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Fonte: Consultor Jurídico
[06/04/14]
Empresa estrangeira pode ter de guardar dados no Brasil - por Coriolano
Almeida Camargo e Cristina Sleiman
*Coriolano Almeida Camargo é advogado e sócio do escritório Almeida Camargo
Advogados.
*Cristina Sleiman é sócia do escritório Cristina Sleiman Sociedade de Advogados.
Especialista em Direito Digital e Propriedade Intelectual.
Após muita discussão, o Marco Civil da Internet foi aprovado pela Câmara dos
Deputados, apesar de muitos sequer acreditarem, vez que a votação fora adiada
inúmeras vezes. Mas qual o real cenário do texto final e suas alterações?
Muito se discutiu sobre a necessidade de armazenamento dos dados no Brasil, ou
seja, data centers alocados em território nacional. Ainda que fosse uma empresa
estrangeira prestadora de serviços no Brasil, teria que obrigatoriamente alocar
seus recursos técnicos no território brasileiro. Entretanto, esta questão, mesmo
existindo divergências, foi retirada do texto, de forma a ser independente o
local de armazenamento.
Pois bem. O texto atual exige o armazenamento de dados por 6 (seis) meses. Sendo
assim, a vítima de qualquer ilícito não poderá “perder” tempo.
Ao analisar o projeto de lei, verifica-se em seu artigo 10, inciso II, que o
provedor responsável pela guarda dos dados de conexão e acessos às aplicações de
internet, bem como dados pessoais, só poderá disponibilizá-los mediante ordem
judicial.
Por conseguinte, o artigo 11 determina que seja aplicada a Lei brasileira sempre
que qualquer operação de coleta e armazenamento ou tratamento de registro
ocorrer em território nacional. Em seu parágrafo primeiro, menciona-se que será
aplicado o disposto no caput do artigo em comento, sempre que os dados forem
coletados em território brasileiro. Assim, se o consumidor preencheu seu
cadastro no Brasil, não há o que se discutir sobre a legislação aplicável.
Entendemos que o local físico do data center seja indiferente no que diz
respeito à obrigação de se atender à lei, tendo em vista a existência de um meio
de comunicação imediato. Vejamos um pensamento prático: se a lei brasileira
exigir a guarda de determinadas informações por seis meses e sua entrega por
ordem judicial, cabe à empresa brasileira ou estrangeira, neste caso, tomar as
devidas providências técnicas e de planejamento, a fim de atender os requisitos
legais. Ou seja, é de sua incumbência se certificar da legislação aplicável e
determinar a melhor estratégia para que a lei seja cumprida.
Em síntese, se uma empresa deseja atuar no Brasil, deverá atender os requisitos
legais. Neste sentido, é o papel preventivo do advogado. Fornecer todas as
informações jurídicas e os respectivos riscos, de sorte a evitar demanda no
setor contencioso de seu cliente.
Tudo é uma questão de planejamento técnico e comunicação. Talvez, seja realmente
necessário, ainda que não seja por força de lei, mas sim, por uma decisão
própria, que a empresa estrangeira armazene os dados em território nacional.
Imaginemos dois pontos:
1. A empresa estrangeira se negue a atender ordem judicial alegando que as
informações estão em solo internacional e que deve atender a lei de seu país,
não sendo possível a entrega dos dados sem um tratado internacional.
2. A lei brasileira exija, como pretende o Marco Civil, que a empresa
estrangeira que queira atuar no Brasil tenha que, obrigatoriamente, armazenar
determinados dados, devendo entregá-los mediante ordem judicial, quando for o
caso.
Ora, no primeiro caso, se assim o for e a empresa realmente quiser atuar no
Brasil, caberá a ela se estabelecer também fisicamente em território nacional, a
fim de que preste seus serviços e cumpra a determinação do ordenamento jurídico
brasileiro. Cristalino está que caberá unicamente à empresa decidir qual
estratégia lhe será mais benéfica visando atender as leis brasileiras, vez que
pode fazer um trâmite de comunicação interna (representando no Brasil recebe as
notificações/ordens judiciais e encaminha à sede localizada em outro país),
desde que tome as precauções de segurança, ou pode promover seu armazenamento já
em território nacional (alocar data centers no Brasil).
Atualmente, quando ocorre um ato ilícito, o juízo determina a identificação dos
IPs e respectivos usuários, com o intuito de se determinar autoria. Quando temos
o envolvimento de empresas estrangeiras, estas, por intermédio de seus
escritórios em território nacional promovem a entrega das informações
solicitadas.
Não podemos deixar que se encontrem brechas e que tentem mudar este cenário que
já funciona. A formalização da Lei deve ser a favor da segurança e proteção do
individuo enquanto ser humano. O documento traz pontos positivos e negativos.
No que tange à neutralidade da internet, podemos observar a tutela pela
igualdade de acesso em relação ao conteúdo, mas não há planos de velocidade
propriamente dito. Sendo assim, não poderão ser vendidas assinaturas por
velocidades diferentes em razão do conteúdo.
No âmbito da responsabilização dos provedores, estes poderão responder
juridicamente pelo descumprimento de ordem judicial e, apenas nos casos de fotos
íntimas, é que o provedor deverá promover a exclusão do conteúdo, mediante
notificação extrajudicial.
Tratando-se do prazo de 6 (seis) meses de obrigatoriedade na guarda dos dados
pelos provedores de aplicativos, cumpre salientar que este período é muito
curto, o qual poderia ser, pelo menos, de 01 (um) ano, como determinado aos
provedores de acesso.
Aplicativos como Snapchat terão que, obrigatoriamente, rever suas formas de uso
em território brasileiro, fator este que pode contribuir positivamente à
sociedade, haja vista que estes têm sido utilizados, por diversas vezes, para
propagação de conteúdos indevidos, como fotos íntimas, inclusive, entre menores
de 18 anos.
Por fim, o que ninguém comenta, mas trata-se de um ponto crucial do texto, é
sobre o dever do Estado na prestação da educação, devendo incluir a capacitação
para o uso seguro, consciente e responsável da internet, pois esta será a única
forma de formar e realmente instruir o cidadão sobre a cultura de ética e
cidadania digital.