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Série de artigos sobre VoIP (5) |
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José de Ribamar Smolka Ramos (*) |
Série
de artigos sobre
VoIP
Quinto artigo - Parte 01
Série VoIP (5) – Sinalização
J. R. Smolka
Introdução
Neste quinto artigo da nossa série VoIP, vamos examinar a sinalização (signaling). Em telefonia, o termo sinalização refere-se à troca de informações entre o equipamento terminal do usuário e a rede para estabelecimento, controle e terminação de chamadas (call-setup, call-control e call-teardown).
Cabe à sinalização identificar e autenticar o usuário, negociar o estabelecimento do circuito de voz fim a fim e gerar as informações complementares que forem necessárias durante a chamada (ex.: para tarifação – billing).
Desde a década de 70 do século passado já era perceptível que a demanda de comunicação por parte dos usuários iria migrar para ambiente de aplicações multimídia (dados, voz e vídeo). Para encarar este desafio, as redes especializadas para cada classe de serviço, então existentes, teriam que evoluir para uma rede integrada, capaz de assimilar todos os tipos de tráfego.
Terreno fértil para bellheads vs netheads. Cada uma destas comunidades técnicas elaborou suas próprias propostas sobre como deveria ocorrer a evolução da rede para permitir a integração de serviços.
No campo bellhead, as propostas aglutinaram-se em torno da ISDN (integrated services digital network), nos “sabores” N-ISDN (narrowband ISDN) e B‑ISDN (broadband ISDN).
N-ISDN essencialmente define um padrão para a interface digital entre o usuário e a rede, BRI[1] (basic rate interface) para usuários comuns e PRI[2] (primary rate interface) para usuários heavy-duty. B‑ISDN complementa o modelo evolucionário no core da rede, com a adoção do ATM (asynchronous transfer mode) como tecnologia básica.
Em paralelo, a comunidade nethead vinha evoluindo a Internet em torno do modelo TCP/IP. Depois do lançamento da worldwide web por “Tim” Berners-Lee[3] em 1991, e a explosão do tráfego na Internet comercial, multimídia entrou definitivamente na ordem do dia da Internet, e foram surgindo diversas propostas para incorporação de conteúdo multimídia nas aplicações (ex.: MIME – multimedia Internet mail extensions).
Embora muito bem articulada, o padrão ISDN não “decolou” em grande escala principalmente por causa das próprias operadoras. N-ISDN exigia a troca dos estágios de assinante da central, bem como a mudança dos terminais dos usuários. As operadoras (talvez porque ainda estivessem “digerindo” o custo da digitalização das próprias centrais) acabaram optando por uma forma mais barata de introduzir acessos digitais de assinante: modems DSL (digital subscriber line). Isto acabou dando força à Internet como principal serviço de dados. Além disso, a introdução da B-ISDN exigiria a troca das centrais convencionais por equipamentos cujo core era uma switch ATM. Mais custos... Como a escala de produção determina o custo, e a necessidade de adoção gradual do modelo ISDN não gerava escala, a opção por DSL se cristalizou. E o resto é história.
Se a ISDN morreu, porque então estamos falando dela? Porque ela, mais alguns embaraçosos episódios de blue box[4] phreaking, forçaram as operadoras a evoluir seu modelo de sinalização, e esta nova forma de sinalização da rede telefônica é a que temos que interoperar com as aplicações VoIP. Além disso, muitos sistemas PABX de médio/grande porte e aplicações CTI (computer-telephony integration) adotaram interfaces PRI e, naturalmente, necessitam das características específicas da sinalização ISDN.
Nosso “roteiro de viagem” começa pela apresentação das características gerais do sistema de sinalização adotado, de forma praticamente universal, pelas redes telefônicas atuais: SS7. Depois veremos como evoluíram as propostas de integração de serviços multimídia sobre TCP/IP (o que inclui VoIP), e as suas principais características.
SS7:
O nome oficial deste sistema de sinalização é: common channel signalling[5]
system #7 (sistema de sinalização por canal comum número 7), e está
descrito em detalhes na série de recomendações Q.7xx da ITU-T.
A sinalização SS7 implementa uma rede para o tráfego de mensagens de sinalização entre os vários componentes da rede telefônica, independente dos circuitos utilizados para o tráfego de voz. Portanto, SS7 implementa out-of-band signaling (o sistema de sinalização digital R2, em oposição, implementa in-band signaling).
Os canais de
sinalização podem ser implementados em links totalmente separados dos
canais de voz (non-associated signaling e quasi-associated signaling),
ou podem ser implementados em multiplexação com os canais de voz no mesmo
link (associated signaling). Estas formas de implementação estão
mostradas na figura 1.
Figura 1 – Formas de implementação dos canais de sinalização
Os elementos componentes da rede de sinalização SS7 são:
SSP (signaling switching point) – São elementos responsáveis pela implementação de serviços (ex.: centrais telefônicas). Trocam mensagens SS7 com outros SSPs e SCPs para negociar o estabelecimento e a terminação de circuitos de voz.
SCP (signaling control point) – São elementos que funcionam como front-end de acesso a bases de dados da rede telefônica (não bases de dados de serviço, porque estes são SSPs). Exemplos de bases de dados da rede são o HLR (home location register) e o VLR (visitor location register) usados em redes de telefonia celular, e o CMSDB (call management services database) usado, entre outras coisas, para orientar o roteamento de chamadas de serviços IN (intelligent network[6]).
