José Ribamar Smolka Ramos
Telecomunicações
Artigos e Mensagens
ComUnidade
WirelessBrasil
Setembro 2011 Índice Geral
21/09/11
• Debate sobre o artigo de Flávia Lefèvre: "Decreto 7.175/2010 (que instituiu o PNBL) - Herança Bendita?" (1)
de J. R. Smolka smolka@terra.com.br
Celld-group@yahoogrupos.com.br
data 21 de setembro de 2011
assunto (Celld-group) Meus comentários sobre o artigo de Flávia
Lefèvre: "Decreto
7.175/2010 (que instituiu o PNBL) - Herança Bendita?"
Oi pessoal,
Todos vocês sabem minha posição com relação aos assuntos levantados pela Dra.
Flávia. Há quem me chame de "direitista" por causa disso. Que seja.
Mais uma vez temos uma peroração ideológica embrulhada para presente em uma
suposta interpretação lúcida da lei. Eu, porém, sustento que a interpretação
defendida pela Dra. Flávia (e muitos outros) é apenas uma forma de tentar
promover as suas visões pessoais sobre como a sociedade em geral deveria ser
organizada: qualquer coisa menos o capitalismo de livre mercado e competição
real e saudável. Acho interessante que, embora digam-se intransigentes
democratas, os proponentes desta visão dita "socialista" esquecem que nenhuma
sociedade em grande escala (do tamanho de um Estado nacional, ou maior)
conseguiu estabilidade política pela via democrática sem um correspondente
estabilidade econômica baseada na economia de mercado (ou seja: no capitalismo).
Assim eu entendo perfeitamente o sentimento de orfandade expresso pela Dra.
Flávia (e seus companheiros de ideologia) quando o atual governo resolve não
perseguir alguns dos delírios socializóides (eu não os considero sérios o
suficiente sequer para merecerem o adjetivo "socialista") expressos no PNBL, nas
decisões da Conferência Nacional de Telecomunicações, e em outros tantos textos
que se propõem a dar uma guinada à esquerda na prática política no Brasil.
O problema é que a argumentação usada para suporte das teses apresentadas é
questionável. Uma coisa que eu sempre me admiro é que a postura geral das
pessoas neste setor de opinião é de desconsiderar toda e qualquer evidência
concreta que contradiga suas opiniões, seguindo em frente, inabaláveis, com os
mesmos argumentos batidos. Para mim isto assemelha-se demais às práticas de
propaganda utilizadas em célebres Estados totalitários, à la Goebbels e
Stalin. Exemplo: todas as análises técnicas sérias, e pelo menos uma ação já
transitada em julgado, consideraram que os procedimentos do processo de
privatização das telecomunicações no Brasil ocorreram em boa forma econômica,
financeira e jurídica. Mas a Dra. Flávia (e seus companheiros) continuam usando
expressões tais como "tunga ao patrimônio público". Curiosamente, pelo menos
para mim, estas teses continuam sem encontrar abrigo toda as vezes que são
escrutinadas em detalhes pelo Poder Judiciário. Decisões liminares ou de
primeira instância sobre assuntos técnicos complicados não são, em minha
opinião, uma métrica correta para avaliar a solidez de uma argumentação, porque
raramente os juízes nesta instância tem competência (pessoal ou via assessoria)
de avaliar todas as implicações. E assim tais decisões seguem um padrão regular:
caem nas instâncias superiores, onde há tempo e recursos para melhor instruir os
magistrados sobre a matéria em pauta.
Entretanto toda esta judicialização de discussões técnicas tem um outro efeito
prático: perde-se muito tempo e dinheiro até que os obstáculos jurídicos, na
maior parte insensatos, sejam superados e alguma coisa prática possa ser feita.
A Dra. Flávia é advogada, e eu não. Sou analista de sistemas pela prática
profissional, com formação acadêmica em Engenharia Elétrica. Mas arvoro-me no
direito de argumentar, no mesmo modo que os advogados: salvo melhor juízo.
Vejamos. Sua tese é que as operadoras do STFC praticaram apropriação indébita,
pois supostamente receberam a posse dos ativos denominados "bens reversíveis" -
que já pertenciam a elas, notem - via autorizações SRTT concedidas "dois dias
antes da privatização". Aos fatos...
