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Fonte: Folha de São Paulo
[23/02/10] Dirceu
recebe de empresa por trás da Telebrás
Petista foi contratado por ao menos R$ 620 mil por empresa beneficiada com
reativação da estatal de telecomunicações
Empresa nas Ilhas Virgens Britânicas comprou por R$ 1 rede de fibras ópticas que
será usada por Telebrás e pode ficar com R$ 200 mi
O líder petista e ex-ministro da Casa Civil José Dirceu participa do congresso
do PT ocorrido no último final de semana em Brasília
O ex-ministro José Dirceu recebeu pelo menos R$ 620 mil do principal grupo
empresarial privado que será beneficiado caso a Telebrás seja reativada, como
promete o governo.
O dinheiro foi pago entre 2007 e 2009 por Nelson dos Santos, dono da Star
Overseas Ventures, companhia sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, paraíso
fiscal no Caribe. Dirceu não quis comentar, e Santos declarou que o dinheiro
pago não foi para "lobby".
Tanto a trajetória da Star Overseas quanto a decisão de Santos de contratar
Dirceu, deputado cassado e réu no processo que investiga o mensalão, expõem a
atuação de uma rede de interesses privados junto ao governo paralelamente ao
discurso oficial do fortalecimento estatal do setor.
De sucata a ouro
Em 2005, a "offshore" de Santos comprou, por R$ 1, participação em uma empresa
brasileira praticamente falida chamada Eletronet. Com a reativação da Telebrás,
Santos poderá sair do negócio com cerca de R$ 200 milhões.
Constituída como estatal, no início da decada de 90, a Eletronet ganhou sócio
privado em março de 1999, quando 51% de seu capital passou para a americana AES.
Os 49% restantes ficaram nas mãos do governo. Em 2003, a Eletronet pediu
autofalência porque seu modelo de negócio não resistiu à competição das teles
privatizadas.
Resultado: o valor de seu principal ativo, uma rede de 16 mil quilômetros de
cabos de fibra óptica interligando 18 Estados, não cobria as dívidas, estimadas
em R$ 800 milhões.
Diante da falência, a AES vendeu sua participação para uma empresa canadense, a
Contem Canada, que, por sua vez, revendeu metade desse ativo para Nelson dos
Santos, da Star Overseas, transformando-o em sócio do Estado dentro da empresa
falida.
A princípio, o negócio de Santos não fez sentido aos integrantes do setor.
Afinal, ele pagou R$ 1 para supostamente assumir, ao lado do Estado, R$ 800
milhões em dívidas.
Em novembro de 2007, oito meses depois da contratação de Dirceu por Santos, o
governo passou a fazer anúncios e a tomar decisões que transformaram a sucata
falimentar da Eletronet em ouro. Isso porque, pelo plano do governo, a
reativação da Telebrás deverá ser feita justamente por meio da estrutura de
fibras ópticas da Eletronet.
Outro ponto que espanta os observadores desse processo é que o governo decidiu
arcar sozinho, sem nenhuma contrapartida de Santos, com a caução judicial
necessária para resgatar a rede de fibras ópticas, hoje em poder dos credores.
Até o momento, Santos entrou com R$ 1 na companhia e pretende sair dela com a
parte boa, sem as dívidas. Advogados envolvidos nesse processo estimam que, com
a recuperação da Telebrás, ele ganhe cerca de R$ 200 milhões.
Um sinal disso aparece no blog de José Dirceu: "Do ponto de vista econômico, faz
sentido o governo defender a reincorporação, pela Eletrobrás, dos ativos da
Eletronet, uma rede de 16 mil quilômetros de fibras ópticas, joint venture entre
a norte-americana AES e a Lightpar, uma associação de empresas elétricas da
Eletrobrás".
O ex-ministro não mencionou o nome de seu cliente nem sua ligação comercial com
o caso. O primeiro post de Dirceu no blog se deu no mês de sua contratação por
Santos, março de 2007. O texto mais recente do ex-ministro sobre o assunto saiu
no jornal "Brasil Econômico", do qual é colunista, em 4 de fevereiro passado.
O presidente Lula manifestou-se publicamente sobre o caso em discurso no Rio de
Janeiro, em julho de 2009: "Nós estamos brigando há cinco anos para tomar conta
da Eletronet, que é uma empresa pública que foi privatizada, que faliu, e que
estamos querendo pegar de volta", disse na ocasião.
Lula não mencionou que, para isso, terá de entrar em acordo com as sócias
privadas da Eletronet, entre elas a Star Overseas, de Nelson dos Santos, que
contratou os serviços de Dirceu.
Enquanto o governo não define de que forma a Eletronet será utilizada pela
Telebrás, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) conduz uma investigação para
apurar se investidores tiveram acesso a informações privilegiadas.
Como a Folha revelou, entre 31 de dezembro de 2002 e 8 de fevereiro de 2010, as
ações da Telebrás foram as que mais subiram, 35.000%, contando juros e
dividendos, segundo a consultoria Economática.