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Fonte: O Globo
[02/02/09]  Diante de alternativas à telefonia tradicional, mercado discute necessidade de cobrança da tarifa - por Elis Monteiro

RIO - Telefonia fixa baseada em alternativas tecnológicas é a promessa de empresas como Embratel, Net, GVT e TIM, que dão novos ares a um mercado até então estagnado ao explorarem, com a anuência da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), novas modalidades de serviços, vendidos sob a forma de linhas fixas. São aparelhos muito parecidos com aqueles que temos em casa mas que, em vez do velho e gasto par de cobre, usam tecnologias como CDMA (caso do Livre, da Embratel), Voz sobre IP (Net Fone) e até telefonia celular (TIM Fixo).

Mudam a tecnologia e a forma de tarifação do serviço fixo, uma vez que estas empresas passaram a montar pacotes que em alguns casos trazem assinatura embutida e, noutros, tarifa zero. É necessário, no entanto, ressaltar que há sempre uma cobrança fixa, mesmo que pequena ou através de franquia.
A idéia é seduzir preferencialmente o público que não deseja ou não pode pagar pela assinatura básica de telefonia fixa, os cerca de R$ 40 incluídos na conta enviada, todo mês, pelas concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC), como Oi, Brasil Telecom, CTBC, Telefonica e Sercomtel. Tal cobrança, que data do leilão que privatizou o sistema Telebrás, em 1998, vem sendo contestada por entidades de defesa do consumidor e já há dezenas de milhares de processos em tramitação na Justiça alegando a ilegalidade da taxa, que nasceu da necessidade das concessionárias expandirem suas redes.
Para os especialistas, Net Fone, Livre e TIM Fixo podem ser uma forma de tirar o mercado de telefonia fixa do marasmo, que se tornou ainda mais evidente diante da incrível disparidade entre o número de clientes de telefonia móvel e fixa - são mais de 160 milhões de celulares ativados, contra 40 milhões de telefones fixos, somando clientes residenciais e corporativos.

De acordo com Guilherme Zattar, diretor de negócios residenciais da Embratel, o Livre, que tem modalidades pré e pós-pagas, tem 1,8 milhão de clientes, enquanto o Net Fone, serviço da Net (do mesmo grupo da Embratel) já está sendo usado por 1,6 milhão de pessoas. Juntos, os dois produtos somam 3,5 milhões de usuários.

Para assinar o Livre, o usuário escolhe planos a partir de R$ 24, com opção de recarregamento mensal. Há também modalidades pós-pagas com chamadas ilimitadas de fixo para fixo a partir de R$ 50.

- O Brasil tem 33 milhões de linhas fixas residenciais ativas. Net e Embratel têm, juntas, 10% do mercado, conquistados em menos de três anos. Temos 57 milhões de domicílios, mas só 23 milhões têm telefone fixo. Pesquisas indicam, no entanto, que as pessoas têm carência de telefone fixo, porque as tarifas de celulares pré-pagos são muito altas e porque a linha fixa é usada para colocar no currículo e abrir crediário - diz.

O próximo passo para a Embratel é a ampliação da cobertura do Livre para mais cem cidades, o que já foi autorizado pela Anatel. Segundo Guilherme, o plano é chegar a cinco milhões de usuários este ano, apostando principalmente na portabilidade numérica. A Embratel já é responsável por 35% das migrações de fixo, lembrando que o serviço só chegará ao Brasil todo em março.

Outra que aposta na telefonia fixa é a TIM, através do serviço TIM Fixo, que usa a rede celular para determinar a posição do usuário, que escolhe determinado local como "casa". Segundo Walter Aoki, gerente nacional de convergência da TIM, a assinatura básica é uma barreira à adesão de clientes à telefonia fixa. Mirando neste público, a operadora lançou pacotes a partir de R$ 29,90, com direito a 250 minutos de ligações locais para números fixos.

- Segundo pesquisas que realizamos, dos cerca de 35 milhões de clientes de telefonia fixa, 30% afirmaram que gostariam de mudar de operadora porque não estão contentes. É um mercado imenso em expansão, que tem aumentado em função desses novos produtos - diz Valter.

Não acabar com a assinatura mas diminuir seu custo foi a opção da operadora GVT, que aposta na associação entre assinatura fixa (cujo valor não é tão alto quanto o cobrada pelas concessionárias) e pacote de serviços.

- Em telefonia fixa, não havia segmentação de planos para perfis diferentes. Decidimos criar planos que permitem de uma a vinte linhas, assim como a opção por pacotes de minutos e até o uso de linhas diferentes em endereços diversos - diz Ricardo Sanfelice, diretor de marketing e produtos da GVT.

