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Fonte: Convergência Digital
[20/05/15]
Acesso ‘gratuito’ domina consulta da Anatel sobre Marco Civil da Internet -
por Luís Osvaldo Grossmann
A consulta pública da Anatel para ‘tomada de subsídios’ ao processo de
regulamentação da neutralidade de rede, como prevê o Marco Civil da Internet,
mais uma vez demonstrou que esse debate está dominado pela questão dos acessos
gratuitos, ou planos patrocinados, ou, ainda, ‘zero rating’. O tema foi
frequentemente mencionado mesmo nas contribuições que não tratavam das questões
sobre modelos de negócios.
Longe de ser uma exclusividade brasileira, planos de acessos gratuitos estão se
disseminando em diversos países, especialmente por contar com patrocinadores de
peso como Facebook e Google e operadoras móveis de grosso calibre em todos os
continentes.
Mas se a prática se difunde, crescem as críticas. No Brasil, diversas entidades
criticaram um suposto entendimento da presidenta Dilma Rousseff com o dono do
Facebook, Mark Zuckerberg, em prol do Internet.org no Brasil. Nesta semana, o
próprio Zuckerberg foi destinatário de uma carta aberta de 65 entidades em 30
países, onde apontam que “o acesso aos pobres aparece como justificativa para
violações à neutralidade de rede”.
É justamente aí o forte do debate no Brasil, que aguarda a regulamentação do
artigo 9o do Marco Civil – onde se define que a regra é a neutralidade de redes,
mas permitem-se exceções. Em tese, são exatamente as exceções o foco da
regulamentação a ser feita por Decreto presidencial, ouvidos Anatel e o Comitê
Gestor da Internet no Brasil, CGI.br.
Sem surpresas, as teles defendem que os planos de acesso gratuito ou
patrocinados sejam liberados. Diversas contribuições – Claro, Vivo, Tim e Sky,
além de seus sindicatos empresariais e empresas de tecnologia como Ericsson e
Qualcomm – insistem que esse tipo de plano não fere a neutralidade e, portanto,
não há por que ser considerado como uma violação a ela. A Claro sintetiza bem
esse raciocínio:
“Ofertas que não cobram do usuário o acesso a algumas aplicações, conteúdos e
serviços não violam a neutralidade. Não degradam nem limitam acesso a nada. Se o
usuário contratou um plano de acesso à Internet com uma determinada franquia e
se algumas aplicações não geram débitos aos créditos contratados, neste caso não
há nenhuma relação entre a prática da não cobrança com o conceito de
neutralidade de rede, pois nenhum privilégio de tráfego é dado aos pacotes
direcionados ou recebidos referentes à referida aplicação.”
Além de usarem aquele encontro de Dilma com Zuckerberg como argumento, as
empresas batem no que pode muito bem ser o coração do debate: a neutralidade de
rede é um conceito técnico em que todos os pacotes de dados devem ser tratados
igualmente, enquanto o ‘acesso gratuito’ envolve uma questão muito mais ligada à
práticas anticompetitivas (ou não, como defendem). Ou seja, não caberia ao Marco
Civil ou sua regulamentação se envolver com algo que seria mais afeito aos
órgãos antitruste.
“O Marco Civil propugna diversas ações em prol da Internet abrangente e para
todos, mas não é um marco econômico/estratégico/concorrencial. Ele não cuida da
inclusão na rede, não cuida dos preços praticados e de se há ou não concorrência
em quantidade e qualidade adequadas. E não cuida de modelo de negócios”, pontua
uma das 110 contribuições à consulta da Anatel.
Não é Internet
Diferentemente dos setores organizados, as críticas ao ‘acesso gratuito’ na
consulta da Anatel foram lideradas por pessoas que enviaram suas sugestões. Elas
sustentam que “o indivíduo fica preso ao conteúdo patrocinado e a ele resume a
sua experiência na internet. Isso leva à equivocada sensação de que a população
está tendo acesso à internet, quando, na verdade, apenas o número de isolados na
ilha do Facebook é crescente”.
Ou, ainda, que, “embora ofertando gratuidade em determinado serviço de uma
empresa, o mesmo serviço prestado por uma concorrente estará sendo
economicamente discriminado”. “Embora aparentemente favoreçam os usuários, têm
efeitos devastadores na competição para outros prestadores de aplicações não
envolvidos no acordo”.
A Proteste, associação de defesa dos consumidores lembrou o jargão comum em
diferentes setores econômicos de que ‘não existe almoço grátis’. “O preço pelo
zero-rating será pago com a violação à privacidade dos usuários e com a violação
ao direito de liberdade de expressão”.
A crítica mais estruturada aos planos gratuitos veio do maior portal brasileiro,
o UOL, do grupo Folha. “Tratar o acesso a determinados conteúdos de forma mais
vantajosa que outros se enquadra igualmente no proibitivo de tratamento não
isonômico, e, como se não bastasse, resulta num bloqueio velado, pela via
econômica, algo mortal ao conceito de isonomia e de não distinção entre
pacotes.”
Para o UOL, também vale lembrar que não são os usuários da Internet que escolhem
quais serão os sites que eles poderão visitar ‘gratuitamente’. “Esse mecanismo
evidencia uma preferência, uma escolha por uns em detrimento de outros, escolha
que não será feita pelo usuário, cuja liberdade de informação e expressão,
dentre tantos outros direitos, foi tão enfatizada pelo Marco Civil da Internet”.