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Leia na Fonte: Band / Colunas
[11/02/14]  O dia do contra-ataque - por Mariana Mazza

Desde que Edward Snowden expôs a espionagem global executada pela agência norte-americana de segurança NSA, o mundo não é o mesmo. Os debates sobre engenharia de redes e segurança da informação deixaram de ser apenas para os "iniciados" nas tecnologias e o medo de ver seus e-mails e históricos de navegação bisbilhotados fez com que o assunto se espalhasse por toda a sociedade. Aqui no Brasil, um dos alvos conhecidos do esquema de espionagem, o tema foi algo de muitas piadas nas redes sociais. Mas apesar da galhofa típica do povo brasileiro, muita gente passou a compreender que a Internet como conhecemos está sob ameaça.

Fora das nossas fronteiras, o tema já faz parte da agenda de manifestações há anos, especialmente nos Estados Unidos, onde tentativas de controlar a Internet sob o mote de reduzir a pirataria na rede provocaram reações fortes da sociedade. Os dois principais instrumentos para esse controle nos EUA são o Stop Online Piracy Act e o Protect IP Act, conhecidos como Sopa e Pipa. A onda de protestos da sociedade fez com que as propostas fossem para a gaveta, o que deu novo ânimo para o ativismo em prol da liberdade de expressão na Internet.

Inspirados no sucesso contra o Sopa e o Pipa, esses mesmos ativistas têm se engajado agora em lutar contra a espionagem internacional. O ponto alto deste movimento é o Fight Back, um movimento iniciado no ano passado que reúne mais de 360 organizações em 70 países exigindo a aplicação dos princípios dos direitos humanos nos projetos de vigilância das Nações. Hoje é um dia importante para o movimento. Neste 11 de fevereiro as entidades estão colhendo assinaturas em todo o mundo em apoio à iniciativa. Esse apoio público pode fortalecer projetos de proteção dos cidadãos contra a vigilância em massa aqui e em todo o mundo. Quem se interessou sobre o tema pode ler mais no site http://bit.ly/fightbackbr.

O movimento "Hoje Nós Contra-Atacamos" não podia ter escolhido data melhor para o Brasil. Neste momento dezenas de entidades civis estão reunidas em Brasília para discutir exatamente quais os melhores caminhos para a governança da Internet sem que a sociedade saia lesada. Trata-se de uma reunião preparatória para o Encontro Global Multissetorial sobre o Futuro da Governança de Internet, que acontecerá no fim de abril, em São Paulo. A mobilização também gerou uma segunda pauta: a tentativa de evitar que o Marco Civil da Internet seja aprovado sem que fique clara a preservação da liberdade de comunicação no texto. Na verdade, um assunto não vive sem o outro. Nos últimos tempos, o discurso das empresas de controlar o conteúdo trafegado na Internet tornou-se a nova fronteira da "governança" da rede. As empresas defendem que, sem uma gestão rígida da rede, onde elas possam discriminar os clientes com base no tráfego (e cobrar mais, é claro), o modelo de negócios da web se tornará insustentável, Por outro lado, as entidades civis veem nesse controle o fim da rede livre ao excluir quem não terá dinheiro para adquirir um pacote que permita o upload de informações mais pesadas, como vídeos.

O drama aumentou com a iminência da aprovação do Marco Civil da Internet, incluído novamente na lista de prioridades do governo neste início de 2014. O projeto era o xodó dos movimentos sociais. Mas recentes mudanças no texto afastaram os antigos apoiadores. O núcleo da controvérsia é a flexibilização do conceito de neutralidade de redes - que, basicamente, impede que as empresas discriminem os clientes pelo conteúdo solicitado na rede - e as medidas voltadas para a segurança da informação. No entendimento das entidades, o texto atual permite que as companhias telefônicas burlem o conceito da neutralidade. E as ferramentas para aumentar a segurança na Internet esbarrariam perigosamente na liberdade de expressão dos cidadãos.

Boa parte das entidades aqui reunidas produziram uma carta aberta ao deputado Alessandro Molon (PT/RJ), relator do Marco Civil, pedindo a revisão do projeto sob pena de a sociedade retirar seu apoio à nova lei. No documento, as organizações civis apontam "graves retrocessos" no último relatório e criticam a busca do apoio das teles a qualquer custo. "Reconhecemos a importância dos esforços de se construir maioria parlamentar no apoio ao texto, mas esses esforços não podem colocar em risco os princípios fundamentais da lei", afirmam.

O Brasil tem a oportunidade de liderar essa nova onda em defesa da liberdade de expressão e da preservação dos direitos humanos na Internet. Logo após descobrir que havia sido pessoalmente espionada pela NSA, a presidente Dilma Rousseff fez um discurso na ONU defendendo esses princípios e rechaçando as políticas de vigilância global. A aprovação do Marco Civil da Internet foi citada pela presidente como a principal ferramenta para a proteção do povo brasileiro. Agora, a sociedade alerta que, da forma como o texto está, a nova lei pode prejudicar ainda mais os cidadãos. É difícil saber se a carta sensibilizou os parlamentares, mas a votação, que poderia ocorrer ainda hoje, foi adiada para a próxima semana. A pergunta do dia é: o Brasil irá ou não contra-atacar?