José Ribamar Smolka Ramos
Telecomunicações
Artigos e Mensagens
ComUnidade
WirelessBrasil
Junho 2011 Índice Geral
26/06/11
• Comentário de José Smolka sobre o artigo "Compreendendo as semelhanças entre serviços de telecom e Internet" de Edmundo Matarazzo
Fonte: e-Thesis
Compreendendo as semelhanças entre serviços de telecom e Internet [Comentário de
Jose Smolka]
Internet X Telecom -
O que se fala...
por Jose Smolka (*)
22-Jun-2011
Explico melhor. Quando a
Internet surgiu (e a visão técnica por trás da redação da LGT pode ser
claramente datada nesta época) não existiam outras redes públicas que não fossem
as utilizadas para suporte à prestação de serviços de telecomunicação. E estas
redes, muita gente parece esquecer, já eram de uso compartilhado entre vários
serviços de telecom. A mesma rede básica de transmissão (definida no antigo CBT
como "serviço de troncos") suportavam os serviços de telefonia (de longe o maior
usuário), TELEX e, mais importante para o caso da Internet, a alocação de
circuitos comutados e/ou permanentes para uso como canais agnósticos para
transmissão de dados. As grandes empresas privadas, por exemplo, sempre foram
clientes destes serviços. Mas as próprias operadoras do então Sistema Telebrás
também construíram redes para a prestação de serviços de comunicação de dados na
modalidade de comutação de pacotes (inicialmente X.25, e depois Frame-Relay)
usando esta mesma técnica de alugar capacidade da rede básica de transmissão.
Neste sentido, os serviços públicos de comutação de pacotes (RENPAC e
assemelhadas) também seriam designados como serviços de valor adicionado,
conforme a LGT.
E foi exatamente assim, com o uso de circuitos permanentes alugados da rede
básica de transmissão das operadoras de telecom para interligar seus hosts
(servidores e roteadores), e com o uso de bancos de modems para aceitar acesso
por circuitos comutados (dial-up) dos hosts usuários (clientes), que se formatou
a Internet original. E isto está em pleno acordo com a interpretação que foi
dada ao que está escrito na LGT: serviço de valor adicionado.
Só que, de lá pra cá, as operadoras de telecom passaram cada vez mais a utilizar
a arquitetura TCP/IP (a mesma da Internet) como transporte básico para todos os
seus serviços (inclusive, e especialmente, o STFC), embora ainda não estendessem
esta mudança tecnológica até o terminal do usuário. Tudo começou a mudar com a
popularização de acessos de banda larga fixos ou móveis. Se alguma operadora de
telefonia fixa decidir, na sua área de atuação, que em vez de:
Colocar na casa do usuário um filtro passa-baixa para que os telefones convencionais possam compartilhar a rede de pares metálicos de acesso com o modem DSL do serviço de acesso à Internet em banda larga,
Ela vai passar a:
Colocar na casa do usuário um ATA (analog telephone adapter) e todos os aparelhos do usuário (inclusive eventuais softphones instalados em desktops e/ou notebooks) passarão a fazer e receber ligações telefônicas via um servidor VoIP da operadora (este é, basicamente, o papel do IMS - IP multimedia subsystem).
Neste segundo caso a operadora
está ou não dentro dos limites do seu contrato de licença STFC? E prover o
serviço desta forma é algo válido para quem só dispõe de uma licença SCM? Estas
são questões válidas para hoje, e as respostas que tenho visto são apenas
tentativas de erguer barreiras de entrada com base na interpretação da
legislação atual (mais hermenêutica!). E não adianta esperar, porque mais à
frente a confusão aumenta.
Enquanto a versão dominante do protocolo IP foi a versão 4 (IPv4) existia uma
clara distinção entre o escopo privado e o escopo público da Internet. Isto foi
criado, inclusive, como uma forma de aumentar a vida útil do espaço de
endereçamento IPv4. Só que isto já chegou ao seu limite, e agora o trabalho que
toda a Internet pública, e todas as organizações que usam a arquitetura TCP/IP
nas suas redes privativas tem pela frente é a migração acelerada para a versão 6
do protocolo IP (IPv6). O grande efeito colateral desta migração (dada a
imensidão do espaço de endereçamento IPv6) é que a distinção entre o que é
público e o que é privado na Internet será apenas uma questão de onde foi
colocado (ou não) alguma barreira de acesso. Mais ou menos assim: digamos que
você tenha uma fazenda de criação de gado, mas os seus pastos ficam no meio dos
pastos de diversos outros fazendeiros, e não existe nenhuma forma, em princípio,
de distinguir onde começa o pasto de um e onde termina o pasto do outro, a menos
que se usem delimitadores como, por exemplo, cercas. E se alguém mover uma cerca
mais pra lá ou mais pra cá não faz a menor diferença, porque continua tendo a
mesma grama verdinha dos dois lados da cerca.
