WirelessBRASIL |
|
WirelessBrasil --> Bloco Tecnologia --> SCM --> Índice de artigos e notícias --> 2013
Obs: Os links originais das fontes, indicados nas transcrições, podem ter sido descontinuados ao longo do tempo
Leia na Fonte: Teletime - Revista - Edição 150
[Dez 2011]
Valor adicionado e regulado - Fernando Paiva
No ano passado, o mercado de serviços de valor adicionado (SVA) em telefonia
celular foi chacoalhado por um ofício da Anatel impondo uma série de exigências
para a oferta de assinatura semanal de conteúdos, entre as quais a necessidade
de dupla autorização por parte do usuário, o chamado “duplo opt-in”, para o
envio de mensagens promocionais. Na época, abriu-se uma discussão sobre a
necessidade de regulamentação de tais serviços.
Agora, passado pouco mais de um ano, a Anatel volta a surpreender e inclui,
pela primeira vez, metas de qualidade envolvendo o serviço de mensagens de texto
(SMS) para as operadoras celulares. Estas terão que entregar 95% das mensagens
enviadas por mês em até um minuto. Embora valha apenas para mensagens trocadas
entre usuários, a nova meta afetará indiretamente a vida de agregadores e
integradores de conteúdo móvel, prevêem analistas do mercado de SVA.
A intervenção da Anatel traz um novo desafio a entidades como o Mobile
Entertainment Forum (MEF): o de agilizar o processo de autorregulamentação,
evitando imposições de órgãos reguladores.
O mercado de SVAs existe há mais de dez anos no Brasil, tendo começado com a
venda avulsa de ringtones monofônicos, alguns conteúdos por SMS e sites WAP. Por
muito tempo não gerou dores de cabeça para os consumidores ou para as operadoras
e seus parceiros. Tampouco rendia uma receita significativa, verdade seja dita.
O cenário começou a mudar por volta de 2007, quando foram lançados no País os
primeiros serviços de assinatura semanal de conteúdo móvel, ideia importada da
Europa. Funciona da seguinte forma: o usuário paga um valor semanal (hoje em
torno de R$ 4,99) e recebe créditos para serem trocados por ringtones, jogos,
imagens, vídeos etc. O modelo foi bem aceito pelas operadoras, pois gera uma
receita recorrente. Em um piscar de olhos, empresas estrangeiras aportaram no
País com esse modelo e várias das companhias nacionais de SVA lançaram ofertas
similares. A receita cresceu, mas junto veio a dor de cabeça. “O problema não
era o produto, mas a forma como era oferecido”, recorda Philemon Mattos, diretor
de desenvolvimento de negócios da Takenet.
Muitos consumidores assinavam o serviço pela Internet, digitando seus números de
celulares atraídos por ofertas pouco transparentes ou mentirosas. Havia casos em
que a pessoa não se dava conta de que estava se comprometendo a um pagamento
semanal. E pior: em alguns desses serviços era difícil ou quase impossível
cancelar a assinatura. Houve até situações de fraude explícita em que dados de
uma mala direta foram usados para forjar assinaturas, relata Rafael Pellon,
advogado e sócio de CFLA Advogados e especialista no mercado de SVA. Para
complicar a situação, os mais afetados eram justamente os usuários pré-pagos,
pois alguns desses serviços se aproveitavam do fato desses consumidores não
terem uma visibilidade adequada de seus gastos com telecomunicações, já que não
recebem uma conta mensal detalhada. Muita gente teve seus créditos descontados
sem saber o porquê.
O resultado foi uma chuva de reclamações junto às operadoras e à Anatel.
Pressionado, o órgão regulador decidiu tomar uma providência, dentro do seu raio
de competência legal. Vale lembrar que, na teoria, a Anatel não pode regular
diretamente os agregadores, integradores ou provedores de conteúdo móvel,
somente as operadoras de telefonia.
Ciente disso, a agência enviou um ofício às teles em julho do ano passado
relatando a enxurrada de reclamações e exigindo providências por parte das teles
por considerá-las responsáveis solidariamente aos seus parceiros, haja vista que
usam seu sistema de billing para cobrar por tais serviços e compartilham de sua
receita. Entre as exigências constava a obrigatoriedade de envio de uma mensagem
de texto pela operadora para o usuário com informações sobre o serviço desejado,
incluindo um link para o contrato, um número de protocolo, o preço e a forma de
cancelamento. Além disso, para que a assinatura fosse efetivada, o usuário
precisaria responder a essa mensagem confirmando seu interesse. Na prática, o
ofício da Anatel determinava a adoção do que o mercado chama de “duplo opt-in”,
ou, em bom português, uma “dupla autorização”.
