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Fonte: Isto É
[04/10/13]
As bancadas pagam a conta - por Izabelle Torres
Grandes financiadores de campanhas eleitorais, setores estratégicos da economia
representados por lobistas no Congresso agora cobram a fatura dos parlamentares
Para entender os bastidores sempre delicados da convivência entre políticos e o
poder econômico, ISTOÉ acompanhou por duas semanas os movimentos de lobistas de
diferentes setores na Câmara dos Deputados. Limitando a reportagem a
contribuições legais, registradas na Justiça Eleitoral, foi possível presenciar
abordagens cordiais e diretas a parlamentares que devem sua eleição, ao menos em
parte, àqueles cidadãos que garantiram recursos às suas campanhas e que, agora,
se apresentam para cobrar a fatura.
Alguns casos são didáticos. Em debate no Congresso, o novo Código da Mineração
recebeu 372 emendas de 46 parlamentares. Desses, apenas sete não receberam
dinheiro de empresas ligadas à mineração com interesses específicos em cada
artigo que seria votado. Somente o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), apresentou
88 dessas propostas de modificação do texto. Sua ligação com o setor é
inequívoca. O deputado é responsável por indicações para cargos de diretoria do
Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão responsável por
autorizar lavras e fiscalizar as atividades mineradoras, e ainda recebeu ajuda
de empresas do setor para pagar as contas de campanha.
A maior mineradora do País, a Vale, doou R$ 29,96 milhões às principais legendas
em atividade no Congresso. As demais somaram contribuições no valor de R$ 43,3
milhões. Financiaram, inclusive, mais de 20% da campanha do relator do novo
Marco da Mineração, Leonardo Quintão (PMDB-MG). Agora, as mineradoras trabalham
para mudar o projeto original do Executivo. Entre outras coisas, querem impedir
um aumento nos royalties, que passariam de 0,2% a 3% do faturamento líquido para
um teto de 4% sobre o faturamento bruto, mudança que pode dobrar a receita da
União nessa área. Os aliados das mineradoras já conseguiram uma primeira
vitória, que foi retirar o caráter de urgência na decisão, transferindo a
decisão para o fim do ano ou, quem sabe, depois.
A dificuldade dos políticos para enfrentar a pressão de interesses gigantescos
também aparece nos debates sobre o Marco Civil da Internet. O governo está
convencido de que tem votos para aprovar suas propostas. Uma delas prevê a
manutenção da neutralidade da rede, sistema que impede a venda de pacotes, como
querem as teles, que poderiam transformar a internet numa grande tevê a cabo,
onde cada usuário adquire opções variadas de conteúdo, pagando preços diversos
por cada escolha. O outro ponto impede que as teles tenham acesso aos dados dos
usuários, direito limitado aos provedores de conteúdo, como o Google, que impõem
essa condição ao cadastrá-los. O problema é que o regimento reserva ao
presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), o direito de colocar
qualquer o projeto em votação. Sempre que é consultado sobre a possibilidade de
debater o Marco Civil, Eduardo Alves responde que irá fazê-lo depois que as
partes entrarem em acordo com o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RN), identificado
também com os interesses das teles, que despejaram um pacote de quase R$ 30
milhões para os parlamentares capazes de defender seus interesses. A principal
fatia, mais de R$ 26 milhões, foi doada pela empresa Contax, cujos sócios são
também donos da Oi. Os recursos chegaram aos diretórios de dez partidos.
Uma situação semelhante, com o sinal trocado, se assiste no debate que
regulamenta a terceirização de trabalhadores. Um conjunto de 19 mil empresas de
todos os tamanhos contribuiu com R$ 2,5 bilhões para as campanhas de 2010. Três
anos depois, um conjunto de 70 companhias de grande porte atua no Congresso,
para auxiliar a aprovação da matéria, de autoria do deputado-empresário Sandro
Mabel (PR-GO). “É difícil enfrentar o poder financeiro dos interessados,”
reclama o secretário-geral da Força Sindical, Sergio Leite.
Já o agronegócio possui uma bancada fixa de 120 deputados e 16 senadores, sem
falar em adesões eventuais, de acordo com a matéria em votação. Sua batalha
atual é trazer para o Congresso, onde tem maior poder de barganha, a palavra
final sobre a demarcação de terras indígenas. Na semana passada, 1,5 mil índios
de diferentes etnias pararam a área central de Brasília para protestar contra as
mudanças nas demarcações. Os índios fizeram um enterro simbólico de políticos da
bancada ruralista e ministros envolvidos com a proposta. A reação indígena pode
provocar uma reviravolta no desfecho do projeto, que até a semana passada tinha
a aprovação dada como certa, mas perdeu a adesão de muitos parlamentares. A
votação está marcada para esta semana e até lá os índios permanecerão acampados
em Brasília, numa tentativa de vencer o poder do lobby do agronegócio.