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[08/07/13]  Espionagem e o Marco Civil: a pressa (na votação) é má conselheira - por Cristina de Luca

As denúncias de que o Brasil teve ligações e e-mails espionados pela Agência de Segurança Nacional (NSA) levaram o governo a se articular para acelerar a votação do Marco Civil da Internet, texto que tramita há mais de dois anos e que determina direitos e deveres fundamentais dos brasileiros na internet.

Entre os direitos previstos no Marco Civil estão a inviolabilidade e o sigilo das comunicações do usuário pela internet, salvo por ordem judicial, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Outro direito assegurado ao usuário é o não fornecimento a terceiros de seus registros de conexão e de acesso a aplicações de internet.

O PL do Marco Civil já foi levado a votação na Câmara outras vezes, mas ela não ocorreu por conta de pressões de setores afetados pela medida, principalmente o setor de telecomunicações. Além da guarda de informações, outros elementos como a neutralidade da rede e o direito autoral travaram o debate.

A ministra Ideli Salvatti, das Relações Institucionais, convocou a imprensa nesta segunda-feira no Palácio do Planalto para avisar que encontrará nesta tarde o vice-presidente, Michel Temer, e o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, para pedir celeridade para que o texto seja votado ainda nesta semana, antes do fim do recesso.

“O que vou fazer neste momento é garantir com o presidente da Câmara que nós possamos ter um movimento ágil, efetivo, urgente do Congresso”, disse Ideli.

Questionada sobre os conflitos de interesses que impediram o projeto de seguir para votação anteriormente, Ideli disse que o fato de a privacidade dos cidadãos estar em cheque torna o tema prioritário. “Todo e qualquer conflito de interesse fica em segundo, terceiro, quarto planos”.

Segundo a ministra, ela conversou ontem à noite com o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), relator do Marco Civil da internet. Ela disse que o texto de Molon, porém, pode ter de sofrer ajustes quanto à guarda de informações da rede, por causa do fato revelado pelo jornal O Globo, no sentido de tornar mais rígida a regra para guarda de informações.

“Talvez o ponto primordial nesse projeto seja exatamente o da guarda das informações, do trânsito pela rede. Precisamos reafirmar, de forma muito firme, que a guarda dessas informações só possa ser feita no Brasil”.

A guarda de log é um dos pontos polêmicos do Marco Civil. O pomo da discórdia, nessa questão? O fato do artigo 12 vetar aos provedores de conexão, onerosa ou gratuita, a guarda do registros de acesso a aplicações de Internet.

O provedor de acesso pode guardar sua conexão à rede, mas não pode guardar os sites que você visitou. Há vários anos, o setor de telecomunicações exerce com eficácia e sigilo a obrigação de guardar informações de conexão dos usuários, como data e hora, duração, o número que está ligando ou enviando a mensagem e o destinatário. Faz o mesmo com a sua conexão à internet.

Onde está o problema então? É que o mesmo artigo 12 faculta ao provedor da aplicação (Google, Facebook. Twitter, HotMail) guardar o log dos registros de acesso dos usuários, respeitado o disposto no art. 7, que determina s inviolabilidade e o sigilo das comunicações pela Internet, salvo por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

As teles querem é o direito de guardar dados pessoais e registros de navegação (do trânsito pela rede), pelo valor comercial e não apenas os logs de acesso.

Não sei quanto a vocês, mas eu não gostaria de ver as teles com os mesmos poderes do Google para identificar o que eu faço ou deixo de fazer na rede. O Google só me identifica dentro dos seus domínios. A tele pode saber tudo o que eu faço na rede.

Por outro lado, em determinados casos (extremos, de crimes) eu gostaria, sim, de ver o Google respeitando a legislação local, sendo obrigado a, por ordem judicial, relacionar o IP a o perfil de um usuário. E também que os dados sensíveis dos usuários brasileiros fossem guardados por Google, Facebook, Twitter, e muitos outros provedores de nuvem, principalmente B2B, fossem armazenados em datacenters localizados no Brasil.

Também preocupa outras ações do governo, como a ideia de defender que a UIT controle à internet. Hoje ninguém controla, muito menos a ICANN, como diz o ministro Paulo Bernardo. O papel da ICANN é de organizar os “nomes e números” da rede, ou seja, os endereços. Na prática, o governo brasileiro está atacando a “lista telefônica” da Internet, quando o grampo acontece na linha telefônica em si, e no serviço internet.

Faria melhor o governo se, além do Marco Civil, desse continuidade ao anteprojeto de lei de proteção de dados pessoais, também parado há mais de dois anos no Ministério da Justiça. O Marco civil e a legislação de proteção de dados pessoais são complementares. Por incrível que pareça, o ministro Paulo Bernardo está correto ao defender que o projeto de lei de Proteção de Dados Pessoais seja concluído e enviado rapidamente ao Congresso.

O governo também deveria correr para tirar do papel os planos de transformar o Brasil em um hub de data centers, conectados a um ponto de troca de tráfego internacional, para que nem todos os nossos dados tenham que ir para for a do país, especialmente para empresas com datacenters nos Estados Unidos.