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Fonte: Tele.Síntese
[11/04/12]   O futuro da concessão da telefonia fixa - por José Roberto de Souza Pinto (*)

Para assegurar a continuidade dos serviços públicos, Jose Roberto Pinto propõe que as atuais concessões de telefonia fixa passem a ser concessões de rede.

A estruturação dos serviços de telecomunicações no Brasil, consolidada a partir da Lei Geral de Telecomunicações – LGT (Lei 9472 de julho de 1997) trouxe para o cidadão um crescimento enorme na oferta dos serviços de telefonia. Primeiro na telefonia fixa que saiu de cerca de 11 milhões de linhas de assinantes para mais de 40 milhões num período relativamente curto de 3 anos.

No momento da reforma do setor, a telefonia móvel celular estava engatinhando e o acesso à internet em banda larga estava restrito às grandes empresas usuárias de serviços de telecomunicações.

Este cenário dos serviços de telefonia móvel celular logo se alterou experimentando taxas de crescimento elevadas e, no final de 2011, atingiu a marca de 242 milhões de linhas de assinantes.

Por outro lado, a telefonia fixa se estabilizou na faixa de 40 milhões de linhas de assinantes, fruto do elevado preço da assinatura básica local, que inacreditavelmente teve esta tarifa aumentada ano a ano e principalmente pela falta de competição neste segmento de telefonia fixa.

Os usuários, apesar dos preços elevadas dos serviços de telefonia móvel celular, preferiram pagar mais e fugir da parcela fixa da assinatura, optando pelos celulares pré-pagos (80% dos terminais móveis estão em planos de serviço pré-pago), onde a alternativa de controle da utilização e do custo parecia ser mais razoável.

Recentemente, após a regulamentação da portabilidade numérica aplicada as telefonia fixa e móvel, e com o crescimento da demanda por acessos à internet em banda larga, a telefonia fixa ganhou uma sobrevida e sofreu um incremento, motivado basicamente pela introdução da competição nestes dois segmentos de serviços. Dados recentes de janeiro de 2012 indicam que foram realizados 17 milhões de pedidos de troca de operadora e que cerca de 36% destes foram de assinantes da telefonia fixa. Neste esforço de sobrevida a telefonia fixa tinha, em 2011, cerda de 43 milhões de terminais de assinantes.

Outro aspecto que deve ser considerado é o elenco de empresas dispostas a prestar este serviço. Excluindo as concessionárias de telefonia fixa local nas suas áreas de concessão, podemos identificar 20 prestadoras de serviços de telefonia e de acesso à internet em banda larga com uma participação representativa no mercado.

A participação total do conjunto de empresas autorizadas a prestar o serviço de telefonia fixa, as conhecidas como entrantes, já atinge 28% deste mercado.

Novas bases

Estamos em 2012 e os contratos de concessão da telefonia fixa se encerram em 2025 e naquele momento novas bases deverão ser ajustadas entre o poder concedente e as empresas interessadas no objeto da concessão deste serviço de telefonia fixa, ou algo que possa substituí-lo.

Não resta dúvida que a tendência da telefonia fixa é de sofrer queda no número de assinantes, assim como em sua receita. Uma hipótese bastante otimista seria a manutenção dos níveis atuais de assinantes, mas com uma participação no mercado das concessionárias de telefonia fixa inferior a atual e possivelmente não superior a 20 milhões de assinantes, com uma concentração em áreas de baixa ou nenhuma competição. Este quadro já estaria considerando uma posição competitiva destas empresas com preços reduzidos e sem a imposição da assinatura básica.

Devemos também considerar que, no período, novas tecnologias estarão disponíveis no mercado e os serviços tradicionais de voz, como a telefonia, serão substituídos por soluções integradas de voz, dados, textos e imagem com preços bem mais acessíveis à população.

Mantido este cenário, as concessões de telefonia fixa estarão gradativamente perdendo o seu valor, uma vez que a perda de mercado e de receita será iminente e as empresas concessionárias continuarão com os compromissos de universalização e de continuidade do serviço.

