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Leia na Fonte: Convergência Digital
[09/02/21]
Nunca antes na história da Anatel - por Juarez Quadros do Nascimento*
Em função do que é notícia, a Anatel passa por um dos momentos mais importantes
da sua história e precisa navegar ao largo de uma eventual crise circunstancial
de modo a evitar uma crise institucional. A elaboração do leilão das redes ditas
de quinta geração (5G), fundamentais para o País, é de competência da Anatel.
Para tanto, é necessário que o Poder Executivo determine diretrizes bem
definidas, mediante uma política governamental para o leilão de 5G.
Com a publicação da portaria ministerial a estabelecer diretrizes para a
licitação das radiofrequências para 5G, no último dia útil (29/01) que precedia
o dia (01/02) da reunião do Conselho Diretor da Anatel para a análise da
proposta do edital da nova tecnologia, foi aceso o rastilho de uma possível
crise circunstancial. Pelo que se lê, parece que faltaram detalhes diretivos de
certas obrigações. Outras autoridades, incluindo parlamentares e membros dos
órgãos de controle, precisam conhecer os “features” da tecnologia 5G para que,
dentro das suas competências legais, acompanhem a Anatel na chegada dessa
tecnologia ao Brasil.
Para tanto, cabe lembrar que um dos objetivos da reforma do setor de
telecomunicações brasileiro, iniciada em 1995, foi fortalecer o papel regulador
do Estado. Esse objetivo orientava que o Estado promovesse um grau adequado de
supervisão sobre o setor, de modo a assegurar que fossem alcançados os objetivos
essenciais da reforma, a criação de um mercado de competição efetiva e a
proteção dos consumidores.
Àquele tempo foi notado que, em praticamente todos os países que já tinham
promovido reestruturação de suas telecomunicações, algum tipo de organismo
regulador (comissão, autoridade, ofício, agência etc.) fora implementado. Foi
decidido, então, que no Brasil seria uma agência. A questão essencial passou a
ser definir os poderes e atribuições da agência reguladora, com o objetivo de
torná-los claros para o mercado e para a sociedade em geral.
Assim, a agência deveria ser peça-chave para garantir a estabilidade das regras
dispostas para o mercado. Seria, portanto, uma agência dotada de competência
técnica e de independência decisória a inspirar confiança, pois ao contrário;
sem autonomia gerencial, com dependência restritiva ou sem capacidade técnica;
geraria desconfiança e afastaria os investidores. Para tanto, desfrutaria de
liberdade gerencial, autonomia e seria obrigada a prestar contas, assim como,
disporia de regras e controles internos para limitar o poder das pessoas
individualmente.
Com a Emenda Constitucional nº 8 (1995) e a Lei Geral de Telecomunicações – LGT
(1997), em 5/11/1997, foi instituída a Anatel, com as competências que a lei lhe
assinalou, compreendendo, entre outras atribuições, a responsabilidade de
outorgar concessões, permissões e autorizações, incluindo a preparação e
realização dos procedimentos licitatórios. Lato sensu, à Anatel compete a adoção
das medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o
desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, atuando com independência,
imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade, conforme disposições
detalhadas no caput e nos 31 incisos do art. 19 da LGT.
Então, quem decide? Quem decidirá sobre o leilão será o Conselho Diretor da
Anatel. Além disso, serão os conselheiros os responsáveis, junto ao Tribunal de
Contas da União, pelo sucesso (ou insucesso) do certame licitatório. Quem
compra? As operadoras comprarão não só os equipamentos (dos fabricantes), mas
também as radiofrequências (da União, via Anatel). Quem recebe? Quem receberá os
recursos auferidos no leilão será o Tesouro Nacional. Quem paga a conta? Quando
usarem os serviços, quem pagará a conta serão os consumidores que esperam
ansiosos pela eficiência regulatória da Anatel na realização do maior
procedimento licitatório da sua história, quando será leiloado o total de 3.710
MHz de espectro. Simples assim.
Vê-se, portanto, que nunca antes na história da Anatel um leilão de
radiofrequências igual a esse ocorreu e, dada a sua complexidade, contivesse
potencial viés para desencontros institucionais. O Conselho Diretor da Anatel
sabe como agir, fazer acontecer e mitigar eventuais acidentes de percurso. E as
autoridades constituídas precisam garantir a continuidade da ação do Estado no
setor. Afinal de contas, ao longo de 23 anos de existência, ao contar com
servidores especializados (de referência mundial), a Anatel acumula competência
técnica e tem independência decisória para bem fazer a coisa pública. Então
deixemos a Anatel desempenhar as suas competências legais para que tenhamos, com
brevidade, as redes 5G no Brasil.
(*) O autor é Engenheiro Eletricista. Foi ministro de Estado das Comunicações e
presidente da Anatel.