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Leia na Fonte: Tele.Síntese
[23/01/17]
Bens reversíveis: ainda a polêmica dos números - por Lia Ribeiro Dias
Em carta enviada à redação, a advogada Flavia Lèfevre, conselheira da Proteste,
entidade de defesa dos consumidores, contesta a reportagem “A disputa (política)
pelos valores dos bens reversíveis: R$ 20 bilhões ou R$ 100 bilhões”. Afirma ser
improcedente a conclusão de que a oposição teria se baseado em dados do valor de
compra dos bens à época da privatização do Sistema Telebras ao falar em valores
de R$ 100 bilhões.
Segundo a Proteste, a afirmação é baseada em um relatório do TCU, de 2013.
Trata-se do relatório de auditoria sobre a atuação da Anatel no que se refere à
regulamentação e ao controle, acompanhamento e fiscalização dos bens reversíveis
vinculados ao STFC. De nº 024.646/2014-8, ele acompanha o voto do ministro
relator Benjamim Zymler, aprovado em julho de 2016.
Acontece que os dados nos quais se apoia o TCU se referem ao valor de compra dos
bens reversíveis pelas concessionárias (parte no momento da privatização, e o
restante à substituição e reposição de equipamentos e insumos). É o valor de
aquisição sem depreciação nem amortização. Tanto que o valor apurado em 2011
(veja Tabela 1) é de R$ 108,3 bilhões, o mesmo informado pela Anatel como o
valor dos bens à época da venda do Sistema Telebras atualizado. Da mesma forma,
o valor depreciado (valor dos bens naquele ano, segundo esta metodologia) era de
R$ 17, 3 bilhões. E não poderia ser diferente, pois a fonte primária dos dados é
a mesma. O que confirma a avaliação feita pelo Tele.Síntese. A crítica só
procede pois em uma das frases “valor dos bens à época da privatização” faltou a
palavra atualizado.
Sobre o valor de aquisição dos bens, diz o relatório da Anatel divulgado em
2012, no mesmo dia em que tornou pública a RBR de 2011: “De acordo com esse
relatório, o valor de aquisição dos bens de todas as prestadoras anteriores a
julho de 1998 somam R$ 25,9 bilhões. Entre 1998 até 2005, prazo de validade do
primeiro contrato, o valor chega a R$ 30,9 bilhões e, até 2011, esse valor sobe
para R$ 51,4 bilhões.” Esses valores somam os R$ 108,3 bilhões.
Diz o texto do relatório, na página 7: “Na Tabela 1, mostra-se o valor total de
custo de aquisição dos referidos bens que foram declarados pelas concessionárias
de STFC (grifo nosso). Ressalve-se que foram identificadas inconsistências
nessas RBR (Relação de Bens Reversíveis) e nos procedimentos de controle e
acompanhamento dos bens sob comento, o que indica que esses valores podem não
estar corretos”.
Tabela 1- Valor total dos bens reversíveis em 2010, 2011 e 2013 (R$ bilhões)
Em seguida, o relatório traz uma segunda tabela que “mostra o valor residual dos
bens reversíveis, ou seja, a quantia investida que ainda não foi amortizada”,
fazendo a mesma ressalva sobre inconsistências encontradas nas RDB.
Tabela 2 – Valor não amortizado dos bens reversíveis em 2010, 2011 e 2013 (R$
bilhões)
O objetivo do relatório com essas tabelas, construídas a partir dos mesmos
números usados pela Anatel, era mostrar que estava ocorrendo venda de ativos,
principalmente da Oi, sem o devido acompanhamento por parte do regulador.
Há que se destacar que o TCU considera, tanto neste relatório como em outros,
que a avaliação dos bens reversíveis pelo critério de depreciação e amortização,
no caso dos imóveis, é falha, pois o valor de mercado de um prédio ou um
terreno, via de regra, está longe de corresponder ao valor depreciado. Este foi
o critério adotado na venda das empresas do Sistema Telebras, cuja precificação
baseou-se no fluxo de caixa e na geração de receitas futuras das empresas,
lembra o relatório.
Redes de transporte
Outro número divulgado pela Proteste refere-se ao valor das redes de transporte
(cobre, fibra e rádio) que seria de R$ 70 bilhões, segundo um estudo interno da
Anatel de 2013. Trata-se de uma planilha, sem identificação da fonte, com o
fluxo de caixa das redes de transporte das concessionárias, com projeção até
2030, cinco anos além do término da concessão do STFC. O que torna difícil
cotejar o VPL encontrado com os valores dos bens reversíveis.
Essa simulação de um Modelo de Negócios de redes de transmissão foi realizada,
segundo apurou o Tele.Síntese, para apoiar as discussões pelo Ministério das
Comunicações do Plano de Banda Larga II, que acabou não aprovado pelo governo
Dilma Rousseff.
Naquele momento, uma das hipóteses em debate, era separar a rede de transmissão
(backbone e backhaul) das redes de acesso, mantendo a primeira sob o regime de
concessão e a segunda, sob o regime de autorização.
Procurada, a Anatel não quis se pronunciar sobre o assunto.
STFC sim, redes não
Em sua carta, Flavia Lefèvre reitera que a Proteste e a Campanha Banda Larga
para Todos não são contra que o STFC passe do regime de concessão para a
autorização, mas sim que a infraestrutura vinculada aos contratos de concessão,
hoje sob o regime público, seja transferida para o regime privado.
Abaixo, a íntegra da carta:
“Minha mensagem para você é por conta desta afirmação no artigo:
Tanto os documentos da Anatel quanto os de TCU mencionam os R$ 100 bilhões (na
verdade, R$ 108,3 bi) como o valor à época da privatização. Ou seja, os R$ 100
bilhões contidos no discurso oposicionista não são resultado de nenhum outro
cálculo com outra metodologia. São os valores da época da privatização, sem
depreciação e amortização dos ativos ao longo desses 18 anos.
Esta informação não procede, pois segundo o TCU, como publicou a “Carta Capital”
(foto do documento), em 2013 o valor atualizado dos bens reversíveis era de R$
103 bilhões.
Além disso, nós da Campanha Banda Larga é um Direito Seu não somos contra o
SERVIÇO de telefonia fixa ficar no regime privado, mas sim a INFRAESTRUTURA
vinculada aos contratos de concessão que hoje está sob o regime público e, por
isso, sujeita a tarifas definidas pela ANATEL para comercialização no atacado e
regras de universalização e continuidade e, mais, suportando mais de 50% da
banda larga fixa no Brasil.
Entendemos que é necessário que o Estado cumpra sua obrigação constitucional de
garantir o acesso às telecomunicações e faça investimentos públicos, ainda que
em parcerias privadas com empresas; mas havendo investimentos públicos, as
regras e obrigações devem se dar no regime público, pois não faz nenhum sentido
que o Estado libere recursos para redes privadas, que deveriam estar sujeitas a
regras regulatórias mais pesadas, dado o caráter essencial dessa infraestrutura
para o país como um todo.
Não somos contra a antecipação do fim dos contratos de concessão do STFC. Somos
contra, especialmente porque é inconstitucional, a entrega dos bens reversíveis,
pois a avaliação do sistema Telebras na época da privatização foi feito com base
na regra do art. 102 da LGT, que diz expressamente que a posse desses bens deve
ser transferida automaticamente para a União ao fim das concessões.
Também somos contra que as novas redes implantadas com recursos públicos fiquem
no regime privado e sem compromissos com políticas voltadas para inclusão
digital.”