WirelessBRASIL |
|
WirelessBrasil --> Bloco Tecnologia --> Crimes Digitais, Marco Civil da Internet e Neutralidade da Rede --> Índice de artigos e notícias --> 2013
Obs: Os links originais das fontes, indicados nas transcrições, podem ter sido descontinuados ao longo do tempo
Leia na
Fonte: O Globo
[15/11/13]
Para especialistas, guarda de dados no país é inócua - por Sérgio Matsuura
Empresários do setor de tecnologia consideram que exigência presente no Marco
Civil prejudica a inovação
RIO - Após quase 20 dias trancando a pauta da Câmara, o Marco Civil da Internet
deve ser votado na próxima semana. A expectativa é que a neutralidade na rede
seja mantida, mas a obrigatoriedade da guarda de dados em servidores no país
ainda causa polêmica. De acordo com o relator do projeto, deputado Alessandro
Molon (PT-RJ), o governo vai insistir na questão, já que foi um pedido da
presidente Dilma Rousseff. Porém, especialistas e representantes de empresas de
tecnologia criticam a proposta, considerando-a inócua e prejudicial à inovação.
A decisão de incluir o artigo sobre a guarda de dados em território nacional
surgiu após a revelação de que altos escalões do governo teriam sido alvo da
bisbilhotagem americana. O argumento é que, com as informações armazenadas no
país, a interceptação dos dados seria dificultada. Além disso, a nova regra
aumentaria a segurança jurídica, pois muitas vezes empresas estrangeiras não
cooperam com investigações alegando que as informações estão sujeitas à
legislação dos países onde a matriz está instalada.
O secretário executivo do Comitê Gestor da Internet (CGI.br), Hartmut Glaser,
considera a medida inócua quando se trata da proteção contra a espionagem.
Segundo informações reveladas pelos documentos vazados, parte da captura se dava
nos cabos submarinos que conduzem a informação, sendo que praticamente todos
passam pelos EUA ou países aliados. Contudo, o especialista é favorável ao
armazenamento de dados de brasileiros no país, mas a discussão deveria ser feita
em outro momento.
Sobre a cooperação judicial, o próprio Marco Civil dá conta, no artigo 11,
determinando que a legislação brasileira deve ser respeitada “em qualquer
operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, dados
pessoais ou de comunicações em que pelo menos um desses atos ocorre em
território nacional”, sendo que o disposto se aplica mesmo que as atividades
sejam realizadas por empresa sediada no exterior, desde que tenham representação
no país.
Google: questão é diplomática
Para o diretor de políticas públicas da Google Brasil, Marcel Leonardi, a
proposta do governo é uma “medida draconiana surgida aos 48 minutos do segundo
tempo”. Segundo ele, o mecanismo de cooperação entre os governos já existe.
Trata-se do MLAT (Mutual Legal Assistance Treaty), que o Congresso brasileiro
referendou em 2001. Por meio dele, a Justiça brasileira pode pedir à Justiça
americana documentos que estejam sob sua jurisdição, e vice-versa:
- A reposta é reformar o MLAT, não obrigar o ecossistema de internet a armazenar
dados no Brasil achando que isso vai resolver alguma coisa - afirmou Leonardi
durante a Futurecom, realizada no mês passado, no Rio de Janeiro.
Segundo fontes, a inclusão do artigo no texto do Marco Civil é uma retaliação
política ao caso de espionagem americana. O texto determina que o decreto a ser
publicado pelo Executivo deverá considerar o porte das empresas, o faturamento
no Brasil e a amplitude da oferta do serviço ao público brasileiro. Traduzindo,
endereçado a grandes corporações, como Google e Facebook, apontadas em
documentos vazados por Edward Snowden como colaboradoras nos esquemas de
espionagem.
A iniciativa do governo brasileiro recebeu destaque no “Financial Times”. Em
editorial publicado esta semana no prestigiado jornal britânico, a medida é
vista como negativa para a “liberdade global na internet”. Segundo a publicação,
o mundo pode ser dividido em dois grupos: um liderado pelos EUA, com liberdade
na rede; e outro que controla o acesso, como China, Rússia e Irã.
“Se o Brasil, o segundo maior mercado mundial do Facebook, se tornar um defensor
do protecionismo na internet, outros o seguirão”, diz o texto. “É ruim para o
Brasil, que pode sofrer economicamente, e ruim para a internet, que corre o
risco de entrar numa era de fragmentação e regulação. Dilma precisa pensar
novamente”.
Como o projeto não é claro quanto ao alcance da medida, empresários do setor de
tecnologia estão preocupados. Levantamento realizado pela BigData Corp aponta
que 66% dos sites com extensão “.br” estão hospedados em servidores no exterior.
O principal motivo, explica o diretor executivo da empresa, Thoran Rodrigues, é
o preço. Os custos para utilização de centros de dados no país é cerca de 30%
maior que nos EUA. Na Amazon Web Services, por exemplo, a hora de uso mais
barata em São Paulo custa US$ 0,08, enquanto no estado americano do Oregon o
mesmo serviço sai por US$ 0,06.
- Empresas que atuam com produtos on-line competem com o mundo inteiro. Uma
imposição dessas reduz a nossa competitividade. É um desserviço para o país -
diz Rodrigues.
Com longa experiência no mercado nacional de internet, Paulo Humberg, fundador
dos sites Lokau, Brandsclub e ClickOn, divide seus produtos entre servidores
nacionais e estrangeiros, “dependendo da necessidade”. Segundo o executivo,
mesmo com o custo mais elevado, algumas aplicações rodam melhor quando
hospedadas no país.
- Como o centro de dados está mais perto, a latência é menor. Para negócios que
consideram milissegundos importantes, o melhor é hospedar no país. Mas essa é a
essência da rede, a liberdade de escolher - critica Humberg.