WirelessBRASIL |
|
WirelessBrasil --> Bloco Tecnologia --> Crimes Digitais, Marco Civil da Internet e Neutralidade da Rede --> Índice de artigos e notícias --> 2013
Obs: Os links originais das fontes, indicados nas transcrições, podem ter sido descontinuados ao longo do tempo
Leia na
Fonte: O Estado de S.Paulo
[09/08/13]
Marco da internet é urgente - Editorial Estadão
As revelações feitas por um ex-agente de inteligência norte-americano, Eduardo
Snowden, geraram no Brasil surpresa e indignação e despertaram o governo para a
necessidade de aprovação do Marco Civil da Internet. A "surpresa" é pouco
justificável. Afinal, não é de hoje que os meios de telecomunicação são
"acompanhados" sob os mais diversos pretextos, entre eles a prevenção de ações
terroristas. Claro que, com a internet e o uso extensivo da "nuvem", tanto na
guarda de dados pessoais e correspondências como no próprio processamento da
informação, aumenta a possibilidade de "acompanhamento", especialmente quando há
a colaboração de empresas do setor ou quando se exploram facilidades
eventualmente embutidas em roteadores e equipamentos de comutação críticos - as
chamadas backdoors.
Já a indignação procede totalmente, e cabe aos governos buscar a melhor forma de
proteger seus cidadãos contra o acesso indevido a seus dados pessoais e sua
navegação, expostos à bisbilhotice internacional.
Enquanto isso, o projeto do Marco Civil, originário do trabalho pioneiro do
Comitê Gestor da Internet (CGI) no Brasil - que em 2009 havia aprovado e
publicado os Princípios para a governança e uso da internet, um decálogo
elogiado pela comunidade internacional -, está há anos no Congresso, à espera de
aprovação.
Apesar de o projeto ter sido discutido durante anos, obtendo o consenso dos
usuários, há quem adie sua análise em plenário sob o argumento de que existe
"algo a consertar ou melhorar que ajudaria sua aprovação final". Enquanto outras
leis criminalizando ações na rede passam olimpicamente, o Marco Civil marca
passo. Mesmo que os que propõem "acréscimos" ou "melhorias" em seu texto o façam
de boa-fé, esquecem-se eles de que o Marco Civil define princípios, não dispondo
sobre modelos econômicos ou sobre tarifas e qualidade da internet. Os pilares do
projeto do Marco Civil são a proteção à privacidade, a manutenção da
neutralidade da rede e a correta responsabilização da cadeia de atores, eximindo
a rede em si dos malfeitos que nela acontecem.
É uma falácia atribuir ao Marco Civil o condão de impedir a "bisbilhotice" na
rede. É o equivalente a imaginar que uma lei sobre roubos fará com que eles
inexistam. Ora, o Marco Civil serve essencialmente para balizar os direitos e
deveres dos partícipes da rede e identificar ações potencialmente danosas. O
Marco não impedirá que os espiões espionem, mas deixará mais claro quais
direitos foram violados, além de garantir, ao cidadão, a liberdade de expressão
e, à iniciativa privada, a possibilidade de competir no cenário de rede sem
estar exposta a riscos de interpretação legal que a coloquem como corresponsável
por eventuais abusos dos usuários finais da internet.
O segundo ponto diz respeito ao próprio CGI, cuja estrutura multissetorial e
caráter não regulatório sempre mereceram reconhecimento como paradigma de uma
gestão adequada da rede. O Brasil marcou, com a criação do CGI, em 1995, seu
protagonismo na proposição de um modelo de governança da internet. A gestão
multissetorial (multistakeholder) é vista como a única adequada a um ambiente
tão diverso, rico e aberto à participação de todos como é a internet.
As ações do CGI para aumentar a segurança do tráfego de dados e reunir
estatísticas sobre a tecnologia de informação tornaram-se "termômetro" no
ambiente da internet e na difícil tarefa de tentar entender o que as redes
sociais representam - sua forma de atuação que, cada vez mais, surpreende,
estimula, engaja, potencializa e, eventualmente, atemoriza.
A proteção desse ambiente e de seus habitantes se torna cada vez mais
importante. A privacidade do indivíduo, a neutralidade da internet e a
responsabilização adequada da cadeia produtiva, que não iniba a criatividade e o
empreendedorismo, precisam ser consolidadas. O Marco Civil é a forma de
consolidar os princípios que ordenam a internet.
Urge, portanto, a aprovação do Marco Civil, sem deformações casuísticas e não
pertinentes a uma carta de princípios.