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Fonte: IDG Now! - Circuito de Luca
[18/02/14]
#Marcocivil: a hora da verdade - por Cristina de Luca
A sorte está lançada. Criticado pelas operadoras de telefonia, que não gostaram
da justificativa do relator para o princípio de neutralidade de rede, por
provedores de acesso e de conteúdo, que garantem que o texto já não reflete o
Decálogo do Comitê Gestor da Internet, e dá uma carta branca ao governo
brasileiro para controlar o uso da rede e até por ativistas, que enxergam na
ampliação das obrigações de guarda de registros de acesso a aplicações uma
licença para o grampo compulsório de toda navegação realizada, invertendo o
princípio constitucional da presunção de inocência, o Marco Civil da Internet
começa a ser debatido publicamente em Plenário – e deve ser votado na Câmara –
esta semana.
A previsão era a do início de debates hoje. Durante a manhã, porém, o presidente
da Câmara, Henrique Eduardo Alves, afirmou que os debates – e a provável votação
do projeto (PL 2126/11) – foram adiados para amanhã, quarta-feira, 19/2. Na
semana passada, Alves afirmou que a proposta seria votada nesta semana de
qualquer maneira, já que o texto está trancando a pauta de votações do Plenário
há quatro meses, por estar tramitando com urgência constitucional.
O relator, Alessandro Molon (PT/RJ), garante ter apoio da maioria dos partidos
para aprovação do texto, sem muitas alterações. Mas a bancada do PMDB, liderada
pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ), pretende votar um destaque em separado
recolocando no texto emendas desconsideradas pelo relator, de autoria do próprio
Eduardo Cunha e do deputado Ricardo Izar (PSD/SP) que comprometem o princípio de
neutralidade de rede como compreendido em todo o mundo: o tratamento isonômico
do tráfego internet, salvo exceções de natureza técnica. Entre elas, a que dá às
operadoras a possibilidade de oferta de “condições especiais de tráfego de
pacotes de dados entre o responsável pela transmissão e terceiros interessados
em provimento diferenciado de conteúdo, desde que não haja prejuízo ao tráfego
normal de dados”. Você quer ver a sua banda larga fixa funcionando e sendo
cobrada como a sua banda larga móvel? Eu não quero.
E não vejo no princípio de neutralidade defendido no Marco Civil uma ameaça a
serviços como a cobrança reversa, que viabilizariam a tal banda larga gratuita
para acesso a sites do governo e acordos como o acesso gratuito ao Twitter e a
Facebook a partir de planos de determinadas operadoras móveis.
A votação do Marco Civil na Câmara, em tese, não esgotará o debate sobre muitas
das questões que, certamente, ainda correm o risco de serem modificadas., como a
própria neutralidade de rede, a imputabilidade dos provedores de conteúdo, a
guarda dos logs de conexão e acesso, a obrigatoriedade do armazenamento em data
centers localizados no Brasil, etc. O texto aprovado na Câmara, qualquer que
seja ele, ainda passará pelo Senado, onde poderá sofrer novas mudanças a serem
validadas ou não pela Câmara, novamente e pela sanção presidencial. Portanto,
muita água ainda vai rolar até podermos nos orgulhar de sermos, talvez, o
primeiro país do mundo a ter uma lei resguardando os direitos dos internautas e
estabelecendo os deveres dos provedores de conexão e de acesso a serviços na
rede.
Na última conversa que tive com Molon, o deputado me pareceu abatido, exausto
mesmo, porém seguro de que o texto final, acordado com lideranças de diversos
partidos, estaria redondo o suficiente para não sofrer demais nas votações na
Câmara e no Senado. Suas convicções começam hoje a serem colocadas à prova. Em
jogo, o desenho do mercado digital que teremos daqui a cinco anos.
É difícil motivar a massa de internautas a se envolver no debate de temas tão
espinhosos. Mas é bom que essa massa saiba que, hoje, no Congresso, aqueles nos
quais votaram começam a decidir se a Internet continua como é, ou vira uma rede
de promoção de desigualdades e controle. E que sem pressão popular, poucos,
defensores de interesses diversos, nem sempre nobres, podem atentar contra a
privacidade e a livre iniciativa de muitos, em nome da segurança e livre
iniciativa de poucos.
Princípios de neutralidade da rede estão no cerne da cultura internet. Acesso
aberto e liberdade para inovar são amados por todos os envolvidos, bem como a
proteção desses recursos é de fato uma questão indissociável da privacidade,
liberdade de expressão, igualdade civil e progresso humano.
O equilíbrio entre a neutralidade imposta e a neutralidade consensual é o que
deveríamos cobrar. Bem como o bom senso no que deveríamos guardar e onde.
A hora de se fazer ouvir é agora! E também nas urnas, em outubro.
“Se a Internet tropeçar, não será por falta de tecnologia, visão ou motivação. É
porque não pudemos definir uma direção e coletivamente marchar para o futuro.”
Bob Kahn