Certamente este cenário não interessa ao poder concedente e muito menos às empresas que detem esta concessão.

A possível cobertura de custos destas concessionárias por outros serviços como acessos em banda larga, TV por assinatura e o Serviço Móvel Pessoal (celular para voz e acesso à internet) não é algo recomendável e até irregular. Segundo a regulamentação, estamos tratando de serviços em regimes diferenciados de prestação dos serviços. A telefonia fixa no regime público sobre a égide de contratos de concessão, com compromissos de universalização, entre outros, e os demais serviços no regime privado sobre a égide de termos de autorização.

Soma-se a este cenário uma maior intensidade na competição entre os serviços prestados no regime privado, o que tornaria esta hipótese de subsídios cruzados insustentável.

Temos então que identificar o que estas concessionárias de telefonia fixa têm ainda de grande valor. Neste contexto, visualizamos a sua rede de telecomunicações, composta por uma infraestrutura de prédios, instalações, linhas de dutos, torres, postes e cabos de pares e de fibras ópticas e sistemas de multiplexação e transmissão. Estes recursos, além de suportar os serviços de telefonia fixa nas suas áreas de concessão, suportam também os demais serviços prestados no regime privado, como o acesso à internet em banda larga, à telefonia móvel celular e à TV por assinatura. Há ainda o atendimento às redes corporativas dos grandes clientes, que sem dúvida é a peça de maior rentabilidade, pela demanda agregada e a pela otimização periódica dos recursos da rede.

A atenção dada à questão dos bens reversíveis, que retornarão para a União ao final da concessão passa a ser decisiva, visto que os recursos da rede de telecomunicações, alocados efetivamente para o serviço de telefonia fixa, objeto da concessão, serão irrisórios se comparados com os alocados aos demais serviços prestados no regime privado.

Há que se considerar que grande parte dos investimentos realizados pelas concessionárias na sua rede de telecomunicações há muito tempo são destinados aos demais serviços e não à telefonia fixa, o que certamente vai provocar uma discussão sem precedentes com risco de grandes perdas para ambas as partes e em particular para o usuário consumidor.

A verdade é que cada vez mais estes novos serviços de telecomunicações fazem parte do dia a dia do cidadão, das empresas e das diversas organizações, sendo indispensáveis e, portanto, devem ter alguma garantia de sua continuidade. Outro aspecto é que as demandas são crescentes por bandas de comunicação cada vez mais largas, alocadas para os diversos serviços e consumidores, o que faz com que investimentos em redes de telecomunicações de suporte aos serviços também tenham que ter um grande crescimento.

Transformar a concessão

Imaginar que uma empresa privada focada exclusivamente no atendimento ao mercado possa realizar estes investimentos em rede de telecomunicações sem algum compromisso ou mesmo que o governo, a partir de uma empresa estatal, possa arcar com toda esta responsabilidade, me parece que estamos fadados ao insucesso.

Temos então que encontrar um espaço onde os investimentos sejam realizados para garantir o funcionamento seguro e ininterrupto da rede de telecomunicações e a sua demanda de crescimento gerada pelos serviços privados que serão suportados por esta rede.


Um caminho a ser avaliado seria o de transformar as concessões do serviço de telefonia fixa, o STFC (Serviço de Telefonia Fixa Comutada) numa concessão de rede de telecomunicações. A partir desta opção, seria definido o escopo inicial da rede de telecomunicações que estaria sob este regime de concessão, os compromissos de universalização, de continuidade e de expansão da rede de telecomunicações entre outras.

Este caminho se justifica pelas seguintes razões:

O que a União faria com os recursos da rede de telecomunicações devolvidos?
Passaria a operar a rede e os serviços de telecomunicações através de uma empresa estatal? Ou faria um processo licitatório para escolha de novos concessionários de serviços?

Estas são algumas das perguntas que, se respondidas a tempo, podem facilitar um processo de negociações de grande complexidade que giram em torno de uma solução adequada para o futuro das concessões da telefonia fixa no Brasil.

(*) Jose Roberto de Souza Pinto é engenheiro, mestre em economia e consultor na área de telecomunicações.