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Leia na Fonte: Teletime
[30/04/15]
Marco Civil: Netflix, Fiesp, teles e Intervozes se posicionam sobre neutralidade
- por Bruno do Amaral
O Ministério da Justiça encerrou nesta quinta-feira, 30, o prazo de
contribuições para consulta pública sobre a regulamentação do Marco Civil da
Internet (MCI). Segundo a entidade, foram quase 1 mil comentários distribuídos
em mais de 300 assuntos, com quase 200 mil acessos feitos por mais de 40 mil
visitantes desde o início do debate, no dia 28 de janeiro. Dentre os pontos mais
polêmicos, as exceções à neutralidade de rede foram os mais visados.
De última hora, algumas entidades apresentaram contribuições, sobretudo no tema
do tratamento isonômico de pacotes. Uma delas foi um coletivo de entidades do
setor de telecomunicações, representando Febratel, Sinditelebrasil, Sindisat,
Telcomp, Telebrasil, Abrafix, Acel e Abinee, que enviou uma defesa focada na
preservação da "liberdade dos modelos de negócios", ou seja, o modelo de
navegação patrocinada. A alegação é que "ofertas que não cobram do usuário o
acesso a algumas aplicações, conteúdos e serviços não se confundem com o
conceito de neutralidade de rede da Lei".
A indústria afirma ainda: "A abrangência do conceito de neutralidade de rede
aprovado na referida Lei tem sua aplicação voltada às atividades de transmissão,
comutação ou roteamento dos pacotes e, dessa forma, garante que as redes de
telecomunicações, ao executarem tais funções, dispensarão um tratamento
isonômico a qualquer pacote de dados, independentemente de seu conteúdo, origem
e destino, serviço, terminal ou aplicação. Nenhum privilégio de tráfego é dado
aos pacotes direcionados ou recebidos referentes à referida aplicação. Todos os
pacotes recebem um tratamento isonômico."
A defesa das entidades é que a regulamentação da neutralidade deve ser
principiológica, sem explicitar todas as exceções. Interessante notar, todavia,
que cita como um caso de exceção "serviços que demandem requisitos técnicos
diferenciados", como "teleconferência, telemedicina, segurança e vídeos de ultra
definição". Elas defendem ainda a livre monitoração de metadados contidos em
pacote - ou seja, a análise de cabeçalhos de cada protocolo usado na Internet em
diferentes camadas. A justificativa é a de garantir a adequada gestão da rede.
Por fim, defendem que a neutralidade não proíba a cobrança por volume de tráfego
de dados, permitindo assim às operadoras encerrarem o fornecimento de acesso em
caso de o usuário estourar a cota mensal. "A interrupção da navegação após o
consumo total da franquia de dados, estabelecida de forma clara e inequívoca em
seu plano de serviço, não se constitui em quebra de neutralidade", defendem.
Outra entidade do setor, a Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da
Informação e Comunicação (Brasscom, que conta entre os associados empresas como
Algar, Microsoft e Google), defende a neutralidade, mas sugere permitir "modelos
de negócios alternativos" para oferecer universalização da Internet por meio de
navegação patrocinada. "É importante que a regulamentação do Marco Civil não
proíba modelos de negócio baseados em planos que ofereçam acesso a serviços de
conexão de Internet subsidiados ou que não limitem a franquia de dados para
algumas aplicações".
Visão antagônica
Naturalmente, há discordância no tema. O Coletivo Intervozes sugere a criação de
um Sistema de Proteção à Neutralidade de Rede. "Somente dessa maneira será
possível garantir uma ação contínua e dinâmica voltada à previsão de normas
complementares ao regulamento, à definição de padrões e parâmetros técnicos, à
fiscalização permanente (e não só responsiva a denúncias e casos específicos de
violação) e ao estabelecimento de punições com base no Marco Civil da Internet e
demais legislações aplicáveis." Essa entidade seria um trabalho coordenado entre
Anatel, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a Secretaria
Nacional do Consumidor (Senacon) e o CGI.br (com o braço operativo NIC.br).
