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Leia na Fonte: Observatório da Internet
[19/04/03]  Retomada discussão sobre Marco Civil da Internet - por Koichi Kameda e Marília Monteiro

O Projeto de Lei 2.126/2011 foi tema de dois seminários produzidos em Brasília, o primeiro uma parceria entre o CTS-FGV e ABERT e outro promovido pela ABRANET.

Na última quarta-feira (17), o CTS-FGV e a ABERT promoveram um seminário para debater alguns dos principais pontos do Marco Civil da Internet, entre os quais a neutralidade da rede e a responsabilidade de provedores por conteúdo postado por terceiros. Esses temas também estão entre os mais controversos, sobretudo a neutralidade de rede, apontada como a razão para o atraso na votação do projeto pela Câmara dos Deputados. No ano passado, a votação do projeto foi adiada seis vezes.

O Projeto de Lei 2.126/2011, número de tramitação do Marco Civil da Internet, traça as bases, as diretrizes e os princípios básicos para o uso da Internet no Brasil. O texto se divide em cinco temas principais: (1) fundamentos, princípios e objetivos; (2) direitos e garantias dos usuários; (3) a responsabilidade dos provedores de internet; (4) a guarda de registros e (5) neutralidade de rede. [1]

A seguir, traremos as principais discussões dos eventos da semana, com ênfase nos temas que nortearam os debates entre membros da indústria, academia, governo e sociedade civil.

Neutralidade da rede

Um dos pontos centrais debatidos no seminário foi a neutralidade de rede, tema do primeiro painel, participação do ex-conselheiro do CADE, Olavo Chinaglia, e do professor do CTS/FGV, Carlos Affonso, e moderação do presidente da ABERT, Daniel Slaviero.

Sob o argumento de que a neutralidade é um princípio importante para a garantia da competição na internet e incentivo à inovação, Chinaglia defendeu a continuidade do princípio tal qual previsto no texto do projeto de lei que vem se arrastando na Câmara dos Deputados:

“Quando se faz referência à neutralidade de rede do ponto de vista concorrencial, não se está pensando em termos lógicos ou de engenharia, mas a possibilidade ou não dos controladores das redes que dão suporte ao serviço possam controlar os fluxos de dados conforme sua origem ou sua natureza. Eles não podem ter uma vantagem em relação aos demais prestadores de serviço”.

A neutralidade de rede tem sido apontada como uma das principais razões para a demora na votação do projeto no âmbito do Congresso. As operadoras de telecomunicação são contrárias ao princípio, por entenderem que feriria a liberdade para adoção de práticas de mercado que considerarem mais convenientes.

Nos últimos dez anos, o Cade avaliou três casos emblemáticos sobre práticas concorrenciais das empresas de telecomunicação em processos sobre interconexão fixa, móvel e de oferta de linha dedicada – EILD.
Em todos esses casos, os controladores da rede eram os fornecedores do insumo e, ao mesmo tempo, concorrentes, tendo, portanto, os incentivos econômicos e condições estruturais para fazerem uso de práticas discriminatórias. Por isso, seria fundamental assegurar o princípio de neutralidade da rede:

“Quem pode assegurar que, ao propor um modelo de negócios com base na diferenciação dos clientes, as detentoras de redes não adotarão mecanismos que vão favorecer os conteúdos gerados por seus grupos? Não há como assegurar, nem há como não garantir. O importante, portanto, é que os modelos de negócios sejam neutros do ponto de vista da concorrência”, reforçou Chinaglia.

Ainda segundo o ex-conselheiro do CADE, só a garantia da neutralidade não é suficiente, dependendo de enforcement e de um ambiente de efetiva proteção ao princípio no serviço de provimento de acesso à Internet.

Além da inovação, segundo Carlos Affonso, o debate sobre neutralidade da rede também afeta o direito de escolha do consumidor a respeito dos serviços que vai usar, bem como o exercício da liberdade de expressão. Para o professor do CTS-FGV, os dados que trafegam na internet devem ser tratados de forma isonômica: “Não se deve diferenciar por causa da origem, do site, do usuário.”

Responsabilidade de Provedores

A responsabilidade dos provedores de Internet por conteúdo postado por terceiros foi um dos grandes temas dos debates envolvendo o Marco Civil nessa semana. O tema é importante, quando um dos mais controversos durante as fases de elaboração do texto do projeto de lei. Ainda é um dos temas responsáveis pelos adiamentos de votação do projeto de lei.

A regulação da responsabilidade dos provedores é de crucial importância, quando protege dois valores essenciais para a Internet:
(1) a proteção de direitos fundamentais como a liberdade de expressão e o devido processo legal e a
(2) inovação, pois confere segurança jurídica a empresas e aos usuários na rede.
A ausência de balizamentos legais qualificados proporciona às empresas e aos usuários um cenário de insegurança jurídica, na medida em que propicia decisões judiciais das mais variadas pelos tribunais brasileiros.

