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Fonte: Estadão / Colunas
[26/03/14]
Marco Civil impôs ao governo a negociação que recusava - por João Bosco
Rabello
O governo deve o êxito da aprovação do Marco Civil da Internet à disposição que
lhe foi arrancada pelo PMDB para negociar politicamente o conteúdo do projeto, a
que se recusava preso a uma intransigência pessoal da presidente Dilma Rousseff.
Pouco afeita à negociação, acostumada no governo anterior, e neste, a uma
relação impositiva com o Congresso, movida a cooptação, a presidente demorou a
perceber que personalizar no líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), a
insatisfação da bancada, foi um erro primário.
Serviu apenas para ampliar a liderança e a visibilidade de Cunha que cresceu com
o debate direto travado com a chefe de governo. Ao pretender isolá-lo, Dilma
acabou isolando a bancada do partido e parte da base formada por outras
legendas, orientando suas ações por uma idiossincrasia pessoal.
O episódio é politicamente didático. No contexto das necessidades do governo,
tornou-se subjetiva as avaliações sobre o caráter do líder do PMDB, ou de seu
perfil pragmático, traduzido por muitos como fisiológico. Um filtro purista que,
aplicado com rigor, resultaria em poucos interlocutores no Congresso.
O Marco Civil não perdeu seu conteúdo essencial e foi aprimorado ao reduzir o
poder presidencial para a sua regulamentação, baseando-a no texto constitucional
e ampliando o fórum que dela se encarregará, onde se inclui o Comitê Gestor da
Internet.
Na versão original, o projeto estabelecia a regulamentação como prerrogativa
presidencial a ser materializada por decreto. O mérito da resistência de Cunha,
ainda que não por virtude, foi o de impor ao governo o ônus da negociação a que
se negava.
Consolidou-se assim a votação como um raro momento de negociação política que
deve reger naturalmente as relações entre Executivo e Legislativo. Os dois
últimos grandes projetos que seguiram essa linha foram o do Código Florestal e o
da reforma dos Portos, ambos com desfechos que não contemplaram integralmente a
versão original do governo, mas que chegaram a uma conclusão por acordo de
maioria.
A negociação é a essência da política e o regime de cooptação que vinha
predominando sustentado pela popularidade de Dilma – e, antes, de Lula -,
acabaram por inibi-lo, deformando o processo político.
Nada disso seria possível sem a avaliação popular dos governos, a mais
contundente manifestada nos protestos de junho que reduziu à metade a aprovação
da presidente, impondo-lhe o exercício da política, que publicamente rejeita.
A forte influência do perfil da presidente na condução dos negócios de governo
também lhe custou o revés econômico com origem na desconfiança generalizada dos
agentes econômicos, de que é retrato mais visível o rebaixamento da nota de
crédito do Brasil pela agência Standard & Poors.