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Leia na 
Fonte: Optoclean
[19/10/16] 
A 
criptografia no Marco Civil da Internet - por Bernardo de Azevedo e Souza e 
Mauricio Brum Esteves
Bernardo de Azevedo e Souza – Mestre em Ciências Criminais. Advogado.
Mauricio Brum Esteves – Mestrando em Direito. Advogado.
Em abril de 2016, o WhatsApp anunciou uma atualização que possibilitava 
encriptar integralmente as comunicações entre os usuários, incluindo as 
mensagens de voz. À época, muitas pessoas se questionaram quais exatamente eram 
os benefícios do novo recurso, intitulado criptografia de ponta a ponta (end-to-end 
encryption).
Passados mais de 6 meses desde a atualização, poucos são os usuários que 
realmente utilizam o serviço de encriptação oferecido pelo WhatsApp. Do que se 
observa pelos comentários em sites, relatos em fóruns e pelo próprio contato 
diário com o aplicativo, a maioria dos usuários desconhece o conceito de 
criptografia.
Diante dos inúmeros debates sobre a privacidade das comunicações em aplicativos 
de mensagens instantâneas, que inclusive chegaram aos tribunais e foram objeto 
de decisões judiciais polêmicas no Brasil e nos Estados Unidos, entendemos de 
suma importância compreender melhor a encriptação de dados e informações.
Assim, a pretensão da coluna de hoje é esclarecer o conceito de criptografia, 
suas implicações para o usuário e, finalmente, como o Marco Civil da Internet se 
posiciona sobre a questão. Comecemos, então, pelo ponto principal: afinal, o que 
se entende por criptografia?
COMPREENDENDO A CRIPTOGRAFIA
Criptografia é o estudo dos princípios e técnicas pelas quais alguma informação 
pode ser transformada, de sua forma original, para outra ilegível. A finalidade 
da criptografia (ou encriptação) é tornar difícil o acesso de alguém – não 
autorizado – a determinada informação.
Uma vez encriptado, o conteúdo somente poderá conhecido por seu destinatário, o 
detentor da “chave secreta”. No caso da criptografia de ponta a ponta do 
WhatsApp, as mensagens são “embaralhadas” ao deixar o telefone da pessoa que as 
envia e só conseguem ser decodificadas no telefone de quem as recebe.
O processo de encriptação da informação pode ser ilustrado da seguinte forma:
Exemplo histórico: durante a Segunda Guerra Mundial, as mensagens enviadas pela 
Alemanha Nazista às suas bases eram todas criptografadas. Somente os próprios 
alemães – receptores dos conteúdos – podiam acessar as informações, pois 
detinham a chave para decifrar as mensagens.
Com a criação da máquina Enigma pelo matemático britânico Alan Turing, 
considerado o “pai” da computação, descobriu-se a chave criptográfica utilizada 
pela Alemanha Nazista. Com isso, as mensagens passaram a ser decifradas, levando 
o grupo dos Aliados a desvelar os planos e o posicionamento dos navios alemães.
CRIPTOGRAFIA E A POLÊMICA COM O WHATSAPP
Embora tenha sido empregada inicialmente no âmbito militar, a criptografia 
recentemente passou a chamar a atenção dos brasileiros, quando o WhatsApp 
afirmou que não poderia cumprir uma determinação judicial de entrega de conteúdo 
de comunicações privadas, para fins de persecução criminal.
Na ocasião, o argumento do Whatsapp foi o de que todas as mensagens que trafegam 
no seu aplicativo são criptografadas. Em outros termos, disse não ter acesso ao 
conteúdo das mensagens de seus usuários, à semelhança dos Correios, que não 
possuem acesso ao conteúdo das cartas entregues aos destinatários.
A diferença principal é o de que os Correios não precisam empregar maiores 
esforços para garantir a privacidade das cartas que são entregues. Basta manter 
a incolumidade dos documentos. A mesma lógica, entretanto, não funciona para 
aplicativos de mensagens instantâneas.
Como regra, os operadores de aplicação que oferecem essa modalidade de serviço 
têm pleno acesso ao conteúdo das mensagens. Para garantir a privacidade dos seus 
usuários, portanto, o WhatsApp decidiu criptografar todas as comunicações 
privadas, para que apenas o emissor e o receptor tivessem acesso ao conteúdo da 
mensagem.
Como era de se esperar, tal fato gerou uma verdadeiro alvoroço na sociedade 
brasileira, que, cansada de tanta violência, destilou toda sua “sede de punição” 
ao aplicativo.
Argumentos como “criptografia só serve para encobertar bandido” e “o Marco Civil 
veda o anonimato” passaram a ser corriqueiros nas redes sociais. Mas, afinal, o 
Marco Civil da Internet veda a utilização de criptografia? A criptografia serve 
apenas para “proteger bandido”, pois “quem não deve não teve”?
Partiremos em busca de respostas sobre estes questionamentos.
O MANIFESTO CYPHERPUNK
Em 1993, o mundo conheceu o Manifesto Chyperpunk (A Chyperpunk’s Manifesto) 
pelas mãos de Eric Hughes. O movimento Cypherpunk ganhou força no final dos anos 
80, quando um grupo informal de pessoas se uniu para defender a privacidade e a 
segurança na Internet.
