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Leia na Fonte: Convergência Digital
[14/03/16]  Uma proposta oportuna, ainda que difícil, para o STFC- por Juarez Quadros do Nascimento

(*) Juarez Quadros do Nascimento é Engenheiro Eletricista, sócio da Orion Consultores Associados e ex-ministro das Comunicações.

A robusta e circunstanciada análise do conselheiro da Anatel, Igor Freitas, propondo ao Conselho Diretor da Agência o encaminhamento ao Poder Executivo de proposta de reorganização da prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC) e, por consequência, de uma alteração distinta da formulada nos processos em andamento para os contratos de concessão e o Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU) é ousada e oportuna, ainda que difícil.

Está claro que a tutela do Estado não é mais necessária se olhado apenas o mercado de voz. Em conformidade com disposições da Lei Geral de Telecomunicações (LGT), o serviço de telefonia fixa está universalizado. Permitam-me, também, lembrar que cabe ao Poder Executivo decidir se quer instituir (banda larga) ou eliminar a prestação de modalidade de serviço (telefonia fixa) no regime público, concomitantemente ou não com sua prestação no regime privado (LGT, art. 18, I), sem depender do Legislativo.

Do mesmo modo, também, está na competência do Executivo a questão pontual dos bens reversíveis. O ano de 2016, ainda que em um confuso cenário político e um delicado cenário econômico, é a última janela temporal propícia para o governo conduzir a tramitação de uma proposta de reorganização da prestação do STFC no Brasil. Portanto, é de suma importância que as autoridades responsáveis pelo setor reflitam sobre os fatos e os conceitos aplicáveis, e orientem um quadro regulatório coerente para esse serviço.

A concessão extinguir-se-á por advento do termo contratual, encampação, caducidade, rescisão e anulação (LGT, art. 112). E pelo parágrafo único, a extinção devolve à União os direitos e deveres relativos à prestação do serviço. Porém, há a hipótese de que os bens reversíveis (se houver) não são, necessariamente, inerentes ao contrato de concessão do STFC (LGT, art. 93, XI). Só haveria reversão dos bens se houvesse necessidade de garantia na prestação do serviço.

A Exposição de Motivos (EM 231/MC/1996), referente à LGT, destaca a responsabilidade que terá o regulador, ao longo da execução do contrato e à luz da evolução tecnológica, de selecionar os ativos que, a cada momento, integrarão o rol de bens reversíveis. Fundamenta o caráter funcional da reversibilidade, e não patrimonial, caracterizando apenas aqueles bens imprescindíveis a prestação do objeto da concessão. Não havendo mais sentido do STFC continuar como serviço explorado em regime público, o serviço poderia ser prestado mediante autorização, expedida pela Anatel, observados os princípios da razoabilidade, proporcionalidade e igualdade (LGT, art. 135).

No Serviço Móvel Pessoal (SMP), as pessoas usam esse serviço e dispensam o STFC. As concessionárias de STFC investem nas redes visando os serviços convergentes e a perecível telefonia fixa, objeto da concessão, perde tráfego, assinantes, receita e valor, com reflexos na sustentabilidade dessas concessões. O interesse público da extinção das concessões de STFC, acordado contratualmente para 2025 (ou adaptação antecipada das outorgas), se insere no contexto regulatório.

Voltando à proposta do Conselheiro. Ela está na competência da Anatel, conforme disposição da LGT (art. 19, III) que lhe permite elaborar e propor ao Presidente da República, por intermédio do Ministro das Comunicações, a adoção da medida a que se refere a mesma Lei (art. 18, I), quanto a instituição ou eliminação da prestação de modalidade de serviço no regime público, concomitantemente ou não com sua prestação no regime privado.

Como propõe o Conselheiro, pode então a Anatel propor que a prestação, no regime público, do STFC se restrinja àquela realizada por meio de acessos coletivos, em terminais de uso público e nas diversas modalidades desse serviço, nas localidades desprovidas da sua prestação por meio de acesso individual ou da prestação do serviço móvel pessoal. Visando subsidiar o referido procedimento propõe então que seja determinada a realização de encaminhamentos internos no âmbito da Anatel, quanto à revisão dos estudos que identificam as áreas já competitivas e a apresentação de proposta de alteração de outros atos regulatórios.

Quanto a revisão dos estudos que identificam as áreas já competitivas e as áreas ainda não competitivas de prestação do STFC, orienta que sejam propostos prazos, metas e formas de adequar a competição naquelas localidades onde isso ainda não foi possível, avaliando quais são os compromissos de interesse da coletividade (LGT, art. 135) necessários para criar um ambiente competitivo e de prestação adequada, nos termos da Análise do Conselheiro.

Pede que sejam apresentadas propostas de alteração do PGO de STFC prestado no regime público (Decreto 6.654/2008), adstrito à prestação do STFC por meio de acesso coletivo em áreas desprovidas de prestação do STFC por meio de acesso individual ou de prestação de SMP; de alteração do PGMU do STFC prestado no regime público (Decreto 7.512/2011), aderente apenas às áreas a que se refere a alteração do PGO; e de minuta de termo de autorização do STFC, contendo compromissos de interesse da coletividade para as áreas ainda não competitivas de prestação do STFC.

Propõe, também, que haja deliberação acerca do resultado dos trabalhos da área técnica, submetendo as propostas à consulta pública (LGT, art. 19, III) e que antes do encaminhamento ao Ministério das Comunicações, seja ouvido o Conselho Consultivo (LGT, art. 35, I e II). Após a realização desses procedimentos, que as propostas sejam encaminhadas à Presidência da República, por intermédio do Ministro de Estado das Comunicações (LGT, art. 19, III), para a aprovação dos decretos.

Com os decretos, propõe considerar que haverá dois cenários de prestação do serviço para as atuais concessionárias:

(i) o de prestação do STFC no regime público, por meio de acesso coletivo (terminal de uso público), em localidades nas quais essa seja a única opção de serviço de telefonia, onde não seja possível a prestação de STFC por meio de acesso individual ou a cobertura de SMP (nesse caso impõe-se a revisão do contrato de concessão frente a nova realidade prevista em Decreto);

e (ii) o de prestação de STFC no regime privado, condicionado por compromissos de interesse da coletividade compatíveis com o nível de competição e de qualidade no município.

Não por último, mas por importante, entendo que o mundo degusta uma mudança da forma, natureza e estrutura de se informar e se comunicar. Essa mudança requer atenção de empresários, legisladores e reguladores em geral, de forma prática e estratégica. Pois, a transformação digital gera disrupção econômica.

Por fim, entendo, também, que as inovações tecnológicas desequilibram as outorgas dos serviços e as empresas que as detêm terão de se adaptar à realidade do mercado. Essas inovações, ainda que imprevisíveis quando na assinatura de contratos com o poder público, são acontecimentos naturais em um mercado sujeito a tecnologias disruptivas, que oportunamente estão sendo consideradas na proposta de reorganização da prestação do STFC. Que o Conselho Diretor da Anatel delibere a respeito e consiga convencer o Poder Executivo, a quem compete a sanção dos atos finais.