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Fonte: Convergência Digital
[20/04/16]
Afinal de contas, quanto vale um pacote de internet? - por Dane Avanzi*
A “Sociedade da Informação”, na qual todas as pessoas conseguem se comunicar o
tempo todo praticamente em toda parte do mundo habitável, consagrou o uso da
internet móvel, como bem de consumo essencial para o cidadão, assim como a água
e a eletricidade, guardadas as devidas proporções. Que a internet móvel no
Brasil é cara e de má qualidade isso não é novidade para ninguém. Mas, afinal de
contas, quanto vale um pacote de internet?
Acostumadas a deitar e rolar no bolso do brasileiro, o céu tem sido o limite
para as operadoras, e o Brasil um verdadeiro paraíso, em razão da ineficiência
da tutela jurisdicional que é lenta demais e da regulação que é titubeante em
coibir excessos. Sem efetividade, a Anatel - Agência Nacional de
Telecomunicações, vez por outra multa as operadoras, que por sua vez vão
discutir o valor da multa por décadas na Justiça Federal atolada em processos. O
resultado desse imbróglio deixa o consumidor dormindo no sereno, como diz o
adágio popular.
Some-se a isso a propaganda agressiva de todas as operadoras, prometendo
serviços incompatíveis com a realidade, dito ilimitados. Há ainda a carga
tributária escorchante que as empresas brasileiras e cidadãos em geral são
submetidos e tem-se o quadro de desalento e cilício imposto ao indefeso
consumidor brasileiro de telecomunicações.
Criada em 1997, para ser uma agência reguladora, a Anatel ao longo do tempo foi
se distanciando de seu principal mister, qual seja, fiscalizar. Eis que o uso
excessivo do laissez faire - deixar o mercado se ajustar - conduziu a uma
situação de afrouxamento das obrigações das operadoras com o consumidor. Tal
doutrina liberal funcionou por um tempo enquanto havia competição com melhoria
real de qualidade entre as operadoras. Eu mesmo mudei de operadora algumas vezes
no passado e senti diferença positiva em custo e qualidade. Hoje mudar é trocar
seis por meia dúzia, ou por três.
Não há como dissociar dessa análise dois fatores inesperados para as operadoras,
que agravaram ainda mais o quadro atual: o uso crescente de aplicativos como o
WhatsApp e o aprofundamento da crise financeira que assola o Brasil, que
acabaram por impactar negativamente as receitas das operadoras. Por essas e
outras, a situação começa a ficar insustentável financeiramente para muitas,
seja por dívidas que se acumulam há anos com difícil possibilidade de
reestruturação, seja pela pressão exercida pelas matrizes estrangeiras que
exigem lucros e dividendos, aviltando ainda mais os investimentos tão
importantes para manutenção e expansão da rede - fato que leva a um ciclo
vicioso, fragilizando ainda mais a qualidade dos serviços ofertados pelas
operadoras.
Recentemente, mais uma vez o assunto da pauta voltou a ser o bloqueio de dados
pelas operadoras, que sistematicamente vem aumentando o preço dos pacotes de
dados. Na prática, o bloqueio é uma maneira de forçar o consumidor a migrar para
um pacote mais caro. As operadoras tem uma certa razão quando argumentam que
banda é custo, e esse custo alguém tem que pagar. Um eventual aumento até seria
plausível, se a internet móvel tivesse qualidade e as operadoras estivessem
cumprindo as metas de universalização (chegando a áreas rurais de municípios
carentes e distantes). Contudo, isso não ocorre e prejudica muito o país, haja
vista a internet ser ferramenta de promoção social, educação e cidadania,
especialmente em comunidades carentes.
Cabe destacar que o papel social a que se obrigaram a desempenhar por força do
contrato de concessão de um serviço público essencial à sociedade, há tempos jaz
esquecido. Por isso, entendo que validar que cobrem mais por um serviço de
péssima qualidade é ilegal, especialmente por ferir o Marco Civil da Internet,
distinguindo os tipos de conteúdo, como algumas operadoras pretendem fazer.
Por conta disso, permitir o aumento de tarifas, além de prejudicar a todos os
brasileiros, premia a ineficiência, aprofunda a crise financeira e piora o
problema já instalado. Penso, pelos fatos acima descritos, que hoje no Brasil,
ninguém sabe ao certo o preço justo de um plano de internet, e isso é muito
grave. Seja como for, uma coisa é certa, quanto mais se adiam os ajustes
necessários à normalização do mercado, tanto mais drásticas serão as
consequências para o governo federal, para as operadoras e para a sociedade que
tanto precisa do serviço.
*Dane Avanzi é advogado, empresário de telecomunicações e presidente da Aerbras
- Associação das Empresas de Radiocomunicação do Brasil.