Para a Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Nancy Andrighi, a regulação dessa conduta não deve ser de iniciativa do Poder Judiciário. Além disso, a Ministra admite a dificuldade enfrentada pelos magistrados na solução de lides envolvendo condutas na rede:
“A preocupação é não deixar o projeto cair no esquecimento para não ficar nas mãos do Judiciário decidir sobre essa matéria. A proposta evidencia a preocupação do legislador com uma lacuna que para o Judiciário é muito difícil. Não se sabe efetivamente se estamos tutelando de forma justa e eficiente as inúmeras relações advindas do uso dessa rede mundial de computadores, matéria complexa para juízes que como eu estão na magistratura há 37 anos.”

A responsabilidade dos provedores de Internet no texto do Marco Civil se encontra da seguinte forma:

Art. 15. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e evitar a censura, o provedor de aplicações de Internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

§ 1º A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.

§ 2º O disposto neste artigo não se aplica quando se tratar de infração a direitos de autor ou a direitos conexos.

Participantes do Seminário promovido entre CTS-FGV e Abert defenderam a remoção de conteúdo sem necessidade de uma autorização judicial para a defesa de direitos autorais, conforme consta no parágrafo segundo do artigo 15 do Projeto de Lei 2.126/2011. Alguns especialistas acreditam que a remoção de conteúdos de caráter subjetivo não deve ser feita sem uma decisão judicial, sobretudo em defesa dos princípios da ampla defesa e inafastabilidade do Poder Judiciário.

Contudo, a Ministra Nancy Andrighi, responsável pela relatoria de quase todos os processos envolvendo responsabilidade de provedores no STJ, acredita que conteúdos subjetivos podem sim serem afastados da apreciação do Poder Judiciário, uma vez que os magistrados têm dificuldade em acompanhar inovações. E admite por fim que suas decisões foram tomadas sem embasamento legal:
“Tudo o que a Vossa Excelência puder afastar do Judiciário estará fazendo um bem. Primeiro ao cidadão. Depois ao próprio Poder Judiciário”. [2]

Os participantes defenderam uma tramitação mais rápida do projeto na Câmara dos Deputados e o Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, defendeu sua votação:
“O governo é o autor desse importante projeto. Embora tenha havido alterações, achamos que ele está adequado e que deve ser aprovado. Sua redação está em ponto de equilíbrio”.

[1] Os temas estão detalhados no Relatório Brasileiro de Políticas Digitais 2011, disponível na página principal.
[2] Globo TV < http://globotv.globo.com/rede-globo/bom-dia-brasil/t/edicoes/v/marco-civil-da-internet-volta-a-ser-discutido-nesta-quarta-17/2523613/ >

Observatório Brasileiro de Políticas Digitais - Quem somos

O Observatório Brasileiro de Políticas Digitais é um projeto desenvolvido em parceria entre o Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio e o Comitê Gestor da Internet no Brasil.
Sobre o CTS/FGV
O CTS é o Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro. Sua missão institucional é estudar as implicações jurídicas, sociais e culturais advindas do avanço da tecnologia da informação, desenvolvendo projetos relacionados àquelas áreas. O termo “sociedade” denota, assim, a abertura disciplinar do CTS para as áreas não jurídicas. No campo específico do direito, o CTS desenvolve estudos e projetos principalmente nas seguintes áreas:
Propriedade Intelectual
Software Livre
Governança da Internet
Privacidade na Internet
Em todos estes campos, o foco do CTS é sempre de fomentar a inovação. Neste sentido, o CTS desenvolve atividades de pesquisa e consultoria para órgãos públicos e entidades privadas, contribuindo para a formulação de políticas públicas e para a implantação de práticas privadas inovadoras.

Sobre o CGI.br
O Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) foi criado pela Portaria Interministerial nº 147, de 31 de maio de 1995 e alterada pelo Decreto Presidencial nº 4.829, de 3 de setembro de 2003, para coordenar e integrar todas as iniciativas de serviços Internet no país, promovendo a qualidade técnica, a inovação e a disseminação dos serviços ofertados.

Composto por membros do governo, do setor empresarial, do terceiro setor e da comunidade acadêmica, o CGI.br representa um modelo de governança na Internet pioneiro no que diz respeito à efetivação da participação da sociedade nas decisões envolvendo a implantação, administração e uso da rede. Com base nos princípios de multilateralidade, transparência e democracia, desde julho de 2004 o CGI.br elege democraticamente seus representantes da sociedade civil para participar das deliberações e debater prioridades para a internet, junto com o governo. (...)