De quebra, as empresas oferecem serviços típicos de celular nos aparelhos "fixos" instalados na casa do cliente, tais como identificador de chamadas, secretária eletrônica e envio de torpedos.

- De oito anos para cá, as concessionárias só perderam linhas, enquanto as atacantes (autorizatárias) só fazem crescer - diz Ricardo.

Nadando contra a maré, as concessionárias insistem na cobrança da assinatura, prevista em contrato. Contrato este que exige, em contrapartida, metas de universalização de linhas fixas e de Postos de Serviços de Telecomunicações (PSTs). O problema é que, segundo a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Pro Teste), tal universalização deixou de ser feita, sem que a tarifa da assinatura tenha baixado ou sido eliminada. Agora, a discussão passa pela expansão de novas redes de banda larga e o uso da renda obtida com a assinatura para viabilizar este processo.

A causa da polêmica é que há dois meses as concessionárias estão praticando uma tarifa ajustada para um conjunto de metas de universalização, só que uma das obrigações está suspensa por liminar que invalidou provisoriamente a vigência da implantação da infraestrutura de rede de banda larga.

Além da concorrência, que milita contra a assinatura de fixo em causa própria, a Pro Teste é responsável por trazer à tona discussões regulatórias sobre a cobrança. Segundo a advogada Flávia Lefevre, fundadora da Pro Teste e representante dos usuários no conselho consultivo da Anatel, a assinatura inviabiliza que mais pessoas tenham acesso às linhas fixas, ficando reféns de celulares pré-pagos.

- Estes pagam a quarta tarifa mais cara do planeta. Isso é ilegal e afronta o princípio à garantia ao direito a um serviço público essencial - diz.

De acordo com João de Deus Pinheiro de Macêdo, diretor de Planejamento Executivo da Oi, não pode ser esquecida a alta carga tributária praticada no Brasil. João lembra ainda que a assinatura básica não é prática exclusiva do mercado brasileiro, mas de todos os países, com exceção de Guatemala e Irã.

- Temos a maior carga tributária do mundo. Dos R$ 40 pagos pelo consumidor, ele entrega um cheque de R$ 27 à concessionária e R$ 13 ao governo. O poder público tem meios de atenuar a questão do imposto. O IPTU e o IR são proporcionais à renda, mas a telefonia não é - diz João.

Em abril de 2008, o decreto do novo Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU) - que no fim das contas desagua na manutenção da cobrança da assinatura, segundo Flávia - foi o estopim para o início de novas discussões relativas às obrigações de universalização de telefonia fixa pelas concessionárias.

Segundo Flávia, estas pressionam o governo e a Anatel com o intuito de trocar os PSTs pela ampliação das redes de banda larga (backhaul). Isso implicaria, diz Flávia, em ilegalidade, uma vez que a concessão refere-se ao serviço de STFC (telefonia) e não de banda larga. Para barrar o decreto, a Pro Teste conseguiu liminar, em novembro de 2008, que impede a troca de obrigações.

- O backhaul não está descrito como meta de universalização - diz Flávia.

A preocupação, diz a advogada, é a utilização de dinheiro público (proveniente da exploração dos serviços de STFC) na construção de redes privadas de banda larga.

Para renovar os contratos de concessão (que agora valem até 2025), as concessionárias de telefonia fixa tiveram que provar à Anatel o cumprimento, até dezembro de 2005, das metas de universalização dos serviços de STFC, através da criação de PSTs e expansão da cobertura de fixo. Mas, segundo Flávia Lefevre, depois de 2006 as metas deixaram de ser cumpridas.

- Algumas concessionárias implantaram parte das PSTs, mas a Abrafix (Associação Brasileira de Concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado) bateu à porta do Ministério das Comunicações pedindo troca de metas. Elas (concessionárias) nunca quiseram fazer PST nenhum e, através do decreto, conseguiram trocar de metas e ainda criar o link com o programa Banda Larga nas Escolas. Enquanto isso, suspendeu-se o cumprimento das metas por dois anos - diz Flávia.

A advogada lembra que no Brasil há 20 telefones para cada cem indivíduos, mas há estados em que a relação é de oito linhas para cada cem habitantes.

- Os mais pobres não conseguem ter telefone fixo porque a assinatura é muito cara. O que a Pro Teste pede é que não exista meta alguma - nem para novos PSTs nem para expansão do backhaul. Pedimos apenas a redução no preço da assinatura básica ou sua extinção.

João de Deus, da Oi, rebate as acusações de Flávia, afirmando que ela faz confusão na questão da infraestrutura relativa à banda larga - propositalmente - usando as preposições "de" e "para" - para justificar os argumentos.

