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Leia na Fonte: Teletime
[23/09/19]  Convivência da banda C com o 5G custaria menos de R$ 500 milhões - por Samuel Possebon

As operadoras de telecomunicações estão elaborando uma proposta para resolver as dificuldades de uso da faixa de 3,5 GHz para o 5G decorrentes das interferências na banda C do satélite. Ao contrário das emissoras de TV, que sugerem ao governo a migração dos canais e usuários de TVRO (distribuição de TV via satélite) para a banda Ku, o setor de telecom entende que é muito mais barato e eficiente, além de garantir o cronograma e os investimentos em 5G, uma mitigação de interferências direcionada, utilizando filtros apenas nos casos em que o problema de fato se apresentar. O argumento central deste modelo alternativo é econômico: enquanto este modelo baseado na mitigação das interferências com filtros custaria cerca de R$ 460 milhões, nas estimativas das operadoras, o modelo de migração para a banda Ku proposto pelas emissoras poderia custar, no limite, até R$ 9,6 bilhões, segundo estudos a que este noticiário teve acesso. Na semana passada, por exemplo, a Abratel (associação de radiodifusores capitaneada pela Record) chegou a apresentar ao governo uma conta de R$ 2,9 bilhões para resolver o problema, mas apenas para os beneficiários do Cadastro Único.

O modelo das operadoras de telecomunicações, que será apresentado ao governo e ao mercado nos próximos dias, será respaldado por testes a serem realizados a partir do próximo dia 10 de outubro, com relatório apresentado ao governo até o início de novembro. Estes testes considerarão os filtros contra interferências disponíveis, assim como as condições reais de irradiação e potência que devem ser enfrentadas nos domicílios das áreas afetadas pelo 5G em 3,5 GHz. Será uma iniciativa de todas as operadoras, coordenadas pela Claro, pois é a operadora que tem o Centro de Referência Tecnológica onde os testes acontecerão, no Rio de Janeiro (CRT, onde os primeiros testes de interferência foram feitos) e também por ser a controladora da Embratel, operadora do StarOne C2, principal satélite hoje utilizado para distribuição dos sinais de TV em banda C.

O modelo que está sendo proposto ao governo e que será validado pelos testes parte de algumas etapas e premissas. Primeiro, está previsto que as emissoras de TV que hoje estão distribuídas via satélite na faixa de banda C estendida (3,625 GHz a 3,7 GHz) serão realocadas para a banda C padrão (entre 3,7 GHz e 4,2 GHz). Pelas contas da StarOne, isso significa que três ou quatro transponders do StarOne C2 não serão mais utilizados para serviços de TV, evitando assim a faixa de espectro em que a maior parte das interferências acontece. Os serviços de satélite na banda C estendida ficariam restritos a aplicações corporativas, em que são comercialmente viáveis investimentos mais elevados na mitigação, caso seja necessário.

Liberando a faixa de 3,625 GHz a 3,7 GHz dos atuais serviços de TV, haveria uma banda de guarda adicional para permitir o uso dos filtros de menor custo, que poderão ser instalados nos equipamentos de recepção de banda C dos usuários de parabólica nas áreas em que a faixa de 3,5 GHz efetivamente venha a ser utilizada. Além disso, com o lançamento do StarOne D2, que substituirá o C2 na mesma posição, haverá um considerável ganho de potência, dando mais robustez ao sinal da banda C. Tudo isso será simulado nos testes de outubro, reproduzindo situações reais que os primeiros testes, coordenados pela Anatel, não detalharam (na ocasião foi simulada a interferência considerando a incidência direta e concentrada dos sinais de 5G sobre as parabólicas).

