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[17/12/13]  Ficou para 2014... - por Mariana Mazza

2014 vai ser um ano agitado, para dizer o mínimo. Teremos Copa do Mundo, eleições... E, de acordo com a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, teremos também a aprovação do Marco Civil da Internet. Depois de meses de debates, pressões, discursos presidenciais em defesa da soberania brasileira e da preservação dos direitos civis na web, o projeto alçado a salvador da pátria ficou novamente para depois. O Marco Civil passará seu segundo réveillon aguardando pacientemente na gaveta da mesa do Plenário da Câmara dos Deputados.

A ministra Ideli tem razão em um aspecto. "Este ano acabou", disse ela em entrevista a jornalistas para justificar a transferência do projeto para a agenda de 2014. O governo, no entanto, pretende manter a "urgência" da proposta, fazendo com que o Marco Civil torne-se o principal obstáculo para as votações na Câmara no próximo ano. Ano este que, por conta das eleições, tradicionalmente é mais curto para o Legislativo, tornando as poucas votações possíveis preciosas para os parlamentares.

O projeto foi colocado em regime de urgência em uma estratégia política depois das denúncias feitas pelo ex-agente da NSA Edward Snowden de que o Brasil - especialmente a presidente Dilma Rousseff - foi alvo da espionagem eletrônica norte-americana. A jogada era colocar o Brasil à frente da cruzada contra a bisbilhotagem diplomática, aprovando uma lei com o que existe de melhor nos novos debates sobre governança de Internet e liberdade na rede.

Mas, passado o alvoroço causado pelas denúncias de espionagem norte-americana, a manutenção da urgência transformou-se em risco para o tão sonhado Marco Civil. Sob a pressão de destravar a pauta, os deputados pouco a pouco têm se mostrado mais dispostos a ceder e concordar com um texto mais flexível, na esperança de assegurar um acordo que permita a aprovação.

Como em toda discussão em que os interesses envolvidos são frontalmente opostos, as últimas mudanças feitas no projeto agradaram um pólo e desagradaram outro. No momento, o principal núcleo opositor, as teles, foram as beneficiadas. A principal alteração foi incluir no texto a garantia de que as empresas de telecomunicações terão plena liberdade para criar novos planos de negócio, desde que os pacotes respeitem os novos princípios legais, como o da neutralidade - que proíbe as empresas de darem tratamento diferenciado no tráfego dos dados na rede. As companhias telefônicas gostaram da mudança e passaram a apoiar o Marco Civil. Mas essa e outras mudanças afastaram antigos apoiadores.

Ontem, a primeira baixa foi registrada. O Partido Pirata do Brasil, um dos principais movimentos civis em defesa da democratização da informação, divulgou uma nota retirando o apoio ao projeto. Diz a nota: "o Partido Pirata do Brasil reafirma que não apoiará este projeto do Marco Civil da Internet no estado em que se encontra, uma vez que a proposta atual navegou para longe de nossa ideologia, afastando-se sobretudo de nossos princípios de defesa da privacidade, liberdade de expressão e democracia plena, não apresentando nessa última versão benefícios para a sociedade que compensem as absurdas medidas de controle, vigilância e censura agora propostas". Esta é a primeira manifestação civil contra o texto, mas não será a única.

Desde a semana passada, os movimentos sociais têm se reunido e discutido a saída em massa dos debates sobre o Marco Civil. Nesse contexto, é bem provável que o governo, e sua insistência na manutenção da urgência na tramitação da proposta, aprove o Marco Civil sem o apoio da sociedade. Será uma grande contradição. O texto que deveria servir de carta de princípios para proteger a sociedade na Internet pode virar algo que a própria sociedade repudia, um instrumento de censura e reforço de um modelo puramente comercial da Internet.

Tudo pode ficar ainda mais intenso se Edward Snowden, que divulgou hoje uma carta aberta ao povo brasileiro pedindo apoio para que o governo lhe conceda asilo, entrar com um pedido formal na diplomacia. Se isso acontecer, será a segunda tentativa. Quando saiu dos Estados Unidos, Snowden pediu asilo a 21 países, entre eles o Brasil. Mas, como tudo ocorreu antes de sermos envolvidos pessoalmente na mega trama de espionagem, foi bem mais fácil negar a solicitação. Um segundo pedido pode colocar o governo em uma saia justa. 2014 vai ser mesmo um ano agitado.