prestação de serviços se dá pelas Plataformas Digitais.
Sem dúvida vai requerer uma revisão das regras atuais, mantendo onde necessário
as devidas proteções para o usuário consumidor e as práticas da competição
saudável.
Jose Roberto de Souza Pinto, engenheiro e mestre em economia empresarial.