O mercado sentiu o baque. Imediatamente, as operadoras se reuniram com a Anatel,
pedindo mais esclarecimentos e receosas de que tais exigências precisassem ser
adotadas por outros SVAs. A agência, então, enviou outro ofício, em setembro do
ano passado, esclarecendo que as novas regras não precisavam ser cumpridas para
serviços como quiz, chat ou votação por SMS. E no caso de compra de conteúdos
avulsos não era necessário enviar link para contrato.
A intervenção da Anatel ligou o sinal de alerta entre as empresas de SVA. Ou
elas se organizavam para se autorregular dali em diante ou a agência interviria
mais vezes. “O mercado muda muito rapidamente e a legislação corre atrás. A
autorregulamentação supre essa carência e a defasagem da lei. A ideia é não
deixar que o mercado vire um faroeste”, argumenta Pellon.
Uma das respostas foi justamente a elaboração de um código de conduta no âmbito
dos associados do MEF, que reúne desenvolvedores, agregadores, integradores,
operadoras e fabricantes.
O código incluiu as exigências da Anatel e acrescentou vários outros detalhes,
como sugestões de fraseologia para as mensagens de confirmação e determinação de
limites para a cobrança pelo serviço. O documento sugere também uma lista de
palavras que devem ser aceitas para o cancelamento do serviço quando enviadas
por SMS pelo usuário.
Gradativamente, começou um processo de autofiscalização, visto que os associados
do MEF são concorrentes entre si. As denúncias, contudo, são encaminhadas pela
entidade às operadoras, pois o MEF não tem poder para punir seus associados. As
teles, sim, com base em termos de conduta assinados pelos parceiros, passaram a
adotar penalidades, que variam desde a multa (que pode chegar a 50% da receita
que caberia ao parceiro) até o bloqueio temporário do serviço.
Segundo fontes, a TIM foi uma das mais duras. A operadora já tinha uma posição
crítica ao serviço de assinatura antes mesmo do ofício da Anatel, tendo
expressado isso em público durante a edição de 2010 do evento TELA VIVA MÓVEL.
Seu argumento era simples: esses problemas estavam traumatizando os
consumidores, que nunca mais voltariam a comprar conteúdo móvel através das
teles. Era um suicídio gradual do mercado de SVA para as operadoras.
O aperto feito pela Anatel, pelas operadoras e pelo MEF surtiu efeito. A
quantidade de reclamações diminuiu sensivelmente, garantem fontes, e as ofertas
se tornaram mais transparentes. Empresas que operavam com métodos, digamos,
pouco éticos, simplesmente estão deixando o País ou mudando de foco. Vale
lembrar que algumas já haviam tido problemas similares em outros continentes
antes de aportarem por aqui. “Algumas até incluem em seus planos de negócios as
multas que receberão das operadoras”, relata uma fonte. Há informações de que os
próximos alvos são países africanos, especialmente a África do Sul. “São
empresas ‘gafanhoto’: vêm e destroem tudo”, compara o gerente geral para América
Latina da Playphone, Renato Marcondes.
SMS em um minuto
Quando as coisas pareciam se acalmar, surgiu neste fim de ano mais uma novidade:
a Anatel incluiu entre as novas metas de qualidade das operadoras móveis a
obrigatoriedade de entrega em até um minuto de 95% das mensagens de texto que
partem de sua rede todo mês. A medida é válida apenas para mensagens trocadas
entre usuários, mas terá efeitos sobre agregadores e integradores. Estes
provavelmente terão que planejar melhor o balanceamento do seu tráfego de SMS ao
longo do dia, a pedido das operadoras.
O objetivo será não provocar a sobrecarga da plataforma de mensagens, evitando o
atraso na entrega do SMS entre usuários. Um dos temores é que as operadoras
priorizem ainda mais o tráfego peer-to-peer (P2P) em detrimento daquele de
conteúdo via SMS (ou A2P, na sigla em inglês). O problema é que alguns desses
serviços são extremamente sensíveis ao tempo, como alertas de gol. Outra
possível repercussão junto aos parceiros é um incentivo por parte das teles à
adoção da tecnologia USSD, que usa um outro canal de comunicação em redes GSM
para envio de conteúdo por texto que aparece na forma de mensagem pop-up na tela
do telefone e que hoje ainda é pouco explorado no Brasil.
A Anatel definiu um prazo de 180 dias para que as operadoras atendessem a essa
meta. As teles, contudo, ainda têm muitas dúvidas. A Claro, por exemplo,
levantou as seguintes questões:
1) como garantir a entrega de uma mensagem ao usuário de outra operadora?;
2) como garantir essa entrega em até um minuto no caso de o telefone do usuário
estar desligado ou fora da área de cobertura?
