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Leia na Fonte: O Globo
[14/02/17]
‘A lei brasileira de telecomunicações’ - por Juarez Quadros do Nascimento
*Juarez Quadros do Nascimento é presidente da Anatel, engenheiro eletricista e
ex-ministro das Comunicações
O PLC 79/2016 tem por objetivo a aceleração do processo de massificação da banda
larga
BRASÍLIA - A proposição de alteração da Lei Geral de Telecomunicações que consta
no projeto de lei da Câmara PLC 79/2016 (PL 3.453/2015, na origem), apresentado
em outubro de 2015, foi inicialmente recepcionada pelo governo da então
presidente Dilma Rousseff. Para tanto, destaco a mensagem presidencial ao
Congresso Nacional (2016); a portaria 1.455, do Ministério das Comunicações
(08/04/2015); e o decreto 8.766 (11/05/2016), todos celebrados no governo Dilma
e, em minha opinião, merecedores de aplausos.
Na sequência, o projeto passou por três comissões específicas na Câmara dos
Deputados e uma comissão do Senado, incluindo audiências públicas, com discussão
além do âmbito do Congresso Nacional, a partir da interação de grupo de trabalho
em pleno governo Dilma, conforme portaria 4.420 do Ministério das Comunicações
(22/09/2015), com vários stakeholders, inclusos representantes da sociedade
civil organizada.
Assim, vale dizer, o projeto teve sequência no governo Temer. Portanto, não se
trata de projeto de um governo específico, mas a continuidade de uma construção
que ocorreu e amadureceu, desde a proposição do projeto de lei, ainda que
atrasada, em outubro de 2015. Entendo que deveria ter ocorrido em 2010, quando
os ativos valiam mais.
Destaco o papel do Poder Legislativo no processo, seja na discussão do projeto,
seja na supervisão de sua execução. Assim sendo, repito, o projeto vem sendo
discutido desde 2015 no Congresso Nacional. As discussões efetuadas na Câmara
dos Deputados foram um desdobramento da consulta pública conduzida pelo
Ministério das Comunicações, com a participação de mais de 56 entidades da
sociedade civil e recebeu mais de 900 contribuições.
Além do papel do Congresso Nacional na elaboração e amadurecimento da proposta,
toda a sua execução, uma vez sancionada em lei, será supervisionada pelo
Tribunal de Contas da União (TCU), órgão de assessoramento do Poder Legislativo.
Assim, consta no projeto que a definição dos investimentos, os termos da
adaptação, e todos os demais procedimentos envolvidos nessas medidas, mediante
políticas públicas, serão supervisionados pelo Poder Legislativo por meio do TCU
e, pelo Poder Executivo, via Advocacia-Geral da União (AGU).
O PLC 79/2016, no momento em tramitação no Senado, já aprovado na Câmara dos
Deputados, determina que todo o ganho econômico decorrente da adaptação da
outorga de concessão em autorização seja convertido em investimentos em
infraestrutura de banda larga nas regiões em que há deficiência na oferta do
serviço.
No referido projeto de lei, não há qualquer disposição que permita doar algum
bem reversível às atuais concessionárias do serviço de telefonia fixa. Qualquer
alegação nesse sentido não é aderente à realidade.
Concomitantemente à tramitação do projeto, mas desvinculado dele, a Anatel,
seguindo regulação em vigor, conduz Termos de Ajuste de Conduta (TACs), dois já
encaminhados ao TCU para análise, penalizando operadoras por descumprimento de
obrigações, trocando investimentos em banda larga e antecipando metas
contratuais, porém acrescidos de valor superior ao das multas, em benefício dos
consumidores.
No contexto do PLC, o valor de R$ 100 bilhões que tem sido mencionado, de modo
desvirtuado, consta do acompanhamento que a Anatel faz dos bens reversíveis e se
refere ao valor de aquisição desses ativos. Tal montante foi o valor despendido
pelas concessionárias na aquisição desses bens. Claro que tais bens não têm mais
esse valor, seja pela depreciação, seja pela inovação tecnológica. Pelo mesmo
acompanhamento, o valor residual desses ativos é em torno de R$ 18 bilhões.
Porém, as avaliações do ganho econômico da adaptação das outorgas serão feitas
por consultorias contratadas pela Anatel e aprovadas pelo TCU, calculando o
fluxo de caixa descontado até o ano de 2025, quando se encerram os contratos de
concessão.
Os usuários de telefonia fixa em áreas deficitárias serão os beneficiados, uma
vez que o PLC 79/2016 traz condicionamentos a serem observados na adaptação da
concessão, dentre os quais a manutenção das condições da prestação do serviço,
nas mesmas condições hoje existentes. Assim, não haverá qualquer retrocesso em
termos de direitos dos consumidores.
O objetivo do projeto é justamente avançar nos direitos do cidadão que vive nas
regiões mais afastadas do Brasil. Por meio desse projeto de lei, será possível
levar cobertura celular e banda larga para os distritos ainda não atendidos.
Hoje o que predomina em grande parte do território nacional não é mais o
telefone fixo, e sim o celular.
Para garantir que esses compromissos sejam honrados, o PLC 79/2016 dispõe como
condição para adaptação do contrato a apresentação de garantias financeiras
firmes. Caso tais compromissos não sejam cumpridos, as garantias serão
executadas.
As concessionárias já não têm o que oferecer para agregar valor ao telefone
fixo. Se o usuário está até um quilômetro da central telefônica, é possível
banda larga com até 10 Mbps. Mas, à medida que aumenta a distância, diminui a
velocidade, que abaixo de 1Mbps já não satisfaz o interessado. Assim, é difícil
oferecer banda larga e outros serviços que não o de voz. Então, não há como
segurar o cliente como usuário do telefone fixo, que prefere o celular.
No Brasil, a telefonia fixa cresceu até o ano de 2014, quando alcançou 45
milhões de telefones fixos, e cresceu 0,7% no ano. Encolheu 3% em 2015, e 4% em
2016, quando reduziu para 41,8 milhões de telefone fixos. Tal redução vem
acontecendo seguindo a tendência mundial de a telefonia fixa se tornar um
serviço fadado à irrelevância. Mundialmente, a redução começou a ocorrer a
partir de 2009, segundo a União Internacional de Telecomunicações.
Apenas a banda larga apresenta resultado positivo ano a ano. Foram 223 milhões
de acessos em 2016, sendo 196,4 milhões móveis e 26,6 milhões fixos. Mas ainda
falta banda larga fixa em 50% dos domicílios brasileiros. A telefonia fixa não
representa mais que um aplicativo adicional às opções do usuário. Hoje, a banda
larga é mais acessível às classes mais ricas do país, enquanto uma elevada
parcela das classes C, D e E permanece sem acesso à internet.
O PLC 79/2016 inova a legislação brasileira de telecomunicações ao permitir
relevância, abrangência e antecipação dos serviços digitais, visando à
necessária aceleração do processo de massificação da banda larga, principalmente
em áreas não atraentes economicamente, assim como em zonas periféricas de
centros urbanos e no interior do país. Não dá para deixar o tempo fazer a sua
parte. A sociedade brasileira tem pressa. Fazer agora será melhor para o Brasil,
do que esperar por 2025.