José Ribamar Smolka Ramos
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Setembro 2010 Índice Geral
15/09/10
• Dá para exigir SLA de 50%? (Texto de José Smolka no website de Ethevaldo Siqueira)
Fonte: Website do Ethevaldo
Siqueira
[15/09/10]
Dá para exigir SLA
de 50%? - por J. R. Smolka*
Este artigo trata de três aspectos:
1) a questão da viabilidade econômica de um provedor assinar um SLA (Acordo de
Nível de Serviço, ou Service Level Agreement) com seus usuários garantindo, no
mínimo, 50% da banda máxima contratada;
2) o problema da impossibilidade de o provedor responsabilizar-se por eventuais
problemas de desempenho localizados fora da sua esfera administrativa, mas que
afetam a percepção de desempenho das aplicações dos seus usuários; e
3) a influência do número de usuários simultaneamente conectados nos serviços de
acesso wireless à internet, sobre o desempenho da rede de acesso.
Primeiro, vamos entender bem o cenário: um provedor de acesso à internet, que
detém uma rede de acesso (wired ou wireless) para concentrar o tráfego dos seus
usuários e um ou mais uplinks (depende da complexidade do provedor) para
encaminhar este tráfego para a internet. Pode haver ou não (geralmente há, mesmo
que pequena) uma estrutura local de prestação de serviços aos assinantes do
provedor, como um servidor web, um servidor de e-mail etc.
É correto o fato de estes uplinks serem, na sua imensa maioria, ainda hoje,
enlaces determinísticos (tipicamente circuitos E1 de 2 Mbps), alugados das
operadoras de telefonia a um custo que pode ser bem salgado. Dependendo da
região e da concorrência no provimento deste tipo de enlace, o preço que tem
sido mencionado (R$ 750/Mbps ou R$ 1.500/E1) parece compatível com o mercado.
Só que a "conta de padeiro" que normalmente se faz (quatro usuários/Mbps = 256
kbps/usuário) exige mais cuidado. É uma questão simples de estatística, mas
pouca gente (mesmo engenheiros das operadoras) se dá ao trabalho de fazê-la
direito. E a resposta desta questão é que dirá se um determinado SLA é viável
economicamente ou não.
Não vou estender-me agora na forma correta de calcular a banda média por usuário
e dimensionar o uplink em função do SLA desejado. Mais detalhes sobre o tema
podem ser objeto de outro artigo.
Responsabilidade?
O segundo aspecto é o mais delicado do ponto de vista do provedor. Para todas as
finalidades práticas, o provedor normalmente só tem ingerência sobre o
desempenho da sua rede de acesso e do seu uplink. Só que, em qualquer instante
do tempo, o tráfego dos usuários muito provavelmente é dirigido,
majoritariamente, para servidores que estão bem longe na estrutura da rede. A
internet é administrada de forma federativa, e cada ente federado chama-se um AS
(autonomous system), que responde pelo comportamento da sua própria
infraestrutura e tem acordos de peering com outros AS nas suas fronteiras.
No Brasil, por exemplo, a Embratel, a Telefônica, a Vivo, a Oi, a Claro (entre
muitos outros) todos são AS. Mas não existe nenhum acordo de peering entre os AS
da internet (pelo menos da forma como ela é hoje) prevendo garantia de QoS
(qualidade de serviço, ou Quality of Service).
Portanto, o tráfego que cursa através de múltiplos AS está sujeito a chuvas e
trovoadas de desempenho. Isso sem falar que cada serviço que o usuário quer
acessar está hospedado em um ou mais computadores, e eles também estão sujeitos
a falhas e sobrecargas, mesmo que toda a rede entre eles e o usuário esteja
funcionando 100%.
Então, um contrato de SLA teria de ser muito específico com relação ao grau de
responsabilidade do provedor. E certamente é necessário que o fornecedor dos
uplinks também tenha o seu contrato de SLA com os provedores de acesso
(geralmente tem). Mas imaginar que, só por pressão dos provedores sobre as
operadoras, de repente começariam a pipocar cláusulas de garantia de QoS nos
acordos de peering entre os AS internet afora é puro delírio.
Não que não haja legisladores aqui no Brasil que não pensem que, se eles
promulgarem uma lei especificando isto, a internet vai adequar-se (aliás, eu
acho que eles acreditam que dá até para revogar as leis da física desta forma).
Entretanto, as operadoras de telecom mundo afora estão no negócio de tentar
redefinir o que nós chamamos de internet nos termos que interessam a elas. A
guerra religiosa
WiMax vs. LTE citada neste site é apenas um dos aspectos deste processo. A
demora na migração para uma infraestrutura all-IP, que a Jana de Paula mencionou
no site dela, é outro destes
aspectos. Nos termos daquilo que elas gostariam que viesse a ser um mundo
totalmente conectado via IP, a possibilidade da garantia de QoS existe. Mas isto
sozinho não é um valor agregado suficiente, na minha modesta opinião, para
aceitar o modelo delas para esta "nova internet". Isto também é um assunto
longo, que pode ser aprofundado futuramente.
Quantidade de usuários
Quanto à influência do número de usuários conectados simultaneamente no
desempenho de redes de acesso wireless, o que se diz é verdade. E é verdade, em
maior ou menor grau, para qualquer tecnologia wireless. Vamos pegar o HSPA (High
Speed Packet Access) como exemplo: a capacidade máxima teórica (depende do tipo
de aparelho do usuário, dos equipamentos da operadora e da maneira como eles
estão configurados) é de 7,5 Mbps no downlink (é o que geralmente influencia
mais no desempenho percebido pelo usuário). Isto para cada setor (são três, ao
todo) em cada radiobase. Mas esta banda máxima tem de ser dividida entre todos
os usuários conectados e ativos no setor, e a distância entre o usuário e a
antena da radiobase também tem influência na taxa máxima que dá para ter.
Você deve estar perguntando: "Mas as operadoras só falam em taxa máxima ideal de
1 Mbps nos contratos de dados 3G". Verdade. Porque a maioria está com um gargalo
horrível no backhaul que encaminha o tráfego das radiobases até as centrais.
Isto porque tentaram extrapolar padrões de uso de dados no 3G com base no
comportamento dos usuários do 2G, e erraram feio. Ficaram na mesma situação de
um provedor que dimensionou mal o seu uplink, e o jeito foi limitar via
configuração das radiobases a taxa máxima permitida por setor.
O que fazer onde a densidade de usuários não permite uma banda decente por
setor? Adensar a malha de radiobases, em primeiro lugar, e tentar desviar parte
destes usuários para usar a rede de acesso fixa (tipicamente DSL) como backhaul,
com o uso de femtocells.
* José de Ribamar Smolka Ramos é engenheiro eletricista
(UFBa 1982), com especialização em gestão da qualidade (CETEAD/UFBa 1994) e MBA
executivo (FGV RJ/Grupo Telefônica 2001). Trabalha na área de informática desde
1980, tendo atuado em empresas das áreas financeira, industrial e de serviços,
estando desde 1989 na área de telecomunicações. Área principal de interesse:
projeto, implantação e gestão operacional da infra-estrutura e serviços de
comunicação baseados na arquitetura TCP/IP.