José Ribamar Smolka Ramos
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Fevereiro 2012 Índice Geral
14/02/12
• "J'Accuse" (5) - O debate
continua entre Smolka, Bruno e Rubens: metas de qualidade da banda larga
de J. R. Smolka smolka@terra.com.br
para Celld-group@yahoogrupos.com.br
data 12 de fevereiro de 2012 23:12
assunto Re: [Celld-group] J'Accuse
> Smolka escreveu:
> Bruno,
>
> Tenho a sensação que isto vai ser difícil de ser aceito por você, mas mesmo
assim vou tentar.
>
> A situação de competição no mercado de telecom, em minha opinião, me parece
análoga à seguinte estorinha: imagine que vai haver uma corrida de 100 m rasos.
Em uma das raias está o Usain Bolt (que já coreu esta distância em 9,58 s - e
ainda pode melhorar esta marca), Nas outras raias estão pessoas comuns, como eu
(quando tinha 17 anos consegui 12 s cravados, mas foi uma vez só, e faz muuuito
tempo :-) ) e você.
>
> Me parece que o "lightning" Bolt tem decididamente PMS nesta prova. Então
existem duas maneiras possíveis de tornar a competição mais equilibrada: ou nós
damos alguma vantagem para nós, assim, tipo, nós largamos vários metros à
frente; ou nós colocamos alguma dificuldade para ele, tipo obrigá-lo a correr
com os pés presos a correntes e pesos.
>
> As duas formas parecem equivalentes, mas só o são no resultado final esperado
(nós e ele passamos a ter chances equilibradas - não certeza - de ganhar a
corrida). Na primeira forma o Usain Bolt pode desenvolver todo o seu potencial,
sem que isso afete a nossa possibilidade de ganhar a corrida. Na segunda forma o
que veremos é uma caricatura do grande corredor em ação, e uma corrida entre um
aleijado artificial e alguns incompetentes.
>
> Com esta analogia pretendo demonstrar que todo o nosso modelo regulatório é do
segundo tipo. Não é voltado ao incentivo para que os competidores de menor porte
possam desenvolver-se, e até aprender, com a convivência com competidores
maiores e mais experientes. Simplesmente cria barreiras artificiais para que o
competidor com PMS não possa atuar com toda sua capacidade.
>
> Eu prefiro o primeiro tipo. Estímulo e oportunidade para que os competidores
menores possam operar e crescer, mesmo convivendo com competidores maiores e
agressivos. Repare que, no primeiro modelo, se os competidores pequenos não
conseguirem aproveitar a vantagem oferecida, ninguém trabalhará direito (nem os
pequenos nem os que tem PMS). E quem será mal servido é o consumidor.
>
> Mas, no segundo modelo, a probabilidade é que mais de um competidor (até mesmo
o que tem PMS) consiga ofertar serviços decentes aos consumidores, e atingimos
dois objetivos: prestação de serviços adequada ao consumidor e desenvolvimento
de empresas que poderão, com o tempo, prescindir do benefício e tornarem-se,
elas também, detentoras de PMS.
>
> Não sei como ser mais claro. Só desenhando.
------------------------------------
>Bruno
escreveu:
>
>
> Ola prof. Smolka, sempre um prazer dialogar contigo.
>
> Ótima analogia! Vamos comentá-la?
>
> Ao impor que apenas prestadoras que tenham a partir de um determinado numero
de assinantes (50 mil? pelo faturamento da empresa - regime de SCM no Simples
Nacional?) precisem obedecer algumas regras, parece-me com o primeiro tipo que o
sr. descreve/prefere.
>
> A questão aqui, no segundo tipo, é que há uma prática de subsidio cruzado
entre o serviço monopolista publico (valor altíssimo da assinatura básica de
STFC) e o serviço que deveria ser prestado em regime privado, inclusive com
caixa em separado. Seria, segundo sua analogia, como levar um peso nas costas
MAS poder usar de um carrinho de golfe, por exemplo, para a corrida, que é o que
ocorre hoje. Mesmo com os metros a frente na largada, ainda fica impossível
concorrer.
>
> Como ex-prestador da área, minha solução seria muito simples: Se usa fio da
rede pública para prestar serviço, deve atender obrigações de universalização
(oferta) e isonomia (preço em toda a área de concessão). E não usar o fio
público para regime privado (ou para dificultar a entrada de novos competidores,
por ex. impedindo o unbundling ou comprando frequências que não são usadas para
que elas não atendam outras empresas)
>
> Aliás a LGT (Art 186) diz que as empresas devem prestar APENAS o objeto da
concessão, justamente para evitar subsídios cruzados e esse tipo de mal prática.
O artigo é sistematicamente ignorado, frise-se.