O que estou dizendo é que, se hoje existe uma distinção clara entre a rede IP
interna das operadoras de telecom, usada para suportar o provimento de serviços
aos seus usuários, e a Internet pública, com a adoção do IPv6 isto passa a ser
uma única Internet, com certos trechos segregados (pelo uso, por exemplo, de
firewalls) e outros públicos. Neste contexto não há mais diferença entre o fato
da operadora tradicional de telecom estar provendo serviço de telefonia aos seu
assinantes sobre esta Internet v6 e outros provedores de serviço estarem fazendo
a mesma coisa, sobre a mesma rede de transporte IPv6. Ou das operadoras de
telecom investirem no provimento de outros serviços (app stores,
video e/ou audio streaming ou on demand, por exemplo) que
não tem nada a ver com o seu portfólio original de serviços de telecom, e seriam
designados, hoje, como serviços de valor adicionado.
O que me preocupa é que a Anatel, embora tenha anunciado a disposição de fazer o
trabalho de revisão do marco regulatório, não tenha divulgado nada concreto a
respeito (que eu saiba) e ainda tenha que se virar com as rivalidades com o
congresso e com o Minicom, que acham que tal papel é sua prerrogativa exclusiva.
José Smolka assina a seção "Eu detesto dizer 'eu avisei'" no e-Thesis
(*) José de Ribamar Smolka
Ramos
Engenheiro eletricista (UFBa 1982), com especialização em gestão da
qualidade (CETEAD/UFBa 1994) e MBA executivo (FGV RJ/Grupo Telefonica
2001). Trabalha na área de Informática desde 1980, tendo atuado em empresas das
áreas financeira, industrial e serviços, estando desde 1989 na área de
telecomunicações. Desde 1995 dedica-se ao projeto, implantação e gestão
operacional de infra-estruturas corporativas de comunicação de dados e serviços
baseadas na arquitetura TCP/IP, envolvendo infra-estutura LAN e WAN, acesso
remoto e interconexão de redes. Principais áreas de interesse técnico: segurança
da informação, engenharia de tráfego e garantia de QoS na arquitetura TCP/IP e
gerência de redes. Foi professor do curso de bacharelado em Informática da
Universidade Católica do Salvador, nas cadeiras de Linguagens para Aplicações
Comerciais e Introdução aos Sistemas de Computação. Trabalhou em grandes
operadoras e, atualmente, é consultor independente de telecom e TI.
---------------------------------
Fonte: e-Thesis
[15/06/11]
Compreendendo as diferenças entre serviços de internet e de telecomunicações
Edmundo Matarazzo (*)
Há ainda muita confusão quando se trata dos conceitos de serviços de internet e
serviços de telecomunicações. Em recente palestra, Edmundo Matarazzo (foto),
sócio da Matarazzo & Associados e diretor do Conselho Consultivo da Associação
Brasileira de Internet (Abranet), demonstrou que ambas são atividades distintas.
"A Lei Geral de Telecomunicações (LGT), de 1997, artigo 61, é clara neste
sentido", lembra o executivo. No referido artigo, o serviço de valor adicionado
(como os serviços Internet) "é a atividade que acrescenta, a um serviço de
telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas
utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou
recuperação de informações". Assim, os dois serviços têm seus sistemas de
gestão, faturamento e vendas em separado.
A relação entre a atividade de provimento de serviços de internet e a atividade
de exploração de serviço de telecomunicações também é claramente definida no
texto da LGT. No primeiro parágrafo do Artigo 61, está definido que "Serviço de
valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu
provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os
direitos e deveres inerentes a esta condição". Os serviços de telecomunicações,
por sua vez, são suportados por conjunto de recursos denominados "redes de
telecomunicações. A mesma LGT define que "Serviço de telecomunicações é o
conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação e, por sua
vez, telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio,
radieletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de
símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer
natureza".
Matarazzo, que já foi Superintende de Serviços Públicos e de Universalização da
Anatel e hoje é consultor, destaca ainda quatro áreas distintas de políticas
públicas relacionadas às varias modalidades de serviços de radiodifusão e
telecomunicações, ou "áreas para políticas públicas". A área 1 engloba os
serviços de radiodifusão prestados pelas redes de serviço de radiodifusão. A
área 2 se refere ao serviço telefônico fixo e móvel, prestado pelas redes de
serviços de telefonia. Já a área 3 incorpora o serviço de dados, como SCM, SLE
etc., fornecido pelas redes de serviços de dados. A área 4, por fim, é a de
serviço de valor adicionado, entre cujos fornecedores estão as empresas de
serviços de internet, de games e de geração de conteúdo em geral.