Áreas urbanas vs. Áreas rurais

A principal premissa deste modelo de mitigação é que a faixa de 3,5 GHz só acabará sendo utilizada para 5G em grande escala nos centros urbanos, já que para áreas rurais e menos densas há outras faixas de espectro mais adequadas, abaixo de 1 GHz, que não interferem com a banda C. Com isso, não seria necessário fazer nada em boa parte as parabólicas existentes, porque não haverá nenhuma transmissão de 5G em 3,5 GHz interferindo. As estimativas das teles assumem que há no Brasil 12 milhões de domicílios com parabólica de banda C (este é o dado usado pelas emissoras junto ao mercado anunciante). Segundo dados da PNAD/IBGE, 30% destes domicílios estariam em centros urbanos, e os demais em áreas rurais. Estimando-se que, nas áreas urbanas, cerca de 80% das parabólicas não tenham outra alternativa e estejam efetivamente sujeitas à interferência, haveria cerca de 2,9 milhões de domicílios que de fato precisarão de filtros. Considerando um valor médio de R$ 160 por filtro já instalado, o custo total da mitigação seria de aproximadamente R$ 460 milhões. Esta modelagem prevê dois tipos de filtros: um mais simples, que se aplicaria a 80% da base, com valor de mercado hoje estimado em R$ 60; e outro, mais sofisticado, necessário em 20% da base afetada, e custaria cerca de R$ 160. Em ambos os casos o custo de instalação estimado é de R$ 80, pois acredita-se que será possível o processo de auto instalação para boa parte dos usuários.

Já o modelo de migração para a banda Ku, segundo estimativas da Claro, considerando a mesma premissa de base de parabólicas (12 milhões de domicílios), pode custar até R$ 9,6 bilhões, muito maior do que a proposta e usar filtros seletivamente, porque implica o desligamento completo de um serviço operador em banda C e migração completa da base de receptores e antenas. Essa conta ou sairá do caixa do Tesouro, que teria que abrir mão da receita do leilão de 5G, ou são recursos que deixariam de ser investidos nas redes de banda larga móvel, ou será uma despesa imposta aos próprios usuários de banda C que não sejam contemplados com políticas públicas. A conta considera R$ 150 o kit de antena mais LNB para banda Ku, R$ 200 para o receptor (necessário para 80% da base atual), R$ 290 de instalação (pois na maior parte dos casos é preciso instalar e apontar as antenas), R$ 200 de deslocamento dos técnicos por conta do serviço em áreas remotas. Sem falar em custo de campanha, divulgação, operacionalização etc. Como comparação, estimativas das emissoras de TV apresentadas à Anatel consideraram apenas a distribuição dos kits para os inscritos no Cadastro Único que utilizam parabólicas, o que poderia reduzir um pouco o valor total, em R$ 2,9 bilhões.

Sem traumas

O modelo de filtros teria a vantagem, segundo resumem os estudos a que este noticiário teve acesso, de não implicar nenhuma mudança traumática ao telespectador, já que a banda C continua operando, e permite a implantação de filtros à medida em que as ativações de 5G na faixa de 3,5 GHz precisarem ser feitas. Ou seja, não seria necessário esperar o final de um processo de troca de kits em banda Ku, desligar os canais de TV na banda C completamente para então se ativar o 5G no Brasil, processo que levaria pelo menos 3 anos (foi o que levou o desligamento analógico nas cidades que passaram pelo processo). Também permitiria que os pequenos radiodifusores, que não têm condições de migrar para a banda Ku, permanecessem no "satélite nacional", em banda C. A banda C ainda teria a vantagem de ser mais robusta para a radiodifusão em relação às atenuações atmosféricas (queda do sinal por conta da chuva), comuns na banda Ku. Além disso, um modelo de mitigação com filtros, escalonada e direcionada a locais em que o problema efetivamente se apresente, otimizaria os recursos públicos decorrentes do leilão de 5G. Caberia ao Estado então optar por arrecadar mais ou estabelecer mais contrapartidas de cobertura de banda larga móvel. A principal desvantagem deste modelo é que, caso no futuro se opte por utilizar toda a faixa da banda C para o 5G, seria necessário um novo processo de mitigação. Mas este cenário é considerado pouco provável no Brasil considerando-se que existem mais de 30 satélites com banda C operando no país, boa parte deles atendendo ao mercado corporativo.

Na proposta que está sendo desenhada pelas empresas de telecomunicações, o modelo de mitigação das interferências na banda C com a distribuição de filtros seria operacionalizado por uma entidade semelhante à EAD, que conduziu o processo de mitigação na faixa de 700 MHz. Confira aqui uma análise já publicada sobre TELETIME sobre a questão das interferências do 5G na faixa do 3,5 GHz.