>
> Nem vou falar da falta de isonomia no serviço prestado em regime público, para
a qual a agência está fazendo vista grossa desde a renovação dos contratos em
2005. Ou de aplicar uma sanção inexistente (impedir a venda) quando a LGT diz
que as sanções são apenas multa, cassação da concessão/autorização e intervenção
na empresa.
Oi Bruno,
Que bom que você gostou da analogia. Comecei meio de brincadeira, mas depois
fiquei com a sensação que ela é mesmo boa. Vamos aos seus comentários.
Não creio que a exclusão dos "pequenos" provedores SCM (no SMP eles simplesmente
não existem) do alcance do RGQ-SCM seja uma atitude coerente com o primeiro
modelo de assimetria pró concorrência que eu descrevi (e do qual declarei ter
preferência). Na verdade esta é uma atitude simplesmente anti-usuários, porque
exclui uma parcela significativa deles do direito de ter informação confiável
sobre a qualidade do serviço que recebem.
A propósito, você ou alguém por aí tem uma estratificação dos provedores SCM em
função do número de assinantes atendidos? Assim, tipo, quantos provedores SCM
com até 5K assinantes, entre 5K e 10K assinantes, entre 10K e 15K assinantes,
etc. etc.
Essa questão do subsídio cruzado é um velho cavalo de batalha nestas discussões.
Minha posição é que isto só importa na medida em que se permite a venda casada
dos serviços SCM e STFC. Basta a Anatel declarar que isto não é mais admissível.
Eu mesmo seria candidato a cancelar minha assinatura STFC e ficar só com o SCM.
O problema real das operadoras amararem os dois serviços é, na verdade, o receio
do "pulo no escuro" que representa a vida pós STFC. Porque a telefonia
tradicional está no começo do fim (ainda vai demorar uns 15, 20 anos pra morrer,
mas vai morrer). Uma atitude da Anatel para "descasar" o STFC e o SCM poderia
acelerar este processo. Pode ser que doa no início, mas depois passa.
A questão básica que eu levanto é que todos, órgão regulador, a cobertura da
imprensa especializada, uma boa parte dos críticos (entre os quais você) e,
acredite! até as próprias operadoras, partem de um único pressuposto: que a
única forma de promover competição é pela castração artificial e imposição de
restrições draconianas às operadoras com PMS. E eu acho que precisamos de um
modo mais inteligente de tratar deste assunto, porque este modelo claramente
mostrou-se incapaz de induzir a competição. Ele apenas reforça a paranóia
institucional das operadoras e atiça a má vontade do público (alguns por razões
práticas, outros por motivos ideológicos, pouco importa), sem propiciar que
novos competidores entrem na disputa.
E, no entanto, como ressaltei na conversa com o Rubens, o surgimento de
competição contra as operadoras com PMS é possível, como prova o caso da GVT. Se
isto pode acontecer, então o que devemos é aprender com isso, e ver como induzir
os fatores positivos que facilitem o surgimento e o desenvolvimento de outras
GVTs, em vez de ficar procurando maneiras de tolher a Telefónica, a Oi, ou
qualquer outra operadora já estabelecida na praça.
O resto é principalmente questão de opinião, então não vou discutir. Exceto um
detalhe: você falou do art. 186 da LGT (veja o
texto da LGT aqui), que definitivamente não tem nada a ver com esta conversa
(é o primeiro artigo do Livro IV, que trata da privatização do Sistema
Telebrás). Acho que você realmente queria falar do art. 86, que na redação
antiga (o texto apontado no link mostra isso) apoiava sua argumentação, mas foi
alterado pelo
art. 38 da Lei nº 12.485 de 12/09/2011 (a Lei do Audiovisual), e já não
impõe mais a restrição que você levantou.
[ ]'s
J. R.
Smolka
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Mensagem de Rubens
para Celld-group@yahoogrupos.com.br,
Wireless BR <wirelessbr@yahoogrupos.com.br>
data 13 de fevereiro de 2012 09:27
assunto Re: [Celld-group]
J'Accuse
> Msg
de Smolka
> A propósito, você ou alguém por aí tem uma estratificação dos provedores SCM
em função do número de assinantes atendidos? Assim, tipo, quantos provedores SCM
com até 5K assinantes, entre 5K e 10K assinantes, entre 10K e 15K assinantes,
etc. etc.
Não com essa granularidade, mas a pesquisa TIC Provedores publicou estes dados:
Os 6 grandes provedores de acesso, que possuem mais de 900 mil clientes cada um,
tem 78% dos acessos;
Provedores médios, que possuem entre 20 mil e 899,9 mil clientes cada um, tem
11% dos acessos;
Pequenos provedores, que possuem menos de 20 mil clientes cada um, tem 11% dos
acessos.
http://www.cetic.br/tic/provedores/2010/
Há diversas outras estratificações na pesquisa como tecnologia e velocidade.