"As quatro áreas são importantes e devem ser consideradas para a definição de
políticas públicas, sempre com o objetivo de desenvolver a oferta, a diversidade
e a qualidade dos serviços oferecidos", pondera o executivo.
Matarazzo cita, mais uma vez, a LGT que, em seu artigo segundo, parágrafos 2 e
5, que afirma que "o Poder Público tem o dever de estimular a expansão do uso de
redes e serviços de telecomunicações pelos serviços de interesse público em
benefício da população brasileira; e de criar oportunidades de investimento e
estimular o desenvolvimento tecnológico e industrial, em ambiente competitivo".
Deveres e direitos dos usuários
A oferta de serviços de valor adicionado, como os serviços de Internet, de games
e de conteúdo em geral, possui direitos e deveres assegurados na qualidade de
usuários de serviços de telecomunicações.
O artigo terceiro da LGT assegura aos usuários de serviços de telecomunicações
"direito de acesso aos serviços de telecomunicações, com padrões de qualidade e
regularidade adequados à sua natureza, em qualquer ponto do território nacional:
de não ser discriminado quanto às condições de acesso e fruição do serviço: e à
inviolabilidade e ao segredo de sua comunicação, salvo nas hipóteses e condições
constitucional e legalmente previstas". Quanto aos deveres dos usuários, eles
implicam "utilizar adequadamente os serviços e equipamentos de telecomunicações;
e respeitar os bens públicos e aqueles voltados à utilização do público em
geral" (LGT,Art.4°).
Direitos e deveres de prestadores de serviço de telecomunicações
As operadoras de telecomunicações (ou as redes das três primeiras "áreas
políticas" da avaliação de Matarazzo) também têm direitos e deveres a serem
exercidos. Sempre de acordo com a LGT, "As prestadoras de serviços de
telecomunicações de interesse coletivo terão direito à utilização de postes,
dutos, condutos e servidões pertencentes ou controlados por prestadora de
serviços de telecomunicações ou de outros serviços de interesse público, de
forma não discriminatória e a preços e condições justos e razoáveis. Parágrafo
único. Caberá ao órgão regulador do cessionário dos meios a ser utilizados
definir as condições para adequado atendimento do disposto no caput".
Para cumprir seus deveres, a concessionária de serviços de telecomunicações
pode, observadas as condições e limites estabelecidos pela Anatel, "empregar, na
execução dos serviços, equipamentos e infraestrutura que não lhe pertençam;
contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou
complementares ao serviço; e a implementação de projetos associados", diz a LGT.
A Lei determina ainda que, "em qualquer caso, a concessionária continuará sempre
responsável perante a Agência e os usuários; que serão regidas pelo direito
comum as relações da concessionária com os terceiros, que não terão direitos
frente à Agência, observado o disposto no art. 117 desta Lei." O artigo 145º é
claro quando afirma "as redes de telecomunicações destinadas à prestação de
serviço em regime privado poderão ser dispensadas do disposto no caput, no todo
ou em parte, na forma da regulamentação expedida pela Agência".
Entre os deveres das redes de telecomunicações, que devem ser "organizadas como
vias integradas de livre circulação", a LGT define a obrigatoriedade da
interconexão de redes, na forma da regulamentação. Além disso, "deverá ser
assegurada a operação integrada das redes, em âmbito nacional e internacional; o
direito de propriedade sobre as redes é condicionado pelo dever de cumprimento
de sua função social" (LGT/Artigo 146º). No mesmo artigo (Parágrafo único), a
Lei define que "interconexão é a ligação entre redes de telecomunicações
funcionalmente compatíveis, de modo que os usuários de serviços de uma das redes
possam se comunicar com usuários de serviços de outra ou acessar serviços nela
disponíveis.
Também é obrigatória "a interconexão às redes de telecomunicações a que se
refere o art. 145 desta Lei, solicitada por prestadora de serviço no regime
privado, nos termos da regulamentação" (Art. 147°); "É livre a interconexão
entre redes de suporte à prestação de serviços de telecomunicações em regime
privado, observada a regulamentação (Art. 148°). Além disso, "a regulamentação
estabelecerá as hipóteses e condições de interconexão a redes internacionais"
(Art. 149°). Quanto ao provimento da interconexão, ele "será realizado em termos
não discriminatórios, sob condições técnicas adequadas, garantindo preços
isonômicos e justos, atendendo ao estritamente necessário à prestação do serviço
(Art. 152°).
