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Leia na Fonte: Estadão
[08/06/19]
Entenda esses ataques à chinesa Huawei
Na última quinta-feira, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão,
declarou que o Brasil rejeita o bloqueio à chinesa Huawei, como pretende o
presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Aí têm carga pesada e grandes interesses em jogo que vão mexer não apenas com
relações entre potências, mas também com o futuro do dia a dia de cada um dos
brasileiros. Daí por que é preciso entender do que se trata.
Entre as mais importantes escaramuças do conflito entre Estados Unidos e China
está a corrida pelo controle da tecnologia de conectividade móvel de quinta
geração, o 5G. Este é o miolo da nova disputa geopolítica pela hegemonia mundial
no século 21.
Ao contrário dos seus antecessores (o 3G e o 4G), a nova versão da ferramenta
promete fazer com que tudo que funciona hoje pareça ultrapassado, como inalar
rapé, usar mata-borrão ou passar o escovão e encerar o chão da sala de jantar,
tal qual se fazia antigamente.
O 5G deve começar a virar realidade a partir de 2020. E, pelo que promete,
alimentará em escala comercial dispositivos móveis (celulares e tablets, dentre
outros), casas inteligentes (com geladeira, fogão, alarmes de segurança,
iluminação avançados), frotas de veículos autônomos, automação de fábricas
inteiras e, até mesmo, cidades inteligentes. Tudo isso deverá conversar entre
si, em tempo real, sem cabos e sem interrupções.
Quem primeiro obtiver sucesso no domínio dessa tecnologia terá enormes
vantagens, além de poder exportá-la para o resto do mundo. A China tomou a
dianteira nessa corrida em 2013, quando o governo do país formou um grupo de
empresas privadas com o objetivo de alavancar os projetos. A líder nesse
segmento é a Huawei, segunda maior fabricante de smartphones do mundo, com
potencial para logo se tornar a primeira.
Para atrapalhar essa escalada, o governo Donald Trump não só impôs, em maio de
2019, restrições à comercialização de produtos da Huawei em território
americano, mas, em dezembro passado, pediu que o Canadá prendesse Meng Wanzhou,
diretora financeira da empresa e filha do fundador da companhia. A justificativa
inicial apresentada para essa operação foi a de que a Huawei violou as sanções
americanas aplicadas ao Irã. As restrições comerciais de Trump passarão a valer
a partir de agosto e deverão prejudicar usuários e fabricantes de todo o mundo.
O especialista da consultoria Eurasia Group no Brasil Filipe Carvalho observa
que a estratégia agressiva dos Estados Unidos se apoia agora na alegada
necessidade de impor represálias a um governo autoritário que bloqueia o acesso
dos seus cidadãos a redes sociais, como o Facebook, e ao mais famoso buscador da
internet, o Google.
Também passou a ser usada como justificativa a suspeita de que a atividade da
Huawei acabe por facilitar práticas de espionagem em outros países. A primeira
denúncia nessa direção foi feita em agosto de 2018 pela agência de inteligência
da Austrália. Com base em testes internos de segurança digital, o governo
australiano decretou o banimento futuro dos equipamentos de infraestrutura 5G
chineses.
As empresas europeias Ericsson (sueca) e Nokia (finlandesa) tentam uma corrida
por fora pelo controle da tecnologia, mas ainda estão longe do nível já atingido
pela concorrente asiática. Pelas mesmas razões, quando chegarem lá, essas e
outras companhias de ponta do G5 também estariam em condições de obter
informações privilegiadas sobre a vida das pessoas. Independentemente disso,
para Carvalho, não há nenhuma prova clara de que a tecnologia 5G da Huawei
coloque em risco a segurança de empresas, cidades e mesmo Estados.
Outros países da Europa, como Alemanha, França e Espanha, que Washington busca
trazer para seu lado, parecem decididos a seguir em frente com a tecnologia da
China, que fará a instalação do 5G também na Rússia e na Venezuela.
O Brasil ainda não tomou posição oficial nesse campo tão sujeito à
bipolarização, mas as declarações do vice-presidente Hamilton Mourão mostram
indisfarçável simpatia pela Huawei.
Para Carvalho, assim que perderem influência sobre a Europa, os Estados Unidos
aumentarão sua atenção sobre a América Latina e tentarão pressionar o Brasil
para também excluir a Huawei dos seus projetos de ponta. Atualmente, boa parte
dos equipamentos de telecomunicações de 3G e 4G em uso no Brasil é fabricada
pela Huawei. Essa é boa razão para acreditar que será difícil fazer uma troca de
tecnologias quando da instalação de equipamentos 5G.9