O termo Cypherpunk é um trocadilho com as palavras cypher (referente à 
criptografia) e cyberpunk (junção dos termos “cibernética” e “punks”). Faz 
alusão ao movimento que emprega a alta tecnologia para engrenar uma onda de 
protestos “pacíficos” na sociedade, que envolvem música, arte, literatura, etc.
Diante da expansão das formas de controle virtuais e do atrofiamento das zonas 
de privacidade, o movimento Cypherpunk se forma como oposição, a fim de devolver 
ao indivíduo o controle sobre sua própria liberdade e privacidade na Internet.
Conforme denuncia Eric Hughes, em seu Manifesto, a Internet trouxe consigo uma 
mudança de paradigma, que progressivamente nos expõe e diminui nossas zonas de 
privacidade. Antigamente, quando alguém se direcionava a uma banca de revistas 
para adquirir algo, essa transação era absolutamente anônima.
Com o advento da Internet, entretanto, todos os processos de compra de bens 
exigem identificação. A operação pode ser rastreada, assim como a própria 
operação financeira. O mesmo caso se denota com a operação dos Correios.
Antes, os Correios simplesmente efetuavam as entregas das correspondências, sem 
que fossem abertas. O conteúdo revelado ou uma cópia da mesma fosse arquivado 
pelos Correios. Hoje, ao utilizarmos o Correio eletrônico, o provedor do e-mail 
tem plena ciência da nossa identidade e de todas as nossas comunicações, em seu 
inteiro teor.
Poderíamos citar inúmeros exemplos de atividades que antes podiam ser realizadas 
de forma anônima – ou com baixa exposição –, e que hoje simplesmente nos 
sujeitam a uma vigilância constante.
Experimente, por exemplo, caro leitor, caminhar por qualquer grande metrópole do 
mundo sem ser monitorado por uma câmara de vigilância. Ou tente, por exemplo, 
utilizar seu cartão de crédito em um local que você nunca esteve: 
automaticamente ele será bloqueado. Afinal, a operadora conhece você, sua rotina 
e seus hábitos de compra.
Diante desta mudança de paradigma, o Movimento Cypherpunk passou a militar em 
favor da adoção de sistemas de transação anônimos, como a Criptografia, como 
ferramenta de defesa da privacidade. De acordo com Eric Hughes,
nós não podemos esperar que o governo, as corporações, ou as grandes 
organizações, se preocupem e garantam a nossa privacidade em prol dos seus 
próprios interesses. (…) Nós devemos defender a nossa própria privacidade se 
nutrimos a esperança de ter alguma.
A denúncia ofertada pelo Movimento Chyperpunk foi recebida com forte impacto 
pela sociedade, rendendo a Hughes e aos outros dois fundadores do Movimento, 
Timothy C. May e John Gilmore, a capa da Revista Wired, edição de Maio/Junho de 
1993:
Graças ao Manifesto Cypherpunk, os anos 90’ viram crescer a influência da 
criptografia, que passou a ser utilizada nos mais diversos meios, principalmente 
empresarial e governamental. Até hoje, entretanto, não havia atingido o usuário 
comum da Internet.
Em um de seus mais famosos livros (Cypherpunks – liberdade e o futuro da 
internet), Julian Assange alerta que, ao conversamos pela Internet, nossas 
comunicações são interceptadas por organizações militares de inteligência. Na 
prática, afirma ele que hoje
“nossa vida entrou em uma zona militarizada. É como ter um soldado embaixo da 
cama (…) ou um tanque de guerra dentro do quarto.
Recentemente, algumas empresas passaram a utilizar a criptografia e o discurso 
da proteção à privacidade como fator de diferenciação de seus produtos. O 
WhatsApp, como mencionamos no início do texto, é uma deles. Outras empresas 
também já estão adotando a criptografia. Tudo no intuito de atingir o usuário 
comum da Internet.
CRIPTOGRAFIA NO MARCO CIVIL DA INTERNET
O Marco Civil da Internet veda a utilização da criptografia? A nosso juízo, não.
Embora a legislação não permita expressamente o uso da criptografia, pelo cotejo 
do local privilegiado que a privacidade foi erigida no Marco Civil – conforme 
expusemos em texto pretérito desta coluna –, parece-nos evidente ser legítimo 
todo o meio (técnico ou jurídico) que busque proteger a privacidade.
Não bastasse, o recentemente regulamento do Marco Civil da Internet (Decreto nº 
8.771/2016), em seu art. 13, IV, definiu a encriptação como diretriz sobre 
padrões de segurança da informação:
Art. 13. Os provedores de conexão e de aplicações devem, na guarda, 
armazenamento e tratamento de dados pessoais e comunicações privadas, observar 
as seguintes diretrizes sobre padrões de segurança:
(…) IV – o uso de soluções de gestão dos registros por meio de técnicas que 
garantam a inviolabilidade dos dados, como encriptação ou medidas de proteção 
equivalentes. (g.n.)
Em síntese, a utilização de criptografia foi acolhida pelo Marco Civil como 
diretriz de segurança da informação.