As obrigações das teles continuam, inclusive para a "interconexão às redes de
telecomunicações a que se refere o art. 145 desta Lei, solicitada por prestadora
de serviço no regime privado, nos termos da regulamentação (Art. 147°). Além
disso, "é livre a interconexão entre redes de suporte à prestação de serviços de
telecomunicações em regime privado, observada a regulamentação" (Art. 148°). A
Lei prevê que "o provimento da interconexão será realizado em termos não
discriminatórios, sob condições técnicas adequadas, garantindo preços isonômicos
e justos, atendendo ao estritamente necessário à prestação do serviço" (Art.
152°).
"Outro ponto em que não pode haver dúvida é quanto ao fato de que a própria
existência das redes implica o pagamento de taxas de fiscalização", destaca
Matarazzo. Ele corrobora sua afirmação com o artigo 52° da LGT que determina que
"os valores das tavas de fiscalização de instalação e funcionamento, constantes
do Anexo I da Lei nº 5.070, de 7 de julho de 1966 passam a ser os da Tabela do
Anexo III desta Lei".
[Observação: A Lei Ordinária 5.070/1966 criou o Fundo de Fiscalização das
Telecomunicações sendo, depois, substituída pela LGT].
Conclusão
Matarazzo aponta que "a clara separação entre as atividades típicas de um
provedor de serviço de valor adicionado e de um prestador de serviço de
telecomunicações é essencial no ambiente presente".
Segundo o especialista, por inúmeras dificuldades em ter seus direitos como
usuários de serviço de telecomunicações assegurados, os provedores de serviço de
valor adicionado foram levados a se inserir no mercado de telecomunicações como
prestadores de serviço de telecomunicações para suporte de sua própria atividade
de serviço de valor adicionado.
"Essa condição, em particular em pequenas empresas, transformou-se em uma fonte
de equívocos sucessivos de todas as partes envolvidas. Como resultado há
milhares de licenças de Serviço de Comunicação Multimídia - SCM, de redes que na
verdade são privativas de um dado provedor de serviço de valor adicionado e as
grandes redes como as do STFC e do SMP utilizadas por provedores associados aos
respectivos prestadores de serviços de telecomunicações", conclui ele.
Nesse contexto o papel de fiscalização pela Anatel surge como crucial.
(*) Edmundo Matarazzo
Graduado em Telecomunicações, cursou Engenharia Elétrica na FESP. Foi
superintendente de Universalização da Anatel até 2005; coordenou os projetos de
inclusão digital no país e a revisão do Plano de Metas de Universalização do
STFC. Dirigiu o Serviço de Comunicações Digitais - SCD -, projeto piloto da
Anatel que leva a internet em alta velocidade a escolas, hospitais, postos de
saúde, órgãos de segurança e bibliotecas públicas. Antes disso, foi
superintendnete de Serviços Públicos da Anatel e coordenou projetos como o novo
Plano de Numeração Nacional; a inclusão do Código de Seleção de Presatdora; a
preparação do setor para o Bug do Milênio; e os primeiros regulamentos sobre
interconexão de redes e qualidade de serviço. Começou sua carreira na indústria
de telecom nas áreas de projeto e desenvolvimento de produtos, controle de
produção e qualidade e testes em fábrica. Passou pela Telesp onde atuou nas
Diretoria de Operações, de Engenharia e de Planejamento Técnico,
especializando-se em redes e sistemas de telecomunicações. Na Telebrás, foi
gerente de Divisão de Evolução de Redes e do Departamento de Planejamento
Técnico e Engenharia. Em dezembro de 1997 foi requisitado pela Anatel, onde
exerceu os cargos de Gerente Geral de Normas e Padrões, superintendente de
Serviços Públicos, e de Universalização. Entre os projetos internacionais, foi
eleito por três períodos consecutivos vice-presidente da Comissão de Estudos 11,
Comutação e Sinalização, e posteriormente Vice-Presidente da Comissão 2 Serviços
e Numeração da União Internacional de Telecomunicações (UIT), integra o quadro
de Consultores Técnicos da União, coordenou Grupos de Trabalho sobre Redes de
Sinalização e Comutação Digital. No âmbito do Mercosul, coordenou Grupos de
Trabalho sobre Normas Técnicas e Planos Estruturais no SGT Nº 3. No contexto da
OEA, atua junto a CITEL, tendo exercido as funções de presidente do Grupo de
Coordenação de Normas e vice-presidente do Comitê Consultivo Permanente I (CCP
I). No contexto da Regulatel coordenou trabalhos nas áreas de universalização e
sociedade da informação. São muitas suas publicações científicas, dentre elas,
contribuições técnicas às Comissões de Estudo da UIT, além de artigos técnicos
em congressos nacionais e internacionais.