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Leia na Fonte: Monitor Mercantil
[26/02/10]  Entrevista com Joaquim Francisco de Carvalho, ex-presidente da LightPar

Rede pública de fibra óptica pode ter papel-chave na banda larga

Quando criou a Eletronet, em 1998, para administrar a rede de fibras ópticas das subsidiárias da Eletrobrás, o governo leiloou 51% daquele patrimônio público ao grupo estrangeiro AES. E para representar as subsidiárias Furnas, Chesf, Eletronorte e Eletrosul, que ficaram 49% das ações, o governo constituiu a LightPar.

Após a falência da Eletronet, a LightPar tornou-se um autêntico cabide de empregos, "aparelhada" por partidos políticos, conforme denúncia em entrevista exclusiva ao MM o engenheiro Joaquim Francisco de Carvalho, ex-presidente da empresa e consultor na área de energia.

Em vez de encerrar as atividades da LightPar, o governo resolveu apenas trocar o nome da empresa para EletroPar, que mantém sob sua gestão, sem necessidade, ações da Eletropaulo e outras empresas de energia altamente lucrativas, que rendem à empresa cerca de R$ 3 milhões anuais, que poderiam ser usados pela Eletrobrás.

O ex-presidente da LightPar revela ainda ter elaborado, em 2005, proposta que "ia muito além da inclusão digital", para colocar a rede pública de fibra óptica a serviço do desenvolvimento do país, mas o projeto foi descartado pelo governo: "A proposta previa também, entre outras coisas, que se intensificasse o intercâmbio de informações entre universidades e instituições de pesquisa, com o objetivo de tornar mais eficiente o esforço nacional nos campos da ciência e tecnologia", disse Carvalho.

Em 2005, embora quase todos 5.500 municípios brasileiros tivessem pelo menos uma cabine de telefone público, apenas 237 dispunham de acesso a serviços tais como provedor de Internet, telefonia móvel e fixa residencial.

Isso acontece, segundo o engenheiro, porque as teles não investem para estender seus serviços aos municípios mais pobre, "desinteressantes para seus planos de negócios", comentou.

Quem controla os 16 mil km da rede pública de fibra óptica?

Não tenho elementos para responder.

Do ponto de vista estratégico, qual a importância dessa infra-estrutura para desenvolvimento humano e tecnológico do país?

Cabe ao governo a iniciativa de oferecer aos municípios não atendidos o acesso a serviços de telecomunicações, visando à melhoria da qualidade de vida da sociedade, à eficiência da máquina pública e ao bom desempenho das empresas, com reflexos diretos na redução do chamado "custo Brasil". Atualmente, quase todos os 5 mil e tantos municípios brasileiros têm pelo menos uma cabine de telefone público, mas apenas uns 300 têm acesso a serviços como provedor de Internet, telefonia móvel e fixa residencial. Isso acontece porque as operadoras comerciais sabem que seu mercado está nos municípios já atendidos, e não investem para estender seus serviços aos municípios mais desvalidos, desinteressantes para seus planos de negócios.

Qual a importância da ação do Estado para evitar a concentração nesse setor?

A Eletronet era uma empresa de telecomunicações voltada para a transmissão de informações, isto é, sinais, dados, voz, imagens etc. Não se trata, portanto de uma operadora de telecomunicações, mas sim de uma transportadora de sinais (carrier of carrier). A estrutura física da rede Eletronet (backbone da rede) consubstancia-se em instalações intermediárias e terminais, em que estão instalados os equipamentos de injeção e reconversão de impulsos eletromagnéticos, e numa rede de fibras ópticas , pelas quais trafegam os sinais ópticos . O suporte mecânico dessas fibras ópticas era provido pelos cabos pára-raios que constituíam a cobertura de algumas das linhas de transmissão de energia elétrica pertencentes às subsidiárias regionais da Eletrobrás, chamadas cedentes da infra-estrutura da rede: Eletrosul; Furnas; Chesf e Eletronorte. Esse sistema, que recebeu o nome de Rede Nacional de Transporte Informações (RNTI), tinha 12.571 km de extensão.