O texto do famoso art. 207 da LGT (Lei
9.472 de 16/07/1997, publicada no DOU de 17/07/1997) é o seguinte:
Art. 207. No prazo máximo de sessenta dias a contar da publicação
desta Lei, as atuais prestadoras do serviço telefônico fixo comutado destinado
ao uso do público em geral, inclusive as referidas no art. 187 desta Lei, bem
como do serviço dos troncos e suas conexões internacionais, deverão pleitear a
celebração de contrato de concessão, que será efetivada em até vinte e quatro
meses a contar da publicação desta Lei.
§ 1° A concessão, cujo objeto será determinado em função do plano geral
de outorgas, será feita a título gratuito, com termo final fixado para o dia 31
de dezembro de 2005, assegurado o direito à prorrogação única por vinte anos, a
título oneroso, desde que observado o disposto no Título II do Livro III desta
Lei.
§ 2° À prestadora que não atender ao disposto no
caput deste artigo aplicar-se-ão as seguintes disposições:
I - se concessionária, continuará sujeita ao contrato de concessão
atualmente em vigor, o qual não poderá ser transferido ou prorrogado;
II - se não for concessionária, o seu direito à exploração do serviço
extinguir-se-á em 31 de dezembro de 1999.
§ 3° Em relação aos demais serviços prestados pelas entidades a que se
refere o caput, serão expedidas as respectivas autorizações ou, se for o caso,
concessões, observado o disposto neste artigo, no que couber, e no art. 208
desta Lei.
Quem são as mencionadas operadoras STFC e do serviço de troncos e suas conexões
internacionais abrangidas pelo art. 207? Dois tipos: as controladas pela
Telebrás (29 empresas - e suas eventuais subsidiárias criadas para exploração do
SMC - listadas no art. 187); e as poucas que não estavam sob o controle da
Telebrás (creio que apenas a CRT, a Sercomtel e a CTBC).
Qual a obrigação das operadoras imposta pelo art. 207? No prazo máximo de
sessenta dias, contados da promulgação da LGT (até 17/09/1997, portanto),
pleitear junto à Anatel (que foi criada pelo art. 8) a celebração do contrato de
concessão. E qual a obrigação da Anatel neste meso artigo? Preparar estes
contratos de concessão em até 24 meses após a promulgação da LGT (isto é, até
17/07/1999).
Mas tem alguns detalhes (sempre os detalhes...): o parágrafo primeiro do art.
207 diz que o objeto dos contratos de concessão mencionados no caput
serão definidos pelo Plano Geral de Outorgas (PGO -
Decreto 2.534 de 02/04/1998, publicado no DOU de 03/04/1998). Então não
faria sentido elaborá-los antes daquela promulgação. Mais ainda,
o leilão de privatização ocorreu em 29/07/1998. Considerando que o prazo
limite para a celebração dos contratos de concessão das empresas do então
sistema Telebrás estendia-se até depois do leilão de privatização, e que
novos contratos teriam que ser celebrados em função do resultado do leilão, acho
que a alegação que a emissão de autorizações SRTT, que tem suporte pleno no
parágrafo terceiro do art. 207 (afinal elas não se referiam ao STFC), carece de
base porque elas não causaram a alegada apropriação indébita do precioso
patrimônio público representado pelos bens reversíveis.
Para encerrar eu gostaria de colocar uma indagação minha (que é meio longa).
Considerando que no leilão de privatização do sistema Telebrás o Governo Federal
alienou cerca de 20% das ações ordinárias em poder da Telebrás, perdendo assim o
controle acionário das empresas e, supostamente, o direito de intervir na sua
administração. Então, considerando que uma parte considerável, senão a
totalidade, dos ativos de rede das empresas - que são o essencial para a
prestação do serviço - estão gravados pela reversibilidade e, na prática, não
pertencem à operadora, pelo que foi que os vencedores do leilão pagaram? Se foi
pelos ativos não-rede e pelo direito de exploração do serviço, então, me
desculpem os que contestam este processo, pagaram caro pra dedéu.
[ ]'s
J. R. Smolka