- A ação usa um exercício mental cujo objetivo não é discutir reversibilidade do backhaul nem troca dos PSTs por infraestrutura que permita banda larga, é um discurso sorrateiro. Os PSTs são internet via linha discada, ou seja, não têm futuro algum. Antes que eles virassem esqueletos, resolvemos substitui-los por uma infraestrutura que permita banda larga, que é de regime público, não confundindo com estrutura de banda larga, que é regime privado - explica. - Hoje, 100% da banda larga ativada por empresas de telefonia fixa tem como suporte a rede de STFC, que continua em regime público.

E quanto às metas de universalização, a Oi chegou a cumpri-las?

- As obrigações de universalização não são como pipocas, que surgem e somem. Elas surgem e ficam. Os orelhões estão aí, as redes para pequenas cidades estão aí. O investimento para oferta de serviços que visam a universalizar a telefonia geram imenso custo de manutenção e continuidade. E você continua com esses custos para sempre - diz João. - A partir de 2008, tínhamos como meta a implantação de mil PSTs e nós os colocamos, mas veio um decreto suspendendo a instalação e os PSTs foram perdidos. A advogada (Flávia) usa técnicas de difamação baseadas em falsa argumentação.

E a Anatel, como fica nesse imbróglio? Seria possível rever os contratos e retirar deles a cláusula que garante a renda advinda da assinatura básica, que segundo a Abrafix corresponde a um terço das receitas do setor? De acordo com Gilberto Alves, superintendente de serviços públicos da Agência, quando assina o serviço de telefonia fixa o usuário tem acesso a infraestrutura individual: um par de cobre sai do aparelho dentro de casa e vai até à central telefônica. Isso difere a telefonia de serviços como água e luz, cujas redes são coletivas.

- Você imobiliza parte do equipamento, que precisa ser remunerado, dependendo do uso ou não. O conceito da assinatura está presente em todos os serviços e sempre há tarifa associada. Nos contratos de telefonia fixa há aspectos legais, direitos de prestação de serviços que não são simples de reverter, já que se trata de fonte garantida de recursos - diz Gilberto. - Uma vez cumpridas as obrigações contratuais, como tirar a assinatura, já que nem a União nem as concessionárias denunciaram, à Agência, um desequilíbrio nos contratos?

Mas e diante de milhares de processos tramitando na Justiça, será que não seria hora de ouvir a opinião dos usuários sobre tal cobrança?

- Nos últimos três anos, os aumentos da tarifa foram menores que a inflação, o que já é visto como redução no valor. A necessidade da assinatura do ponto de vista técnico é razoável. Sabemos, no entanto, que o sentimento do usuário vai no sentido de pagar menos. Em consultas públicas que publicaremos muitas questões serão tratadas, inclusive a tarifária. Há, de nossa parte, o reconhecimento de que os contratos precisam ser revisitados periodicamente.

E quanto às acusações da Pro Teste de que as operadoras pressionam a Agência e o governo com o intuito de não cumprir metas e de usar recursos provenientes do STFC (estando incluso, aqui, o valor da assinatura paga pelos clientes) para criação de infraestrutura de banda larga?

- Em vez de instalar algo superado (os PSTs), é melhor trazer uma solução moderna e com perspectivas de futuro. Agora você me pergunta: e se diminuísse o valor da assinatura? Quem precisa de PST e de backhaul não é o pessoal de São Paulo, e sim as pessoas que moram no interior, que dependem de um aparelho que nem traz retorno às concessionárias. É preciso haver uma forma de compensação dos grandes centros em relação às pequenas localidades, que de outra forma nem seriam atendidas - diz o superintendente da Anatel.

Em nota, a Abrafix diz que "a eliminação da assinatura representaria uma quebra contratual sem precedentes no Brasil e, se adotada de maneira isolada, determinaria a inviabilidade econômico-financeira das concessionárias". Diz ainda que "qualquer decisão contra a taxa da assinatura básica é passível de recurso por parte das concessionárias, pois se trata de um serviço de telefonia operado com concessão da União por meio de regulação de competência da Anatel.".

Sobre a competição das autorizatárias no mercado de telefonia fixa e o lançamento de novos produtos, a Abrafix diz que "as operadoras que informam que não cobram tarifas de assinatura têm pacotes mínimos de consumo de minutos e tarifas de uso muito acima das cobradas pelas concessionárias de serviço telefônico fixo local. Diante disso, é clara a distinção dos cenários em relação às operadoras fixas locais, que estão sujeitas à obrigação de universalização".