Rubens
-----------------------------
de J. R. Smolka smolka@terra.com.br por yahoogrupos.com.br
para Celld-group@yahoogrupos.com.br,
"wirelessbr@yahoogrupos.com.br" <wirelessbr@yahoogrupos.com.br>
data 13 de fevereiro de 2012 12:26
assunto Re: [Celld-group]
J'Accuse
Muito interessante Rubens. Fiz o download
do documento. Os dados que você mencionou estão na página 28.
Um problema sério: compare estes dados com a tabela do item 4.2.3.7 (página 8)
da
Análise 870/2011-GCJR da Anatel, que instruiu o voto do Relator do processo
de aprovação do RGQ-SCM. Lá somente são apresentados quatro provedores
SCM que entrariam na categoria de grandes provedores da pesquisa do GCI.br (900K
acessos ou mais): Oi, NET, Telesp e GVT - nesta ordem. O quinto provedor naquela
tabela é a CTBC, que está bem abaixo dos quatro primeiros com 275K acessos.
Então quem seriam os dois provedores SCM de grande porte que a pesquisa TIC
encontrou mas a Anatel não? Alguém comeu mosca, mas quem?
Meu interesse é tentar determinar que parcela dos usuários de acessos de banda
larga fica "no escuro" com relação a informações de desempenho da rede dos seus
provedores. A pesquisa TIC faz uma divisão quase que exatamente dentro da
regra de
Pareto - 78% para os grandes provedores e 22% para os médios e pequenos. Diz
ainda que, desses 22%, 11% são atendidos por provedores médios, e 11% por
porvedores pequenos (com até 20K acessos).
Na falta de dados mais estratificados, vou fazer uma estimativa (precisa
dizer isto bem claramente, para depois não saírem por aí confundindo estimativa
com fato).
Suponhamos que, com relação ao limite de 50K acessos adotado como critério de
corte pela Anatel, a faixa dos provedores médios da pesquisa TIC 2011 (entre
900K e 20K acessos), os 11% de market share desta categoria também possa ser
dividido pela regra de Pareto. Então teremos 80% do market share desta faixa
pertencendo a provedores com mais que 50K acessos, e 20% do market share desta
faixa pertencendo a provedores com menos que 50K acessos. Então a fração do
market share abaixo de 50K acessos na faixa dos provedores de médio porte
corresponde a 0,2 × 0,11 = 0,022, ou 2,2%.
Então esta estimativa colocaria cerca de 11% + 2,2% = 13,2% dos usuários
de banda larga no Brasil sem direito a informações sobre o desempenho da rede do
seu provedor. Se isto for verdade, quantos acessos isto representa? A pesquisa
TIC diz que os 22% de market share dos provedores médios e pequenos corresponde
a cerca de 4M acessos, então os 13,2% de market share que estimamos seriam,
aproximadamente, 0,132 × 4.000.000 / 0,22 = 2.400.000.
Ou seja, estou ESTIMANDO que a regra de corte da aplicabilidade do RGQ-SCM
somente para provedores com 50K acessos ou mais deixará cerca de 2,4M usuários
de banda larga sem acesso a dados de desempenho da rede dos seus provedores.
Eu não acho que assim esteja bem.
[ ]'s
J. R.
Smolka
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de J. R. Smolka smolka@terra.com.br
por yahoogrupos.com.br
responder a Celld-group@yahoogrupos.com.br
para Celld-group@yahoogrupos.com.br
data 14 de fevereiro de 2012 15:05
assunto Re: [Celld-group] J'Accuse
>
Bruno escreveu:
> A Anatel já proibiu desde julho do ano passado, apesar do regulamento de SCM
ser de 2001. Mas vá tentar cancelar. Ocorrem absurdos como cobrar mais pelo
serviço separado que pelo combo, ou dizer que você precisa cancelar tudo para
após 3 dias pedir a instalação do serviço especifico, pagando nova instalação.
> E a pior agência nada faz, como sempre.
> Sobre o art 186 foi erro de digitação.
Sobre a venda casada de SCM e
STFC.
A
medida cautelar da Superintendência de Serviços Privados da Anatel é mais
antiga, de julho de 2010. Até onde sei, apesar da medida estar em vigor, porque
os pedidos de efeito suspensivo foram sempre negados pela anatel, as operadoras
ainda recorrem dela. Os exemplos mais recentes que achei foram da
GVT em 26/01/2011, e da
BrT em 20/05/2011 e
01/12/2011.
Além da esfera administrativa, alguma operadora escalou para a esfera judicial?
E, se sim, em que pé estariam estas ações? E as eventuais ações das entidades de
defesa do consumidor? Sei de pelo menos uma, movida pela ProTeste (embora,
creio, o pedido tenha ido muito além do fim da venda casada).
[ ]'s
J. R.
Smolka