O coletivo entende que os desafios podem ser abordados com o "trabalho
articulado dessas instituições, cada uma na sua esfera de atribuições, com a
designação de servidores e recursos internos dedicados à regulação e
fiscalização da neutralidade da rede". O Sistema deveria ainda publicar
mensalmente os casos recebidos e analisados com base na Lei de Acesso à
Informação.
A Federação de Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) considera que o
princípio da neutralidade não deve ser "burlado por meio de lobby pelas grandes
operadoras, razão pela qual é necessário que a lei e o regulamento sejam claros
neste sentido". A entidade pede tratamento de pacote de dados de forma isonômica
tanto para a Internet fixa quanto móvel. Sugere ainda fiscalização rígida para
monitorar eventual descumprimento do princípio por parte das teles, inclusive no
caso de degradação de tráfego de serviços de provedores de conteúdo "que não dão
retorno financeiro aos prestadores de serviço". Assim como o Intervozes, também
considera que deveria ser criado um órgão específico, subordinado ao Ministério
da Justiça e seguindo parâmetros técnicos do CGI.br, para a atribuição de
fiscalização.
Para a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC do Ministério Público
Federal), a neutralidade tem a premissa básica de impedir as vias rápidas (fast
lanes), que fariam diferenciação de velocidade de acesso por serviço e em
detrimento a concorrentes. O PFDC coloca uma noção genérica de "guiar-se pela
ideia de rede livre", sem especificar questões técnicas. "Pequenos negócios
somente florescem na rede porque estão em igualdade com empresas já
estabelecidas. Qualquer exceção que viole esse pensamento, viola a neutralidade
de rede."
Livre interconexão para OTTs
Esse ponto é caro a um dos maiores provedores de conteúdo do mundo, a Netflix,
cujo documento de contribuição foi assinado pela diretora de relações
governamentais e políticas públicas da companhia para a América Latina, Paula
Pinha, e já havia sido noticiado por este boletim. A over-the-top (OTT) afirma
que é necessária a adoção de neutralidade não apenas na última milha, mas também
no ponto de acesso - do contrário, as regras seriam "insuficientes". "A ausência
de diretrizes que tratem do abuso no ponto de acesso a rede do detentor da
última irá prejudicar a eficácia de qualquer regra de Internet aberta ou de
proteção ao consumidor que seja adotada no Brasil".
A Netflix alega que, sob nenhuma circunstância, os provedores de Internet (ISPs)
deveriam cobrar dos provedores de conteúdo uma taxa para a administração da
rede. Trata-se de uma referência clara à prática de operadoras norte-americanas
como Comcast e Verizon, que exigiram o pagamento de um "pedágio" para evitar o
estrangulamento do tráfego nas portas, alegando que o serviço OTT exigia muita
capacidade. Ou seja: ela quer que os provedores sejam obrigados a fornecer
"capacidade de interconexão suficiente, evitando congestionamento nos pontos de
acesso de dados" para que os assinantes recebam o tráfego na velocidade
adquirida, desde que não seja além da própria capacidade de rede do provedor.
A empresa considera justa a flexibilidade para os ISPs para gerenciar a rede,
tanto na última milha quanto no ponto de interconexão às redes de acesso.
"Entretanto, as situações nas quais essa discriminação e/ou degradação são
legalmente aceitas devem ser muito restritas". Pede ainda que não haja
favorecimento de provedores de conteúdo específicos "em troca do recebimento de
qualquer pagamento ou outra forma de vantagem".
Assim, a Netflix declara que essas medidas sigam regras de transparência, que
deveriam ser implantadas e executadas pela Anatel. Na visão da empresa, a
agência "deverá obrigar os prestadores de serviços de conexão a Internet a
divulgarem informações significativas sobre a fonte, localização, horário,
velocidade, perda de pacotes e duração de congestionamento na rede". Essas
informações seriam divulgadas em tempo real. A inclusão da Anatel se
justificaria porque os provedores de conteúdo são considerados como serviço de
valor adicionado, abrigado pela LGT e, por isso, regulamentado pela agência.