O senhor propôs ao governo a implantação de uma rede de transporte de informações a longa distância, a partir da infra-estrutura de fibras ópticas já implantadas pelo setor elétrico. Como era sua proposta?

Nossa proposta era de que o consórcio público associasse o Serviço Federal de Processamento de Dados, do Ministério da Fazenda (Serpro), a Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação, do Ministério do Planejamento (SLTI) e a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), do Ministério da Ciência e Tecnologia, com as empresas detentoras das fibras ópticas (Furnas, Chesf, Eletronorte e Eletrosul).

Em outubro de 2005, enviei ao então ministro de Minas e Energia (Silas Rondeau, ligado ao grupo Sarney) - com cópias à ministra da Casa Civil (Dilma Housseff) e aos presidentes da Eletrobrás e das empresas participantes do projeto Eletronet - carta, relatando de forma sintética o andamento do projeto que estávamos procurando elaborar para que essas autoridades, em particular o presidente da Eletrobrás, tivessem elementos para decidir a questão da melhor forma para o país.

Por que, na sua opinião, a proposta não foi implementada?

O principal interessado no assunto, que seria o presidente da Eletrobrás (o mineiro Aloísio Vasconcelos, protegido do senador Renan Calheiros, de Alagoas) - sem conhecer detalhes do projeto, já que, ao que parece, sequer lia os relatórios de acompanhamento que eu lhe enviava, mandou interromper os trabalhos de forma inesperada, para desapontamento dos técnicos de SLTI, RNP, Serpro e das cedentes de Eletronet (Eletronorte, Chesf, Furnas e Eletrosul). Foi diante dessa indecisão que mandei a carta ao ministro, com as cópias que mencionei.

A proposta defendia algum programa de inclusão digital?

A proposta ia muito além da inclusão digital, prevendo, entre outras coisas, que se intensificasse o intercâmbio de informações entre universidades e instituições de pesquisa, com o objetivo de tornar mais eficiente o esforço nacional nos campos da ciência e tecnologia.

O que o governo ganharia com a proposta?

Poderia intensificar o intercâmbio de informações entre universidades e instituições de pesquisa, com o objetivo de tornar mais eficiente o esforço nacional nos campos da ciência e tecnologia. Teria, ainda, informações online sobre tudo o que se passa no território nacional. Poderia também agilizar os serviços de coleta de impostos e taxas (imposto de renda, contribuições trabalhistas, previdenciárias e outras) e otimizar as atividades das Forças Armadas, particularmente nas regiões de fronteira. Sem falar na melhoraria da qualidade do atendimento do INSS, entre outras possibilidades.

O governo está revitalizando a Telebrás. Em que a volta da estatal pode ser útil?

Depende da forma que a empresa tomará e de sua governança. Se ele vier a ser "aparelhada", será um desastre.

Por que o senhor propôs modelar a Eletronet como um consórcio público-privado (figura criada pela Lei 11.107, de 6 de abril de 2005), com a participação das entidades governamentais direta ou indiretamente ligadas ao setor de Telecom (SLTI, RNP e Serpro), associadas a operadoras privadas do setor?

Com isso, a Eletrobrás poderia se dedicar apenas ao setor elétrico, a sua finalidade. Naturalmente, nessa hipótese, as subsidiárias da Eletrobrás que cederam suas fibras ópticas ao sistema Eletronet (Chesf, Eletronorte, Eletrosul e Furnas) seriam ressarcidas dos investimentos que fizeram no projeto.

O que pensa da antiga Lightpar, atual Eletropar, que o senhor presidiu?

Já deveria ter sido extinta. De resto, os acionistas minoritários da Eletrobrás se queixam de que têm seus interesses dilapidados na Eletropar, que não passa de um cabide de empregos, no qual são pendurados um diretor-presidente e um diretor não-sei-de-que, ambos ociosos, além de secretárias e pessoal de apoio que não aparece nos quadros da empresa, mas custa dinheiro aos acionistas da Eletrobrás. Para fazer tudo que a Eletropar faz, bastaria um operador competente no departamento de relações com os investidores da própria Eletrobrás.