Sobre a primeira pergunta, um técnico da Anatel ouvido por este noticiário
informou que o prazo vale a partir da chegada da mensagem na rede da operadora
de destino. O difícil será medir e fiscalizar isso.
Para atender à demanda da Anatel, as operadoras terão que investir em mais
capacidade em suas plataformas de mensagens de texto. O problema é que não há
como garantir essa entrega em um minuto durante momentos de pico, como Natal,
Reveillon, finais de futebol etc. É provável que os detalhes dessas metas ainda
sejam discutidos mais profundamente entre as empresas e o órgão regulador, tal
como foi feito em relação ao ofício sobre o serviço de assinatura semanal.
As interferências da Anatel dividem as opiniões das empresas de SVA. “As
intervenções eram necessárias e bem-vindas até certo ponto. O que me incomoda é
a forma como a Anatel faz: manda um ofício e pronto. Não existe diálogo ou
conversa técnica”, reclama Marcondes, da Playphone. “Quando a intervenção é
feita para garantir a qualidade do serviço que, por sinal, anda muito ruim no 3G
e no SMS, sou 100% a favor”, diz Gustavo Ziller, diretor da Aorta, uma
desenvolvedora de aplicativos móveis. Ele ressalta, entretanto, se opor a
qualquer tentativa de controle do conteúdo distribuído, o que não é o caso por
enquanto.
Próximos passos
Ainda há muitos pontos no mercado de SVA que merecem atenção das empresas se
estas não quiserem sofrer novas interferências da Anatel. Um deles é o problema
do spam via SMS. Crisleine Pereira, presidente da BeWireless, explica que é
muito fácil comprar uma mala direta com nomes e telefones celulares e, em
seguida, enviar mensagens de texto não solicitadas usando brokers não
homologados pelas operadoras.
Esses brokers usam canais de roaming internacional para entrar nas redes das
teles como se fossem mensagens P2P e conseguem inclusive preços mais baratos que
aqueles cobrados pelos integradores homologados.
Entre os casos mais emblemáticos de spams via SMS estão alguns ocorridos durante
campanhas eleitorais. Em 2010, por exemplo, no dia da eleição presidencial foi
disparado um spam fazendo campanha para o candidato José Serra, do PSDB, cujo
comitê central negou qualquer participação no ocorrido. “O broker pirata degrada
a funcionalidade do SMS. Não há garantia de entrega das mensagens e pode passar
qualquer conteúdo e em qualquer horário. A meu ver as maiores prejudicadas são
as operadoras”, analisa Crisleine. No combate a esse problema merece destaque a
atuação da Claro, que passou a exigir uma senha para o disparo de qualquer
broadcast de mensagens. Segundo fontes do mercado, a iniciativa será seguida em
breve pela Vivo.
O MEF pretende lançar uma revisão de seu código de conduta a cada ano. A versão
de 2011 estava em negociação quando do fechamento de TELETIME, com previsão de
publicação em dezembro. Entre os pontos abordados estão o aperfeiçoamentos nas
fraseologias das mensagens e no limite de cobranças. Mas uma das principais
novidades estará no combate ao conteúdo pirata, principalmente no seu uso na web
para atrair usuários a assinar serviços móveis, nova prática que se estabeleceu
no mercado brasileiro. O MEF firmou acordo com o IFPI, um órgão internacional de
combate à pirataria, para quem serão encaminhadas denúncias de irregularidades
encontradas por aqui. O novo código também passará a exigir opt-in via SMS para
quem assinar serviços através de sites WAP. Atualmente, é requerida apenas a
marcação de um “checkbox” para adquirir uma assinatura semanal via WAP.
Para especialistas ouvidos por TELETIME, uma área que o mercado precisará olhar
com mais atenção em um futuro próximo é a de m-commerce. Será necessário criar
certos padrões para evitar problemas conforme esse segmento cresce. Uma das
preocupações é a proteção ao público infantil, para que não faça compras
inadvertidamente. O assunto está no radar do MEF para 2012.
No mundo dos apps é diferente
Enquanto isso, no mundo dos aplicativos móveis, quem dá as cartas em termos de
regulamentação são os donos das lojas de aplicativos, ou seja, Apple, na App
Store, e Google, no Android Market. São eles que ditam as regras, através dos
contratos assinados pelos desenvolvedores. São contratos padronizados, sobre os
quais os desenvolvedores não têm poder de realizar qualquer alteração – muito
menos as operadoras ou os órgãos reguladores de telecomunicações. Quem pode,
sim, interferir é a legislação local de cada país. No Brasil, por exemplo, a
exigência de classificação etária para jogos eletrônicos obrigou a Apple a
excluir, por enquanto, a categoria de games da versão brasileira da App Store.