STP (signaling transfer point) – São “roteadores” de mensagens SS7 entre os SSPs e SCPs.
Cada SSP e SCP em uma rede SS7 é identificado por um point code com três bytes. Cada um dos bytes do point code, por sua vez, identificam a rede (network), o grupo de elementos (cluster), se mais de um elemento funciona em conjunto para garantia de disponibilidade, e o membro (member) dentro do cluster.
Os STPs são organizados hierarquicamente. Em cada nível, um ou mais dos STPs servem como gateways de interconexão para os outros níveis hierárquicos. No nível mais baixo estão os STPs da rede interna de cada operadora. O próximo nível hierárquico é formado pelos STPs nacionais, responsáveis pelo roteamento de mensagens SS7 entre redes de operadoras distintas, dentro do mesmo país. No nível mais alto estão os STPs internacionais, que roteiam as mensagens SS7 do tráfego internacional.
Os links que interconectam os elementos da rede de sinalização SS7 são classificados em seis tipos:
A-links (access) – Conexão entre SSPs/SCPs e seus STPs primários (home);
E-links (extended) – Conexão entre SSPs/SCPs e seus STPs secundários (backup);
F-links (fully associated) – Conexão direta SSP/SSP ou SSP/SCP, sem a intermediação de um STP;
B-links (bridge) – Conexão STP/STP no mesmo nível hierárquico;
D-links (diagonal) – Conexão STP/STP em níveis hierárquicos diferentes;
C-links (cross) – Conexão STP/STP dentro de um cluster de alta disponibilidade.
A estrutura de
protocolos na rede SS7 não segue exatamente as definições funcionais das
camadas do OSI-RM (ver artigo 2 desta série), mas segue aproximadamente as
mesmas idéias. A figura 2 mostra a estrutura básica dos principais protocolos
em uma rede SS7, e suas funcionalidades equivalentes com o OSI-RM.
Vamos apresentar uma descrição breve de cada protocolo da estrutura:
Message transfer part (MTP) – Faz a transmissão fim a fim das mensagens SS7 entre os elementos da rede. Está estruturado em três níveis: level 1, level 2 e level 3, de forma aproximadamente igual às camadas 1 (física), 2 (enlace) e 3 (rede) do OSI-RM.
Telephony user part (TUP) – Implementa as mensagens básicas para call-setup e call-control da telefonia convencional. Está sendo gradualmente substituído pelo ISUP.
ISDN user part (ISUP) – Estende as funcionalidades do TUP para redes N‑ISDN. Também é usado para mensagens de serviços IN e para interoperação entre redes de telefonia celular e a rede telefônica fixa.
B-ISDN user part (BISUP) – Projetado para estender as funcionalidades do ISUP para redes B-ISDN. Voltado para as necessidades de conexões de vídeo e dados em switches ATM. Na prática, muito pouco utilizado.
Application service part (ASP) – Previsto para suportar o acesso de aplicações que tenham que interagir com a rede de sinalização SS7. Até onde sei, não implementado na prática.
Signaling connection control part (SCCP) – Implementa o roteamento das mensagens TCAP para o gerenciador de base de dados apropriado.
Transactional capabilities application part (TCAP) – Facilidades de comunicação transacional para aplicações que interagem com a rede de sinalização SS7, especialmente aquelas que envolvem acesso a bases de dados externas à rede telefônica.
Operations, maintenance and administrative part (OMAP) – Protocolo de aplicação que usa as funcionalidades do TCAP para implementar facilidades de acesso remoto aos elementos da rede.
Mobile application part (MAP) – Protocolo de aplicação utilizado na troca de dados do assinante entre redes celulares, especialmente em situações de roaming.
Estes são apenas os protocolos mais conhecidos. Existem outros, mas foge do nosso objetivo entrar em maiores detalhes sobre isto.
Com esta descrição básica do funcionamento da sinalização SS7, podemos seguir em frente para analisar os diferentes cenários de interoperação com o ambiente VoIP. Aqueles que tenham pendor para o desenvolvimento de aplicações nesta área, podem encontrar muito material interessante na Internet[7].
José de Ribamar Smolka Ramos (smolka@terra.com.br)
é engenheiro eletricista (UFBa 1982), com especialização em gestão da
qualidade (CETEAD/UFBa 1994) e MBA executivo (FGV RJ/Grupo Telefonica 2001).
Trabalha na área de Informática desde 1980, tendo atuado em empresas das áreas
financeira, industrial e serviços, estando desde 1989 na área de
telecomunicações. Desde 1995 dedica-se ao projeto, implantação e gestão
operacional de infra-estruturas corporativas de comunicação de dados e serviços
baseadas na arquitetura TCP/IP, envolvendo infra-estrutura LAN e WAN, acesso
remoto e interconexão de redes.
Principais áreas de interesse técnico: segurança da informação,
engenharia de tráfego e garantia de QoS na arquitetura TCP/IP e gerência de
redes.
Atualmente é especialista técnico da Telebahia Celular S/A (Vivo), e (desde
1993) é professor do curso de bacharelado em Informática da Universidade Católica
do Salvador, nas cadeiras de Linguagens para Aplicações Comerciais e Introdução
aos Sistemas de Computação.
Uma coleção de suas "mensagens-artigos" em grupos de debates está disponível em: http://www.wirelessbrasil.org/jose_smolka/js01.html.